domingo, 10 de dezembro de 2023

Das práticas espirituais: a repetição sentida de orações, mantras e seus efeitos. Japa, Ishwara, Aum,

A prece ou oração, com poucas ou muitas palavras, mais ou menos sentida, momentânea ou perseverada, é encontrada em todos os povos e tradições, e uma das que a aprofundou e desenvolveu mais foi a indiana, onde se valorizou bastante Japa, palavra sânscrita que significa repetição dum mantra, ou seja, duma frase, oração ou som sagrado, realizada com sensibilidade e inteligência, e seguindo as indicações dadas em iniciações ou por vezes recolhidas de fontes tradicionais puras, pois proporciona circulações e distribuições energéticas  valiosas, ora com acalmias dispersadoras de negatividade ora com intensificações luminosas conscienciais, do que resulta a harmonização da alma e intuições do que está simbolizado, contido ou relacionado com os mantras ou orações e simultaneamente uma abertura do canal central ou do olho interior para os níveis internos e mundos subtis e espirituais, os quais se podem manifestar por imagens, cores e luz.

A prática humilde da repetição de uma invocação divina, ou de uma afirmação espiritual, ou dum mantra ou som,  das jaculatórias cristãs ou islâmicas, ou as que nós próprios formamos, deve ser perseverada ao longo da vida, pois é uma forma de oração ou meditação simples mas valiosa e eficaz, face ao excesso de informação e manipulação a que a generalidade das pessoas está envolvida ou confrontada, por vezes nem se apercebendo bem de quão alienada do que seria mais importante, ou do que é o mais verdadeiro, ela está. E sabemos como a maioria dos meios de informação funcionam e bem pagos para isso, desinformar, desalmar...

O Japa funciona como um guru, um dispersador de trevas, e por isso ao longo da vida algumas pessoas vão-nos dando ou sugerindo orientações ascensionais, orações ou mantras, ou então por nós próprios sentimos vontade de os pronunciar, de os dedilhar, de reinventar e endereçar, seja para nós seja para outros, ora em voz alta ora em silêncio. E onde se devem evitar os automatismos superficiais que observamos na recitação de mantras na tradição cristã, seja nas ladainhas ou no terço, pois se a devoção  não é bem desenvolvida e se no fim não é seguida ou concluída pelo silêncio interiorizante e revelante, perde-se o mais importante.

Diga-se de passagem que mesmo na Índia, ou nas importações indianas no Ocidente, há também repetições de mantras ou de "cura pelo Om" que são desequilibrantes ou mesmo potencialmente nocivas quando pronunciadas demoradamente em voz alta e em ritmos desarmoniosos, e provindas de instrutores pouco religados espiritual ou divinamente

Se a interiorização-meditação, auxiliada inicialmente pela respiração consciente e com a oração ou mantra e que depois até os dispensa, alcança um aquietar das ondulações mentais, então podem brotar visões interiores  tão rápida e subtilmente que por vezes nem as conseguimos reter na memória mais do que escassos momentos, embora o impacto na aura, na alma e consciência tenha acontecido bem e sido forte. E, ou se escreve e se regista, e daí a importância dum Diário, ou então apenas algumas delas ficarão guardadas na memória, na gaveta ou zona neuronal das experiências espirituais mais fortes.
                                               
Cada pessoa deve dedilhar nomes e orações, frases e mantras e ver quais são as que lhe dizem ou tocam mais, algo que varia em geral com as circunstâncias e o tempo evotutivo na vida. No Ocidente, o Pai Nosso, a Avé Maria, a oração ao Anjo da Guarda, a Oração do Coração hesicasta, ou pequenas jaculatórias ou preces ardentes, sempre foram conhecidas e praticadas pelos mais místicos e com bons resultados, acompanhadas ou não de atenção à respiração, esforço de entrada no coração e por fim de contemplação. 

