quarta-feira, 5 de janeiro de 2022

Poemas de Mevlana Rumi, em homenagem a Qassem Soleimani e Al-Mohandis, lidos e traduzidos, e transcritos, por Pedro Teixeira da Mota

Li alguns poemas de Jalāl ad-Dīn Muḥammad Rūmī, traduzidos para francês por Emir Nosrateddine Ghaffary (incluídos na obra Farah, editada em 1965, em Teerão, onde a comprei num alfarrabista em 2010), em homenagem aos heróicos comandantes da resistência irano-iraquiana Qassem Soleimani e al-Madhi Mohandis, no 2º aniversário do seu martírio pelos drones norte-americanos liderados por Trump e Pompeo, no Iraque. Li traduzindo e comentei, gravando, e poderá ouvi-los no fim. E flores e amor para as almas luminosas, mártires e inspiradoras de Qassem Soleimani e Al-Mohandis...

E para contextualizar melhor o que li e comentei,  vou acrescentar por escrito outros poemas de Rumi partilhados por Emir N. Ghaffary, que inicia a obra com um bela dedicatória à companheira, agradecendo eu à amiga Elahe Habibi alguns esclarecimentos quanto à tradução de algumas palavras iranianas:
«À doce companheira da minha vida aqui em baixo. Aquela cujo
pensamento transcendental Hagighi (Verdade)  já era na pre-existência idêntico ao meu pensamento e cuja luz clarificada no Único reunir-se-á à Imanente Realidade Criadora: O Khaleg
[Criador-Deus] do Além.»
Muito valiosa dedicatória, pela reminiscência da pré-existência
enquanto almas gémeas e aponta uma linha de trabalho espiritual: clarificarmos, melhorarmos, intensificarmos a nossa luz interior pela sua comunhão com a Divindade, que é tanto transcendente como imanente. 

Acolhamos os poemas do flamejante Jalāl ad-Dīn Muḥammad Rūmī:

«Que frescura espiritual,
Quando sentados na varanda, tu e eu.
Diferentes na forma e na face
realizamos sermos uma só alma, tu e eu.
As estrelas do céu virão olhar-nos
e mostrar-lhes-emos a tua beleza, como a da Lua, tu e eu.
Tu e eu, saídos do nosso Eu, estaremos sentados em êxtase
Felizes e libertos das alucinações e tabus, tu e eu.

Todas as aves do paraíso, inebriar-se-ão de frutos doces
ao verem-nos rir tão alegremente, tu e eu.»

 «Aceita do Amor - com felicidade e alegria - o vaso do vinho
Este vinho que grita: "Onde é que está o desencantado?"
O que é a vida sem Amor?
Um capricho num ambiente rígido.
E face ao Amor, o que é a Vida?
Uma duplicidade escrava em correria.
Vou-te pôr uma questão, vou dizê-la e calar-me:
Como amadurecem a nossa alma e o nosso coração?
É a partir da inexperiência.»

                                        

Mevlana Rumi criou e poetisou muito a Sama, a dança circular, em volta do centro, e do Murshed (mestre) ou do Sol espiritual, e pela qual os sufis tentam expandir a sua consciência para as dimensões subtis e espirituais e elevar-se para o Divino. Oiçamo-lo em mais uma tradução indirecta, a minha, através do francês, e sabendo nós como Mevlana Rumi tem sido manipulado e superficializado em tanta tradução traidora. Boa e fidedigna (pois há também já muitas falsas) é a música que pode escutar  por esta ligação: https://youtu.be/_h1wayIgn8o

«Atenção, sufis! Hoje é preciso
Estar alegre e inebriado para dançar o Sama.
Atenção! Os nossos espíritos serão hoje preenchidos
Do perfume dos reencontros do mundo espiritual...»


«Não viste em certos parques
A árvore enlaçar a sua vizinha!
Sabe que o vento primaveril é a causa
De cada vez que, ao dançar, um ramo se mexe.
Porque queres tu portanto fugir a esse vento
Não sabes - que ele te traz ajuda e assistência?»

«Esta chama que brota do canto da flauta é expressão da alma,
Que os que não têm esta chama sejam reduzidos a nada.
Pois quem está privado deste fogo é como um morto
É o fogo do amor que inspira a flauta.
E o gemido da cana verde fala-vos de separações:
Depois que me cortaram do campo natal, diz ela,
Homens e mulheres escutam a minha voz queixosa.

Queixo-me de estar separada dos meus,
O meu coração está dilacerado pelo abandono.
A minha voz em som triste é para vos exprimir a minha pena
Pois toda a pessoa que esteja longe das suas origens
Procura a altura em que a reunião se operará de novo.
Também tu, irás um dia reunir-te ao teu Deus.»

Terminemos esta pequena antologia, com outro poema em que a mesma nota fundamental é tocada, a da busca da religação com o Deus vivo de cada um, no íntimo, pelo amor, o silêncio, a aspiração. E que nesta curta viva terrena devemos tentar realizar já, ou mais...

«Escuta o som da flauta que sem a ajuda da linguagem te fala.
Sem palavras ela faz-se ouvir, como jóias em cascata.
Agora que os nossos companheiros se aqueceram, senta-te tu, pois
A chama da flauta abrasou-nos tanto que extingui-la é impossível.
Quando estiveres em Sama ultrapassar-te-ás a ti mesmo,
E talvez no espaço duma respiração, vejas a imagem da Divindade Amada.»                                     

                      

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