terça-feira, 22 de março de 2022

Swami Premananda Tirtha, 2ª parte. Os seus ensinamentos provindos de sonhos. Com vídeo de leitura comentada por Pedro Teixeira da Mota

Voltemos a Swami Premananda Tirtha (1875-1959), em jovem Harideva, para partilhar a leitura comentada, iniciada no 1º vídeo, e que pode ouvir no fim deste texto, e para acrescentarmos mais alguns ensinamentos valiosos deste mestre espiritual indiano quanto ao acto de sonhar e aos misteriosos sonhos...
Como já dissemos no primeiro artigo, Swamiji teve alguns sonhos fortes, e interveio nos de outros, e que lhe ensinaram muito, tendo já mencionado um deles, no qual uma sua discípula recebeu o seu mantra ou fórmula de oração. Ora como as pessoas consciencializam-se pouco de que os sonhos podem ser ecos ou refrações de experiências nos corpo subtis, vou transcrever outros sonhos especiais e elevados e suas lições, na Índia mais naturais pois crença e a consciência dos corpos subtis está ainda hoje generalizada:
Tendo a sua mãe desencarnado, «um mês depois, Harideva sonhou que a sua mãe regressara e estava sentado perto da sua cabeça. Ele abraçou-a  com ambas as mãos
à volta do pescoço e disse-lhe:    "- Mãe, onde esteve este tempo todo? Procurava em toda a parte. E a mãe replicou-me: - Oh, eu nunca estive afastada de ti um segundo que fosse. - Como é possível, mãe, se não a conseguia ver? - Não me viste. Mas olha então agora de novo. Onde é que eu não estou presente? E passou-me a mão sobre os meus olhos três vezes. Então para onde quer que eu olhasse só via a mãe: na tia, no meu irmão, nas árvores, nos muros, etc." O Swami Premananda costumava contar este sonho com grande emoção e como sendo o acidente mais significativo da sua vida. E dizia que desde então tornara-se fácil e natural olhar para todas as mulheres como mães.»
Nessa época teve um outro sonho muito forte que ensinou-o a respeitar as diferentes religiões e tradições espirituais, pois vendo-se a avançar por uma floresta, ouviu ao longe tocarem música devocional e aproximando-se dum conjunto de casas dentro de um muro, o guardião deixou-o entrar. Já dentro do pátio viu outro conjunto e avançou e o guarda também o deixou entrar. Ouvindo uma música ainda mais maravilhosa vinda de um terceiro espaço murado, de novo avançou, e aí viu então «Chaitanya, Shankara, Buda, Maomé, Cristo e vários outros santos sentados juntos a cantarem músicas e poemas devotos. Ao chegar a este ponto a sua memória primordial reviveu. Reconheceram-no e tomaram-no como um  amigo de longa data. Ele inclinou-se diante de Chaitanya, que o abraçou, enquanto ele se perdia em pensamentos. Então Chaitanya perguntou-lhe: "- Em que estás a pensar?" E ele respondeu: "Há tanta luta sectária lá fora, enquanto que aqui tudo parece ser um". Então Chaitanya levou-o mais para dentro e mostrou-lhes como todos eles provinham de uma Luz maravilhosa. E explicou-lhe: - "Na realidade somos todos Um. De acordo com o tempo e a necessidade das pessoas, entramos no mundo sob diferentes aspectos, com ideias várias, para curar as variadas doenças da sociedade, tal como o mesmo médico tratará diferentes doentes e diferentes doenças, em épocas diferentes, com diferentes medicamentos". Swamiji costumava dizer que desde esse dia as dúvidas acerca dos diferentes grupos religiosos e incarnações de Deus tinham sido completamente removidas da sua mente.

A universalidade da religiões, ou a unidade espiritual delas, realizada por Ramakrishna Paramahansa e por Premamanda Tirtha....
Pouco depois, quando ainda só tinha onze anos, viu pela 1ª vez o seu guru ou mestre em sonhos, e recebeu dele um ensinamento e iniciação bem poderosos como narrou assim: sonhava que estava numa floresta sob uma árvore quando três ou quatro sannyasins (peregrinos renunciantes) vieram ter com ele e disseram-lhe: "Vem connosco até aos Himalaias" E pensei, como, tão longe? E eles disseram: "Iremos pelo caminho celestial no firmamento". E durante o caminho foram falando sobre as realidades espirituais. Depois de uma longa distância, descemos num alto monte e os monges disseram-lhe, fica aqui que  vamos ver o nosso mestre e já voltamos. Eu pedi-lhes contudo que me levassem mas não concordaram. Todavia, daí a pouco um deles voltou a correr e disse-me: "Estás com muita sorte, pois o mestre disse para vires." Fiquei muito feliz e parti com ele e fui  logo muito amistosamente recebido pelo mestre que me mandou tomar um banho num ribeiro, e depois disse: "Deus é uma personificação do Amor. O Amor é o nosso principal equipamento, e o mais importante dever do ser humano é servir a humanidade, a nossa vida devendo ser gasta ao serviço das Suas criaturas. Mas quando estiveres a servir, não penses que estás a fazer um favor a alguém. Pensa sempre que a oportunidade de servir é um meio de purificares a tua mente e de realizares a Divindade omnipresente. E portanto está grato a quem serves. O Deus Vishnu rege ele próprio este mundo, depois de assumir a forma dos seres vivos". Em seguida o mestre deu-me um mantra de religação  à Divindade omnipresente nas formas do Universo, e disse-me para repeti-lo diariamente e explicou como o deveria praticar. Abracei então o Gurudeva e fiquei num estado de grandessíssima felicidade. Quando acordei vi que estava abraçado à almofada e esta estava molhada das lágrimas».