Na tradução indiana, há muitos mantras e por exemplo, Iswara e Om são duas dessas palavras milenárias mais ricas de significações, sendo basicamente nomes da Divindade, a primeira da Divindade relacionável pessoalmente, o que geralmente sucede mais com Vishnu (e suas avatarizações) e Shiva.  E o Aum ou Om, como o som da primordialidade da Manifestação, algo equivalente "Ao princípio era a Palavra, Logos ou Sermo", e como o a vocalização sonora correspondente e invocadora da Divindade nos três mundos da manifestação: físico, subtil e espiritual, A, U, M, ou então nos três estados de consciência, vigília, sonho e sem sonhos ou sem pensamentos, encaminhando-nos no silêncio final para o 4º estado dito unificado, Turya, supremo, não-dual, eventualmente abrindo-nos à Inominável Divindade da qual os Deuses e Deusas são faces pessoais de acordo com as tradições e devoções.

Ora  vários processos energéticos e psíquicos entram em acção quando meditamos e pronunciamos mais conscientemente tais mantras, orações ou frases, nomeadamente nessa passagem e ascensão do que concebemos e visualizamos, e depois intencionalmente pronunciamos sonoramente, em ritmos próprios, de acordo com as características  que eles têm em si e que cada um tem ou consegue gerar  na orientação  devota e de aspiração, mas que pode ser sempre mais bem direccionada, interiorizada e intensificada, pois tal é sempre o desafio da prática psico-espiritual de auto-realização e aproximação divina.

Assim, por vezes, por entre a repetição consciente e sentida do mantra, um pensamento desconexo dele, ou fora da discursividade natural das associações ao tema-mantra, brota, e podemos admitir que até é um sinal de que a repetição e concentração operou permitindo-nos sair do conhecido e intuir ou ver nos planos da anima mundi. Frequentemente, tais intuições que geramos ou captamos como compreensões, ideias ou frases são inserem-se num fundo, num desenho por vezes colorido ou mais burilado e texturizado. E como brotam dum plano universalizante, seja apenas do nosso mundo interior seja  da Terra-Humanidade, unem facilmente tradições espirituais diferente. Um exemplo: num clarão a cores na fronte, forma-se um desenho em forma de quadrado com a palavra Om, e depois O4enquanto se vê ou lê: "Nem só de ricos vive o Céu", numa paráfrase evangélica. Outras vezes pode ser apenas o Céu, em imagem ou em palavra, e damos exemplos numa linha hermética de religação axial da Terra com o Céu e a que todos somos chamados a contribuir...
Por vezes a sensação pode ser como uma manivela que se faz rodar, e de repente aparece o cliché, o letreiro, com a mensagem, o sinal, tal um calendário automático da mudança do dia,  noutras vezes é apenas a abertura do olho espiritual na sua beleza pluridimensional, com alguma palavra significativa.
Este tipo de visão no olho espiritual quando acontece, e se veem seja um quadrou ou imagem, seja uma palavra, seja sequências de palavras, letras ou números em pequenos letreiros, no olho espiritual,  em geral, embora não se deva procurar tal em quanto fenómeno, gera uma certa admiração e alegria e deveria então intensificar tanto a nossa gratidão e aspiração como a concentração e focalização do olho espiritual para as direcções superiores, espirituais ou divinas em que estaríamos a trabalhar, a meditar e que essa mensagem transmite, para além de a assimilarmos durante o dia, aproveitando a subtil e inquantificável carga energética que nos é transmitida.
Temos de admitir que  pese o decorrer dos séculos e das tradições religiosas e espirituais  bem desenvolvidas por alguns místicos e iniciados,
e sobretudo nas indianas, persas e cristãs, há ainda, pelo menos para a generalidade das pessoas mesmo já mais conscientemente no Caminho do despertar espiritual, bastantes mistérios que nos interpelam no aprofundamento mântrico, orativo e meditativo rumo à realização espiritual e divina, à Verdade, e à Sabedoria que resulta da sua comunhão e vivência, para que haja mais paz e justiça, liberdade e fraternidade num mundo que tem de ser necessariamente multipolar....
                                               

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