domingo, 9 de janeiro de 2022

Swami Natana Gopal: vida e ensinamentos, por Pedro Teixeira da Mota. Com uma das suas canções.

Natana Gopal, ou de seu nome completo Sriman Natanagopala Nayaki Swamigal, foi um notável místico, yogi, poeta e músico do sul da Índia, nascido a 9 de Janeiro de 1843 na Palmal Cross Street, em Sourashtrapuri, parte sul da famosa cidade de Madurai, em Tamil Nadu, filho de Rengariyar e Lakshimi Ammal, uma família de bramanes Sourashtra, os da profissão de tecelões, tendo então recebido o nome de Rama Bhadran. Desde cedo foi muito atraído para o mundo espiritual não ligando muito à escola, nem depois, aos dez anos, ao trabalho de tecelão que naturalmente no modo de vida das castas lhe pertenceria, já que não queria estudar. Aos dezasseis anos resolveu desprender-se do trabalho, para o qual não sentia vocação, sentindo-se chamado para outros voos e, despedindo-se dos pais ,retirou-se para a natureza e as montanhas a fim de se dedicar mais plenamente à renúncia do mundo e à realização espiritual. A dado momento, por sonho, recebeu a indicação de procurar um guru, que era Nagalinga Adigal, em Paramakuti, onde foi bem recebido, aprendendo rapidamente o sindi e recebendo na iniciação o nome de Sadhananda Siddhar.
Teve contactos com personagens públicas importantes que, atraídos pela sua fama ou o queriam ver ou testar, saindo bem sempre dos testes. Foi também iniciado na tradição já não dos Sidhas, mas dos Vaishnavas, os devotos de Vishu. O mestre ou acharya foi Vadapathraararyar, que na iniciação lhe deu o nome de Natana Gopal, com que ficará conhecido e manteve por ele grande amor ou respeito, acrescentando o seu nome em quase todos os poemas devocionais que foi compondo, e dos quais poderemos ouvir um no fim. Leu muito os poemas dos 12 místicos Alvares, contidos na famosa compilação, do séc. IX, Divya prabandam, que alberga 4.000 versos de alta devocionalidade e espiritualidade yogi e  vaishanava, isto é, devotos de Vishnu Narayana, Krishna, Radha, caracterizados por muita Ananda, beatitude...
A sua rotina diária em Madurai no seu ashram, onde recebia discípulos, devotos e visitantes, incluía, cantos, música e satsanga, isto é, diálogo ou palestra em grupo e sob a invocação da verdade. Um dos nomes divinos que mais utilizava e recomendava era Govinda, que significa tanto o Deus Krishna como o Senhor da terra e das vacas, ou ainda dos VedasSendo levado nos dois anos antes de morrer, no dia de anos,  em procissão de elefante e de palanquim, anunciou então que no próximo ano já o iriam levar morto. E assim foi libertou-se do revestimento físico, no mesmo dia em que nascera, a 9 de Janeiro, de 1914.  
 O meu mestre de Madras, Shudhanda Bharati, na fotografia em cima (em jovem, tendo-o eu conhecido já bem mais tarde), escreveu um livrinho sobre Natana Gopal, e começa-o assim: «Fui convidado a escrever sobre um santo que viveu em Madurai, a cidade das artes e da beleza, Eu vi este santo e os seus êxtases espirituais na minha infância Ele vivia, movia-se e tinha o seu ser em Deus. Ele despertara Deus na argila humana. Eram dias em que a educação inglesa apressava-se a tornar os homens meros robos pragmáticos. O ozono do fervor espiritual estava viciado pelo gás da impertinência agnóstica. O sexo era em excesso. O espírito era enterrado no estômago. O estudo era sem alma, a vida era sem espírito. A escola era enganar as pessoas levando-as a pensarem que a vida era feita para ganhar e gozar, comer e beber, guiar carros, e afirmar: Eu sou rico, e o que tenho é grandioso. Os intelectuais estavam apanhados no beco sem saída de desespero moral. A civilização era mecânica, como um carro guiada por um obstinado condutor embebedado em direcção a uma crise grave. As pessoas estavam hipnotizadas pelo colorido exterior da vida, pondo de lado as delícias ontológicas e os níveis profundos de consciência psíquica.» 
