quinta-feira, 17 de fevereiro de 2022

Milésimo texto ou mensagem do blogue de Pedro Teixeira da Mota. O caminho ascensional humano, outrora e hoje. Os apoios e os desafios. Aum.


Na Tradição Espiritual Portuguesa, afim da Tradição Perene de outros povos, observamos que em alguns místicos ou seres de coração houve a consciência clara de que Deus está potencialmente ou presencialmente no interior de cada ser; e em alguns deles, tal Antero de Quental (que nisso se filiara pela linha grega de Pitágoras, Sócrates e Platão e pela obrinha medieval Theologia Germanica que durante alguns anos foi de sua cabeceira), sonhava-se que o ser humano se deveria tornar uma consciência ascendente englobante ou expandida para a sociedade,  ambiente, o universo, o mundo espiritual e divino. Um lema anteriana proclamava: «O Homem deve ser a consciência do Universo em ascensão para Deus».
Contudo será só o Homem e Mulher da Terra ou devemos contar com outros homens e mulheres noutros planetas e sistemas solares, também eles consciência no universo e consciência do Universo se calhar bem mais desenvolvidos que nós na Terra, tão condicionados em tal busca da Verdade seja pela nossa ignorância e a historicidade condicionante das mensagens das grandes religiões quer pela opressão que os governos mais sinistros fazem, apesar dos biliões que se vão gastando na arrogantemente denominada conquista do Espaço, ou nos armamentos sem fim?
E tal consciência do Universo será a meramente material, mental, digital, dos meios de comunicação e instrumentos de ponta científicos, ou bem mais profunda, vista, sentida e vivenciada por dentro, talvez chegando mesmo à consciência supra-sensorial do Universo e do Uno, que subjaz e coroa o diverso múltiplo e pluridimensional do Universo?
Se o Absoluto e a Divindade são a origem emanadora do Cosmos e de tudo, se tal é a Fonte Una que a multiplicidade da manifestação e a sensorialidade cerebral ilusoriamente tanto escondem, há que reconhecer que o acesso consciencial a tal está de tal modo sepultado pela corporalidade, as ideologias, os pensamentos e actos humanos que poucos são os seres que sentem e intuem, vivem e comungam das forças mais subtis e espirituais ou mesmo das bênçãos divinas.
A ideia de ascensão perpétua a que Antero de Quental se refere e que por exemplo também Sri Aurobindo, Teillard Chardin ou Ismael Quilles desenvolveram, indica a existência de um movimento de elevação organizacional, consciencial que perpassa o universo, dando por isso razão ao panteísmo na sua modalidade espiritual e divinizante que ao longo dos séculos vários pensadores, filósofos e místicos pensaram ou constataram, frequentemente com as suas limitadoras idiosincracias.
Tal fenómeno de aperefeiçoamento, evolução, reintegração do ser humano vai ter consequências bem importantes pois significa que desenvolvemos um corpo espiritual, o organizamos, lhe damos forma consciente e unificadora, e lhe permitimos um crescimento orgânico, nomeadamente dos seus sentidos espirituais, algo fundamental e que é esquecido pela grande maioria dos seres, que ignoram que são um ser espiritual com um corpo anímico, além do físico a que tão facilmente se reduzem. E que muito do melhor das religiões se encontra no que de algum modo movimenta, afecta ou impulsiona tais níveis e órgãos subtis ou anímicos do ser humano.
Se a entropia física é um facto, se a degradação corporal é tão visível no ser humano como em cada sistema solar ou universo, então devemos admitir que só havendo tal desenvolvimento subtil espiritual esta ascensão se verifica a um nível interior anímico, consciencial e espiritual e que poderá perdurar. 
E que portanto por tal desenvolvimento deveremos então lutar ou esforçar-nos diariamente, reservando até espaços consagrados de tempo para tal reorganização, alinhamento e fortificação nossa, sobretudo quando tantas são as energias ou influências adversas que os grandes grupos económicos, políticos e mediáticos lançam tão insidiosa, alienativa e opressivamente sobre a Humanidade e sobre as suas capacidades conscienciais e psíquicas, na realidade cada vez mais sepultadas pelo famigerado jornalixo que pontifica na sociedade moderna, sobretudo ocidental...
Que evolução da consciência social, amorosa, espiritual e divina poderemos discernir nos que habitam no planeta, ao longo dos últimos séculos da história humana? Se há mobilizações para certas causas, outras tragédias, repressões e prisões são intocáveis, tal como vemos no Médio Oriente ou em Jules Assange. Por outro lado há um decrescimento de crenças míticas e infundadas, mas quanto ainda subsiste fanatismo religioso e de seitas? E quanto à quantidade de seres mais auto-realizados espiritualmente, de mestres bem iluminados que houve bastante em alguns países há séculos, tal a Índia e a Pérsia, haverá hoje mais?
