sábado, 23 de dezembro de 2017

Ana Pinto e Rogério Paulo da Silva, artistas do belo e do sagrado. Suas obras e um poema a eles oferecido.

A Ana Pinto e o  Rogério Paulo da Silva são um casal luminoso de dois amigos espirituais e artistas, a Ana ainda poetisa (tendo eu mesmo apresentado um dos seus valiosos livros no pessoano Martinho da Arcada),  e lembraram-se de me enviar as boas festas com grande beleza e profundidade.
No anel das graças, à graça recebida, retribui-se com gratidão (neste caso um pequeno texto sobre papel persa) e amplifica-se do Amor Divino a circulação.
Que continuem a gerar e a reflectir beleza, harmonia e amor nas nossas almas, no planeta e no Cosmos... 
 
 

                                     Hércules nos seus trabalhos ou provações que o vão iniciar....
                          AMOR - DIVINDADE - PAZ justa e culta no mundo

sexta-feira, 22 de dezembro de 2017

Fernando Pessoa e os Mestres. A evolução espiritual do poeta e a sua compreensão dos Mestres.

                Fernando Pessoa e os Mestres.  
A aspiração, o interesse e a ligação de Fernando Pessoa aos Mestres, aos seres que se destacaram na realização espiritual e divina, ou no génio e mestria de si próprios e da criatividade, perpassa por toda a sua obra e podemos entendê-la ora como inata, ora como a apreensão da importância deles a partir das suas leituras, conversas e exemplos, ora como a consciência da possível acção subtil deles sobre si mesmo. 
Encontramo-la expressa, desde novo, em contos intitulados O sonho de Buda (em papel do jornalzinho caligráfico Palrador), Mestre, No Jardim (Horto) de Epitecto e, mais tarde, nas comparações entre Jesus e Buda, nos estudos intitulados o Sentido Oculto do Cristianismo e em designações utilizadas, tais como: o meu Mestre Caeiro, os Mestres do Concílio Pagão, os Encobertos Rosa Cruzes, os Superiores Incógnitos, os Mestres da Doutrina Secreta, os Emissários Desconhecidos, os Mestres ou Sacerdotes da Ordem do Templo, os Mestres das Eras, os Hierofantes, os Santos, os Sábios Invisíveis, a Hierarquia Oculta, a Grande Fraternidade, «que chamou a si Shakespeare», um escritor que será abordado várias vezes em textos sobre a consciência espiritual e a ligação aos Mestres que ele teria...
Também nos ensaios sobre a Iniciação, nos
estudos sobre o grau de Mestre na Maçonaria (onde «o Mestre representa a Palavra, a Sophia, a Terceira Pessoa»), nos mestres da sua alma: - o rei D. Sebastião, o arquitecto Hirão, o grão-mestre templário Jacques de Molay, o mítico fundador dos rosacruzes Christian Rosenkreutz e Jesus Cristo - e, por fim, na indagação e demanda do Mestre interno, de acordo com o que reconheceu por mais de uma vez ser um dos princípios fundamentais da iniciação ou da vida oculta e íntima: «quando o discípulo está pronto, o mestre está pronto também», tal demanda está bem presente.
Se alguns textos da sua adolescência serão contundentes críticas a Deus (sobretudo ao da versão bíblica, o Jeová) ou a Jesus, feito Deus, passada essa fase frequente na idade juvenil, talvez em parte devedora da morte prematura do pai e do aparecimento de um padrasto, de conversas com familiares e sobretudo das influências radicais de livres-pensadores, ateus, anarquistas e agnósticos, tais como Nietzche, Binet-Sanglé, Max Nordau eJohn M. Robertson. Mas tal influência anti-mestres foi contrabalançado pela acção do mestre-escola e bom latinista V. H. Nicholas, e pelas leituras de Shakespeare («um iniciado divino»), Novalis, Milton (cuja teologia do Paraíso Perdido «vive da luz cabalística»), Shelley («um alto intuitivo»), Carlyle, Henry Drummond, Ralph W. Emerson e Walt Whitman, valorizadoras dos heróis, sábios e santos, ou seja, das qualidades ou virtualidades criativas e luminosas do espírito, por alguns seres mais incarnadas, manifestadas.
A primeira tomada de consciência, de que há registo, da importância dos mestres do caminho espiritual, ou da gnose, aconteceu ao ler, ainda na África do Sul, e portanto antes dos 17 anos, causando-lhe grande impressão, a obra de Hargrave Jennings, The Rosicrucians, their rites and mysteries, transmissora de doutrinas e mistérios da Tradição universal, dos gnósticos, templários, herméticos e rosicrucianos, com extractos significativos de obras de Hermes Trimesgito, Sinésio, Robert Fludd e Thomas Vaughan, no que foi certamente uma iniciação juvenil e não só, já que está assinalada por três tipos de lápis e  tinta a sublinharem ou a anotarem o exemplar da obra, não datada mas sendo a quarta edição e ainda do séc. XIX, hoje depositada na Casa Museu Fernando Pessoa, no Campo de Ourique lisboeta, e consultável online.
Na realidade, desde cedo encontramos muitos poemas espirituais em que Fernando Pessoa pesquisa, trabalha ou exprime sensações, expressões e conceitos que tentam aproximar-se ou ecoar o Ser Divino, em si mesmo ou através dos mestres, ou ainda desvendar o mistério ora da Presença Divina ora da sua ausência, bem como da sua Luz clarificadora, em especial tão necessária face às dualidades e dificuldades da vida. Todavia, como rejeitou em vários aspectos e textos a Igreja Católica de Roma, embora prossiga na demanda do sentido oculto do Cristianismo, o seu labor é no panteísmo transcendental e no paganismo superior, culminando em Março de 1914 na intensa descoberta ou criação de um mestre, o guardador de rebanhos Alberto Caeiro.
Assim em 1914-15 encontramos Fernando Pessoa a laborar feliz nos seus estudo sobre as origens também pagãs do cristianismo, e sobretudo no paganismo superior, no regresso dos Deuses (outra forma das entidades supra-humanas serem denominadas), e na descoberta do mestre Caeiro, um antídoto contra a especulação filosófica ou mesmo o pseudo-esoterismo (que, diz-nos, afastam da apreensão directa da verdade), quando subitamente lhe surge a encomenda da tradução de livros teosóficos para a editora A. M. Teixeira, por parte de João Antunes, que dirigia a Colecção Teosófica e Esotérica, pondo-o em contacto com as descrições dos Mestres, dos famosos Mahatmas (em sânscrito,  grande alma ou espírito, maha atman), apresentados de forma algo mistagoga pelos dirigentes da Sociedade Teosófica, fundada em 1875, pela russa Helena Petrovna Blavastky e o seu companheiro norte-americano Olcott.
Muito impressionado com a abrangência e força
de tal explicação doutrinária do ser humano e do mundo, Fernando Pessoa reagirá contudo e, em vários textos, critica as metodologias, doutrinas e personalidades dos teosofistas, escrevendo, por exemplo, que «Blavatsky era um espírito confuso e fraudoso; mas também é fora de dúvida que recebera uma mensagem e uma missão dos Superiores Incógnitos», reconhecendo deste modo, não obstante os defeitos da transmissão, a existência e acção dos Mestres. 
Mas prefere procurar, o que já fazia aliás antes, o acesso ao Mestre, ao Espírito e à Verdade, no fundo a íntima ligação superior e divina, nas fontes ocidentais, em vez de o receber da tradição oriental, em segunda ou terceira mão, já pouco vivenciada, antes vulgarizadora e fatalmente distorcida.
Proveniente, todavia, da leitura desses livros da Sociedade Teosófica com aspectos da sabedoria indiana e budista, e provavelmente de outros autores, encontramos em Fernando Pessoa ecos do elevado conhecimento da Yoga Vedanta: «No ocultismo dos Índios o Mestre, a que os discípulos procuram, é a própria substância monádica do discípulo. «Eu próprio sou o cantor», diz-se no poema sagrado [Bhagavad-Gita]. Só há a procurar o que já se encontrou.», transmitindo assim a sua compreensão de um dos aspectos mais subtis da realização interior do espírito e do mestre interno, algo que escapará sempre aos profanos, e que foi aprofundado, por exemplo, com grande mestria, na tradição de outro ramo da realização espiritual indo-europeia, o iraniano, como os numerosos e valiosos estudos de Henry Corbin patenteiam.
Esta transversalidade universal espiritual e iniciática até ao Oriente, não muito frequente em Fernando Pessoa, mas para a qual já fora iniciado com a leitura da obra referida de Hargraves Jennings (com capítulos sobre a unidade das mitologias e religiões), ao de leve referida por Bernardo Soares no Livro do Desassossego («o rio Ganges também passa pela rua dos Douradores»), e trabalhada nas suas Rubayates, ao estilo do persa Omar Khayyam, surge bem mais evidente num dos seus pares da época, o ocultista William Butler Yeats, prémio Nobel e que traduziria no final da sua vida, com Purohit Swami, alguns dos 108 Upanishads, título que designa em sânscrito os ensinamentos secretos aprendidos junto aos mestres e que constituem os textos mais essenciais da tradição da Yoga Vedanta.
Poderíamos ainda referir nessa busca de inspiração e ligação superior, mas a um nível escorregadio, os anos de 1916 e 1917, em que tentou o mediunismo da escrita automática, com o resultado de termos hoje numa letrinha miúda várias respostas ou mensagens, apenas uma ou outra mais substanciais, algumas assinadas como provindas de um dos ilustres platonistas de Cambridge, Henry More, designando-se (ou sendo designado, «ele é um F. R.C.») como Frater Rosa Cruz, para além de outras mais prosaicas, assinadas com diversos nomes, tal como a de Joseph Balsamo (o famoso mago e ocultista), e que eram provavelmente auto-projecções, ou então entidades do mundo invisível brincalhonas. 
Aliás, esta filiação rosacruz do famoso platonista de Cambrigde Henry More, julgamos nós ser uma invenção, ou então uma intuição de Fernando Pessoa, pois não está consubstanciada em factos conhecidos da biografia do sábio pastor anglicano, que debate com Descartes e Gassendi o mecanicismo das propostas deles e defende a visão espiritual e platónica da alma e do espírito como independentes do corpo, podendo quanto muito dizer-se que era um Rosacruz enquanto inserido na tradição ocidental platónica e cristã. 
Faltará certamente descortinarmos as fontes de Fernando Pessoa, e sempre difíceis quando sabemos que os alfarrabistas resolveram por vezes algumas das suas limitações financeiras, mas as referências a Henry More nas obras de Hargrave Jennings e em George Herbert Meads (1863-1931), possuídas e lidas por Fernando Pessoa, devem ser assinaladas, estando ambas na sua biblioteca hoje sita na Casa Fernando Pessoa.
