quarta-feira, 13 de novembro de 2019

Antero de Quental, com 18 anos, comemora o Infante D. Henrique e as harmonias do Universo.

 Celebra-se a 11 de Novembro a libertação do corpo físico e da Terra visível, do Infante D. Henrique (1394-1460), filho de D. João I e da Rainha da Filipa de Lencastre, o principal impulsionador da expansão náutica portuguesa. No Livro dos Descobrimentos do Oriente e do Ocidente, publicado por mim em 1998, e posteriormente ampliado no blogue: https://pedroteixeiradamota.blogspot.com/2017/10/efemerides-de-novembro-do-encontro.html, encontra tal efeméride, transcrita em seguida. Quem também a celebrou, e pouco se sabe de tal, foi Antero de Quental.
De facto, Antero de Quental, estudante de 18 anos, em 1860, nos 400 anos da morte do Infante, na revista O Académico, que fundara com Cunha Seixas, João de Deus, Alberto Sampaio e Alberto Teles Utra Machado, escreveu um esboço biográfico intitulado O Infante D. Henrique, o qual, aquando dos 500 anos do seu nascimento, em 1894, foi de novo dado à luz,  pela Imprensa Nacional de Lisboa, e que está agora a comemorar a sua fundação com uma notável exposição, "Indústria, Artes e Letras, 250 anos da Imprensa Nacional". É de um exemplar desta edição de 1894 que partilharemos imagens, extractos e pequenas reflexões...
                                    
Antes transcrevo a breve efeméride do Infante: «Deixa a orbe terrestre, jazendo os seus restos no mosteiro da Batalha, o infante D. Henrique, regedor e administrador da Ordem de Cristo, neste dia 13-XI de 1460, depois de ter começado a revelar ao Ocidente as costas de África rumo ao reino do Preste João e à Índia e de ser pela sua acção o principal iniciador dos Descobrimentos, com tudo o que isso de bem e mal implicou. D. Manuel I mandou esculpir a sua estátua, segundo o notável historiador e erasmiano Damião de Goes, no portal magistral do mosteiro dos Jerónimos, em Belém, Lisboa. Nos seus testamentos, reza com grande sabedoria quanto ao ressurgir antes da hipotética ou fantasiosa ressurreição final: «primeiramente encomendo a alma minha e o corpo ao meu senhor Deus e lhe peço que antes da ressurreição e desde que ressurgir, ele me dê salvação e me faça do conto dos seus santos por a sua grande misericórdia e piedade... E peço ao meu senhor S. Luís, a quem desde a minha nascença fui encomendado, que ele com todos os santos e santas e anjos da corte celestial, roguem a Deus por mim que me dê salvação». Instituiu missas duradouras pela sua alma que deviam ser rezadas em diferentes capelas e pagas aos vigários da Ordem de Cristo que as celebrassem, mas em 1556 os padres jesuítas absorvem tal privilégio celebrando todas as missas no Colégio que detinham em Coimbra, de certo modo substituindo-se à Ordem de Cristo como hierofantes do seu testamento e impulso espiritual expansivo.
De temperamento vincado, costumava dizer quando se impacientava, para se controlar, «dou-vos a Deus», ou «sejai de boa fortuna». E deixou-nos a sua divisa Talent de Bien faire, Vontade de Bem Fazer, muito valorizada na reconstituição dos princípios da ordem Espiritual de Portugal, que Fernando Pessoa debuxava. Também Antero de Quental, estudante, escreveu, em 1860, para a revista O Académico, uma pequena biografia histórica-filosófica intitulada O Infante Dom Henrique, onde se espraia sobretudo sobre a alma dos povos, de Portugal e da época.»
                                
Passemos agora a alguns excertos dessa obra juvenil, inacabada, à qual Antero chamou esboceto biográfico, e à apresentação digital da Introdução aos sete capítulos, com belas vinhetas e capitulares e em cinquenta e nove páginas, desta "formosa edição", no dizer do seu prefaciador Rodrigo Veloso, o director  por mais de trinta anos do pioneiro semanário Aurora do Cávado, e o editor na última década do séc. XIX, em Barcelos, de folhetos de muitos dos pequenos escritos dispersos de Antero e portanto pouco conhecidos.
«Tudo o que da pena consciente e levantada de Antero de Quental, "a figura mais característica do mundo literário português" [Oliveira Martins], se reúna em volume ou opúsculo, inéditos ou escritos seus perdidos nas folhas volantes e efemérides do periódico, bem vindo será sempre, e especialmente no momento actual em «que tudo o que se publique dele deve ser coleccionado com todo o amor», escrevia o Dr. Rodrigo Veloso, em Barcelos, a 9 de Fevereiro de 1894, no prefácio a tal reedição levada a cabo por Manuel Gomes, editor lisboeta.
Na Introdução, Antero de Quental, num texto genial para um estudante de 18 anos, realça o valor da leitura e do estudo da História passada como sinal de sensibilidade e evolução das pessoas e povos e defende que o aprovar e reprovar o que de bem e mal aconteceu, empaticamente até, «há de produzir a mais salutar influência sobre o desenvolvimento dos grandes instintos populares - o amor e o entusiasmo por tudo o que é grande e belo - entusiasmo e amor, que na vida real, em breve tem de desatar em esforços, para imitar esses tipos grandiosos, que a história, ajudada pela poderosa imaginação do povo lhe representa como já tocando a meta da perfeição.
Assim, se ao estudo da história é incentivo uma civilização crescente, é também esse estudo motor poderoso dessa civilização, porque, dando a experiência - que é uma luz no porvir - dá ao povo mais alma, se assim se pode dizer, mais vida pelo coração, mais sentimento moral».