E se na altura os céus eram bem mais limitados na sua extensão, hoje que dominamos a observação de galáxias a biliões de anos e calculamos os seus movimentos, vida e características físicas ou quânticas, deveria já haver  mais correspondência de conhecimentos quanto às
profundezas e alturas do ser humano no Universo, tal como Antero de Quental em carta de 7-IX-1888 afirma estar-se a reconhecer que «O espírito humano não é um fragmento truncado e incompreensível ou uma coisa à parte isolada no meio do Universo, mas sim um elemento fundamental dele e a mais alta potência e expressão da sua essência.»  
Conseguiremos descortinar, indo mais além da ânsia de consciência
patente em todo Universo, que Antero de Quental detecta ou pressente e em certos sonetos transmite, tais mistérios e riquezas espirituais tal como, por exemplo,  alguns seres das tradições cristã, yogui, sufi e persa, mais capazes de visão espiritual e de amor a Deus, conseguiram?
Conseguiremos nós discernir, valorizar e desenvolver mais essas ou as  linhas claras de evolução consciencial e de crescente revelação divina amorosa, enquanto unidade, afectiva, sábia e solidária que é trabalhada pela  vida do dia a dia e pelas  práticas espirituais, e de que os conceitos de anima mundi, panpsiquismo, alma da criação, campo unificado de energia consciência nos falam como oceano nutritivo, sábio e amoroso, a deusa Fortuna e da Providência?
Importante nesta melhor compreensão e captação de quem é o ser humano e quais são as potencialidades a desenvolver para se harmonizar e abrir
ao ambiente, a Gaia, ao Universo e ao Divino, será então a nossa maior assimilação dos ensinamentos que os mestres que mais fundo foram na demanda espiritual conseguiram realizar de tais níveis e transmitir. Todavia a generalidade dos seres pouco sabe com claridade de tais seres e de tais práticas e estados conscienciais que ficam assim reduzidos a figuras, frases, clichés, ritos, costumes das religiões, que certamente podem ter ainda hoje efeitos morais e éticos valiosos ou civilizadores.
No fundo teremos de reconhecer que cada ser tem por si próprio de conhecer e vivenciar a seu modo o Quem sou eu, o que é ou quem é o Jivatman e o Brahman indiano, o Nirvana budista, o  Pai e o Eu que somos um, de Jesus Cristo, tarefas como já vimos nada fáceis perante tanta informação e desinformação a acontecer acerca das vias espirituais e suas realizações, tão carnavalizadas por pseudo-esoterismos, novas eras e tanta comercialice...
Apesar de já terem decorrido tantos séculos sobre a passagem na Terra de tantos grandes seres, nomeadamente os fundadores das religiões, e depois, frequentemente mais importantes ainda, os seus filósofos místicos e mestres, continua a generalidade das pessoas a saber ou a vivenciar pouco o Divino (e dizia Antero Quental em carta de 17.X.1875: «Deus, dizia-se há perto de dois mil anos, é o Alfa e o Ómega; depois de muitos trabalhos e meditações, durante esse longo curso de anos, somos levados hoje a dizer que Deus é o Ómega e o Alfa...»), ou a pouco saber também sobre o Espírito e a vida depois da morte, ou mesmo como melhor desenvolver o auto-conhecimento, o auto-controle e vivenciarmos mais a saúde natural, a alimentação biológica, a ecologia sóbria, o equilíbrio psico-somático, a justiça, a solidariedade, o bem, o amor, a verdade, numa harmonia dos corpos físicos, subtis e espirituais, a demanda essencial da vida e para a qual a educação oficial pouco contribui ou prepara.
Como vemos e sentimos, muito a ser trabalhado por todos nós, um desafio constante que pede respostas criativas e dialogantes, ecológicas e espirituais, tanto individuais e familiares como grupais ou comunitárias ou mesmo nacionais e que não devemos deixar sepultar ou abafar sobre toda a inutilidade e superficialidade que os meios de informação despejam alienadora e manipuladoramente, ou que os partidos e governos superficialmente ou subordinadamente tentam implementar
Reaja pois a tanta manipulação e opressão, corte com a televisão, escolha a sua própria informação na net, e religue-se mais harmoniosamente com a Terra e o Céu e as suas energias, seres, antepassados, guias, anjos, arcanjos e mestres, trabalhando e vivendo mais criativa e libertadoramente no Amor,  na Verdade,  na Unidade, e  mesmo mais com a Divindade. 
Oremos ou meditemos com o Aum, ou com o que mais sentir... Lux.