Numa carta a Mário de Sá Carneiro, datada de
24/6/1916, em plena época de contactos com a teosofia e o ocultismo, confirmados até por algumas encomendas de livros, revelará as suas expectativas a propósito das escritas mediúnicas ou automáticas (que estarão também em voga, com o registo dos sonhos, no surrealismo francês contemporâneo) e da visão etérica e astral que lhe acontecera: «É que tudo isto não é o vulgar desenvolvimento de qualidades de médium. Já sei o bastante de ciências ocultas para reconhecer que estão sendo acordados em mim os sentidos chamados superiores para um fim qualquer, que o Mestre desconhecido, que assim me vai iniciando, ao impor-me essa existência superior, me vai dar um sofrimento muito maior do que até aqui tenho tido, e aquele desgosto profundo de tudo que vem com a aquisição destas altas faculdades».
Esta concepção “semi-trágica” do caminho do despertar e da relação com o mestre, provavelmente devedora em parte da literatura teosofista (nomeadamente da Voz do Silêncio, de Helena P. Blavatsky, e da Luz no Caminho de Mabel Collins, obras que traduzira para a editora A. M. Teixeira), surge de novo cristalizada numa concepção algo “temível” dos Mestres em 29/11/20, desta vez na carta à sua namorada Ofélia, justificando a sua primeira (já que voltarão a namorar seis anos depois) separação, quem sabe de uma relação que talvez o tivesse tornado mais mestre da sua vida e corpo: «Que isto de “outras afeições” e de “outros caminhos” é consigo, Ofelinha, e não comigo. O meu destino pertence a outra lei, de cuja existência a Ofelinha nem sabe, e está subordinada cada vez mais à obediência a Mestres que não permitem nem perdoam».
Se será verdade, ou seja, se estava a sentir um
influxo espiritual sobre ele dos mestres ou de um mestre, ou se era antes desejo, ou mesmo mistificação, é difícil termos hoje a certeza, mas cremos que exagerou pois os verdadeiros mestres não obrigam e respeitam o livre-arbítrio...
Talvez dessa época seja um texto sobre os três níveis da Iniciação (exotérica, esotérica e divina) não datado no qual diz a dado passo: «Há, depois, a iniciação esotérica. Difere da primeira em que tem que ser buscada pelo discípulo, e por ele desejada e preparada em si mesmo».
Esta aspiração consubstanciada num modo de vida e de meditação e a não recusa da ajuda indispensável dos mestres é por ele confirmada  ao escrever: «"Quando o discípulo está pronto", diz o velho lema dos ocultistas, "o mestre está pronto também".»
Mesmo já quando no final de 1917, em reacção ao espiritismo e à busca dos poderes ocultos, se analisa mais detalhadamente, num texto dactilografado de cinco páginas, não datado, intitulado Um caso de mediumnidade. (Contribuição para a actividade subconsciente do espírito.), considerando-os perigosos e que quanto muito deveriam estar reservados a uns poucos de investigadores, deveremos considerar ainda assim tal texto algo melodramático ou mistificador, pese a provável decisão de não fazer mais consultas ao mundo invisível e ensaiar escritas passivas ou automáticas. 
Com efeito, ao longo dos anos continuará ocasionalmente a assinalar sentir-se mais inspirado do Alto, como nos diz, por exemplo, num poema, templariamente: «Não meu, não meu é quanto escrevo.// A quem o devo?// De quem sou o arauto nado?», ou ainda registando com o símbolo da lemniscata que recebeu uma informação ou ensinamento de níveis superiores.
Nesses anos e nos seguintes, em que faz a sua
transição (ou aprofundamento) do paganismo para o caminho iniciático, Fernando Pessoa vai lendo e conhecendo obras e ensinamentos ocultistas e esotéricos, muitas das quais encomenda do estrangeiro, seja de adeptos (de Pitágoras a Juliano Apóstata, de Ramacharaka e Eliphas Levy a Franz Hartman, de Arthur Edward Waite a Oswald Wirth), seja de Ordens, destas se destacando a Maçonaria e a panóplia tão fértil nesse final do século das ordens ocultistas inglesas, da Societas Rosicruciana in Anglia à Golden Dawn e à Astrum Argentinum, ou à Stella Matutina, todas elas referidas em textos, além de uma ou outra francesa, tais como o Martinismo de Papus, e a Sociedade Hermética dos Rosa-Cruz, fundada por Stanislas de Guaita no ano emblemático de 1888.
Nelas reencontra a noção dos mestres, que se encontra em quase todos os povos e tempos e indica a existência de uma Tradição viva (e vivida por muitos) de espíritos conscientes e capazes de se moverem ou contactarem os seres dos sucessivos degraus ascensionais da hierarquia dita angélica (descritos por ele numa elevação de níveis que leva dos «líderes, heróis, mestres aos semi-deuses, deuses e demiurgo, Pai, Filho e Espírito Santo» e que Fernando Pessoa investigará, teorizará e tentará mesmo ressurgir, primeiro como uma ordem psíquica nacional, depois como Ordem Terceira e Ordem Sebastianista e, por fim, como a Ordem de Cristo ou Templária de Portugal.
Com efeito, a noção dos Mestres, dos Psicopompos, dos Irradiantes da Arqui-luz, da Fraternidade espiritual, da Hierarquia, indica a real existência duma Tradição, vivida por alguns, desse corpo místico ou espiritual da Igreja e Humanidade, dessa satsanga ou companhia da Verdade, que se consubstancia nos mestres e ordens espirituais de cada povo ou país e que Fernando Pessoa não só investigará e teorizará como tentará mesmo fazer ressurgir sobretudo nos últimos anos da sua vida com a Ordem de Cristo ou Templária de Portugal, a propósito da qual nos deixou fecundas impulsões espirituais.
E se em Junho de 1919 nada resultara (de
contactos, amizades, ligações) de uma carta escrita aos ocultistas Hector Durville e seu filho Henri, directores do Institut du Magnetisme et du Psychisme, pedindo informações sobre o curso de correspondência de magnetismo pessoal, e descrevendo o seu psiquismo como o de um “histerico-neurasténico” e com pouca força de vontade, e confessando ainda divertidamente que «a minha vida psíquica é uma espécie de curso de desmagnetismo pessoal», já em 1929, depois de ter detectado no 1º volume das Confessions de Aleister Crowley, uma provável incorrecção no horóscopo quanto à hora de nascimento e o ter assinalado em carta endereçada aos responsáveis da editora, a qual foi lida e aprovada por Crowley e levou a uma correspondência entre os dois e à vinda do mago, auto-denominado mestre Therion, a Portugal, tendo Fernando Pessoa se encontrado algumas vezes com ele, numa relação ainda algo enigmática quanto às influências que terá recebido e às consequências na sua própria realização e evolução espiritual.
Todavia,  num escrito (não datado mas que cremos já depois da estadia de Crowley em Portugal em 1930) 
considerou-o um exemplo de magia negra, porque nas suas funções cerimoniais usava o sexo mesmo invertido e, sobretudo, recusava o dobrar o joelho diante de Deus, numa posição típica do orgulho e ambição, tão criticados por Fernando Pessoa enquanto formas que matam ou abafam o verdadeiro mestre e espírito em nós, bem como as suas ligações superiores.
Mas não se pode negar também a forte impressão
senão mesmo iniciação que Crowley lhe fez e que um documento só há poucos anos recolhido ao seu espólio na Biblioteca Nacional, revela: «Honra ao Mestre Therion…»
Numa post-Modernidade, em muitas doutrinas e
vivências culturais ainda emaranhada em análises e especulações meramente mentais sem referências espirituais e nada predisposta a aceitar hierarquias e leis invisíveis (donde até o lema «nem deus, nem mestre»), parecerá estranho esta admissão, no nascimento do Modernismo, dos Mestres e do mundo Espiritual, mas se olharmos pela Europa a dentro encontramos os casos exemplares de Rilke, Yeats, Mallarmé, René Guénon, Gustave Meyrink, Thomas Mann, T. S. Eliot, René Daumal, Herman Hesse, aliás já antecedidos, no romantismo, por Goethe, W. Black, Balzac, Nerval, Novalis e Villiers de L’Isle-Adam os quais dão testemunhos nítidos deles, e entre os quais Fernando Pessoa se pode afirmar como um confrade se não mesmo como um irmão, ele próprio por fim afirmando-se iniciado nos três graus menores dos Templários. 
 A base ou razão fundamental da existência dos Mestres pode ser vista de múltiplos modo, tais como: «a humanidade é um vasto animal que dorme; o que se passa nela não é mais que os sonhos que lhe são impostos», ou ainda «o verdadeiro sentido da iniciação é que este mundo visível em que vivemos é um símbolo e uma sombra, que esta vida que conhecemos através dos sentidos é uma morte e um sono, ou, noutras palavras, que o que vemos é uma ilusão. Iniciação é o dissipar - um dissipar gradual e parcial – desta ilusão».
Ora este estado de ignorância e a necessidade de
se percorrer, de se trilhar, um caminho de inspiração, desvendação e iluminação implica a existência dos iniciadores e assim «iniciar alguém no sentido hermético, é conferir-lhe conhecimentos que ele não poderia obter por si, quer pela leitura de livros, quer pelo exercício da sua inteligência, por forte que seja, quer pela leitura de livros à luz dessa mesma inteligência».
No fundo, mestres que ora inspiram e catalizam ora transmitem energias e impulsos, práticas e correntes que despertam espiritualmente a alma, a libertam das trevas da ignorância e a abrem à luz interna, à linguagem dos pássaros, ao diálogo intuitivo com os símbolos e arquétipos, mestres e anjos, com a Luz da Verdade e o calor do Amor a irradiarem então das almas mais unidas a Deus.
Neste sentido dirá mesmo que na Iniciação se transmite ao discípulo um apressar evolutivo…
Contemplando a história e a Tradição Portuguesa, Fernando Pessoa considerou mestres certas figuras eleitas para o seu breviário, a Mensagem, tais como D. Afonso Henriques e D. João I («Mestre, sem o saber, do Templo/ que Portugal foi feito ser»), e Bandarra e P. António Vieira, pelo espírito profético que possuíam e a capacidade de clarividentemente vencerem as limitações do tempo e da mente, e por serem, como ele, arautos do que ele denominou, com sucessivos sentidos, o Encoberto e o V. Império.
                   
