quinta-feira, 31 de dezembro de 2020

Contributo de Leonardo Coimbra no "In Memoriam de Sebastião de Magalhães Lima".´Com vídeo do texto, comentado...

Leonardo Coimbra (1883-1936) homenageou Sebastião de Magalhães Lima (1850-1928), outro grande tributo ou orador, como ele, da passagem do séc. XIX para o XX, quando este morreu, no In-Memoriam que lhe foi dedicado,  e realçou não o aspecto de possuir o dom da palavra mas sim os traços mais valiosos da sua personalidade, tais como os da sinceridade, esforço, lealdade,  ainda a luta pelos ideais do socialismo e pacifismo, que Leonardo Coimbra considerava cristãos.

                                    

Sebastião de Magalhães Lima fez um percurso típico da época: estudante de Direito em Coimbra (1870 a 1875), escritor, advogado, jornalista e fundador do Século, defensor dos ideais republicanos e socialistas, com um pendor forte de livre pensador e anti-religioso, ao contrário do seu irmão Jaime, ou mesmo de Antero de Quental e de Leonardo Coimbra, que embora passando por fases mais revolucionárias, se elevaram depois a demandas mais filosóficas e espirituais, Leonardo chegando mesmo a converter-se ao catolicismo por acção do popularmente santo padre Cruz, uns meses antes de morrer.                                                 

 Já Antero apenas admitiu, cremos que a instâncias de Oliveira Martins, concluir os seus Sonetos com o famoso Na Mão de Deus, no que pode ser visto como uma aceitação do Deísmo ou de aspectos do Cristianismo, embora evidentemente Antero tenha sido sempre  um ser em demanda da Luz, um espiritual, de certos modos místico na sensibilidade e aspiração e embora algo limitado pelas ideias-forças alternativas na época ao materialismo e ao catolicismo que se lhe ofereciam e que eram as doutrinas do inconsciente, do budismo, do panpsiquismo e do espiritualismo, tanto imanentista como transcendentalista, nestas estas últimas, as melhores, por fim se inserindo .

Sebastião de Magalhães Lima, desde a época de estudante de Coimbra, sobretudo a partir do seu 3º ano, notabilizou-se como revolucionário e foi certamente uma das consciências e vozes mais progressistas do nosso meio socia,l erguendo a voz sucessivamente contra o imperialismo britânico, a corrupção nos bancos,  a manipulação e opressão da Igreja e as incapacidades da Monarquia e foi dos maiores obreiros da implantação da República, do movimento internacionalista pacifista e do fortalecimento de Maçonaria, onde tendo sido iniciado em 1874, veio a ser o grão-mestre de 1907 a 1928. Certamente que tinha algumas limitações na sua visão do mundo, nomeadamente as derivadas da sua repulsão forte de todas as religiões (e particularmente da Igreja em Portugal), que considerava pré-históricas, prevendo o fim delas, algo que não se verificou, pois há ainda nelas ensinamentos morais, éticos e espirituais que sempre serão necessários à Humanidade. 

 
Poderíamos fazer entrar neste diálogo Fernando Pessoa, dos maiores conhecedores da Maçonaria em Portugal, crítico dela enquanto mera carbonária, anti-jesuítica e ignorante dos veios gnósticos que lhe caberiam preservar e transmitir, nomeadamente nas doutrinas iniciáticas, algo que Fernando Pessoa aprofundou bastante. E por isso na sua nota final uns meses antes de morrer se confessa Cristão gnóstico, referindo mesmo a Maçonaria, que acabara de defender face à opressão e proibição que Salazar e o deputado José Cabral instauraram.
Oiçamos então Leonardo Coimbra elogiando Sebastião de
Magalhães Lima, com alguns comentários meus inspirados no momento, do qual transcrevemos agora os primeiros parágrafos:  

«A vida do homem é testemunho da realidade, como, pelo menos, qualquer outro acontecimento da realidade fenoménica. E esse testemunho é tanto mais valioso quanto 
mais essa vida se apresenta sincera, esforçada e leal.
Foi Magalhães Lima um servidor do Ideal e a sua vida foi o combustível dessa chama, que acende os astros do destino humano.
Socialista e pacifista, eis a forma simples do seu cristianismo de realizações.
O seu testemunho sobre a vida é, pois, o da existência duma
vontade de amor, duma unificação de instintos e tendências no grande abraço da sociabilidade consciente, perfectível e progressiva. (...) »

                            

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