Sabedoria Persa (15). Um aforismo de Nizami: "à noite mais sombria sucede o dia luminoso", comentado. Com o seu poema Leyli e Madjoun musicado, com a letra e bela iconografia.

Nizami entrega um dos seus poemas a um governante culto. Miniatura do séc. XVI.

Nizami, ou Nizame, ou Muhammad Ilyas ibn Yusuf ibn Zaki Mu'ayyad, foi um sábio persa, nascido em 1141 em Ganja, na zona do sul do Cáucaso, actual Azerbaijão, de pai iraniano de Qom e mãe curda, e que levou uma vida discreta e calma até 1209 (embora com três casamentos felizes mas sucessivamente cortados pelas Parcas), devido à sua grande sabedoria e arte literária, já que os sucessivos governantes (grande valorizadores das bibliotecas, kitabdar) o souberam apreciar devidamente, escrevendo obras que pela sua perfeição e conteúdo influenciaram toda a literatura posterior persa, árabe, urdu, curda, indiana, turca. 

Haft Peykar, o rei sassânida Bahram V e suas princesas sábias: a indiana. Mss. iluminado do meados do séc. XVI, safávida, da Freer Gallery of Art.

Inspirando-se em tradições e temas anteriores, pré-islâmicos, conseguiu recriá-los com grande beleza e intensidade, e os seus cinco masnavis ou poemas, épicos e líricos, denominados Khamse (cinco joias ou poemas), sempre tingidos de amor, sabedoria e moralidade, tiveram um sucesso tal que foram representados em miniaturas de pintura persa e cantados por bardos, atravessando os séculos a fazendo vibrar os leitores ou auditores deles.

Makhsan ol-Asrar, a ascensão de Mohamed. Mss. de 1620. B.N.F.

O Makhsan ol-Asrar, ou Tesouro dos segredos, com as suas orações, visões e vinte e um longos discursos de filosofia moral,  Khosrow o  Shirin, o imperador e a sua amadaHaft Peykar, ou As Sete belezas (ou o Pavilhão das sete Princesas), ao estilo das Mil e Uma Noites, considerada a sua melhor obra, Eskandar-nameh, ou A Vida de Alexandre Magno, o mestre dos dois mundos, ou o que tem dois cornos, Zoul-Qarnayn, apresentado como conquistador e profeta ou visionário) e, por fim, o poema do amor tão desventurado nesta vida terrena, Leyli o Madjnum, tão glosado ou cantado por tantos poetas e músicos e que no fim podemos ouvir.

