Fachada da parte mais antiga do Colégio Militar, antigo Hospital da Nossa Senhora dos Prazeres, junto à igreja da Luz, construído entre 1601 e 1618, por voto e testamento da filha de D. Manuel I e de D. Leonor, "a princesa muito sábia e virtuosa" Dona Maria, e que foi de administração nobre e misericordiosa dos frades e cavaleiros da Ordem de Cristo. |
Pintura do fundador Marechal Teixeira Rebelo, exposta na Biblioteca, e infelizmente fotografada com algum desfocamento. |
Fundado em 1803, como Colégio Regimental da Artilharia da Corte, e conhecido como Colégio da Feitoria, junto ao forte de S. Julião da Barra, pelo abnegado oficial de artilharia então coronel António Teixeira Rebelo (17-12-1750 a 6-10-1825), um transmontano de Santa Marta de Penaguião, vizinho do Marão, filho de agricultores e que se elevaria às mais altas funções militares no país, com uma folha de serviços notável, o Colégio da Feitoria, destinado aos filhos dos oficiais do seu regimento, e com magros rendimentos iniciais, sobreviveu graças à protecção in loco do príncipe D. João, e só em 1813 se torna Real Colégio Militar sendo em 1814 transferido para o Hospital de Nossa Senhora dos Prazeres, na Luz, tendo estado em p Mafra entre 1835 e 1859 .
Começara apenas com uns poucos jovens filhos de militares do seu regimento, e ao crescer, passando a cem, aberto a outros alunos, filhos de heróis ou necessitados, foi mantendo os seus objectivos elevados, desenhados ou arquitectados pelo seu fundador e primeiro director (de 1813 até à sua morte em 1825), de criar bons militares, almas fortes, conhecedoras, corajosas, solidárias, disciplinadas, com ética, ideais, abnegação e capazes de servir a Pátria ou Mátria com dedicação, criatividade e excelência.
E assim os professores e alunos se dedicarão ao longo de muitos anos criativamente a essa maravilhosa actividade humana que é a educação, o preparar do desabrochar para o exterior as melhores potencialidades do corpo e da psique em formação, crescimento e desenvolvimento.
Um dos directores, num quadro na Biblioteca do Colégio. |
A
forte componente de desportos, com competições renhidas anuais e
presenteadas com medalhas, e que se realizavam ao ar livre nos vários campos de jogos e onde pontificavam bons professores, ou então no
interior, tal como o xadrez, as damas, o ping-pong, estimulavam as
faculdades psico-somáticas requeridas a tais práticas, que complementavam a formação militar com tiro, cavalos, e acampamentos e marchas na tapada de Mafra.
A
tais estímulos fora do currículo estadual liceal ou colegial civil,
acrescentava-se um filme por semana, quarta-feira à noite, mensalmente as visitas voluntárias a famílias carenciadas da zona, em colaboração com as conferências de S. Vicente de Paula, e as confissões para quem quisesse num seminário de belíssimo jardim acidentado e próximo,
que sendo de noite davam uma sensação de entrada noutro mundo de fantasia. Mas havia uma capela no andar acima dos claustros, não longe da biblioteca, e onde alguns de nós podiam exprimir a sua devoção e aspiração ao bem e à Divindade divino, pela oração a qualquer hora livre e a missa ao Domingo.
Havia ainda as
visitas de estudo sempre muito apreciadas mas raras, a feira do livro anual junto à biblioteca (onde me lembro de ter comprado e muito apreciado gozado o livrinho a Conquista do Everest por sir Edmund Hillary,) e o
armário de livros ou biblioteca de cada companhia, onde muitos de nós
tomaram consciência dos escritores contestatários da época, seja os
neo-realistas Soeiro Pereira Gomes, Alves Redol e Fernando Namora, seja o
presencista José Régio, ou ainda os mais modernos Sttau Monteiro,
José Cardoso Pires e Bernardo Santareno, habilitando-nos a discernir
melhor a luta contra o que estava mal no Estado Novo e que esses escritores descreviam e apontavam. Mas havia outros autores e se esta foi a minha formação de leitura aos 14 anos outros ter-se-ao deliciado ou viajado por outras autorias, paragens ou mensagens.
Nesse in illo tempore, quando entrei para o Colégio Militar nos meus 10 anos,
tal como era a regra desde 1803, comecei uma aprendizagem e
convivência bem valiosa por seis anos escolares (já que chumbei o 1º ano e
depois saí no 5º ano, para ir para Letras) em regime de internato, com
uma saída semanal, entre o começo da tarde de sábado e o começo da
noite de domingo, dois términos-inícios semanais, certamente intensos em
todos, ao passarem-se no curto espaço de tempo de um dia e pouco, em que reeencontravamos a família e os seu ambientes, e os nossos pequenos mundos pessoais.
Formados, decorridas algumas décadas de crescimento, trabalho e amadurecimento, realizou-se este encontro dos muitos sobreviventes do curso, embora só estivessem presentes cerca de 37, com a deposição de uma coroa de flores de homenagem ao fundador, o Marechal António Teixeira Rebelo, tendo sido pronunciados no fim os nomes dos que já
partiram para o misterioso além, subtil e espiritual, com o toque de clarim. Gravei essa
cerimónia de fora do salão onde se encontra estátua do Marechal (pela exiguidade do espaço e por ter sido dos três últimos a assinar o livro do curso na biblioteca), e assim acompanhei o que se ouvia de dentro e sobretudo o som do clarim ressoando pelo
claustro e pelas almas, lembrando-me um pouco
desse belo poema de Fernando Pessoa, em que ele invoca a tradição
militar, heróica, poética e iniciática portuguesa:
(...) «Vibra, clarim, cuja voz diz
Que outrora ergueste o grito real
Por D. João, Mestre de Aviz,
E Portugal. (...)