Mas talvez ainda mais importantes mestres foram D. Dinis, o transmutador dos templários portugueses, ameaçados de extinção, nos cavaleiros da Ordem de Cristo e sobretudo o Infante D. Henrique, o governador da Ordem de Cristo, e cujo lema Talant de bien faire, adopta como o princípio ou lema da sua tentativa de ressurgimento da ordem espiritual de Portugal, por ele nomeada como Ordem Templária, ou Ordem de Cristo, de Portugal e da qual virá mesmo a dizer, algo enigmaticamente no seu último ano de vida: «pertenço à Ordem Templária de Portugal. Posso dizer, e digo, que sou templário português. Digo-o devidamente autorizado. E, dito, fica dito». 
Dos seus contemporâneos, dos com mais conhecimentos espirituais, ainda se correspondeu, pedindo informações sobre o Sebastianismo, com Sampaio Bruno, autor do Encoberto e da Ideia de Deus, embora pouco ou nada tenha recebido, conheceu o poeta do Marão Teixeira de Pascoaes e o flamejante orador e pensador Leonardo Coimbra, com quem dialogou algumas vezes, e que, com Antero de Quental, foram para ele, como escreveu, os elos mais próximos da Tradição Espiritual portuguesa, em especial Antero de quem traduziu vários dos seus sonetos para inglês e pensou que ele tinha falhado no caminho iniciático da Ordem de Cristo por ligações maçónicas, algo que não está comprovado. 
Raul Leal (este iniciado por Aleister Crowley), Almada Negreiros, Augusto Ferreira Gomes, César Porto, Augusto de Santa Rita e Manuel de Meneses, e mais alguns, foram provavelmente seus dialogantes à volta ou sob os Mestres...
Ora como quem reconhece ou intui os mestres, e procura os mestres, aceita implicitamente a existência de discípulos, ou neófitos, ou ainda adeptos, Fernando Pessoa teorizou as condições de iniciação, essa dissipação das trevas e da ignorância, que nos desperta e nos torna mestres ou pelo menos receptivos e já conscientes do espírito e deles, e descreverá as provas ou testes para se atingir o grau de mestre na Ordem Templária de Portugal, desenhando até os rituais e redigindo alguns discursos para os neófitos e irmãos, receberem «luz, calor e vida».
Aos Mestres, aos seres que entre a humanidade
adormecida e a Divindade desconhecida servem de pontes e de guias e que, de modo subtil e invisível, influenciam e inspiram não só os que se querem libertar como a própria evolução da humanidade, Fernando Pessoa dedicou várias poesias de grande sensibilidade, inteligência e visão, tal a de 9-5-34, intituladA Sup[eriores] Incógnitos, e assim se inicia: «Nunca os vi nem lhes falei/ E eles me tem guiado/Segundo a forma e a lei/ Do que, ainda que conhecido,/ Tem que ficar ignorado», e que publiquei pela 1ª vez em 1988 na obra Poesia Profética, Mágica e Espiritual.
Mestres, pois, amados, e não é descabido afirmarmos que por mais de uma vez a sua invocação ardeu no coração de Fernando Pessoa e que na sua boca os seus nomes foram escudos protectores contra o que ele considera os três assassinos do mestre, «a Ignorância, o Fanatismo e a Ambição», que então como agora, tentam impedir ou matar a nossa vida espiritual e a ligação com os mestres e Deus. Isto nos diz em 4/1/1934: «Há cinco Mestres de minha alma/Por (Em) cinco pontos me levanto/Da estrela que me resplende calma/E tem no meio o sinal santo/A letra que nos traz dos céus/A sigla do nome de Deus//./Foi o primeiro um Arquitecto/Morreu sob o imperfeito tecto/Por não dizer nosso Segredo. /Três assassinos (agressores) o mataram/Nas três portas em que o acharam. //. Seu nome, virgem de traição/Está em meu ser como um remédio/Contra o que é fraco em coração, /Contra o dissídio e contra o tédio. /A sua imagem de exumado/Quando é que serei levantado?»
Mestres, designando aqueles que, já unificados
com o espírito, são capazes de despertar ou intensificar a potencialidade espiritual latente do ser humano que, como a bela adormecida, espera pelo príncipe ou mestre encantado que a saiba beijar correctamente, ou que lhe saiba soprar as palavras mágicas perdidas, as que fazem com que o coração e a intuição despertem para o espírito e a revelação da unidade, tal como vemos no poema Eros e Psique, em que Fernando Pessoa glosa a tradição iniciática grega e o romanceiro popular indo-europeu (a Bela adormecida ou a Shakti indiana), mostrando a união do espírito do peregrino com a alma, a amada princesa adormecida. 
Fernando Pessoa, mestre?
De certo modo, não só pela procura da Verdade na
 qual, segundo as suas teorias de iniciação, cumpriu os requisitos iniciáticos, mas também pela sua genialidade de criador e posterior influência literária universal, destacando-se o acto mágico ou demiúrgico da criação dos três heterónimos: Alberto Caeiro, a natureza pura e simples revelada por quem a sabe ver sem pensamentos e preconceitos, ou em quem está «o nosso espírito apenas como preceptor dessa realidade», tal como ela é, mas que no fundo, iniciaticamente, é apenas a intuição directa do neófito; Ricardo Reis, mestre do velho paganismo epicurista e estóico, vencendo o amor da vida e o temor da morte (tendo-os...), e Álvaro de Campos, avatar dos tempos modernos e tecnológicos, estilhaçando a estreita, deformada e formatada personalidade e vida burguesa e, pela multiplicidade extrema, procurando prometaica, alquímica e perigosamente romper tais opressões e coletes normalizadores e democráticos, tenderia a chegar à Unidade, à Universalidade...  
O que em alguns textos de um modo ou outro foi afirmando: «O grau de Mestre será, da mesma maneira: 8) o escrever poesia épica, 9) o escrever poesia dramática, 10) a fusão de toda a poesia, lírica, épica e dramática em algo para lá de todas elas.».
 Três persona (resultantes de um acto de magia mental, como nos diz) que acabam por ser os exemplares dos três graus menores da iniciação de Fernando Pessoa, o ortónimo, ele próprio, o fino estudioso de linhas e entrelinhas dos ensinamentos, na Ordem Templária de Portugal: «Para obter o Grau de Neófito é preciso passar as três provas do Pórtico – vencer o Mundo, a Carne e o Diabo. Para obter o Grau de Adepto Menor é mister passar as duas provas do Átrio – vencer o amor à vida como vida e o temor da morte como morte. Para obter o Grau de Mestre do Átrio é mister passar a prova do Altar – vencer o apego à personalidade, a noção de que cada qual é o que é, obter a de que cada qual é o universo inteiro e que estão nele, e são ele todos os outros homens», testes e condições que Fernando Pessoa realiza nos anos finais da sua vida, estes três graus sendo referidos nos termos de "iniciação, avanço e completude".
Num texto mais antigo ou juvenil, Fernando Pessoa escrevendo sobre «os três processos de «libertação ou ascensão», que resume no hindu, no cristão e no rosa cruz, e cujos excessos ou desvios resultam no ascetismo que odeia a personalidade, no misticismo que odeia a inteligência, no voluntarismo que odeia a lei, conclui que o ser «mais completo é aquele que consegue reunir em si as três aspirações, e realizar a ascensão por todos os caminhos ao mesmo tempo, embora por uma só via. O que, abstendo-se, sublimando-se e aproveitando-se, se diviniza pois se anula, se excede e se transforma. É esse verdadeiramente o Mestre, o que, livre do mal e do bem, conhece a lei...».
Eis um texto que, embora não da sua maturidade,