Num dos poucos reencontros amorosos Leily beija os pés de Madjnoun. C. 1622

Deixou ainda alguns ghazals e dos seus livros compilaram-se ditos editados com regularidade, os Aforismos, donde pode ter vindo o seguinte da antologia que temos vindo a comentar, Fontes da Sabedoria Persa:

                  "A noite mais sombria tem um fim luminoso" 


Comentário:
Que o teu intelecto e ser seja sábio, isto é, bem consciente, amoroso, e previdente, capaz de pressentir as consequências maiores de qualquer acto ou pensamento. De modo a que, na adequada frequência consciencial, possas dirigir-te ou orientares-te de acordo com os melhores desígnios de harmonia de vida, justiça, misericórdia e amor que possas realizar.
Miniatura da Vida de Alexandre,  quando na busca da fonte de imortalidade encontra dois mestres
 
No teu coração, no seu mais íntimo, está a Divindade, ou o teu acesso a Ela. Esforça-te então, com as bênçãos dos mestres ou anjos, por meditares mais profundamente, até as trevas nocturnas  se dissiparem e no teu olho espiritual a Luz Divina veres. E que toda a ordália, dor ou provação seja vencida pela tua sabedoria, paciência, estoicismo, humildade, aspiração e religação espiritual e Divina.
                

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2022

Sabedoria Persa (14); "Bebe e alegra-te". Um ghazal de Hafiz, o poeta nacional do Irão amoroso, comentado por Pedro Teixeira da Mota

« Bebe, Hafiz, e vive alegre!
Não sejas como o hipócrita
que imagina disfarçar a sua astúcia
       com o Alcorão citado em voz alta.»

                                   

Comentário:
Alegra-te. Não te castigues com reprovações e penitências. Descontrai-te e bebe da taça diária que a existência, a prática espiritual e a fortuna te possam oferecer, harmoniosamente, sem regras opressivas, sem expectativas frustrantes nem diminuições.
Beber o vinho, na linguagem de Hafiz e dos sufis ou espirituais do Islão, e em especial do Irão dadas as raízes masdeístas (com o seu cálice graal,  jam-e jam, ou Djam Djehan Nema), significa sintonizar com amor os seres e Cosmo, viver em amor, sentir a presença ou a ligação Divina, estar livre das hipocrisias de querer parecer isto ou aquilo, ultrapassar os formalismos e fluir na naturalidade inspirada.
Quem bebe o vinho místico, quem cultiva o amor à Divindade e até se inebria nele, é sincero, fala transparentemente e entrega-se sem falsidade ao diálogo, à fraternidade, à compaixão, ao caminho espiritual, à demanda da Divindade Amada, ao Amor. 
 
Bebe e come, anda e fala com consciência, amor e gosto. Não te afirmes ou mascares de asceta ou renunciante quando sentires que o convívio pode trazer mais luz aos que contigo querem dialogar.
O Espírito sopra ou (explique-se) pode ser respirado ou sintonizado, em toda a parte, e tanto as tabernas como os jardins, o quarto íntimo ou a cela do convento podem ser locais de hierofanias, isto é, de momentos de hiero, sacro, sacralização, consciencialização tanto do Amor divino em acção como do espírito que, no mais profundo ou íntimo de nós, culmina ou coroa a Manifestação e é a nossa razão de ser...
Tua deve ser a via universal que consegue abranger e dialogar com todos, e ainda que discernindo o justo e o injusto, repudiando-o, sabe complementarizar os extremos que se digladiam, frequentemente desnecessariamente.
Que a tua alma e corpo espiritual sejam capazes de se ir abrindo e expandindo no universal, com o fogo do amor divino mais forte e profundo a arder e inebriar-te de quando em quando, ou mesmo a tocar e inspirar outros.