Os Himalaias vistos espiritualmente pelo pintor e mestre alemão Bô Yin Râ....

Swami Premananda Tirtha só o tornaria a ver, passados dezassete anos, ao vivo nos Himalaias, passando alguns dias de grande felicidade com ele, e à despedida, à questão quando é que se tornariam a ver, o mestre respondeu-lhe:«Isso serei eu a decidir um dia, mas estarei sempre contigo, onde quer que, ou quando, precisares de auxílio. Eu ajudar-te-ei nos sonhos e no teu trabalho», e assim desde então «sempre que tinha um problema ou dificuldade, este mestre ou santo aparecia-lhe em sonhos e sugeria-lhe a orientação necessária. Uma lâmpada é acessa por outra lâmpada. [Princípio da iniciação directa, muito visível por exemplo na vida de Dara Shikoh, como já relatei]  Esta tradição [iniciática] vem-se mantendo ao longo de tempos imemoriais. Também Swamiji Premananda Tirtha frequentemente dava as instruções necessárias aos seus devotos em sonhos e conhecem-se muitos casos disse. Ele costumava dizer:"Quanto mais pura e tranquila for a tua mente, mais fácil será para ti veres-me em sonhos. Tenta ser um bom receptor. Se alguém não está preparado para receber, a mensagem volta para trás"»

Fiquemos ainda com um ensinamento valioso, já não só do mundo dos sonhos, escrito na montanhosa de cidade Darjeeling onde também peregrinei, dado em 11.4.1925:
«Sabeis quem é o meu Deus? É aquele sem o qual não estamos
verdadeiramente vivos. É a fonte primordial de toda a Existência, Conhecimento e Felicidade (Sat Chit Ananda). O mundo é a manifestação do seu jogo (lila). O ser humano é a sua imagem viva. Se o conhecemos, então não há nada mais para ser conhecido; se o encontramos, não há nada mais para ser encontrado. É um pouco da sua palete de beleza que faz  os céus, as árvores, as aves, os mares parecerem tão belos. É pelo Seu Amor (Prema) que pai e mãe marido e mulher, filho e filha nos são tão queridos. Foi um pouco do Seu conhecimento que tornou Buda, Shankara, Newton, Sócrates e outros sábios. Ele é o nosso Eu mais íntimo...
Sabeis o que é que eu considero ser a melhora prática espiritual (sadhana), o
mais fácil e mais natural método de atingir a perfeição ou realizar Deus? É esforçar-nos por mantermos as portas internas do coração abertas. Ele então esforçar-se-á por iluminá-lo pela refulgência do seu Amor. Quando os esforços de ambos os lados se completam, descobre-se que as tristezas e sofrimentos desaparecem. Tudo é mais doce e alegre.»
Saibamos mergulhar mais no íntimo, viver justa e harmoniosamen
te e receber e partilhar as energias luminosas, amorosas e pacíficas que tão necessárias são à Humanidade... Aum Shanti Aum...

                      

segunda-feira, 21 de março de 2022

Swami Premananda Tirtha, ensinamentos de um mestre indiano bem valioso. 1ª parte. Com vídeo de leitura comentada por Pedro Teixeira da Mota.