 
 
No 1º capítulo, Antero eleva o seu pensamento até níveis muito elevados da compreensão da ligação do ser humano com o Cosmos, considerando que o coração é uma harpa cuja corda mais maviosa é a do sentimento do Infinito, considerando esta ideia de Deus como a síntese do universo, centro para onde tudo converge, dando alguns exemplos, tal como o amor: «O que é com efeito, o amor, esse mutuar de afectos de duas almas irmãs, senão um gozo, antecipado na terra, das delícias do céu?...
O que outra coisa é a esperança, esse embalar suave de uma alma ao futuro, mais que uma aspiração, melhor diríeis intuição do infinito? E a glória, o sentimento do belo, o amor dos homens, que outra coisa serão mais que reflexos desse sentimento de Si, que Deus em nós depositou? 
São todos irmãos, que gerou o mesmo seio, ramos no mesmo tronco; raios do mesmo centro, estames do mesmo fascículo».
No 2º capítulo destaca «o sentimento social e o sentimento religioso - o amor de Deus e pelo de Deus o amor dos homens» como sendo o «incentivo de grandes acções», enaltecendo o influxo destes destes sentimentos no engrandecimento da alma, concluindo no fim «Amor dos homens, entusiasmo religioso, eis duas ideias, que a terra nunca viu aparecer sem cortejos de heroísmos, piedade e dedicação; eis aí dois sentimentos que jamais toparam alma, em que não acordassem aspirações duradouras de virtude e elevação».
No 3º capítulo Antero de Quental considera que tais sentimentos se encontram em todos os povos e seres, pois «o poder ser grande e bom é direito que a todo assiste: filhos de Deus, a todos deu alma imortal com que a ele se elevem, desenvolvendo-lhe nobres instintos»,  mas deve-se reconhecer que há muitas causas que os impulsionam ou que os abatem e sufocam, apontando como as principais «a história do povo, o clima e natureza do solo que habita, e a raça que descende.
É a história incentivo de desenvolvimento moral quando mostra, engrandecendo-a através do prisma de interpostos séculos, a vida, os feitos, as virtudes e os cometimentos dos que antes de nós foram na terra, e faz assim nascer na alma do povo a nobre emulação, o desejo ardente de os igualar naquilo em que foram grandes, talvez até de os exceder.
A raça, pela pureza ou então pelo cruzamento de vários sangues, exerce sobre o carácter dos povos a mais poderosa influência. Vereis o ousado Espanhol, em cujas veias gira sangue de Romanos, Godos e Árabes, ardente nos desejos, exaltado nas paixões, ambicioso e aventureiro, contrastando com o Inglês fleumático, o Holandês empreendedor e paciente, ou o Alemão situado e pensador».
No 4º capítulo Antero de Quental considera que pelo «abençoado solo de Portugal» passaram «mil gerações, raças diversas», «Celtas, Fenícios, Cartagineses, Romanos, Godos, Árabes, tudo por aqui passou, aqui viveu, pensou, sentiu, chorou ou exultou» para fazer erguer-se «um povo rico de força, de seiva, de recordações, de glórias no passado, de aspirações e de esperanças no futuro.»
Bela e original é a sua visão de insular, de açoriano do movimento dos Descobrimentos, discernindo-a numa apetência do Infinito: «Embalados pelo murmurar das vagas em descanso, que se espraiam indolentes nos areais, ou por seu rugido feroz, quando de encontro às rochas se vem despedaçar, não podiam os generosos filhos desta terra, tê-la senão como pátria de adopção. A outra, a verdadeira, aquela atrás de que se lhes ia a alma inteira, eram as ondas espumantes, o pego imenso aonde o espaço é sem medida e o horizontes em limites!...». E conclui-o, vendo o Infante D. Henrique como «um vulto gigante imortal, porque a tudo deu o impulso, a primeira ideia».
No 5º, 6º e 7º descreve a traços largos a evolução de Portugal desde os romanos e bárbaros da Europa central até às lutas de cristãos e árabes, até começar a emergir na Idade Média a literatura: «Povo, então ainda na sua idade heróica, poeta, porque, como diz Chateaubriand, nessa idade todos o são, já sem seu seio vira nascer mais de um trovador enamorado suspirar as magoadas endeixas de Egas Moniz, e, ao escutar o Rouço da Cava [um dos primeiros textos e poemas na língua galaico-portugueses, talvez do séc. VIII, referente à derrota dos Visigodos, em 711. Será o proto-esoterista Faria e Sousa a transcreve-lo pioneiramente na sua Europa Portuguesa, 1680], aprendera a detestar a traição e os traidores. Já Vasco de Lobeira, no seu Amadis de Gaula, romance de cavalaria, poema, que assim se pode chamar, dos altos feitos de então, ensinara ao povo como a bravura se pode casar com a galantaria e nobreza», concluindo que faltava ao Portugal de então o estudo e desenvolvimento científico, citando Alexandre Humboldt, porque «todas juntas não formam mais do que uma só ciência, todas tendem a um único fim, o estudo de Deus nas suas obras, ideia do infinito, que toda a criação revela, quer a estudemos na alma humana nas leis da sua razão, nas suas relações, quer na natureza física do Universo, na rotação dos planetas, nas transformações da matéria, e nas leis que a elas presidem. Todas se ajudam, porque todos brotam do mesmo centro.»
E terminando assim, poderemos pensar que aspectos biográficos, ou então dinamizadores, do Infante D. Henrique teria ainda pensado Antero de Quental, mas que não passou à escrita?
 
Talvez referisse o lema adoptado pelo infante, o Talent de Bien faire, que Fernando Pessoa veio a glosar para uma Ordem espiritual de Portugal, da qual a Ordem de Cristo de que o Infante era o Governador serviu de algum modo de base especulativa e simbólica, num lema que nos diz para  sermos o melhor possível, na vida material, psíquica e espiritual, ou ainda realçaria a sua forte devoção ao divino e a sua visão futurante e universalista?
Mistérios...
        Última vinheta do belo opúsculo juvenil de Antero de Quental: Clarear as trevas do centro, ou trazer a tonalidade azul do céu à terra, à arte, às nossas almas, e com ajuda do anjo ou dos cupidos do Amor criativo?

domingo, 27 de outubro de 2019

Da vida e emanações dos livros e suas comunhões com as nuvens, os ventos, as grandes almas, a Divindade.