deixa ver algumas linhas da transformação iniciática que Fernando Pessoa crê ou prevê na ascensão a mestre, mas que conhecerá ser bem mais difícil, tal como registará quanto a uma das razões: «Para todos quanto queiram mais da vida que o nada que ela é em si mesma, a regra é aquela que, em um dos seus modos, os três graus maçónicos simbolizam. Entramos aprendizes pelo sofrimento, passamos companheiros pelo propósito, somos erguidos (levantados) Mestres pelo sacrifício. De outro modo não se chega, na arte como na vida, à Cadeira, que é o trono de Salomão».
Esta ideia está também glosada em escrita
inspirada ou mediúnica no último ano da sua vida: «O neófito sabe que só se readquire a nova alma com sofrimento e saudade. O sábio conhece o que o neófito sabe. O mestre aplica o que o sábio conhece». Aliás, do sofrimento da sua vida, falam-nos muito o Livro do Desassossego, a sua própria morte prematura, ou, por exemplo, ainda outra glosa: «Para se ser um Mestre temos de imitar os mestres e temos de sofrer e “morrer” portanto».
A noção real e interna de Mestre será muito trabalhada ou interrogada, por vezes em níveis bem subtis e difíceis, tal como se vê no seguinte fragmento: - «A alma da alma é um homem aparte de cada homem e isto é o Mestre, um Anjo da Guarda. A alma desta alma é Deus (ou isto é apenas no génio e inspiração?)», um conjunto perguntas com valor na Tradição Espiritual Portuguesa, dado o seu nível íntimo e elevado. 
No mesmo texto, acrescentará: «Individualmente alma e corpo são um, mas a alma é mestre do corpo no sentido inferior, assim como o Cristo é mestre no sentido interior. Está o mestre separado contudo inseparado? Quando a morte ocorre a unidade dual torna-se uma unidade dupla? É este o significado da frase Grega, “morrer é ser iniciado"?», aqui desaguando numa correnteza que de Plutarco a Antero de Quental inspirou meditações, reflexões, sonetos...
Noutro texto, acerca dos vários níveis possíveis de serem encontrados no aprofundamento interior diz que nos primeiros sentidos de interpretação do Mestre, que é o ego íntimo, ele é a alma e, nos mais elevados sentidos, Deus, Cristo e o Ser que não se conhece.
De facto, um dos níveis elevados da grande obra
iniciática é a revelação do Mestre, que surge mencionado, por exemplo, nos cinco níveis que nos apresenta do simbólico Desejado e Encoberto: «o homem, a esperança, o símbolo, o Mestre, o Cristo», acrescentando ainda que a progressão neles implica um trabalho iniciático de ascese, conhecimento e amor pelo qual se irá «talhando o corpo espiritual do Rei para que nele, uma vez formado, o Segundo Advento carnalmente se faça», afirmação que está de acordo com a doutrina tradicional tanto do corpo glorioso como dos avatares, as manifestações da Divindade ou dos grandes Mestres, na Humanidade, ainda que qualquer especulação sobre se um mestre regressa de novo ou quando tal acontecerá, seja sempre falível e ilusória...
São também muitos os fragmento soltos dedicados ao estudo do grau de Mestre na Maçonaria, ou os dedicadas aos mestres da tradição Rosacruz, desde Valentim Andrea, Bacon e Shakespeare a Robert Fludd, Thomas Vaughan, e já do seu tempo Arthur E. Waite, embora reafirme mais de uma vez que estes são apenas expositores, e que os verdadeiros mestres rosacruzes nunca alguém os conheceu.
Numa importante glosa da Tradição ocidental,
maçónica, diz-nos: «o Templo de Salomão é a alma humana. Sua expressão interna e suprema, o Mestre, é morto (no astral) pelos três assassinos: - o Mundo (desejo dos outros), a Carne (desejo de si) e o Diabo (o desejo de mais que si) e é este último que dá no Mestre, na fronte (isto é, na parte mais sublime do ser) o golpe mortal. A Grande Obra é o elaborar em nós o com, no sentido estrito e pessoal, que não reincarnarmos, a transmutação (aqui mesmo) do chumbo do nosso ser perecível no ouro do nosso ser que não perece».
De registar aqui a menção da fronte, zona
principal e fundamental de visão (o terceiro olho) e de irradiação espiritual, bem como a alusão ao talhar do corpo espiritual imperecível ou de glória, o augoeides, na designação dos neo-platónicos, bastante referidos por Fernando Pessoa como elos importantes da Tradição Espiritual Ocidental.
Mas será Jesus Cristo, nas suas várias dimensões, aquele que depois de ser desvalorizado ou rejeitado na sua fase anti-religiosa ou de sociologia ateia e libertária (em que as suas leituras omnívoras o levaram demoradamente por Binet-Sanglé, Max Nordau ou John M. Robertson) e de paganismo transcendentalista, se torna por fim o Mestre e Desejado da sua vida, ou do seu ser, conforme o seu testamento ou nota autobiográfica de 1935, um ano final importantíssimo, no qual escreve artigos e textos (estes não publicados) em defesa das associações secretas, nomeadamente da Maçonaria, com a sua tradição dos Mestres, atacadas pelo conservadorismo, o salazarismo e o catolicismo.
Na verdade, redige em 30 de Março de 1935  a sua esclarecedora carta autobiográfica (certamente na linha do seu mestre em jovem Antero de Quental, que escreveu em 1887 a sua carta autobiográfica a Wilhelm Storck), na qual se afirma “Cristão gnóstico”, fiel «à Tradição Secreta do Cristianismo, e «iniciado, por comunicação directa de Mestre a Discípulo, nos três graus menores da (aparentemente extinta) Ordem Templária Portugal».
Refira-se ainda noutro texto seu, com certa originalidade, que «o progresso em Cristo, na Ordem, é feito em três estágios – o primeiro revelando Jesus da Nazaré, ou simplesmente, Jesus; o segundo o Cristo de Glória. O terceiro o Cristo de Deus. O primeiro é simples, o segundo contém a unidade essencial de todas as fés e a sua auto-transcendência no Cristo da Glória. O terceiro contém a auto-transcendência mesmo disto, a visão final», aspectos ascensionais que nos remetem para a gnose não-dual e para a iniciação humana e universal, com o mestre Jesus e o Cristo ou Logos cósmico, e apontam para a desejada libertação na Consciência Suprema.
Não dissera ele na carta, algo preparatória, a Adolfo Casais Monteiro, de Janeiro de 1935, que «segundo a nossa afinação espiritual, poderemos ir comunicando com seres cada vez mais altos», os mestres e as hierarquias celestiais. Ou como explicitou ainda noutro texto: «a nossa comunicação, mesmo na sua maior elevação, não pode ir mais além do que a Segunda Pessoa; portanto União com Deus e União com Cristo significam a mesma coisa, pois só podemos ser um com Deus em e através de Cristo», assim se atingindo a Pax Profunda, por ele designada como correspondente à realização de que «In nobis regnat Iesus, não quere dizer “Jesus reina em nós” mas “É em nós que Jesus reina”, em nós, que não nos templos externos», a qual florescerá no cruciforme corpo de glória róseo esbranquiçado.
Lembraremos que o nome Cristo ou Christos é a tradução grega da palavra hebraica messiah, que significa ungido, e que Cristo foi considerado por S. João como o Logos dos gregos,  a Inteligência-Consciência Divina no Cosmos, sendo de certo modo a fonte onde todos os Mestres comungam, e à qual nos devemos abrir para depois irradiar ou partilhar harmoniosamente.
Em verdade, pelos anos fora da sua vida a sua ligação, ou desejo dela, com os mestres será
uma constante, patente em textos ou poemas. Em 1930 fala bastante da Ordem Espiritual de Portugal, que nos inspira a todos, na famosa carta ao conde de Keyserling. E, em 1935, terminará o seu testamento ou nota auto-biográfica exortando-nos: «Ter sempre na memória o mártir Jacques de Molay, Grão Mestre dos Templários, e combater, sempre e em toda a parte, os seus três assassinos – a Ignorância, o Fanatismo e a Tirania.»
                         