Um dos mestres bem valiosos do século XX da Índia foi (e é...)  Swami Premananda Tirtha, que viveu na zona da Bengala, Batajore, Calcutta e Benares ou Varanasi, de 1871 a 1959. Pouco conhecido no Ocidente, pois era avesso a publicidade e procurou mais servir do que servir-se, ou destacar-se, apenas deixou serem publicadas as suas cartas a discípulos, que constituem mais um rico epistolário da Humanidade, tal como os de Erasmo de Roterdão e de Antero de Quental, valiosa prática que hoje não é tão cultivada dado o predomínio avassalador dos mails, que  perdem a naturalidade e intimidade que a escrita pela mão deposita no papel...
Tendo nascido de pais religiosos e educado tradicionalmente na grande Índia, cheia de costumes, ensinamentos, histórias e santos, a sua excelente memória permitiu-lhe não só conservar e narrar inúmeros episódios pessoais, como partilhar muito do essencial da sabedoria indiana que ele vivia e estudava, aprofundava e partilhava no seu ashram ou centro de ensino e serviço, meditação e adoração...
Nasceu a 26 de Novembro de 1871, em Batajore, Bengala Oriental, hoje Bangladesh, filho de um brâmane, que ensinava em casa, e de uma mãe muito piedosa, e recebeu o nome Harideva. Uma vida de criança e jovem cheia de aprendizagens luminosas e uma clara vocação para ser um asceta, um sannyasin, e que os seus pais desejavam. E assim mal  cumpriu o último exame do seu bacharelato, em Calcutta, em 1899, parte com três livros na sacola, a Bhagavad Gita, Ashtavakra Gita e Imitação de Cristo, e torna-se por si mesmo um renunciante, despindo as suas roupas junto ao rio Ganges, banhando-se e assumindo as vestes ocre-laranjas e, com o nome de Krishnananda, dirigiu-se
como qualquer sadhu, ou peregrino renunciante, para Vrindaban, centro do culto a Krishna  e depois para os míticos e poderosos Himalaias, onde encontrou  finalmente o seu mestre que já o vira em jovem, em sonho, há dezassete anos.
É dessa época, 1901, a sua primeira carta conhecida, onde diz: «A alma mais íntima do Universo, isto é Sat Chit Ananda (Ser, Consciência, Felicidade) da Divindade universal, tendo penetrado todos os níveis da Natureza, está tentando manifestar-se a si mesma. Quando mais limpa for a mente, tanto maior e mais limpa será a sua reflexão. O objectivo da vida humana é descobrir e manifestar Deus dentro de si». 
Poucos anos depois em 1904 foi formalmente iniciado  como sannyasin em Varanasi ou Kashi, no mosteiro de Kamrup, pelo swami Ramananda Tirtha e residiu nesse math ou tirtha, ou mosteiro, doze anos servindo com muito amor, e para grande gosto do mestre, e tendo sido mesmo o editor da revista Bharat Dharma Mahamandal.  Ao longo da sua vida teve inúmeros casos, sincronias e exemplos fabulosos de que tudo vem de Deus, ou como disse: «Há um só corpo, um só princípio de vida, um corpo e um espírito em todo o universo. Se a mente está pura e calma, é fácil discernir os pensamentos dos outros».
Só o conhecendo pela leitura de um livro, Swami Premananda Tirtha, Life, Sketch & Letters, Sri Krishna Sangha, Calcutta, 1973, que adquiri quando estive em Calcutta seis meses em 1993, e por subtil percepção espiritual posterior, irei destacar certos aspectos mais originais ou fortes: 
Uma grande confiança e entrega a Deus, que em todas as circunstâncias não o abandonara, pois somos todos filhos de Deus, que está dentro de nós, e é verdadeiramente a nossa força.
Valorização grande da Mãe, do princípio feminino e maternal, muito sagrado, e embora tenha sido um celibatário, naturalmente já que era um yogi e sannyasin, aconselhou muitos a deixarem de ser religiosos ou estouvados e a casarem-se, e sentirem na mulher essa dimensão divina.
Grande consciência da presença Divina em todo o universo e em todos os seres e portanto servindo com amor o próximo, vendo e sentindo nele Deus ou a unidade divina que perpassa todos os seres, e fazendo-o nas condições mais difíceis.
Valorização da verdade e da sinceridade. "A minha palavra é sagrada", costumava dizer, e assim cumpria o que prometia mesmo sob as maiores dificuldades.
Valorização dos sonhos como meios de comunicação entre os seres, incarnados e desencarnados, chegando a dar-se conta dos sonhos dos outros, ou a receber e dar indicações importantes, seja o de ter visto pela 1ª vez o seu mestre em sonho, ou o de ter dito à discípula principal, Maji, que receberia o mantra de iniciação, que ela tanto desejava dele,  em sonho directamente da Divindade, o que se veio a passar, como ambos comprovaram posteriormente ao confrontarem o mantra recebido.
Valorização do desprendimento, do desapego, da renúncia às posses, e ao sentido do ego ou de ser importante: "Se alguma vez pensar que sou superior, então terei caído muito espiritualmente."
Valorização das práticas tradicionais de interiorização para quem quer conhecer ou entrar mais em contacto com Deus ou a com a sua energia, tal como ele escolheu ou recebeu no seu nome: Prem Ananda, isto é, Amor e Felicidade ou Alegria ou Beatitude. Entre essas práticas apontava o controle dos sentidos, da mente e dos sentimentos, recomendando, por exemplo, um kriya yoga, ou acto unitivo interior, de retirar a atenção para as costas, para o interior da coluna vertebral e para o canal subtil, chamado sushsuma, de modo a que a energia, dispersada sensorialmente e mentalmente para o exterior, possa aquietar-se e sensibilizar-se aos níveis subtis e espirituais, e sentir o néctar ou a serenidade feliz de Sat Chi Ananda.
 Swami Premananda Tirtha deixou o seu corpo físico terreno em 2 de Maio de 1959, no seu ashram e tendo anunciado isso um pouco antes na sua última mensagem, na qual dá um testemunho da sua continuidade espiritual, tal como poderá ouvir no vídeo que partilho em seguida, com a duração de treze minutos, terminados a meio de uma leitura e que finalizei depois num segundo vídeo, de sete minutos, também já no youtube, e o qual incluirei num segundo artigo... Aum...
                

sexta-feira, 18 de março de 2022

Dulce bellum inexpertis. A guerra só é doce para quem não a experimentou. Adágio comentado de Erasmo. Tradução do latim por Pedro Teixeira da Mota.

 Erasmo (1466-1536) foi sem dúvida uma das grandes almas e vozes do Renascimento europeu, e durante alguns anos, no começo do século XVI, mesmo o mais escutado e admirado dos humanistas pela sua grande sabedoria e mestria, amigo do nosso Damião de Goes que foi até Friburg para com ele aprender e confabular. As suas obras mais imortalizadas são certamente o Elogio da Loucura, os Colóquios e os Adágios, onde a sabedoria e erudição e a crítica bem irónica dos costumes e crenças do seu tempo brilham imorredoiramente, pesem as censuras, ataques e proibições que sofreram. Ao ter sido obrigado pelos tutores, por morte do pai, a tornar-se um clérigo, muito do seu labor foi dedicado à religião cristã e a uma purificação e retorno às fontes documentais autênticas e ao cristianismo original, para isso contribuindo com uma nova versão do Novo Testamento, com o  Manual do Cavaleiro cristão, o Modo de Orar a Deus (que traduzi com Álvaro Pereira Mendes, e comentei) e com as numerosas  edições críticas pioneiras dos primeiras padres da Igreja, traduzindo do grego para latim, então a língua franca europeia, por exemplo, Orígenes e Clemente de Alexandria. 