                                   

O conteúdo desta quadra de Hafiz (de seu nome, Sams-al-Din Moḥammad, já que Hafiz significa que sabia o Alcorão de cor, viveu entre 1325-1390)m um dos poetas místicos mais amado do Irão e dos que amam a civilização persa, extraída do seu Diwan, repete-se bastante na sua poesia e nas dos Fiéis do Amor como ele, tal Ibn Farid, Maulana Rumi, Saadi, Jami, Attar, Sheik Bahai e outros, e põe em causa os ortodoxos, os seguidores das narrativas oficiais, os que seguem os hábitos ou vestes que não fazem monges, e se esquecem do silêncio e mergulho interior para resgatarem o fogo divino do Amor e nele se intensificarem e poderem consumir mais  o que os separa da harmonia, da justiça, do espírito e do Ser Divino e Amor Primordial...

                                     

terça-feira, 15 de fevereiro de 2022

Um poema de amor espiritual e divino, escrito a ouvir Homayoun Shajarian - Gholabum همایون شجریان و سهراب پورناظری - تصنیف قلاب

Um Poema do Amor Espiritual ao Divino, por Pedro...

Ó Fonte de Tudo,

Misteriosa Entidade Primordial,

Raiz de todo o Eu

que nos universos se afirma,

Escuta a nossa aspiração,

responde à nossa oração,

Brilha no nosso coração.


Como te discernir, ó Númeno,

Por entre a multidão dos fenómenos?

Será que o amor do meu coração

o transforma num graal para a Tua bênção?


A noite vem avançando sobre o dia,

e à semana sucedem-se os meses e estações.

Aonde me devo estacionar para te acolher

senão neste coração que ferido canta por ti,

tingido desta aspiração de sangue e ardor,

pela qual é ti,  Amor Um, me posso religar?


Como chegar desta multiplicidade dos sentidos,

mesmo que todos aspirem ou em Ti intentem,

à unidade e subtil Seidade tua que me emanou?

 

Oro, canto, ardo, aspiro e chamo-Te pelo coração,

corpo e alma dançam, vibram ou tremem ao vento,

tal como as canas verdes que exalam o Teu som.


Assim chego à unificação de mim em Ti,

um teu Nome se pronunciando em mim

E me estilhaçando e galvanizando em Ti.

 

Assim seguirei discreto em paz e ardor,

na caravana das almas fiéis de Deus Amor.

 

                                

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2022

Do Amor e do dia de S. Valentino. Uma pequena aproximação, para o ano da graça de 2022.

Emane flores e aves do seu ser e coração...

O dia de S. Valentino, um italiano santificado nos primeiros séculos, adquiriu a sua conexão de protector ou inspirador do amor humano a partir dos séculos XIV e XV, tornou-se a partir da generalização das imagens e postais dos meados do séc. XIX e no decorrer das últimas décadas na civilização ocidentalizada, um dia em que se celebra o Amor, em geral entre namorados, amantes ou casados, mão são mistérios se o Amor é um sentimento, uma energia, um princípio, uma ideia, ou mesmo a força por excelência e divina. E é tão, tão, tão rico de características, variantes, níveis, significados, metáforas, símbolos, imagens e representações que, fora da sua vivência pessoal e íntima, qualquer aproximação ou descrição do Amor é sempre como a da criança que quer vazar a praia para a sua cova na areia da orla do oceano.
                                            
                                     
 Geometria e aura subtil do coração...
Comemorar clara e dignamente o Amor nos dias de hoje, para além daquilo que dois seres que se amam mais exprimirão ou se ofertarão, é porém é t
arefa difícil, tal a quantidade de pontos opressivos do amor que escurecem a aura da terra, e fazem sofrer tanta gente. Comemorarmos demasiado ou apenas uma visão do amor romântico e egoísta, burguês, mesmo que com bastante cultura, estética e sentimento, pode ser uma traição ao verdadeiro Amor, que apela a que vençamos as trevas do ódio, da opressão, da ganância, da inveja, da prepotência que tanto ensanguentam a humanidade.
                                         