Testemunhou pois bastante e bem a Tradição
secreta, a Hierarquia e Fraternidade dos discípulos e mestres que, ao longo dos milénios, tem impulsionado e inspirado a marcha da humanidade e da qual vai sendo também a hora de aceitarmos mais a sua existência e a possível acção interna inspiradora de modo a que, abrindo-nos a eles, ou sintonizando-os, possamos ser mais inspirados ou iniciados no caminho da realização espiritual e Divina.

Mensagens solsticiais e natalícias. Postais de Boas Festas belos e perenes. Com esperança para um futuro melhor.

BOAS REALIZAÇÕES DO CORAÇÃO
Que a pureza da neve e das estrelas do céu nos inspire sempre...
                                   Liberdade e convivialidade fraterna entre todos os seres..
        Reuniões de almas amigas, e que sabem dialogar ou mesmo cantar, religam ao Amor divino...
                 Que a tua alma esteja carregada de dons para os que fores encontrando no caminho...
                           Descidas de bênçãos espirituais: cada criança é uma luz na noite dos tempos..
         Meios de transporte antigos que tanto encantavam. Mas o caminhar pelos campos continua...
   Todos subimos às costas de alguém e viremos também a servir outros, para haver mais Luz e alegria.
              Orar, cantar aproxima-nos dos seres angélicos, mais próximos da Fonte Divina....
     Que os anjos e mestres nos protejam, inspirem e impulsionem no caminho do Amor e da Verdade...
                                  Que o Amor divino arda e irradie mais musical e ritmicamente, em nós...
 
                              Do tão misterioso quão poderoso abraço e ósculo unitivo humano, angélico e divino...

sábado, 2 de dezembro de 2017

O enigma da morte de Antero de Quental. Diálogos e reflexões. Dezembro de 2017...

   Quando Antero de Quental resolve morrer fisicamente, quando renuncia à sua vida e ego no corpo terreno, poderemos nós pensar que estamos diante de um sacrifício, de um fazer sacro, de um entregar-se a Deus, de um assumir doloroso de uma morte-renascimento voluntária e abrupta?
Como não sabemos bem a quem se estava a dar, a entregar Antero : se à desistência, se à morte endeusada, se à morte redentora, se à Divindade, se ao Não-Ser ou se, simplesmente ao simples descanso e paz, ou quem sabe ainda se a uma mão divina ou à substância infinita e omnipresente divina, ficamos na dúvida.
Para complicar a solução temos de confessar que não temos  meios de saber qual o pensamento ou os pensamentos e sentimentos que o animavam, ou impulsionaram, no momento de premir o gatilho, ao que consta duas vezes, tal  como ele terá confirmado com os dedos,  sentado naquele banco de jardim pintado de verde e sob o signo da âncora e da Esperança, num dos anoiteceres mais trágicos da ilha açoriana.
Havia ainda hesitações, ou cogitara e decidira que chegara mesmo a hora naquela  tarde pois não tinha condições para continuar a viver na Terra e já concluíra a sua missão?
Face ao seu trajecto de líder da geração intelectual mais notável do seu tempo, como não pensarmos na morte de Sócrates, mestre da juventude de Atenas, tendo de tomar a cicuta pelas suas mãos calmamente, ou na do mestre Jesus repudiado por judeus e romanos e mesmo assim entregando-se a Deus sem rancores, ou a do sufi Hallaj quando não se retratou, e por isso foi morto, de ter proferido o herético ana al-haqq, ou seja, que Deus nele afirmava ser ele Deus?
Vários aspectos da vida de Antero parecem convergir, após uma juventude fulgurante, para o não-ser, para o não-existir, para o não encontrar o seu lugar e plenitude na Terra e assim, retraída a plenitude  criadora nele e com a sua doença psicosomática, as forças da passagem para o outro mundo e portanto da morte, internas e externas, cresceram. 
E como sempre cultivara não só o destemor perante a morte como o desprendimento em relação ao amor da vida, intrinsecamente corajoso e desde jovem líder no dar o passo inicial revolucionário,  também o passo fatal voluntário de cruzar o umbral  e ver o que resultaria surgiu-lhe como apetecível, natural, consequente, inevitável, não sabemos se nocturna e sombriamente, se numa subtil tonalidade de amanhecer e de se libertar das sombras terrenas que provavelmente o apoquentavam... 
Deve ter sentido, porém, que faria sofrer algumas almas, em especial as suas duas jovens pupilas Beatriz e Ermelinda, bem como um ou dois amigos e isso poderá ter sido o mais doloroso nessa sua ingenta via sacra, quantos metros até chegar ao banco, quantos minutos até desfechar do revólver a sentença de fim de vida...
                                             Indis)Pensáveis: 11 de Setembro de 1891 - O último passeio de Antero
Possivelmente não estava ressentido com as pessoas (e uma seria a irmã) ou ambientes que o encarreiraram e apressaram nessa vereda estreita que o levava a tal acto de abandono samuraico da vida terrena. 
A última representação iconográfica de Antero, uma pintura feita pelo seu primo Sebastião d'Arruda.
 Morria assim simplesmente em sincronia com uma desadaptação geral derivada da sua própria evolução psicosomática de envelhecimento e desagregação, que pouca harmonia realizava com o seu Eu superior e com o meio ambiente e que já era incompatível para o seu eu lúcido mas desgastado  face à constante insuficiência dos nervos, da digestão, do sono e da qual resultava a vida no corpo físico se ter tornado um purgatório de certo modo inútil.
Poderemos interrogar ainda o outro lado do enigma:  quando ele sai do corpo físico para que níveis ou planos invisíveis vai, que cores e densidade de alma ou do corpo psico-espiritual leva, que tipo de sentimentos-pensamentos o envolverão durante mais ou menos tempo, o que pensaria ele de tal voo? 
Quem estava por perto? Quem foi o primeiro ser a apoiá-lo? A sua mãe, o Anjo da Guarda, Germano Meireles?
E o que se passou na sua psique? Apenas a perda de consciência, o entrar num adormecimento? Ou o choque violento do tiro estilhaçaria tal possibilidade e um tipo de dilaceramento psíquico surgiu como contraparte do rasgar de artérias, nervos e tecidos cerebrais pelas duas balas?
Respostas difíceis...
E hoje, após tantos anos de pensamentos e escritos sobre a sua vida e obra, e certamente muitas orações por ele, como está e onde se encontra a alma espiritual de Antero de Quental? 
 