   Frontispício da edição aldina de 1508, constitucional e evocadoramente um Graal..

A recolha comentada dos Adágios ou Provérbios, a que chamou um depósito de Minerva, a Deusa da Sabedoria, teve sucessivas impressões, tendo começado em Paris em 1500, a Collectanea Adagiorum, com 808, crescendo, após e graças à sua estadia em Itália de 1506 a 1508  na oficina e sodalidade do impressor e humanista Aldo Manuzio, para os 3.000, saindo então nos seus prelos venezianos a Adagiorum chiliades tres, reproduzida ao alto E por fim chega aos 4.151 adágios na edição final de 1533, de Basileia, no seu amigo Froben, Adagiorum chiliades quator cum..., Quatro Milhares de Adágios...
Entre eles, alguns foram crescendo na profundidade e tamanho do
comentário ou glosa, que já não era só filológico e literário mas bastante  moral, irónico, político e espiritual, e como nos tempos da sua vida alternaram ora dissensões e guerras ora concórdia e grandes esperanças de uma paz geral (sob a égide da República das Letras e dos soberanos abertos a ela), um adágio destacou-se: o famoso Dulce Bellum inexpertis, a Guerra só é doce para quem a desconhece, que chegou mesmo a ser editado autonomamente, sob o título Bellum, Guerra.  E como as lutas entre o papado, os reis, os estados cristãos e os turcos fendiam de tal modo tumultuosamente a sua época, sob a mesma temática dará a luz  a sentida Lamentação da Paz, Querela Pacis, em 1517 (ano em que se escusou a acompanhar o imperador Carlos V a Espanha), a qual teve também grande sucesso, nomeadamente em Espanha, bastante erasmista na época, com duas edições logo em 1520 e 1529, como o historiou nos nossos dias magistralmente Marcel Bataillon, grande amigo do nosso notável erasmiano e moreano José V. de Pina Martins.
Resolvi então eu traduzir, bem laboriosamente, do latim de uma edição quinhentista, e cotejando com a tradução espanhola de Lorenzo Riber (na Aguilar, 1964) o começo do longo comentário do Adágio,
pois vive-se hoje na Europa um conflito importante, que tem agitado e dividido bastante a opinião pública, pesem os mass media seguirem na sua generalidade uma narrativa oficial que sabemos nunca corresponder aos factos mas que influencia muito as populações e as suas almas e ânimos, levando-as frequentemente a comportamento e pensamentos pouco verdadeiros e nada adequados à serenidade e imparcialidade de observação e julgamento.  Possam estas palavras e imagens, ideias e conhecimentos sábios e belos do perene Erasmo, desde o "beijo que une as almas" à "centalhazinha divina", tocarem algumas pessoas e contribuírem para o auto-conhecimento e o discernimento e para uma maior aplicação e vivência da verdade, da justiça e da paz...

Gravura dada por José V. de Pina Martins. Erasmo abençoando-nos: Sancte Erasme, ora pro nobis.

 Começo do Quarto Milhar dos Adágios de Erasmo, o 4.001...
«Um adágio tão elegante quão celebrado pelos escritores é lcys
apeiro polemos, isto é, dulce bellum inexpertoa guerra é doce para quem não conhece. Isto diz-nos Vegecio  no livro III, cap. XIV, do seu Tratado de Arte Militar: «Não confies muito no noviço que cobiça o prélio, pois a luta só é doce para quem não a provou.»
De Píndaro cita-se: «a guerra é agradável ao que a desconhece, mas
para a quem a experimentou, ela é horrível no seu coração».  Na vida dos mortais há coisas que antes de experimentadas não se consegue discriminar quantos perigos e infortúnio trazem consigo.
"Apetecível para quem não a conhece é o cultivar da amizade
com um poderoso; mas quem a experimentou, teme-a".
É vista como bela e esplêndida a possibilidade de se andar entre
pessoas importantes e discorrer-se sobre os assuntos dos governantes; mas os que conhecem penosamente tal, abstêm-se de beber de tal felicidade. Parece suave amar jovens mulheres, mas só aos que ainda não sentiram quanto de amargo traz [ou pode trazer] o amor consigo.
Por esta norma general poderá medir-se qualquer assunto que ande misturado com muitos perigos e junto a muitos males, já que ninguém o quererá tomar sobre si, a não ser que seja jovem e
inexperiente.
A propósito de isto, Aristóteles, na sua Retórica, adverte quanto à
razão da juventude ser mais audaz e a velhice mais tímida: porque naqueles a inexperiência gera confiança e nestes o conhecimento pessoal de muitos males causa timidez e inações. Pelo que se há algo nas coisas mortais que importa fugir por todos os modos, evitar pela oração e afastá-lo é sem dúvida a guerra, que é a coisa mais ímpia, a mais largamente perniciosa, mais pegajosamente tenaz, mais tétrica, e mais indigna do ser humano, para não dizer cristão.
E contudo é incrível como hoje até que ponto e com que temeridade
e quanto por qualquer causa fútil se declara a guerra e com quão feroz bestialidade e barbárie se a leva para a frente, não tanto pelos não cristãos como pelos cristãos; e algo não só pela gente profana, mas por sacerdotes e bispos; e já não só por jovens e inexperientes, mas verdadeiramente até por anciões plenamente experientes; e não exclusivamente por plebeus e de natureza vulgar mas por príncipes ou governantes cujo ofício era compor com a prudência e a razão os os costumes temerários e estultos das massas. E não faltam jurisconsultos [ou homens públicos] e teólogos [ou pensadores] que a esta actividade tão nefasta ainda juntam lume e pingos de água fria.
Resulta de todos estes antecedentes que nos nossos dias a guerra é
algo tão aceite e corrente que as pessoas admiram-se que haja quem não a aprecie; é em geral tão aprovada, que se tem por impiedade e, estou pronto a dizer, por heresia, reprovar-se uma coisa, a mais celerada e miserável de todas.
Quão mais justo fora interrogar-nos que mau génio, que peste, que
intempérie, que fúria foi a primeira a pôr na mente dos homens uma animosidade tão selvagem, que impulsionará a uma criatura tão plácida, gerada para a paz e a benevolência, a única dada à luz para a salvação, a precipitar-se com feroz vesânia, com tão insanos tumultos, à destruição mútua!
                                                   