A Todos, todos, feitos num
Que é Portugal, sem lei nem fim,
Convoca, e, erguendo-os um a um,
Vibra Clarim!
E outros, e outros, gente vária
Oculta neste mundo misto,
Seu peito atrai, rubra e templária,
A Cruz de Cristo.
Glosam, secretos, altos motes,
Dados no idioma do Mistério
Soldados não, mas sacerdotes,
Do Quinto Império. (...)»
Vinde aqui todos os que sois,
sabendo-o bem, sabendo-o mal,
Poetas, ou santos ou heróis
De Portugal.»
Este encontro, permitiu ver alguns antigos colegas e amigos que desde que saíra do curso tinham desaparecido, e nos quais a matriz facial ora se manteve pouco alterada e me foi fácil sentir o reconhecimento identificador, ora noutros foi mais alterada pelas vicissitudes da vida, pelo que sem o acesso à fotografia da época não podia discernir facilmente as continuidades identificadoras, de modo que cumprimentava sem reconhecer bem a ligação da perenidade de cada um desses antigos colegas ao longo das décadas, tanto mais que a maioria deles avançou no mesmo curso, enquanto eu, chumbando (tristeza forte sentida, contrastada com alegria buliciosa da maioria, ao meter a roupa e os poucos pertences na mala das férias onde tinha escrito, "mala em uso, sinal das férias") passei a ter outros companheiros de curso, e a ser chefe de turma deles por três anos.
Foi na bela e valiosa biblioteca do Colégio que ouvimos antes de tudo os discursos de dois membros importantes da Associação dos Antigos Alunos do Colégio Militar, o general Rositas e o actual director Filipe Soares Franco, e o do ilustre coronel e actual sub-director do Colégio Militar, que delineou a adaptação conseguida aos novos tempos do funcionamento da centenária instituição, bem como os professores, pessoal militar e tipo de alunos que têm, já não só rapazes nem só internos, e ainda os valores e metodologias que têm permitido aos alunos do Colégio classificar-se com elevado nível nas classificações escolares nacionais e sobretudo prepararem-se adequada e valiosamente para os desafios da vida moderna.
O novo edifício onde se realizam as aulas... |
A criança de olhos talvez mais luminosos, sucessora de um dos ex-alunos com quem dialogaria durante o almoço, numa mesa animada... |
A Beatriz, sucessora do José Cortês, grande amigo de um comum amigo o ilustríssimo livreiro e escritor Luís Burnay, como descobriríamos mais tarde. |
Valiosa a passagem pelos belos azulejos oitocentistas do jardim da enfermaria, que fotografei, já que são pouco conhecidos, com uma bela e bem instalada estátua da Deusa, quem sabe se Diana, Vénus ou a Tétis dos Lusíadas, a caminho, e casualmente conversando com o director do Colégio Militar.
Assistimos então ao desfile, de cerca de oito minutos, do batalhão do alunos e alunas, que passaram em continência diante do seu director e dos antigos alunos, que gravei e pode ver no youtube.
Por fim, houve o almoço e as conversas amistosas, ora de memórias divertidas e dos professores que tivemos, ora dos trabalhos, conhecimentos e gostos que fomos adquirindo ou desenvolvendo ao longo da vida.
Os alunos, fim da refeição em comum, entoam em uníssono o famoso grito Zacatraz... |
Ofereci um exemplar de um dos livros que escrevi, certamente o mais apropriado à biblioteca do Colégio Militar e a poder ser lido instrutiva e agradavelmente por algum professor ou aluno, dado à luz em 1998, no V centenário dos Descobrimento do caminho marítimo para a Índia por Vasco da Gama e seus nautas, sob o título Livro dos Descobrimentos do Oriente e do Ocidente, e que se encontra hoje online no meu blogue, dividido em doze partes ou meses, com o título Efemérides do mês de.... do Encontro do Oriente e Ocidente, e que tem sido acrescentado com muitas outras efemérides, nomeadamente dos nascimentos e mortes dos seres que se destacaram na comparação e união do Oriente e do Ocidente, dos estudiosos do Orientalismo, dos mestres sociais, culturais e espirituais, e onde brilham assim tanto biografias como efemérides de grandes navegantes e militares, escritores e filósofos, mestres, reis e santos.
Sala de armas, museológica, do Colégio Militar. |
Embora não tivesse seguido a carreira das armas, como o meu pai, oficial de engenharia e que chegaria a Brigadeiro, e antes me formasse em Direito, que também deixei pela aprendizagem na Índia do Sanatana Dharma ou dever perene espiritual, no caso sobretudo o Yoga e meditação, do qual fui professor durante uns doze anos, não poderia estar senão grato pelas aprendizagens, experiências e camaradagem do Colégio Militar (e com o aluno 189, Gustavo de Mello Breyner Andersen, mantendo-se ininterruptamente até ele partir para o mundo espiritual), pelo que na dedicatória do livro que dei ao coronel sub-director do Colégio Militar, no fim do simples mas animado ágape, escrevi, «à Biblioteca do Colégio Militar oferece o 265, Chico, grato, e com votos de perenidade valiosa».
Sob a égide da Ordem de Cristo e da sua cruz ígnea, e do princípio Feminino da Divindade, perenes, entram, formam-se e avançam na vida os alunos do Colégio Militar.... |
E agora pode ouvir então clarim tocando belamente em homenagem "àqueles que por obras valerosas se vão da lei da morte libertando", e estimulando-nos a perseverarmos corajosamente na manifestação e defesa dos valores e ética universal e do Colégio Militar e da tradição militar e espiritual portuguesa.
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