Em certas casas lisboetas não é preciso esperarmos pelo desaparecimento da luz solar nem pela imersão no oceano onírico para assistirmos a algumas cenas inabituais mas justificadíssimas, pois como recusarmos aos livros o direito de saírem das suas estantes e desfrutarem um pouco do sol, do vento, das vistas, das procissão ou danças das nuvens?
                                    
Certamente não é fácil discernirmos as trocas energéticas e  conscienciais que constantemente acontecem no ambiente, nos livros, nas pessoas bem como as correntes que percorrem a cidade ou a aldeia, nos mundo visíveis e invisíveis e subtis, influenciadoras ou testemunhas de tais actos, transformações e trocas. 
Estas cinco fotografias, captadas na tarde de Domingo 27-x, de livros a apanharem sol e ar fresco servem agora já noite para tentarmos entrarmos um pouco mais nas atmosferas subtis tanto externas como internas dos seres, livros, ideias e mundos...
                                    
Perfilados sobre o horizonte podemos dizer que tanto deixam escapar suas emanações, como recebem o que os ventos terrestres e solares lhes trazem ao baterem e acariciarem as folhas e as frases abertas sobre a paisagem e o amplo céu convivial...
                                      
Expostos equilibradamente ao céu e seus ventos e nuvens, os livros desfrutam de tais bens e podem até exporem-se como os humanos nas praias sem contudo perderem os conhecimentos neles impressos em letras e  que pouco se inscrevem duradoramente nas mentes humanas, em geral demasiado mutáveis, e mais constituídas por imagens cinematográficas do que por mensagens em letra manuscrita ou impressas com caracteres firmes e elegantes, embora nos tempos antes e do começo da impressão talvez tal fixação do conhecimento muito mais acontecesse do que hoje.
Também porque a linguagem mental subtil é tão volátel como a das nuvens, o que pode ser tanto uma vantagem pelo desprendimento e liberdade que têm e geram, como um defeito ao não sabermos concentrar-nos mais profunda e demoradamente e podermo-nos superficializar e não deixarmos na terra  o nosso contributo no Grande Livros dos Livros...
                                      
Este erguer-se, verticalmente e saber equilibrar a luz e a sombra, o verso e o reverso, o prazer e a dor, o sucesso e insucesso, o ler e o escrever, o dar e o receber, o que se sustenta e do que se abstém, é certamente uma arte trabalhosa mas que ao longo dos séculos teve grande praticantes que nos legaram as suas obras e que merecem ser divulgadas e partilhadas nos nossos dias, aí onde dois ou três se reunirem em nome delas ou de um mestre ou autor, mais claramente brilhando sua essência íntima e dinâmica.
                               
Os livros podem então ser expostos como mantos sobre uma procissão, ou como bandeiras desfraldadas ao vento, tanto anunciando como transmitindo suas energias e apelando à nossa receptividade e reactividade sensível, assimiladora e, criadora, justa, amorosa e divinamente.
Cada livro é um ser vivo que nos desafia a expandirmos o nosso conhecimento e sensibilidade de modo a que a sabedoria e o amor divinos que originaram o cosmos e que estão tão presentes na melhor criatividade humana possam por nós ser acolhidos e desenvolvidos, inspirando-nos e orientando-nos.
E quem sabe se as nuvens, ventos e marés absorvem algumas emanações dos livros para derramarem-nas mais frutiferamente aí onde a secura da ignorância, do desânimo, do fanatismo, do egoísmo mais as necessitem...
Saibamos então semear pelos escritos e livros, pelos ventos e nuvens mensagens e aspirações que se propaguem em ondulações sábias e amorosas pelo grande oceano psíquico que tudo e todos envolve e nos torne mais unos com os ventos solares, as nuvens galácticas, os grande seres e autores e a Fonte Luminosa Primordial Divina.

Antero de Quental traduz e melhora um poema de Victor Hugo e corrige o profetismo dele e de Junqueiro. Face ao mistério da morte, medita no silêncio. "Museu Ilustrado", 1878.

A Sociedade Athena, portuense, apresentou em 1878,  um Album Literário,  Museu Illustrado, com as colaborações de numerosos escritores derramadas nas 400 páginas,  patenteando o nome, uma fotografia e um  poema de Victor Hugo, este que fora traduzido por Antero de Quental há dezassete anos,  quando o publicara em Janeiro de 1861 no 2º vol. do  Preludios-Litterários: Jornal Académico.
Como hoje em dia é publicação rara de se encontrar e passou-me pelas mãos na livraria olisiponense alfarrabista, à rua do Alecrim, do amigo Bernardo Trindade (infelizmente em 2021  substituída, perante o clamor indignado dos céus e dos amantes de cultura, numa loja de tatuagens ou tatoos...), eis  as imagens da publicação, colaboradores e poema, mais algumas reflexões.                      
 
Dirigida por David de Castro, propriedade de Arnaldo Rocha, incluiu colaboração de Alberto Pimental, Alberto Teles, Angelina Vidal, Camilo, Fernando Leal, Fialho, Gomes Leal, Gonçalves Crespo, João de Deus, João Penha, Joaquim de Araújo, Leite de Vasconcelos, Luís de Magalhães, Magalhães Lima, Amorim Viana, Santos Valente, etc., sendo apresentadas as fotografias de tal ilustre plêiade, com Antero de Quental a surgir na numerada com o nº 20.
                                          