Narrando depois como o irmão do seu avô, o yogi Purnananda o iniciara na via espiritual e na busca do contacto com mestres, Shudhananda Bharati relembra-se de tê-lo visto com Natana Gopal no jardim onde aquele dispunha de uma pequena cabana, e conta o episódio quando tinha 11 anos: «de repente uma alma emocional entrou no jardim, luminosa, ágil e cheia de vida. Tinha um fogo subtil nos seus olhos e um encanto doce feminino na sua face. Era a verdadeira imagem da devoção fervorosa a Deus. Hari Om, exclamou o meu Mestre erguendo-se para o abraçar. Era Swami Natana Gopal. Eu já vira este Swami. As suas canções devocionais e danças extácticas  tinham encantado a minha alma. Natana Gopal sorriu para o meu ser. Durante cinco minutos, ele sorria e olhava-me e, batendo-me as nas costas, disse: Lopala undi pandu,  Recolhe-te interiormente e amadurece. Falava num excelente Telugu com o meu Mestre e foi uma festa para o coração escutar a conversa deles.»
Em seguida narra parte da conversa e como o seu tio avô, e seu mestre inicial, Purnananda, que afirmava que o caminho espiritual se deveria basear na Gita, Jnana e Nama, algo bastante comum nos mestres indianos, ou seja, lerem-se e meditarem-se os valiosos ensinamentos do poema em diálogo  Bhagavad Gita, depois Jnana, discernimento, conhecimento, sabedoria acerca de quem somos realmente e o que usamos transioriamente e, finalmente, Nama, nome, subentenda-se de Deus. Ou seja, recomenda praticar a invocação de Deus numa ou noutra face ou nome divino que nos mais atraia, pondo em acção o amor e a aspiração, e conseguindo uma certa unificação das forças anímicas e uma religação ao espírito e a Deus, que se manifestará eventualmente por algum tipo de graça. Sem dúvida uma boa base programática, por exemplo também muito praticada e recomendada por guru Ranade, um mestre acerca de quem já escrevi neste blogue. 
Por fim «Natana Gopal cantou um Kirtan melodiosamente e emocionalmente e a sua substância era: "Canta o nome de Hari ( Harinam) incessantemente e caminha humildemente para os seus pés"», conselho que Shudhanada Bahrati seguiu à letra, peregrinando muito e praticando  bhakti e kirtans, e que me transmitiu também, já que durante os três meses que estive com ele encaminhou-me com cartas de recomendação para o ashram de Tiruvanamali, de Ramana Maharishi, para a comunidade de Auroville e para o centro de Aurobindo em Pondichery, onde dialoguei e meditei.
Alguns ensinamentos desse seu livrinho biográfico de Natana Gopal mostram bem a qualidade devocional da sua via yógica, a da bhakti, ou da devoção, em que o amor a Deus na forma escolhida pelo discípulo é perseverantemente dedilhado, cantado: «Pára a mente que passeia e fixa-a no coração do amor... Medita no que habita no coração, noite e dia e vencerás a morte... A repetição do nome de Deus (japa, namdev, satnam) abre o coração... Mantém a Luz do Amor de Deus ardendo com brilho no coração... O corpo murcha sem comida. A sabedoria tremeluze sem a devoção amorosa...».
Nestes tempos em que tanta mentira e opressão política, científica e mediática nos envolve, saibamos  acender e erguer mais em nós e à nossa volta, o amor, tanto em discernimento como devocionalmente, isto é, em aspiração aos seres celestiais, aos mestres, santos e santas, ao espírito, ao Amor e à Divindade, sob que forma ou nome mais A amarmos e adorarmos...

                      

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