Quando escrevia este texto, sons vindos da rua e janela aberta sobre jovens valentinizando.
Haverá então que disc
ernirmos e denunciarmos alguns dos pontos fulcrais onde as forças mais negativas de anti-amor se exercem violentamente antes que possamos comemorar e invocar o amor humano, o amor terrestre, o Amor Cósmico, o Amor Divino.

Que pontos são esses, brevissimamente: o imperialismo do Reino Unido  e dos Estados Unidos da América norte-americano (tão arrogante, opressivo e vingativo em tanta parte, e lembremo-nos do lento assassinato anglo-saxónico e australiano de Julian Assange, um Cristo do séc. XXI), o do fanatismo racista e criminoso da Arábia Saudita e de Israel, os governos e agentes de autoridade super-opressivos e violentos da Austrália, França, Canadá e mais alguns, as ditaduras egoístas e gananciosas de bilionários e grandes corporações, nomeadamente as farmacêuticas e, finalmente, os jornais e meios de comunicação, na generalidade, no Ocidente completamente vendidos e logo manipuladores. De tudo isto resulta a predominância segmentos imensos populacionais mergulhados nas trevas da ignorância e logo massificados na banalidade de consu

mistas superficiais ou então, por reacção, extremizados ou radicalizados.

                                                           
Aquela Terra que muita gente de coração ou de bem desejaria, mas que a ganância e insensibilidade de uns poucos impede. Uma lástima, uma luta....

Lutemos então e oremos pela justiça, o conhecimento, luz, a paz, o amor em tais seres e povos tão subjugados pelo egoísmo, consumismo, racismo, imperialismo, autoritarismo, ou seja, pelas trevas, o ódio, a crueldade, a vingança, o mal, que existem em potencial em todos os seres e fora deles enquanto entidades demoníacas (pouco reconhecidas ou aceites nos dias de hoje), e mais manifestadamente em alguns mais insensíveis ou cruéis, criminosos ou assassinos.

Os espíritos da natureza, nomeadamente os anões, ainda existem, em verdade...

Passada esta parte dolorosa do panorama vivencial politico-social e que na realidade se afigura bem difícil de se vencer, aproximemo-nos da Natureza e do templo do Amor, mas pouco  devemos dizer pois ele é sobretudo uma vivência interna, uma demanda espiritual, uma construção interior, uma dádiva permanente irradiativa e apesar dos milhões de sermões ou declarações que o proclamam na realidade são apenas em geral palavras e leves sentimentos que se agitam, as pessoas pouco vibrando verdadeiramente no Amor todo poderoso...

                                                                       
Bem poderosa imagem da irradiação do Amor divino num ser. Algo, contudo, exagerada...

Busque então o amor no seu trabalho bem executado, no mais profundo de si (quando ora, medita ou contempla),  no encontro e diálogo verdadeiramente amoroso e unitivo com outro ser, com os seus familiares e amigos, e na sintonização ou religação com os espíritos da natureza, os guias, o seu mestre e os anjos dos planos subtis, ou mesmo com a Divindade em ou através de algumas das suas Faces ou Nomes invocadores que mais sinta afins e operativos.

O culto do chakra do coração como fonte especial do Amor foi grande na devocionalidade cristã

Ommm  Vishnu Narayana....

É por aqui que o amor se desperta e se intensifica mais e só posso desejar que neste dia por algum destes modos consiga chegar a despertar e a sentir mais o fogo do amor poderoso brotar do seu espírito e alma em comunhão com o que seja, ou quem seja, ou com o Todo, e não se deixe tanto manipular e subjugar. Viva o Amor libertador!