 Na atmosfera da Terra, nos mundo subtis e ainda com um corpo subtil próximo do terreno, lentamente ganhando ainda forças de Luz e de Amor, para se elevar mais? 
Ou, sacrificialmente, com esse acto e pelas forças psíquicas e de consciência altamente desenvolvidas na sua vida, obra e epistolário, tornou-se um ser que se conserva nos planos invisíveis próximos da Humanidade e que nos vai interpelando, inspirando, sobretudo enquanto leitores e pensadores da sua vida e obra?
E quantos dos nossos escritos, pensamentos e sentimentos, orações e meditações, sorrisos e chamas chegarão até ele numa certa medida de utilidade ao seu caminho ascensional? 
                                    
O que lhe faltou mais na vida e que deve ser uma lição para nós? Amar, encontrar e viver com a amada? Ou também amar mais a Divindade interna, meditando-a, invocando-a e pressentindo-a no amor que lhe dedicamos e na felicidade que sentimos?
Que trabalhos e investigações na sua obra ele mais desejaria que prossigamos? O que melhor nos faça e torne, na verdadeira religião da Humanidade,  seres mais harmoniosos e livres?
Que valores núcleos mais altos ou significativos considerará  presentes na sua obra, podendo  fortificar-nos e impulsionar no caminho de uma Humanidade mais harmoniosa e luminosa?
O amor, a liberdade, a aspiração ao bem, a sinceridade, a coerência, o ser-se justo, o dinamismo psíquico transformador, a fraternidade, a Divindade, o espírito em nós?
Mistérios e desafios criativos....  Lux Dei!
 ***
Texto dedicado a Eduardo Lourenço e à Ana Maria Almeida Martins, dois anterianos, já que há dois dias debatemos este tema na casa dele, estando ainda presentes a sua irmã e a sobrinha Isabel Fraga, tendo uma pequena parte do diálogo sido gravada e disponibilizada para o youtube: https://pedroteixeiradamota.blogspot.com/2020/12/na-partida-de-eduardo-lourenco-breve.html

sexta-feira, 1 de dezembro de 2017

Dezembro e as Efemérides do encontro do Oriente e do Ocidente, e em especial da Índia e de Portugal. Constantemente ampliadas.

1-XII. O padre Pedro Afonso, cirurgião e curador, escreve de Goa, neste dia, em 1560, aos companheiros jesuítas em Lisboa: «A santa obediência me mandou, caríssimos irmãos, que lhes escrevesse esta, e na qual lhes desse conta do meu ofício, para que saibam o que o Senhor obra por um instrumento tão baixo como eu, e assim se alegrarão em Nosso Senhor, do qual todo o bem procede, e o que por minha parte falta Ele o supre, por sua piedade e misericórdia, porque de outra maneira ficaria tudo muito sujamente feito, porque Ele é o que dá a perfeição às coisas, quanto mais carecem de perfeição, de maneira que o que eu faço, fá-lo Deus». Vinte e dois anos trabalhará na seara anímica oriental. Esta condição de curadores do corpo e da alma será uma das que melhor favoreceram certos portugueses, aptos por isso a sentir e desenvolver a compaixão que abre à fraternidade, conhecimento e inspiração universal: «trazem tantas diversidades de doenças que muitas vezes não me sei dar a conselho, porque trazem doenças que os doutores antigos não escreveram, e eu me vejo assim desconfiado de mim mesmo, parecendo-me que é impossível poderem-se-lhes sarar. Então me encomendo ao Senhor e aos meus santos que me ensinem o melhor e têm remédio». Esta parte final remete-nos  para duas características da Filosofia Perene e da Tradição Espiritual Portuguesa: a existência do corpo místico da Humanidade, hoje confirmada a certo nível por vários investigadores na teoria do Campo unificado de energia, informação e consciência, e que ela se pode concretizar na ajuda ou inspiração que recebemos (seja nas orações e meditações, seja nos sonhos), remetendo até àa incubatio, inspiração nocturna e onírica, praticada nas raízes de Portugal, por exemplo no culto ao Deus Endovellicus, «de presença subtil presentíssima e prestantíssima», na zona do Alandroal, como bem o comprovam aras e inscrições, hoje no Museu Nacional de Arqueologia José Leite de Vasconcelos.
                                          
  Neste 1 de Dezembro, mas de 1594, na Casa da Companhia de Jesus em Macau, iniciada no ano de 1567, quando os mandarins de Cantão deram a península de Amacau para servir de porto e vila aos portugueses, começou a funcionar mais autonomamente o Colégio de Macau, dirigido pelo P. Duarte de Sande, com lições de Latim, Direito e Teologia, a que se juntarão em 1597 as aulas de Artes e depois Filosofia. Os reis de Portugal foram seus grandes protectores, tais D. João III, D. Sebastião e D. João IV, e estava consagrado a Nossa Senhora Madre de Deus, embora vulgarmente fosse chamado Colégio de S. Paulo, destacando-se a pujança e beleza da Igreja, com a sua notável escadaria, como ainda hoje se presencia. O grau de Mestre era atribuído, com todos os cerimoniais europeus, e foi um cadinho ou forja de notáveis missionários e pregadores numa época áurea de crença e força expansionista cristã, humanista e portuguesa, que durou pouco por várias razões de decadência e concorrência, apontadas por vários pensadores e historiadores, desde Diogo de Couto a Duarte Ribeiro de Macedo, de Alexandre Herculano e Antero de Quental a António Sérgio, Vitorino Magalhães Godinho e António Matoso.
1640. Portugal reconquista neste dia 1º de Dezembro a independência, após sessenta anos de subordinação à uma má e bastante opressiva administração castelhana, sobretudo com o conde de Linhares e Miguel de Vasconcelos, graças à conjuração rápida e corajosa desencadeada vitoriosamente na capital do reino, no paço Real e nos centros nevrálgicos do poder, na qual se destacam D. Antão de Almada (num desenho das época, em baixo), o futuro marquês de Marialva D. António de Meneses, o 3º conde de Arcos D. Tomás de Noronha (1593-1669) e outros dos quarenta patrióticos restauradores. A boa nova leva o seu tempo até chegar ao Oriente, e é acolhida com júbilo. Não sendo aceite pelos castelhanos  nem pela Santa Sé que a eles estava condicionada, será por batalhas e lutas prolongadas durante vinte e oito anos que a Restauração triunfará. Tornado feriado nacional, permitirá aos portugueses consagrarem algum tempo à invocação e comunhão com o Arcanjo de Portugal, sua essência espiritual,  relembrarem-se de portugueses patrióticos e corajosos e receberem inspirações e forças para os seus trabalhos e caminhos de resistência e independência, hoje em dia tão necessários face às novas opressões tecnológicas, financeiras, sanitárias, globalistas, além do que se passa na comunicação, media e redes sociais, numa percentagem enorme vendida à alienação e repressão dos conteúdos que ponham em causa os que pretendem tornar-se os donos de uma Humanidade cada vez mais desprotegida de direitos sociais e logo explorada e manipuladapelo neo-liberalismo transhumanista ou melhor infrahumanista implementado pelo Fórum Económico Mundial, a Open Society, a Blackrock, e & e no qual direitos dos trabalhadores, planos nacionais de saúde, identidades de género, famílias, nações, tradições e religiões são neutralizadas, alteradas, manipuladas, destruídas. Em 2023, com um governo demitido, assistiu-se uns dias antes desta data histórica a uma tentativa de mudança de símbolos sagrados da Tradição Portuguesa, por parte de governantes ineptos e sabujos. Esperemos que não passe de moda passageira ditada por Ursula e seus assessores, provavelmente a mandado dos  dirigentes da oligarquia super-imperialista que têm no Fórum Económico Mundial e outras instituições congéneres, no dólar infinitamente impresso, nas individualidades e organizações não governamentais avençadas,  na indústria dos armamentos e da farmácia e nos meios de comunicação arregimentados os seus instrumentos de domínio manipulativo e destrutivo e que através da anti-democrática e insana direcção da União Europeia, tem levado os políticos portugueses no poder constantemente a agir contra o sentir, a alma e os verdadeiros interesses e objectivos de Portugal, Terra, pessoas e história, que foi é e será espiritual, fraterna e universalista, tal como tanto realçaram Jaime Cortsão e Agostinho da Silva, e deveria ser hoje de multipolaridade e não de histérica russofobia, e  de complacência com o genocídio palestiniano pelo sionismo. 
Ore ao Arcanjo de Portugal, e com o seu Anjo da Guarda, ou mestres, santos e santas preferidos, à Divindade na forma que a mais sentir (a ishta devata, na tradição indiana), e alinhe-se, fortifique-se, seja agraciado e logo corajoso na vivência e irradiação do Logos, que foi é e será a essência e objectivo do ser humano, enquanto Divindade, Amor, Inteligência, Palavra, Ordem justa ou Dharma, harmonia bela ou Kosmos, na sua peregrinação e ascensão psico-espiritual..
D. Antão de Almada, 7º conde de Avranches (1573-1644) uma alma abnegada e heróica do Portugal a ter de renascer em todos os verdadeiros portugueses.. 