Vejamos e leiamos então a versão anteriana do poema de Victor Hugo, publicado por este em 1840 com o título Écrit sur le tombeau d'un enfant au bord de la mer, uma das referências do jovem Antero de Quental, como ainda em 1877, reflectindo o espectro das suas leituras, confessa a Oliveira Martins, ao realçar "a afirmação, a paixão e a imaginação" que fazem «os grandes escritores, que não são propriamente escritores, mas poetas, videntes e grandes homens no fundo - Rabelais, Lutero, Carlyle, Michelet, Hugo»,  mas de quem depois  se distanciará, como se vê numa carta (e neste blogue já estudámos outra) bem curiosa ao jovem Carlos Cirilo Machado, de Junho de 1886, que se atrevera a criticar o já consagrado Guerra Junqueiro: «Meu caro. Apesar de Você bater tão desalmadamente num que eu sempre amei muito, mas não lhe posso encobrir que na maioria dos casos bate certo./ A Velhice  do Padre Eterno foi um grande erro e custou-me imenso  ver que o Junqueiro persistiu em o cometer. O Junqueiro é um admirável idílico e além disso  em certos assuntos um poderoso satírico. Mas a Velhice é o sintoma duma deplorável mania de profeta, que ameaça perdê-lo como perdeu o Hugo.» Explicará ainda as atenuantes de ambos terem a poesia mais de que diletantismo:«a intenção era boa, o caminho que seguiram é que foi errado.» E ainda numa carta a Göran Björkman, três anos e depois a uns meses de partir da Terra, depois de considerar João de Deus o melhor poeta português, seguindo-se Tomás Ribeiro, nomeia Junqueiro, e traduzimos do francês «o seu volume Morte de D. João é muito desigual, mas contudo valioso, e, no meu sentir, superior à sua outra obra Velhice do Padre Eterno, onde ele imita demasiado Victor Hugo, no que Victor Hugo tem de pior»
 
 Alexandre Herculano e Victor Hugo pontificando numa biblioteca do séc. XIX na Beira transmontana
 
 A recente publicação por Luís Fagundes Duarte de uma edição crítica da poesia de Antero de Quental permite-nos até compararmos a tradução anteriana com o original de Victor Hugo,  já que o transcreve, e realçaremos apenas brevemente o seguinte, reproduzindo a versão de Antero, onde a poderá ler:
                                           
 No 2º verso do 1º quinteto, onde Victor Hugo escrevera «Église ou l'esprit voit Dieu ailleurs», Antero melhorou bastante: «Sagrado templo em que a alma contempla Deus», deixando-nos com boas direcções de visão: a do local da campa que pela sua harmonia da natureza envolvente permite seja ao morto nos primeiros tempos da sua transição, seja aos que por lá passam, caso do pastor, seja ainda aos leitores do poema, elevarem-se, contemplarem, intuírem Deus. De realçar ainda a passagem de l'esprit para alma...
No 2º quinteto, Antero de Quental introduz a meio uma versão de mais alta espiritualidade do que Victor Hugo, neste  "Bois, qui faites songer le passant serieux ("Bosque, que fazes sonhar o que passa sério"», enquanto Antero amplia de novo numa linha espiritual valiosa, criando mesmo um ambiente oriental: "Selva, que a meditar convida o sábio".
  Há uma diferença bem forte entre o sonhar ou divagar de Hugo, para o aprofundamento causal que Antero faz de tal ambiente: a natureza convida a meditar as pessoas, ou seres com sabedoria, ou que aspiram a ela. Provavelmente  a vivência infantil e juvenil da ilha da Terceira dos Açores e a religiosidade familiar contribuíram para esta sensibilidade bem espiritual, valorizadora da meditação e da possibilidade de aprofundarmos com ela a sabedoria mais necessária, a que triunfa das aparências da morte..
No 4º e último quinteto realçaremos  ter-se Antero,   nos dois versos finais, sujeitado à vulgar visão da morte católica e hugiana (dormir a criança, e chorar a mãe), mas antes, onde Victor Hugo escrevera apenas «Ne faites pas de bruit autour de cette tombe», Antero de Quental consegue transformar tal pedido numa injunção sagrada, quase iniciática: «Folhas, ninhos... silêncio em volta à campa». Ou seja, propicie-se um ambiente meditativo, conducente a uma experiência espiritual que mostre ou faça sentir interiormente ser a morte apenas a alma abandonar o corpo físico e o plano terrestre visível.
O cavaleiro andante do silêncio, da noite, da morte, da abnegação, do desprendimento, da ética e da voz da consciência que viria a ser Antero de Quental já se pressentia nesta tradução juvenil, tanto mais que o seu génio brilhou mais puro e menos influenciado nessa época...
A fotografia, com pouca definição ao ser ampliada e não de um arquivo policial, de Antero. Muita luz e amor nele!

sábado, 26 de outubro de 2019

Bô Yin Râ, "Geist und Form", "Espírito e Forma". Resumo comentado deste pequeno livro do seu ensinamento, Hortus Conclusus.

  Como artista e espiritualista, como mestre de grande exigência de perfeição na sua vida e obra, pictográfica (como pode contemplar neste artigo) e de escrita, com alguns livros bastante trabalhados e remodelados até chegarem à melhor forma de transmissão, Bô Yin Râ (1876-1943, e encontra neste blogue bastante sobre e dele) teria que tentar clarificar, na perspectiva do caminho Espiritual, aspectos e questões relacionados com o uso de objectos, roupas, formas e instrumentos, casas, bem como com as principais emoções, felicidade e infelicidade, alegria e dor.
 Será num pequeno livro publicado pela primeira vez em 1925, Geist und Form, Espírito e Forma, dividido em seis capítulos que Bô Yin Râ abordará o relacionamento entre esta dualidade  que tende frequentemente a ser ou estar desequilibrado ou desarmonizado, ainda que por "boas" intenções e desprendimentos...
No capítulo I,  intitulado A Questão,  Bô Yin Râ tenta despertar as pessoas que estão ou querem estar no caminho espiritual para a importância de harmonizarem melhor a relação com o mundo das formas ou da matéria, lembrando aos que menosprezam as formas ou revestimentos materiais que, sem eles, os espíritos não poderiam exprimir-se plenamente, pelo que devemos rodear-nos de formas transparentes a tal elevado desiderato, afirmando mesmo:«tal como um vinho precioso não é servido em malgas de barro medíocres, pois isso seria injuriar a sua qualidade, de igual modo o simples respeito devido ao espírito exige que só te satisfaça a forma mais perfeita, a partir do momento que que queres tornar templo do Espírito. O teu comportamento no exterior deve testemunhar incessantemente tal respeito», pelo que mesmo a aparência exterior deve manifestar tal e inspirá-lo nos outros. Há portanto uma meta ou objectivo a ser alcançado na forma interior, na alma, sermos templo do Espírito, respeitar-mo-lo e manifestá-lo com as formas e meios adequados.
                                 