Emanação do Sol Primordial, por Bô Yin Râ...

Sabedoria Persa (13): "Ao deitares-te determinado no caravanseray, dormirás bem", comentado por Pedro Teixeira da Mota. E música de Loreena McKennitt: Caravanserai.

    

             «No albergue (caravanserai) da decisão,
           as pessoas dormirão bem.»

1º comentário: Conseguires determinar-te correctamente, após uma cogitação ou reflexão vasta e sensível, permitirá que durmas descansado e que viajes mesmo na direcção afortunada da decisão, algo que poderás sentir pelos sonhos e suas compreensões e,  depois, pelas decisões que tomarás e implementarás no dia seguinte.
Sabermos adormecer como qu
e numa estalagem ou caravanserai, que nos acolhe na travessia do deserto, e nos dá água fresca, cama, repouso e tempo para oramos e meditarmos, será meio caminho andado para resolvermos as nossas indecisões.

Avance bem luminosamente na caravana da vida, sabendo repousar nos albergues ou caravanserais.
Embora seja um provérbio citado e ilustrado da sabedoria persa ou iraniana (mas pouco interpretado), encontramos paralelos na tradição portuguesa, tal quando se fala de adormecermos para sermos inspirados pelo Espírito Santo do travesseiro, ou mesmo o Espírito Santo de orelha. Ou seja, que ao adormeceres tenhas criado um ambiente, pela oração ou meditação, que te harmonize de tudo o que se passou no dia e que te prepare o melhor possível para o sono e de sonhos, ou mesmo meditações, donde possas renascer ou acordar inspirado para o novo dia.

É um belo dito da sabedoria iraniana que tem também afinidades com a tradição pitagórica, que tanto recomenda, antes de adormecermos, meditarmos e revermos o dia, para assim, consciencializando-nos dos nossos erros, dúvidas ou esperanças, possamos semear nos sonhos e na disposição ou decisões do novo dia o melhor para ele, bem como a mais alta evolução espiritual possível nossa e dos outros seres. E então a grafia também utilizada de caravenseray, a terminar com o Y pitagórico da escolha certa para a via mais ascendente ou luminosa, deverá aqui e agora ser realçada...

Saiba usar bem o seu relativo livre arbítrio...

2º Comentário: O que é dormir bem? Não é necessariamente dormir de seguida, ou como um pedregulho que não se lembra de nada. Pode-se ter tido vários sonhos, acordado por mais ou menos tempo, o que para uns menos sábios seria uma insónia, e contudo tudo isso servir para se gerar mais claridade e discernimento no nosso cérebro e alma, de modo a que que as melhores decisões sejam tomadas e implementadas, e assim avançarmos sábia e harmoniosamente...

Convivência fraternas de almas peregrinas em satsangas imemoriais nas caravanserais

A própria estrutura do histórico albergue iraniano, com mais de 2.500 anos (e bem mencionado por alguns dos nossos viajantes dos Descobrimentos, tal António Tenreiro ou Pedro Teixeira), e que é hoje património mundial da UNESCO,  o caravanseray (de caravan- grupo de viajantes, e seray - habitação), tão frequente nas estradas e ligações através da Pérsia (tal a estrada Real ou a rota da Seda), aponta para este objectivo, já que em geral é uma construção com quartos para os peregrinos ou viajantes (outrora e seus animais, de fora) poderem descansar e recuperar e que tem no centro do quadrado, rectângulo ou círculo um pátio grande onde por vezes  se encontra a água ou poço, sempre bela imagem da fonte energética e espiritual da vida, a própria Divindade, ou que seja, das suas bênçãos e fortuna que se derramam, para as almas peregrinas  que demandam, merecem e  precisam...
                                       
Saibamos pois adormecer e atr
avessar a noite no caravanseray dos peregrinos ou amigos e amigas de Deus e, quer dormindo, sonhando, orando, meditando ou pensando, recebamos as melhores bênção para a jornada seguinte, em geral começada até sob a Aurora, Husa, ou Usha, na tradição proto-indo-europeu indiana e iraniana, tão cultuada como face refrescante e entusiasmante da Divindade no globo terrestre, tal como  sentem os peregrinos das grandes rotas, seja de Isfahan ou da Seda, de Santiago ou de Fátima...