                                               Início do adágio do 4001 numa edição antiga.
E tanto maior será o assombro de quem, afastando a sua atenção das opiniões aceites pelas pessoas normalizadas, e a dirige para apreciar a força e natureza das coisas, e contempla,  por um momento separadamente, a imagem do ser humano por um lado, e por outro o 
simulacro da guerra, com olhos de verdadeiro filósofo.
Ora ao considerar-se em primeiro lugar a figura e o corpo humano,
por acaso  não se compreenderá logo que a Natureza, ou antes Deus, gerou este ser animado não para a guerra mas  para amizade; não para a destruição mas salvação, não para a injúria mas a beneficiência? Enquanto que cada um dos outros seres animados está provido de armas, tal o ímpeto do touro armado de cornos, a raiva do leão com unhas-garras...»
[Seguem-se uma série linhas de exemplos de como os animais tem consigo as suas próp
rias armas, tais como cornos, unhas, venenos, etc...]
                                           
                                Nosso querido amigo na sodalidade da cavalaria do Amor sábio.
«Só ao ser humano produziu-o nu, frágil, terno, sem defesas, de carne flexível e pele delicada. N
ão se pode ver nos seus membros algo que tenha sido dado para a luta ou violência, para não mencionar  entretanto que, na generalidade, os outros desde que nascem, bastam-se a si mesmos para cuidarem da vida, só o ser humano sendo produzido de modo a que por muito tempo dependa do subsídio ou apoio  alheio. Não sabe falar nem andar nem captar alimento; implora auxílio apenas com vagidos. De tudo isto pode-se facilmente deduzir que é o único ser animado nascido plenamente para a amizade e que, por serviços mútuos, se une e adquire coerência social. Por onde, a Natureza quis que fosse aceite o dom da vida, não tanto para o seu próprio bem como para o dos outros e que estivesse bem ciente de que fora dedicado as graças [ou musas], à compreensão de si e às relações necessárias.

As três Graças, numa sanguínea de Rafael.

Deu-lhe uma aparência não tétrica nem horrenda, como aos outros, mas suave e plácida, para manifestar sinais de amor e de benevolência. Deu-lhe olhos amigáveis, e nestes sinais da alma. Deu-lhe braços generosos para abraçar. Deu-lhe o sentido do beijo, para que deste modo se juntem e se relacionem sexualmente as almas.
                                              
Abraço de todo o ser, beijo de união. Em Hypnerotomachia Polifilo, de Colona.
Só a ele atribui o riso, indício de alegria; e a ele só deu as lágrimas, símbolo da misericórdia
e da clemência. E deu-lhe a voz, nem ameaçadora nem horrenda, como às feras, mas sim amiga e branda.
E não contentando-se com isso a Natureza só a ele atribui uso da
palavra  e razão, ambas as coisas muito importantes para se ganhar e alimentar a benevolência, para que nada se faça à força entre os homens. Inseriu a repulsão  da solidão e o amor da sodalidade [ou companhia amiga], e introduziu interiormente a semente da benevolência. Fez com que o mais salutar fosse também suavíssimo. Que coisa mais agradável que um amigo, e igualmente  mais necessária? Portanto se fosse possível viver comodamente a vida sem comércio mutuo,  nada pareceria agradável sem companhia, a não ser que  alguém abandonasse completamente a sua humanidade e degenerasse em fera.
Juntou ainda mais o estudo das disciplinas liberais e a aspiração
ardente ao conhecimento; algo que assim como afasta poderosamente o engenho humano de toda a ferocidade assim também tem força especial para conciliar as necessidades. Pelo que  nem afinidade nem o parentesco carnal une os ânimos com vínculos de amizade mais apertados e firmes como a sociedade [sodalidade, grupo, fraternidade] de estudos  honrados. E acima disto distribui uma admirável variedade de dotes entre os mortais, assim das almas como dos corpos, de tal modo que cada um deles encontra as qualidades que amassem ou admirassem por sua excelência ou que por sua utilidade e necessidade ambicionassem e abraçassem. 

A centelhazinha divina em nós, em Bô Yin Râ.