No capítulo II, Exterior e Interior, Bô Yin Râ mostra que o exterior tem sempre um interior e que esse interior está até ligado a um interior ainda mais profundo e espiritual, mas que todos os níveis implicam formas para serem percepcionados por nós, e que assim tudo o que nos rodeia nos convida a entrarmos mais fundo do que nas meras aparências. E se tentarmos tal demanda constantemente seremos presenteados com a revelação das essências das coisas e seres...
Adverte portanto que toda «a forma do mundo interior é sempre expressão de qualquer coisa de arqui-interior, que jamais existiria para ti, se não a discernisses em ti enquanto forma»,  e que este discernir o interior expresso pelas formas será o melhor meio para também no mundo post-mortem conseguirmos encontrar nas formas do mundo espiritual o seu interior profundo.
Não se desprezarão assim as formas, nem se usarão pretensiosamente as que já  estão em desuso, tais as roupas, devendo haver ainda cuidado na rejeição de  formas sociais, tal a da instituição do matrimónio, a qual, apesar de se poder errar na escolha, é ainda válida para evitarmos «que se comece a desenraizar tudo o que a humanidade tinha plantado a fim de não sucumbir na tempestade dos instintos transviados e das paixões incontroladas.» 
                                                The Paintings of Bô Yin Râ: Ornament Series:: The Kober Press
No capítulo III, A Casa e a sua Decoração, Bô Yin Râ apela a valorizarmos mais a nossa influência na casa, seja construindo-a nós, ou dando os planos a quem a erguerá, ou então moldando-a, adaptando-a, impregnando-a, pois o que conta mais será "o modo como farás tal espaço teu".
Reconhecendo as energias e a patine ou aura própria dos objectos que já nos vieram de outras pessoas, «a maneira como tu utilizas hoje o antigo na ornamentação exterior da tua vida, dará sempre aos objectos um valor novo que não pode emanar senão de ti», valorizando assim a nossa participação, afirmando mesmo que tudo que nos rodeia deve receber uma parte do nosso amor, e detalhe algum dentro da casa deve escapar à nossa atenção, consciência e amor. No seu livro  Magia do Culto e Mito, ele explicará melhor como certos objetos carregados energeticamente por nós se tornam talismãs, que nos fortificam, em especial em momentos de maior necessidade.
Para Bô Yin Râ a casa deve ser um oásis, um local onde tudo nos transmite ou «impulsiona à alegria e a uma quente e pura alegria espiritual». E mesmo quem tem pouco dinheiro deve velar para que haja uma harmonia e dignidade na sua ornamentação da casa ou local de trabalho.
Ou seja, após qualquer situação negativa, chegando-se a casa deve-se conseguir « voltarmos rapidamente a nós, e ao nosso nível mais alto», já que os objectos que nos rodeiam, «lembrarão os melhores aspectos da tua sensibilidade, falarão do seio do teu próprio universo, te trarão a calma e a serenidade». Podemos pois acrescentar que nestes tempos minimalistas da post-modernidade, o corte com os objectos de antepassados ou amigos,o menosprezo de tais objectos do passado ou associados a memórias sentimentais acaba por ser um enfraquecimento de uma aura mais protegida tanto da nossa casa como da nossa alma...
E faz uma pergunta notável: «Tu que queres perceber interiormente a voz do Espírito eterno, como poderás tu suportar estares rodeado de coisas que querem parecer o que elas não são – que são como um insulto à lei da forma?»
E essa lei, é a de que «qualquer forma é sempre um símbolo, parte integrante de uma linguagem, que tem algo a dizer».
Para quem quer ser um templo do Espírito todos os elementos ou utensílios incompatíveis com tal qualidade ou dignidade devem ser afastados: «Vigia de modo  rodeares-te apenas de objectos pelos quais possas responder um dia diante do Espírito que procuras encontrar em ti.»
E como o Espírito a que te queres unir «é harmonia, pureza, luz e verdade», deves-te rodear de formas que sintas como verdadeiras e puras, excluindo o que na sua forma desvenda-se que «não é verdadeiro, ou que se torna falso pelo facto de não se harmonizar com a tua sensibilidade» 
No capítulo IV, a Forma da Alegria, Bô Yin Râ lembra-nos que devemos saber dar forma, limites, controle aos instintos e paixões, se queremos atravessar tal mar alto de ondas e tempestades e chegar a bom porto.
Mais do que perder-nos em alegrias, devemos configurá-las nobremente, de acordo com a nossa individualidade e especificidade eterna, e sabermos também respeitar as alegrias dos outros, nas suas formas que o merecerem, mas sem que sejam elas, nem o que tais pessoas pensem das nossas, que nos determinem no nosso caminho de individuação da nossa vida e suas alegrias.
No capítulo V, Forma do Sofrimento, Bô Yin Râ desenvolve a mesma ideia de darmos forma,  não à alegria mas à dor de modo tal que ela se torne suportável. O método é aceitá-la nesse momento como estando «ligada de modo evidente à forma de vida que nos corresponde o mais estreitamente – como não podendo ser de outro modo» e depois ir superando-a.
Graças à acção formadora do Espírito, e a uma desvalorização ou mesmo menosprezo da dor, tanto física como moral, acabamos por não nos deixarmos derrotar e vencer por ela: «Deves elevar-te acima dela e aprender a comandá-la.
Tu próprio és o que permanece. A dor é efémera e  ela mente quando tenta incitar-te a crer na durabilidade dela (...)
Deves, em verdade, dar mais valor a ti próprio, que ao sofrimento, pois é em ti próprio que a luz irradiante e resplandecente do Espírito quer-se revelar a ti.» 
No capítulo VI e último, Arte de Viver, Bô Yin Râ defende que a vida, embora constituída de materiais que nos são dados, depende de nós pelo modo como os encaramos, acolhemos e trabalhamos, e segundo o plano interno ou projecto da nossa vida que a nossa alma capta ou percebe. Algo que na Índia se denominava, acrescentamos, o swadharma, a missão ou dever pessoal, no Dharma ou Ordem planetária
Assim se «cada dia terrestre traz-te um novo material com o qual podes construir a vida espiritual de uma forma artística.
É contudo a ti que caberá trabalhar a matéria bruta, de tal modo que ela se adapte ao projecto sublime que a tua alma descobre no mais profundo dela própria.».
Deste modo, face ao que cada dia nos traz, devemos perguntar-nos  como  podemos rapidamente dar-lhe forma, de modo a que tal sirva o nosso subtil templo Espiritual.
Esta tarefa de intuir e seguir o plano de vida espiritual nosso exige, desafia-nos Bo Yin Râ, «que desde que escutares estas as minhas palavras comeces a procurar no cofre mais interior da alma o plano de construção.
Ele encontra-se em lugar seguro e descobri-lo-ás se procuras com toda a calma, derivada da certeza plena.
Não é uma procura apressada que te permitirá chegar lá.
E logo que o tenhas encontrado, põe-te ao trabalho e permanece fiel à tarefa empreendida.»
É durante o trabalho de construção e realização da missão ou projecto da nossa vida que nos tornamos mais conscientes do plano e vamos ficando mais confiantes ao vermos (ou sentirmos) o que levamos (ou temos) dentro de nós e então, de acordo com essa auto-confiança, virá a ajuda, sem sabermos bem de quem.
Tais ajudas e impulsões maiores para este trabalho artístico espiritual, virão porque: «Lá no íntimo do teu ser, saber-te-ão guiar para uma arte superior – a arte de modelar a vida espiritual segundo a lei inerente ao Espírito eterno». E todos nós que meditamos ou oramos sabemos bem como nesses momentos as intuições e inspirações nos iluminam...
«O que quer que te traga a tua vida exterior, procura tirar partido espiritualmente, esforçando-te por lhe dares forma espiritual, e brevemente, graças a tal sábia actividade espiritual, farás desaparecer do teu caminho muitos dos obstáculos que te pareciam insuperáveis.»
A tua vida exterior transformar-se-á segundo a imagem da tua vida espiritual, na medida em que saberás formar espiritualmente para ti tudo o que é exterior» 
 E conclui a obra dizendo, bem acima e mais profundamente que os defensores da mindfulness e dos vazios de formas: «Em toda a forma se encontra o Espírito a agir.»... 
 