Lutar contra a ignorância e arrogância dos que se opoem agressiva, opressiva ou violentemente ao Bem, à Justiça,  à Verdade, ao Amor, à Fraternidade, à Liberdade de Portugal e da Multipolaridade mundial, e vencer. 

2-II. Em S. Brás, na actual África do Sul, a armada de Vasco da Gama em 1497 descortina neste dia duzentos homens a chegarem e «começaram logo de tanger quatro ou cinco flautas, e uns tangiam alto e outros baixo, em maneira que concertavam muito bem para negros de quem não se espera música; e bailavam como negros. E o capitão-mor mandou tanger as trombetas e nós, em os batéis, bailávamos e o capitão-mor de volta connosco». Pela arte, pela dança, pelo ânimo bom belos momentos de pontes entre mundos, seres e cosmovisões diferentes se ergueram e erguem. Esperemos que no Brasil  os sucessivos governantes  respeitem cada vez melhor os Índios e a biodiversidade dos eco-sistemas protegendo as suas reservas e modos de vida tradicionais...
                                   
Bartolomeu de las Casas (1484-1566), o notável teólogo defensor intimorato dos Índios da América perante as brutalidades dos castelhanos, conclui a sua Breve Relação da Destruição dos Índios em 1542, em Valença, orando, clamando para «que o inferno seja retirado das Índias» e para que Deus não destrua a sua pátria pelos grandes pecados cometidos. A obra é proibida mas, duns poucos exemplares que escaparam, as reedições europeias multiplicam-se. Apesar de algum apoio do papa e de Carlos V a Bartolomeu de las Casas, a ganância desmedida dos europeus pela riqueza do Novo Mundo continuou a ser fatal para milhares senão milhões de Índios se formos contabilizar ainda a tragédia da ocupação das suas terras pelos norte-americanos e canadianos.
                                      
Às 14 horas de 1552, a alma e o espírito de S. Francisco Xavier desprendem-se do corpo ardente de fome, de febre e de amor prosélito, na ilha de Sanchoão, em frente da China que desejara evangelizar, e evolam-se para os mundos subtis, enquanto o seu corpo vai tornar-se um ícone, depois de transportado para Velha Goa, então a capital da Índia Portuguesa. Oito meses antes de morrer, talvez já com a mira nos mundos infinitos, escrevera a S. Inácio: «Da China conto ir até Jerusalém e quando souber a distância escrever-vos-ei».
No Hospital Real de Goa, fundado logo após a 2ª conquista de Goa por Afonso de Albuquerque, neste dia em 1702 iniciam-se aulas de Medicina pelo Dr. Manuel Rodrigues de Sousa, sucedendo-lhe o Dr. Cipriano de Valadares e Dr. Manuel Rosa Pinto, e aqui se formarão inúmeros médicos bem úteis em Goa e em todo o mundo.
Morre o poeta Floriano Barreto neste dia 2 em 1904, no Porto, quando estava a aprofundar na Faculdade de Medicina a sua licenciatura obtida na Escola Médica de Goa, com apenas 26 anos de idade e quando muito se esperava dele, tal como o grande amigo de Antero de Quental, o militar e poeta Fernando Leal, escreveu no prefácio da obra de Floriano Barreto, Phalenas. Com uma parte sobre assumptos indianos, Bastorá, 1898, redigida, tal como estas efemérides na sua versão original em livro (Livro dos Descobrimentos do Oriente e do Ocidente, 1998), nas comemorações de um centenário da chegada à Índia de Portugal:«A não ser Moniz Barreto, que tinha talento na razão inversa do seu minúsculo corpo, e com quem Floriano Barreto tinhas afinidades espirituais e físicas, não conheço nesta Índia vocação literária mais firme e prometedora». Também Bragança Cunha e Júlio Gonçalves testemunham a sua qualidade anímica e poética, o último num belo In-Memoriam no jornal Heraldo, de 28-XII-1904. Oiçamos Floriano Barreto, no seu estilo bem goês: «campos de voluptuosa relva, polvilhados de gotinhas de rocio que o sol transforma e cristaliza em diamantes, safiras e granadas, em gemas de vividos reverberos, e por sobre tudo isto, o «eterno feminino», a querida visão, com o doce luar dos seus olhos, com o encanto dos seus sorrisos, com as seduções do seu Amor!...»

3-XII. O capitão e poeta da primeira expedição francesa ao Oriente, Jean Parmentier, morre na Samatra em 1530. Talvez inspirado na obra chave da filosofia moral do Renascimento, a Oração da Dignidade do Homem de Pico della Mirandola, escreveu o Tratado em Forma de Exortação Contendo as Maravilhas de Deus e a Dignidade do Homem, um belo manifesto marítimo humanista. Os poucos sobreviventes da expedição do armador Jean Argo, de Dieppe, desalentados pela distância, e pela ferocidade indígena ou o receio dos portugueses, só terão continuadores no século XVII.
                                                          
O conde de Redondo D. Francisco Coutinho, o 8º vice-rei da Índia (de 1561 a 1564), um humanista e a quem Luís de Camões dedicou em 1563 uma ode impressa em Goa, opõe-se em 1561 às medidas fanáticas dos anteriores governadores Francisco Barreto e D. Constantino Bragança («por eu ver o muito prejuízo que disso se seguia ao serviço Del-Rei meu senhor, e ao bem desta terra»), e anuncia neste dia que os hindus fugidos às perseguições religiosas e a quem se confiscaram as propriedades, se voltassem no prazo de seis meses, receberiam de novo as terras. Mas em Lisboa as influências mais intolerantes dos meios clericais que circulam na corte não sossegam e em 1563 voltou quase tudo ao mesmo. 
Nandal Bose, notável pintor e pensador indiano, nasce em Bihar, Bengala, neste 3 do XII de 1886 e viverá até desencarnar no Shanti Niketan, o centro, ashram e universidade de Rabindranath de Tagore, a 16 do IV de 1966, gerando cerca de 7.000 obras e alguns valiosos ensaios. Enraizado na tradição indiana milenária, nomeadamente no estilo de Ajanta e de Abindranath Tagore, foi desde 1921 o director do Colégio de Artes,  Kala Bhavana na Universidade tradicional e   International de Tagore, Santiniketan, onde estive também eu em peregrinação. Após a luta inicial na família para estudar Artes e não Comércio, começou a ser reconhecido, tendo sido comissionado para importantes obras públicas do Estado Indiano.                                       

                                             
Júlio Francisco Adeodato Barreto nasce em 3/12/1905 em Margão, numa família com cultura e posses. Aos 18 anos virá para Portugal e formar-se-á em
Coimbra, em Direito e em Ciências Histórico-Filosóficas, em 1928 e 1929, revelando-se um esforçado animador e divulgador da cultura e da vida indiana, conhecida então pelas obras de Lúcio Miranda, Santana Rodrigues, Luís da Cunha Gonçalves e Telo de Mascarenhas. Funda várias instituições culturais, colabora na Seara Nova e no Diabo e dirige o jornal Índia Nova. As suas obras principais são Civilização Hindu, 1935, e o Livro da Vida (Cânticos Indianos), já póstumo, de 1940. Casou-se em Coimbra e teve cinco filhos, e exerceu a profissão de notário, sendo ainda um pedagogo, explicador, escritor e conferencista, vindo a morrer precocemente de tuberculose. A sua admiração por Rabindranath Tagore e pelo Mahatma  Gandhi está muito presente no seu pensamento e obra. Dirá: «Causticada por contínuas invasões, a Índia criou uma civilização essencialmente plástica, universalista e compreensiva». Talvez o facto dos Himalaias, materiais e espirituais, estarem em cima dela e constantemente abençoando-a, possa ser considerado também um factor da sua espiritualidade e humanidade.
Em 1937, neste dia 3-XII, em Lahore, desincarna Narayana Swamiji, o discípulo principal do notável yogi vedantino e orador  Rama Tirta. Sobre as visões disse: «Dois corações encontram-se. Há unidade. Visões são sombras e não se deve amar a sombra, mas a substância interior»; e quanto a grupos: «Não podemos ser sectários. Amor, puro amor, é onde nós estamos e vivemos».