Finalmente deu uma centelhazinha [ou estrelinha] do espírito [mens] divino para que sem a ostentação de  prémio, mas por si mesmo ajudassem ao bem de todos. Na verdade isto é sumamente natural de Deus, no seu olhar pelo bem do universo.
Por outra parte, que volúpia é aquela que o nosso ânimo sente de
modo algum vulgar quando percebemos que alguém foi salvo por nós? E por isso mesmo um ser é caro ou querido por outro ser, por estar-lhe obrigado por algum insigne benefício.
Pelo que Deus neste mundo constitui o ser humano como uma certa
imagem [ou simulacro] de Si mesmo, para que,  tal como uma divindade [numem] terrena, propiciasse a salvação de todos.
Sentem isto também até os animais, tal como vemos que não só os
mansos mas também os leopardos e os leões e outras ainda mais ferozes, nos grandes perigos refugiam-se sob poder [opem] do ser humano. Este é o santuário extremo de todos; este altar é santíssimo
no universo, esta âncora para ninguém não é sagrada.
Pintamos em certa grau a 
efígie do ser humano. Agora, o simulacro adverso da guerra, tal como é visto, componhamo-lo...»
                                 
E continuava Erasmo com as suas belas e sacras mãos a escrever... Ficará talvez para outro tradutor, mais conhecedor e familiar do latim, e logo com necessidade de menos utilização do nosso tão limitado e precioso tempo na
Terra...
Tradução feita em algumas horas dos dias 16, 17 e 18 de Março,
quando além das guerras surdas que os Ocidentais sustentavam no Oriente, uma mais intensa ou cirúrgica se realiza no coração da Europa e para a qual desejamos sincera e ardentemente que rapidamente se chegue ao consenso que evitará mais mortos, destruições e sofrimentos. Para tal oro ou rezo que contribuam  estas palavras sábias, por vezes tão elucidativas e frescas, contendo as forças anímicas de Erasmo e da sabedoria Divina que ele realizou, sem dúvida um dos mestres da Europa humanista, hoje em grande parte subsistindo no intelecto, ou vá lá nas almas, de apenas alguns milhares de seres, nesta União Europeia dirigida de modos demasiados cinzenta, ineptos, conflituosos e pouco humanistas, mas que ainda assim se encontra sob a égide subtil da República das Letras, Corpo místico da Humanidade ou Satsanga, onde Erasmo, com outros grandes seres, mestres e espíritos celestiais, continuam a inspirar-nos, se a tal aspirarmos e querermos...

quinta-feira, 17 de março de 2022

Amizades e conflitos. Guerras distantes e próximas. Da manipulação e dilaceramento actual. Dialogar e pacificar....

Nestes tempos em que tantas amizades perdem a sua coesão e se esfiapam, parecendo perdidas as razões de ser, até então válidas e sobretudo suficientes para manterem um statu quo sem atritos...

Nestes tempos em que mesmo pessoas amigas de longa data se surpreendem em campos opostos e ora conseguem dialogar e fazer luz, raro, ou se afastam ou silenciam para não terem de discutir demasiado...

                    

Nestes tempos em que mesmo amizades familiares enfraquecem ou mesmo fenecem, caindo por terra o à vontade, a franqueza e o amor que tinham raízes sanguíneas centenárias, milenárias mesmo...

Nestes tempos em que tantas pessoas conhecidas, nomeadamente nas redes sociais, se digladiam ou mesmo repudiam mutuamente, e mais ou menos, na circunstancialidade em que estão envolvidas, justificadamente...

Nestes tempos de insultos soezes e ordinários, com transbordamentos do diabólico ódio e até incitamentos à morte, e que nos desvendam o que ia e vai dentro de cada um...

Nestes tempos de raríssimos seres de grande desprendimento e em que quase todos, ao tomarmos partidos por actos, sentimentos pensamentos, palavras ou escritos, entramos em lutas e afectivamente desiludimos ou desiludimo-nos, ou mesmo fazemos sofrer e sofremos...

Nestes tempos de progressivo isolamento dos mais lúcidos face a tantos outros, aos media, aos partidos, aos Estados, aos grupos de pressão da nova Ordem mundial, subsistindo apenas aqui e acolá alguns núcleos de almas, famílias, grupos, satsangas, comunidades e zonas mais afins e luminosamente coesas, algo que devemos sempre demandar ou perseverar...

Resumindo e concluindo, nestes tempos de tanta manipulação e opressão, corrupção e violência, só podemos desejar e querer que as pessoas se mantenham íntegras e serenas, alinhando-se verticalmente, e não se deixem expor, influenciar e subjugar tanto pelos media, os meios de informação tão vendidos e alinhados com quem lhes paga, assim partidários fanaticamente e desinformantemente aumentando a ignorância e o medo, os ódios e as doenças...

Assim, nestes tempos de tanta morte e sofrimento,  só podemos desejar que terminem os vírus e as medidas sanitárias opressivas,   embora saibamos que não será tão rápido pois, aberta, seja por quem foi - se a Natureza, se um laboratório de guerra biológica - a caixinha da Pandora viral e depois a vacinal, com os biliões de lucros das farmacêuticas, ela não se fechará tão facilmente, pelo que teremos de aprender a sobreviver com modos de vida mais biológicos, alternativos, prudentes, sábios,amorosos e espirituais....

Nestes tempos em que, para além dos múltiplos conflitos em África e no Médio Oriente, tal a Síria, a Palestina e o Yemen, tão ocultados e manipulados nos noticiários e artigos dos media ocidentais,  desabrochou menos larvarmente o confronto entre a Rússia e a Ucrânia, entre o Ocidente norte-americanizado e a Rússia, no qual muito e tanto está ainda em aberto, com os mais fanáticos, e os gananciosos dos armamentos, desejando a 3ª grande Guerra, só podemos agir, meditar e orar para que rapidamente diálogos e negociações obtenham o consenso justo e necessário e assim findem as mortes, sofrimentos e destruições...