Possa este pequeno resumo de mais uma obra valiosa de Bô Yin Râ ajudar as pessoas a libertarem-se de tanta ilusão e mistificação multidimensional, ocultista, cabalista, nova era,  esotérica e yoguica   que em Portugal tanto abunda em pseudo-mestres, seitas, grupos e modas, e que na realidade estão frequentemente muito pouco na demanda do Graal da Verdade e da consciência do Espírito e da Divindade, que desejamos que seja mais realizada por si, alma leitora amiga...

terça-feira, 22 de outubro de 2019

Os doze níveis do Amar e do Amor, segundo os Peregrinos, Fiéis e Cavaleiros e Cavaleiras do Amor.

  Dos 12 níveis do Amar e do Amor, segundo os Peregrinos Fiéis do Amor.
Como o estar em Amor é a obrigação dos peregrinos e fiéis do Amor, ou mesmo cavaleiros e cavaleiras do Amor, isso implica que as nossas forças somáticas e psico-espirituais estejam activas, lúcidas e irradiantes, pois estar em amor é estar com ele acesso dentro de nós, não o deixando apagar pelo que quer que seja, ou quem quer que seja, e é viver numa compreensão
harmonizadora ou mesmo unitiva com o que nos envolve, com o Cosmos multi-dimensional e a Fonte Divina..
 No seu 1º nível o Amar é querermos ou aspirarmos à Divindade, a Fonte Primordial de Amor e de Luz.  É o nível mais elevado do Amor, ideal, para nós com graus infinitos de aproximação, ignição e unidade à Divindade.
Este estado ou direcção de Amor porém não se deve  esquecer ou perder de sintonia ou aspiração, e convém ser cultivado nos ritmos e modos  adequados, tal como Erasmo recomendou no orar sem cessar, qual a oração do coração dos hesicastas russos ou o canto devocional dos místicos indianos e persas, ou a plena atenção dos mil olhos dos caminheiros e peregrinos das montanhas e falésias.
Assim, uns fazem-no pela oração e canto, outros pela  sensação, interiorização, gratidão, adoração, serviço abnegado e dedicado, contemplação, visão e unificação. Mas é nos grandes mestres e místicos, sobretudo indianos, persas, sufis e cristãos que encontramos os casos de mais elevada ligação a Deus, ou de estados mais intensos de amor interior e transbordante.
Quando este estado de amor, ou estação do caminho real, se consegue sentir ou estabilizar mais, devemos desfrutá-lo, senti-lo, assimilá-lo, irradiá-lo, intensificá-lo subtil e fortemente.
O segundo nível do Amor é o do espírito, o da nossa identidade própria, centelha íntima, essencial e subtil que existe no seu corpo luminoso espiritual.
É pelo amor a ele que em grande parte sobrevivemos aos obscurecimentos, desânimos, desgastes e ataques da vida quotidiana, pois o corpo físico é então apoiado pela sua contraparte subtil, ígnea e espiritual, e talhado,  configurado e assumido mais unitariamente pela vontade nossa em unísono com espírito, ganhando nós com isso sensibilidade e resistência, intuição e discernimento maiores.
O 3º nível do Amor é o que sentimos e manifestamos pelos mestres, anjos e espíritos celestiais, pelos seres mais próximos da Divindade e da verdade; e que veneramos e de quem acolhemos energias, inspirações e bênçãos. 
 A comunhão com este nível é bem subtil e difícil, pela elevação vibratória dos mestres e anjos e dos planos onde se encontram, e realiza-se pelo coração, pela nossa adoração a Deus e pela nossa perseverante identificação e realização espiritual.  Mas a saudação e invocação dos mestres sintonizada ou praticada diariamente é bem salutar. 
 Atente-se que há uma infinidade de grupos de esoterismo e nova Era com concepções inventadas de mestres, e suas quintas e sétimas iniciações,  uns denominados de ascensos, com mestras e tudo, outros intraterrenos, com decretos, rituais e canalizações mirabolantes, sendo grande a mistificação e possibilidade de engano...
O quarto  nível do amor é o das pessoas amigas que mais amamos, ou pelas quais sentimos mais afinidade de comunhão vibratória, havendo contudo diferentes tipos de afinidades e razões justificativas das atracções, possibilidade e níveis unificadores.
Ao perguntarmos ou inquirirmos quem amamos mais, teremos que equacionar primeiro o que entendemos por amar: se é o desejar o bem, se é o querer estar, se é o querer ser, se é o querer lucrar, se é o querer ser amado, se é o querer dar-se, se é o querer trabalhar como, ou se há mesmo a constatação da presença da graça do Amor beatífico. 
Nesta graça do amor unitivo e beatífico se elevaram muitos trovadores e poetas, grandes amantes, paixões ardentes, seres anónimos ou conhecidos por suas obras, em todos os casos tingindo mais de rosa e dourado o Grande Livro dos Livros.
Amar é estar ou mesmo ser em Unidade com outro ser, certamente em múltiplos graus de comunicabilidade e osmose, mas com o coração bem flamejante do Amor que é, sem estar submetido a forças negativas e opressivas, ciumentas ou partidárias.