Pintura de Bô Yin Râ... E segue-se música de Loreena dedicada à caravanserai:

                    

domingo, 13 de fevereiro de 2022

Sabedoria Persa (12), Omar Khayyam, Não sejas apenas uma sombra vã. Um ruba'i, ou quadra, comentada por Pedro Teixeira da Mota.

                                      

Esta quadra de Omar Khayym  será em geral interpretada no sentido da ilusão e evanescência do mundo e dos seres, podendo despertar várias associações na cultural anima mundi nossa, tal como uma primeira, a da famosa roda da Vida, ou roda do Destino, ou como Omar Khayyam lhe chama ainda a Roda dos Céus, que gira, gira e ora nos faz descer em desgraças e dificuldades ou elevar em ganhos e realizações.

Ou ainda à Deusa Fortuna, que rola sobre a esfera do mundo ao sopro dos ventos, ora bafejando-nos nos momentos de êxito ora abandonando-nos numa tempestade e naufrágio. Contudo, a imagem que nos brota logo directamente é da lanterna mágica, a antiga predecessora da maquina de projectar filmes: O Sol, ou a Fonte de Vida emana raios luminoso para o  écran do mundo ou, noutra imagem, para as paredes da sua esfera roladora, e nós somos apenas evanescentes imagens ou sombras que aí passam, sofrem, amam e desaparecem.

«Esta roda sobre a qual giramos
É semelhante a uma lanterna mágica.
O Sol é a lâmpada, o mundo o écran,
Nós somos as imagens que passam.»

Comentário:
Encontramos então nesta quadra o sábio às voltas com os enigmas e mistérios do Universo e como tudo parece sombra e ilusão, algo muito patente entre nós noutro poeta que oscilou entre a gnose e a descrença, e também cultivou o vinho como meio alquímico, Fernando Pessoa, e que tanto traduziu quadras de Omar Khayyam como  escreveu as suas próprias, para além de em muitos poemas denotar tal influência e nem tanto na linha do vinho do amor mas mais da consciência da sombra e sonho que é a vida...
Encontramos na versão maturamente preparada por Fernando Couto e bem prefaciada (embora tingida de certo agnosticismo e pouco conhecimento da essência sufi) por Eugénio Melo e Castro, pequenas variantes de tradução deste ruba'i, o nº115: 
«Esta abóbada celeste, sob a qual nós vagueamos,
compara-o a uma lanterna mágica
de que o sol é a lâmpada.
E o mundo é a tela» 
 
Todavia, na realidade por outras quadras de Omar Khayyam vemos que ele sentiu que era no amor e no vinho material, afectivo ou espiritual que estava a chave que rodava a porta do coração, o "abre-te sésamo" bem pronunciado, e que nos faz comungar com a Unidade da vida divina ou, se quisermos e conseguirmos, mesmo com a Divindade íntima...
Poderemos então pensar que nesta quadra Omar Khayyam, dando conta do misteriosa origem e destino dos seres nos alerta para não sermos meras sombras evanescentes, mas que saibamos assumir a nossa vontade e livre arbítrio e conscientemente religar-nos tanto à nossa essência ou espírito que perdura e é eterna, como à Divindade, o Sol do Amor primordial, e logo agirmos na roda da vida como actores-autores responsáveis, despertos, lúcidos, amorosos e clarividentes.
É em outras «ruba'i»s que encontramos mais fundamentação para esta última hermenêutica espiritual transmitida, e esperamos apresentá-las e comentá-las brevemente.