sábado, 16 de março de 2024

Apresentação de "Primórdio [Cordis]" de Maria de Fátima Silva, no ALI, do Convento da Terra, no Torrão.

                                                                  

Para além do que direi in loco e de coração na inauguração da exposição da Fátima, no ALI do Convento da Terra, pediu-me o Mário Caeiro, o dinamizador, que escrevesse umas palavras:

Esta exposição da Maria de Fátima Silva, organizado pela associação do Convento da Terra, no Torrão, contém os núcleos principais da sua obra pictórica onde  as raízes arqueológicas, históricas, míticas e espirituais nos são apresentadas com  grande dinamismo de formas, cores e perspectivas, constituindo-se como pinturas cheias de simbolismo, de emoções, de tragédias e glórias, e que nos desafiam a senti-las e a compreendê-las, o que nem sempre é fácil tal a carga histórica e simbólica, pessoal e estética, com que a Fátima as investe.

Podemos discernir alguns núcleos, tal um primeiro da memória dos tempos da Atlântida e pré-históricos, através das suas pedras, megalitos, antas e monumentos, a que ela acrescenta as suas intuições, seja de cultos e sacerdócios, seja de Anjos e Deuses que habitavam tais locais sagrados e respondiam, ou correspondiam, às aspirações dos povos e orantes.

Esta é uma raiz que subjaz Portugal e cada a alma portuguesa que sente mais ou menos fortemente tais pilares e eixos dos tempos antigos que ainda sobrevivem ora na nossa paisagem ora apenas numa vaga memória ou imaginação colectiva, como é o caso da Atlântida, e que alguns rochedos ou ilhas próximas da nossa costa a fazem emergir imaginalmente do Oceano que a engoliu.

O segundo núcleo é o Amor de Inês e de Pedro, tanto na sua essência do amor intenso sentido e realizado como no da fragilidade trágica face às circunstâncias adversas mas capaz de se imortalizar, e que encontrou na Fátima a discípula preferida, ela se deixando mergulhar em tudo o que a fará sentir ou saber mais de tal vivência e história tanto trágica como gloriosa, atestada perenemente na estatuária dos dois amantes jazentes na brancura da eternidade no templo do mosteiro cisterciense de Alcobaça, e que ela tem repetidamente peregrinado, como aliás outros locais ligados à vida de Pedro e Inês, sempre atenta ainda ao que em gravuras e livros antigos pode recolher.

O terceiro núcleo fundamental liga-se aos Anjos e na maioria das suas pinturas eles estão presentes, em formas diversas, em conúbio com os seres humanos, os animais, as pedras, e introduzindo assim face à materialização progressiva da humanidade que se intenta infra-humanizar (WEF), um contra-discurso pictórico em que a dimensão espiritual surge intensamente presente no nosso quotidiano, e logo salvando-nos da redução a meros consumidores materializados do que os manipuladores meios de comunicação social querem e intentam. O Anjo apela à nossa interiorização, oração e meditação e  elevam-nos acima da horizontalidade para dimensões mais vastas da consciência e da existência e podem abençoar-nos com a sua luz,  paz, amor e lucidez.

É certamente  difícil avaliar os sentimentos e pensamentos que as obras e seus núcleos suscitarão nas pessoas que os virem, embora seja em geral agradável o todo qualitativo de cada uma das suas pinturas, nas cores, formas, conjuntos, movimentos, planos, personagens, narrativas e mensagens.

Teríamos de saber se, após as contemplarem mais ou menos demoradamente, ficaram com maior amor à terra, à arqueologia, à pré-história, às brumas das civilizações antigas, ou se ficam mais decididas a serem amor e não se deixarem matar pelos  inimigos externos ou mesmo internos, e assim se erguerem como cavaleiros e cavaleiras do Amor, Fiéis do Amor Divino na Terra e  entre os humanos e, finalmente, se conseguem sentir ou então (bem mais difícil) ver interiormente o Anjo, os Anjos, e se nas suas orações e meditações eles passam a ser invocados e orados, talvez aumentando o número e a força dos que ainda exclamam alguma versão da oração do "Anjo da Guarda, minha subtil companhia, inspira a minha alma de noite e de dia", e de tais práticas e esforços de religação recebem inspirações e energias.

Talvez possamos finalizar lembrando um quarto núcleo na tão rica e promissora obra da Maria de Fátima Silva: o mar, não só de amar mas daquele que abraça ou cinge toda a nossa costa ou, para quem vive no interior, as costas, pois a Fátima e a sua família, que a acompanha e apoia nas suas incursões e peregrinações, vivem mesmo junto ao Oceano Atlântico e assim recebem mais as suas vibrações harmonizadoras, purificadoras, inspiradoras...

E com este núcleo finalizamos estas breves  palavras escritas a pedido do Mário Caeiro para a inauguração da exposição da Fátima no Torrão, junto ao convento da Nossa Senhora da Graça, outrora das Terceiras e Sorores Clarissas, com a sua valiosa mística franciscana de amor divino, humano e da Natureza (e onde floresceram almas agraciadas), certamente uma terra muito promissora na linha do Agostinho da Silva que apelou a novos conventos, algo que vinha já de Antero de Quental com a sua Ordem de Mateiros, para se constituírem como enclaves de resistência económica, cultural, espiritual e fraterna, tal o Montado do Freixo Meio, do Alfredo Cunhal Sendim, no Alentejo profundo, face ao desumanismo ameaçador, onde se podem gerar criativa e dinamicamente actividades e crescimentos conscienciais belos e valiosos para as personas, para a Natureza, para a harmonia entre a Terra e o Céu.

Os quatro núcleos perfazem os Quatro elementos ocidentais tradicionais, a Terra e a Água, dos megalitos desde o Neolítico, da Atlântida e do Oceano, o Ar e o Fogo, dos Anjos mensageiros, anunciadores, comunicadores e do amor que uniu e une Pedro e Inês, e cada um de nós enquanto "Fiel do Amor" esforçando-se por realizar o lema da bandeira Amor omnia vincit, mais  desfraldada agora sobre o Convento do Torrão, e no nosso coração.

Pedro Teixeira da Mota.

2 comentários:

Anónimo disse...

Muitas graças, carissimi amicum, do fundo do coração, pela sua amizade, imprescindível no meu caminho pessoal e no meu trabalho. Lux e Pax, Petrus

Pedro Teixeira da Mota. disse...

Graças muitas, Fátima, pela sua amizade e arte e que continue trabalhando inspiradamente pela cultura, a beleza, a espiritualidade, o bem, a tradição espiritual e divina portuguesa...