O Amor, sendo a Fonte dos Espíritos e do Cosmos, desabrocha ou manifesta-se  sobretudo a quem mais o ama e particularmente nos seres que se amam e em especial em dois seres que se amam o mais plenamente possível. 
Aprofundar o amor entre dois seres é então a grande obra,   alquimia infelizmente pouco aprofundada e clarificada nos seus aspectos mais subtis e íntimos que nos elevam ao espírito, à unidade, à Divindade. Mas felizes os casais que procuram sensível e criativamente chegar a tal unidade, em todos os seus níveis, e fazem das suas famílias e crianças seres harmoniosos e livres na sabedoria e no amor.
O ser Fiel do Amor é aquele que conhece ou vive o  amor e o seu poder imenso e tenta transmiti-lo no mundo, e intensificá-lo em si e nos seus mais próximos.
A rede de seres que amamos, ou que podemos amar mais, com o crescimento dos meios de comunicações modernos, tem aumentado bastante mas haverá que passar do virtual para o real, da dispersão superficializante para a união ou mesmo comunhão frutífera, benéfica, transformadora. Anote-se que recentemente o sar covid veio destruir muita facilidade de contactos presenciais por algum tempo, e esperemos que os seres não se deixem apanhar pelas negatividades que lhes estão associadas...
Descobrirmos que seres são verdadeiramente almas afins nossas, em si, no que comunicam e no que podem realizar, é fundamental para as criatividades ou missões que todos nós somos chamados a realizar na peregrinação terrena.
Sabermos mesmo discernir os seres mais próximos, seja para trabalhos criativos, seja por afectividade, e com regularidade mantermos linhas de comunicação, apoio e aprofundamento é importante, mas sem entrarmos em hipnoses, dependências, explorações doutrinárias e  comerciais, como infelizmente tanto ser, grupo ou seita faz.
O 5º nível do Amor é o que estendemos para os que já partiram da Terra, mais particularmente antepassados, familiares e amigos, e que recebem através de tal santa campanha no corpo místico da Humanidade algumas forças amorosas ou de comunhão, pelas mais diversas formas em que os possamos relembrar ou incluir no coração, no Amor, nos Mestres e Anjos, no mundo e ser Divino.
O 6º nível de Amor é para o que nos rodeia do ambiente, casa, trabalho, rua, aldeia, cidade, e nele se destacam os objectos que temos connosco, as plantas, árvores, aves e  animais próximos, e a natureza com que mais convivemos ou conhecemos e que cuidamos, preservamos e defendemos, nomeadamente face a tantos seres gananciosos e destrutivos, em espacial das árvores, rios e natureza.
O 7º nível do amor é do dos livros e autores e assuntos que mais gostamos ou amamos e aqueles nos quais ou em cujas tradições nos inserimos.
Por exemplo, os Humanistas europeus, os místicos Persas, os sábios portugueses e indianos, os místicos e iniciados dos mistérios da Antiguidade, etc, etc.
O 8º nível do Amor é o da nossa criatividade: que obras estão em curso em nós, quais as que querem germinar, quais as mais necessárias, e seja livros, esculturas, poemas, música, tecelagem, pinturas aquelas às quais devemos estar mais atentos, esforçando-nos por sairmos da horizontalidade do quotidiano e elevar-nos com criatividade e perenidade verdadeira, boa nelas e através delas, deixando o nosso contributo na história da evolução da Humanidade...
O 9º nível do Amor é o da humanidade em geral, pelo qual tentamos ser cada vez mais justos, atentos, compassivos, corajosos, lutadores pelo bem dos seres, dos que mais sofrem, das causas justas, da liberdade dos povos, com espírito de sacrifício ajudando aqui e acolá, e com coragem denunciando ou lutando mesmo as opressões e injustiças e de novo tentando cooperamos com as causas e lutas harmonizadoras e evolutivas da Humanidade...
O 10º nível do Amor é do futuro e da crianças, pelo qual lutamos ambiental, politica, educativa e afectivamente pelo que entendemos ser o melhor para elas e para todos, desenvolvendo metodologias, ambientes e relações justas, ecológicas, sábias e amorosas, em especial para e com as crianças, jovens e seus educadores...
O 11º nível do Amar é o do mistério do Amor, da sua primordialidade e fonte, tanto na dualidade cósmica, a Shakti e Shiva dos indianos, ou o Yin e Yang taoísta, como na individual, homem-mulher, ou mesmo nas enigmáticas almas gémeas, e consequentemente com as múltiplas polaridades em nós e no universo, com as suas harmonias e unidades possíveis.
 O 12º nível do Amar: o aqui e agora, o é a hora, o viva Deus santo Amor, ser o fogo do Amor.
 Texto escrito no dia 22-X-2019, por Pedro Lencastre Teixeira da Mota, ilustrado com três pinturas de Bô Yin Râ.  Revisto em 11-II-21