Pelo que, nestes tempos dilacerantes que correm, só podemos orar pedindo as bênçãos do Alto e do Divindade para a Humanidade e sobretudo para todos os que procuram viver na luz, na sabedoria, justiça, amor e paz, de modo a que os mais sub-animais, insensíveis e extremistas, capazes de crueldade e ódio, sejam enfraquecidos, vencidos e reeducados...

Nestes tempos de tantos conflitos e divisões, guerras e separações, aspiremos e oremos para que muitos seres possam encontrar de novo as suas terras e lares, as suas almas amigas ou afins, as suas famílias, os seus grupos e com eles, e em interdependência fraterna mundial, gerar mais paz, beleza, prosperidade, sabedoria, arte e amor para a Humanidade e o Planeta...

domingo, 13 de março de 2022

Luzes e sombras, dos desejos e aspirações à estrela. Fotografias por Pedro Teixeira da Mota. Manhã de 13.III.2022.

A Luz solar é tão multidimensional, tão divina...

    

Nas manhãs de cada dia, os raios do Sol entram pelas casas a dentro e deixam, sugerem e inspiram mensagens
para as almas que as sabem acolher com o coração aberto...
O alimento de cada dia solarizado nos é dado...
A maçã vermelha dos nossos desejos e aspirações pode dourar-se aos raios do Sol Divino da Verdade e do Amor, até a estrela do Espírito despontar e a paz se irradiar...
Os encontros e uniões transfigurantes e imortalizantes...
Sejamos as estrelas (jivatman), de Luz e de Amor, emanadas da Divindade...
Lux   Pax

terça-feira, 8 de março de 2022

Dos conflitos que dividem e dilaceram as pessoas e sociedades. Com um sábio poema ( ای بیخ) de Hafez Shirazi em vídeo.

Estes dois últimos conflitos que tomaram conta das almas humanas e as dividiram, e fizeram mesmo enfrentar-se ou até sub-animalizar-se, o Covid  e suas políticas sanitárias e a luta da Rússia contra a Ucrânia e o Ocidente, indicarão que os factores ideológicos são nas pessoas bem mais importantes que pensámos, já que separam pessoas, amizades e famílias, umas erguendo-se contra as outras, e não discutindo já apenas a bola, os partidos e o preço certo, ou será que deparamos antes posicionamentos fundamentalmente emocionais, em grande parte manipulados pelos "media" e arregimentados, sem haver nas almas verdadeiro discernimento do que está por dentro e detrás de tais acontecimentos e actores, ou o que está em causa nas encruzilhadas e qual é a melhor ou mais justa via, pois tal como Fernando Pessoa dizia no final da Mensagem:  «Ninguém sabe que coisa quer. Ninguém conhece que alma tem, Nem o que é mal nem o que é bem?»?

O Y pitagórico, discernir e intuir bem o caminho. Não sermos marionetas, mas antes seres do caminho do meio. Já com outro artigo no blogue, o bívio ou Y.

Quatro vantagens ou aspectos positivos vejo nestes conflitos, apesar dos muitos trágicos sofrimentos e escombros. Primeiro, caminharmos para sociedades mais justas e sóbrias e para o fim duma ordem internacional demasiado unilateralmente dirigida pelos que detêm o dólar norte-americano e manipulam pelos media em grande parte o mundo. Segundo, aceitar o dilacerar de antigas amizades ou, vamos lá, aparentes conhecimentos tidos como aceitáveis, pois ficamos a ver os outros sob aspectos que apenas suspeitávamos ou nem sequer, e portanto ficamos com mais discernimento quanto ao que eles são ou valem em certos aspectos. Terceiro, é  que reduzem a nossa convivialidade dialogante, nomeadamente se queremos evitar discussões e conflitos desnecessários. E assim tanto vamos eliminando de seguir no Facebook pessoas, e haverá quem as remova, para que já não nos incomodem ou os incomodemos na página inicial, como também deixamos praticamente de falar ao telefone,  para  não termos que discutir, criar sofrimento e desilusão nos outros, ou ouvir então insultos soezes e ordinários a quem quer que seja. Deste modo libertamo-nos de exacerbar tolices e teimosias, lutas e ódios que só densificam o labiríntico ou pantanoso astral do mal na humanidade, ao serem amplificados, esperando que o bom senso e o amadurecimento pelo sofrimento tornem as pessoas mais sábias, fraternas e menos sujeitas a tantas fobias desgraçantes...

O astral labiríntico que atrai e prende as almas, numa pintura de Bô Yin Râ.
A quarta vantagem, com duas vertentes, é podermos termos mais tempo para irmos trabalhando e dançando, lendo e escrevendo, aprofundando e ouvindo o que mais gostamos e bem faz ao mundo, seja por exemplo, como está no vídeo final, as belas vozes da cultura poética iraniana, mesmo sem as percebermos  senão pela tradução, no caso um iluminante poema de Hafiz de Shiraz, e a esta sua cidade natal e de libertação fui eu peregrinar e conferenciar há uns anos, e por isso talvez mais a rosa da cavalaria do Amor no meu coração brilhe, abrindo-me mais a valorizar, e entramos na segunda vertente, da escarpada subida à montanha de Meru, Albornoz ou Himavat,  certamente muito importante, a relação polar, nomeadamente quando com uma ou outra alma mais afim, subtil, valiosa dialogamos ou mesmo vivemos, comungando do Graal  ou Jam-e Jam da gnose, do amor e da realização e assim peregrinando juntos às caravanserai do mundo espiritual e divino....  
Possa  da lama de tanto ódio e violência, insensibilidade e arrogância, a flor de lótus do Amor despontar em mais seres e uma paz mais verdadeira, divina mesma, permear-nos a todos...

Dara Shikoh (20-III-1615 a 30-VIII-1659)e sua alma polar Nadira Banu Begum (14-X-1618 a 6-VI-1659), mártires no caminho do Espírito... Mil pétalas do lótus da Divindade em vós e unindo-nos...

Oiçamos então Hafiz, de Shiraz, terra natal de outro mestre da  religião do Amor persa ou iraniana, Saadi (e ambos apreciados por Antero de Quental e Fernando Pessoa), com uma poema de grande sabedoria e belas imagens, que nos falam do Caminho do aperfeiçoamento e da humildade, da libertação dos desejos e da realização do amor e luz Divina. E possa "a Luz fulgurante da Verdade chegar ao nosso coração", tal como ele ora ou reza poetizando...

                         

sábado, 5 de março de 2022

Acerca da Oração nestes tempos do ano do Tigre. Com texto de Bô Yin Râ e música do Dead Can Dance - Sanvean.

Pintura de Bô Yin Râ, na queda d'água de Cela Cavalos, Gerês.

Nestes tempos em que estamos tão envoltos por conflitos externos, mais do que nunca se torna necessário trabalhamos por preservar a alma lúcida e luminosa não a deixando ao alcance perturbante de qualquer acontecimento ou imagem, político, comentador ou pessoa pronta a distorcer o discernimento calmo da verdade, e a nossa capacidade para sermos fiéis do Amor e, para tal, a oração, a meditação, a contemplação, o diálogo sereno, o canto, a dança sagrada, o banho consciente e a comunhão profunda com a natureza ou com alguém são meios fundamentais de recriarmos a harmonia em nós, pois tanta força, impacto, impressão, palavra ou intenção negativas que entram ou tentam afectar a nossa psique ou alma obrigam-nos constantemente a limpar-nos, purificar-nos, alinhar-nos, recarregar-nos.
Salientarei hoje e agora apenas a oração, uma prática que todos
aprendemos desde crianças numa ou outra oração que em geral ainda sabemos de cor e que, se pronunciada conscientemente e sentidamente no nosso interior, vai-nos tornando capazes de verdadeiramente acalmar, interiorizar, orar e logo descobrir-nos enquanto seres espirituais e podermos estabilizar, operar e irradiar luminosamente pelo Bem, a Luz e o Amor no Universo e no planeta.
O ensinamento que junto ou acrescento agora é de um dos mestres
mais valiosos dos últimos séculos XX, Bô Yin Râ, do seu livro A Oração, que brevemente espero publicar na tradução a que laboriosamente cheguei,  onde no capítulo quarto, depois de nos anteriores ter explicado o que significam os princípios da oração transmitidos por Jesus: "procurar e encontrar, pedir e receber, bater e ser aberto", e como se enganam os que pensam que falam com Deus, um deus da sua imaginação, diz-nos: 

«O ser humano que “ora” então da maneira certa, tal como deve pedir-se, - atingirá uma verdadeira renovação espiritual, e esta renovação é necessária sempre que a vida exterior entorpece insensibilizantemente os sentidos da alma. -
A “renovação espiritual” não reside portanto num renovamento da centelha viva espiritual do ser humano, mas numa renovação da receptividade da alma a todos influxos que, emanando do mundo do Espírito puro, podem e querem atingi-la pelas “antenas” do núcleo da sua essência espiritual. -»
Meditarmos na diferença entre a alma e o espírito é bem importante e compreendermos que na oração profunda, que certamente pode passar antes por uma certa confissão humilde e logo de abertura às bênção do alto, as forças anímicas são renovadas e fortificadas pelo influxo que a centelha vital consegue então receber do mundo espiritual, com os seus guias, mestres e anjos, e do mundo e ser Divino e primordial...
Segue-se o original alemão do extracto de Bô Yin Râ e uma tradução inglesa deste importante  ensinamento...


Ein Wichtig Lehre...
Vom "Das Gebet": «Der Mensch, der dann auf rechte Weise also
"betet" wie gebetet werden muß, wird wahrlich geistige Erneuerung erlangen, und diese Erneuerung ist immerfort wieder vonnöten, wenn das Außenleben die Fühler der Seele taub geschlagen hat. –

"Geistige Erneuerung" ist aber nicht etwa eine Erneuerung des geistigen Lebensfunkens im Menschen, sondern Erneuerung der Aufnahmefähigkeit der Seele für alle Einflüsse, die sie aus dem Reiche des reinen Geistes,über die "Antenne" ihres eigenen geistigen Wesenskernes, erreichen können und erreichen wollen. –»
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«The person who then ‘prays’ in the right way, as the prayer should be prayed, will truly attain spiritual renewal, and this renewal is always necessary again whenever external life has insensibilized the soul’s antenns. –
But "spiritual renewal" is surely not a renewal of the spiritual spark of life in the human being, but renewal of the receptivity of the soul to all influences which can and want to reach it from the realm of pure spirit, via the "antenns" of its own spiritual core of Being. –»