domingo, 20 de outubro de 2019

Ensinamentos (1º) das cartas de Marsilio Ficino: o caminho ascensional para o Sol. Nos 520 anos da sua morte.

              
Marsilio Ficino à esquerda, Pico della Mirandola e Angelo Poliziano, fresco da época por Cosimo Rosselli
O médico, clérigo, filósofo e espiritual florentino Marsilio Ficino, que viveu entre 1433 e 1499, foi um dos seres que mais procurou, pensou, meditou, contemplou, intui e amou a Divindade e o  Cosmos bem como os caminhos para nos harmonizarmos e e religarmos a Ela, deixando nos seus livros e cartas imensas
indicações valiosas.
Nestes dias dos 520 anos da sua morte (2019), eis uma tradução do latim (na edição parisiense de 1641, comparando com a discutível edição inglesa de 1994), que fiz de um excerto  da sua longa carta escrita em 1478 em Florença para o cardeal João de Aragão, filho do rei Afonso de Aragão, e que bem merece a nossa atenta meditação: 
«Eia, caminha de novo para o círculo lúcido da tua mente, de certo modo quase um espelho, e especulando e contemplando atinge no mundo e no extra-mundo a esfera intelectiva e a esfera do inteligível, cujo centro está em toda a parte, pois penetra todo universo infinito, mas a circunferência em parte alguma pois está infinitamente sobre-eminente  ao universo..
 Eia, contempla a forma divina, a fonte de todas as formas, a forma uniforme e omniforme. Vê esta forma apresentando-se a cada passo a todas as mentes, especialmente diante das puras como espelhos! 
Agora, atinge-te fulgurantemente o Deus dos deuses, perante o qual nenhum deus é o verdadeiro. 
Agora  a bondade eterna do bem é exuberantetotalmente não participante do mal. 
Agora brilha a imensa Luz das luzes do Sol e dos outros seres espirituais. À volta da qual circulam  o sol, as estrelas e as almas, tal como a lua à volta do sol.
 Os raios perenes deste Sol eterno, que eternamente são sempre os espíritos humanos, são envolvidos pela nuvem escura do corpo, mas reflectem em  si o Sol, se o quiserem através da cogitação e do afecto
Sem dúvida, eles contraem-se para o Sol, tal como  originalmente brotaram dele. 
Portanto, assim como eles podem refluir para o Sol em qualquer altura, uma vez que todos os impedimentos foram subtraídos pelo  contemplar e amar segundo os ritos certos, pois claramente emanaram dele desde o princípio sem se separarem, é evidente que são sempi-eternos,  próximos do eterno em si mesmo.
Eles patenteiam mais claramente a sua imortalidade quando  valorizam as coisas mortais como mínimas, principalmente comparadas  com as graças eternas.
Para além disso reconhecem o que é imortal como imortal e a imortalidade em si mesma, isto é, apreendem até certo ponto Deus, através da razão certa de tal  imortalidade.
Deus providencia primeiro e acima de tudo para aqueles que vêem o Deus omnividente. Se Deus é (como certamente é) a causa de todas as coisas, ele está acima de todas as coisas. 
Se ele é simplicíssimo, o que a suma potência manifesta,   certamente então nele não é outra coisa ver que ser, pelo que ele é tudo e vê tudo nele. Sendo óptimo, o que não se duvida, então nele o ver é providenciar. 
Assim vendo tudo, ele providencia universalmente perfeitamente, sobretudo para os espíritos que verdadeiramente o vêem em toda e qualquer coisa e o veneram acima de tudo.»
Possamos nós então conseguir tornar a nossa alma mais transparente à Divindade e mais capaz de a ver e a amar com persistência ou fidelidade, e logo acolhê-La viva no coração do coração, como Fiéis do Amor.

sexta-feira, 18 de outubro de 2019

De la Méditation. Lecture commentée du VI chapitre du livre "De L' Ame à l'Esprit", de Pedro Teixeira da Mota.


Lecture, en français, avec des commentaires du VI chapitre , De la Méditation, de mon dernier livre Da Alma ao Espírito, De l'Âme à l'Esprit, publiée aux Publicações Maitreya, em 2015.
C'est une acessible aproximation à la méditation, ressentie, pensé et dite dans le moment (avec mes limitations dans la langue française), mais certainement sur un subjet qu'on pourrait parler, pratiquer et dialoguer des heures et des années sans qu'on aurait ouverte toutes les portes et visions que peuvent faciliter ou développer sa compréhension et pratique.
Je souhaite que les 30 minutes de l'enregistrement, dans le matin de 18-X-2019,  vous fortifient et inspirent un peu plus dans la connaisance de l'âme et dans les pratiques de méditation, de façon que votre vie soit plus harmonieuse et épanouie, vraiement dans le chemin spirituel, en lumiére et amour, vers l' Esprit, vers les Maîtres et esprits lumineux, vers la Divinité....