4-XII. Em 1518 o missionário Frei António escreve ao rei D. Manuel para que se convide o capitão Krishna a visitar Portugal, o que sucederá em 1520. Mas em 1545 o intolerante padre jesuíta Miguel Vaz solicita ao rei que este seja expulso da comunicação com os portugueses, pois ao fim de tantos anos de serviço a Portugal continuava hindu. O rei anui, mas o capitão e embaixador Krishna já não regressará do reino de Bijapur, onde se encontrava então detido.
Um decreto do 9º vice-rei D. Antão de Noronha (1520-1569) datado neste dia em 1567 permite a destruição dos templos pagãos nos territórios sobre dominação portuguesa, contrariando assim os decretos do Concílio de Diamper do mesmo ano, segundo os quais as conversões não podiam ser feitas sob a ameaça da força. Desgraças dos fanatismos católicos, talvez derivados da primitiva e violenta concepção de Deus, o Jehova do Antigo Testamento, posta em causa por Jesus, mas infelizmente incorporada com o Novo Testamento na nova religião do Cristianismo, que foi assim desgraçadamente enfraquecida....
Neste 4 de Dezembro, de 1580, os restos físicos do famoso botânico e médico Garcia de Orta são queimados e as cinzas lançadas ao rio Mandovi  pelo crime de ter sido um judeu que praticava as suas crenças, ainda que às escondidas, durante trinta e seis anos na Índia. Com efeito chegara ao subcontinente indiano na nau Rainha com o novo governador da Índia, Martin Afonso de Sousa, seu grande amigo e protector, a 12 de Março de 1534. Acompanhando-o nas idas a muito locais e aí aprendendo sobre plantas e curas com vários curadores e médicos locais, de quem foi amigo, Garcia de Orta vai tornar-se um médico de sucesso, actuando mesmo como enviado para cortes que necessitavam de ajuda médica, com grande sucesso. Veio a ser um pioneiro da medicina e farmacologia tropical   ao escrever o seu Colloquios dos simples e drogas da Índia,  dado à luz na tipografia jesuíta goesa em 1563, que rapidamente será traduzido para latim e depois incorporado em parte na obra do Cristóvão da Costa, o Tratado de las Drogas, o qual Cristóvão chegado à Índia na armada de D. Luís de Ataíde, terá também grande sucesso mas não se deixará prender ao hospital de Goa e partirá até ao Extremo Oriente para se informar das mezinhas. Na sua obra regista: "y encontre en las Indias Orientales con el doctor Garcia de Orta, medico Português y varon grave de raro e peregrino ingenio". Os exemplares portugueses dos Colóquios tendo praticamente  desaparecido, será o Conde Ficalho, em 1886, na biografia que lhe dedica, e em 1891 e 1895, com os dois volumes dos Colóquios reeditados, que os tornará de novo acessíveis.
 O P. Rafael Bluteau nasce em Londres, de pai francês em 1638. Pregador arguto, sábio original e hermetista, viverá muitos anos em Portugal. Nas Primícias Evangélicas, Lisboa, 1685, oferecida a uma "doutissíma, poderosíssima e virtuosíssima princeza" (sendo que esta princesa era a livraria de D. Luís de Sousa, arcebispo de Lisboa, a quem dedicava uma oração dedicatória muito extensa), dirá que o Espírito Santo na terra «é o laço invisível, com que o homem se une com Deus pela conformidade das vontades», contribuindo assim para a elucidação do misterioso Espírito Santo, ainda hoje no séc. XXI pouco discernido...
A indo-portuguesa e francesa D. Joana Castro, a Begun, casada com o vice-rei da Índia francesa, o almirante Dupleix, e durante muitos anos verdadeira imperatriz e protectora dos portugueses, passando lamentavelmente os últimos anos de vida em Paris perseguida pela ávida Companhia das Índias Francesa, morre neste dia em 1756, com a filha e o marido ao lado. Das cartas de condolências vindas de Pondichery, a do Padre Domingos louva-a: «Era ela verdadeiramente a mãe dos pobres aflitos... Devemos crer que o Senhor foi misericordioso para com quem em vida semeou tanto bem».... Bons karmas... 
Manuel Galvão da Silva, natural da Baía, Brasil, matricula-se neste dia de 1772 na Faculdade de Matemática (tal como fará também na de Filosofia), da Universidade de Coimbra, onde foi aluno de Domingos Vandelli e será um notável cientista ao serviço da coroa portuguesa em viagens de investigação e exploração em Brasil, África e Índia, deixando o pioneiro trabalho sobre a Flora de Goa, onde descreve 163 espécies, nos dois meses em que esteve em 1783-1784, e sobre as terras, plantas e minérios de Manica e Tete em Moçambique, onde esteve até 1794. Menos luminosa foi a sua actividade comercial de levar africanos, escravizados, para fora das suas terras e gentes.
É proibida finalmente em Bengala, Índia, neste dia 4-XII de 1829 pelo governador inglês William Bentink, sob a pressão de Raja Ram Moham Roy (1772-1833) e outros pensadores progressistas do chamado Renascimento Bengali, a prática e obrigatoriedade da imolação no fogo das mulheres indianas que enviuvavam. Era a sati, já proibida na Índia Portuguesa desde o início do séc. XVI com Afonso de Albuquerque, e com Constantino Bragança estendida ao Ceilão, para além de que o imperador mogol Akbar a proibira também, possivelmente movido tanto pelo facto do Islão apoiar o segundo casamento de uma viuva, como tembém pelos missionários portugueses, segundo o orientalista goês prof. Mariano Saldanha. Finalmente, os ingleses reconheciam que «é revoltante para os instintos da humana natureza; e que em parte alguma é adoptada pela religião dos Indús como um dever obrigatório; pelo contrário um vida de pureza e de mais recato por parte da viúva é o mais aconselhado», não havendo aliás tal hábito negativo em muitas partes da Índia. Provavelmente provindo duma tendência machista feroz e criminosa, e consta que originária na casta dos Kshatriya ou guerreiros, e que depois já na Idade Media se inseriu em alguns textos religioso-sociais, constituindo sem dúvida uma prática muito cruel mesmo que desculpada se fosse voluntariamente, ou coberta sobre a ideia de que as duas almas assim continuariam juntas...  
                                      
5-XII. Nasce D. Paulo de Lima Pereira, em 1538, filho do alcaide-mór de Guimarães D. António de Lima, cultor das humanidades e das musas, intrépido navegador e lutador por trinta anos anos no Oriente, da Índia a Malaca. O notável e muito lúcido historiador Diogo Couto biografou-o, como um dos exemplos de grandes almas portuguesas. 
O P. Manuel Godinho nasce em 1630 em Montalvão, Portalegre. Depois de sete anos na Índia, o vice-rei António de Melo e Castro envia-o por terra a Portugal com correio importante sobre a cedência de Bombaim. Na Relação da sua viagem há boas descrições de povos e terras e aventuras emocionantes, mas já na apreciação religiosa quase só vê «como o demónio soube tanto contrafazer nossas coisas, para encobrir as suas».
Carta de Queluz, escrita neste dia em 1880, de D. Carlos, príncipe regente, um estudioso da natureza, para o governo em Goa em que «manda novamente recomendar a Vossa Exa. o Jardim Botânico que mandara estabelecer em Goa, para ali se cuidar da cultura das mais interessantes plantas da Índia, China e ilhas adjacentes, a fim de se fazerem transplantar para o Brasil e outras colónias». Mas também do Brasil virão alguns frutos para a Índia, tal o caju e a goiaba. Quanto às mangas, graças a enxertos, desenvolver-se-ão variedades muito saborosas, tal como a famosa Goenchó Afús, a Afonsa de Goa.
                                   
Sri Aurobindo Ghose, um dos últimos mestres da Índia, revolucionário, filósofo e místico, abandona o corpo em Pondichery,  neste dia em 1950, com 78 anos de idade terrena, no meio do pesar dos discípulos que esperavam que o corpo se mantivesse incorrupto, já que ele teria recebido a descida da Supermente. Um belo túmulo de mármore no seu ashram é ainda hoje o centro de meditações silenciosas e perfumadas, como eu próprio senti quando por lá peregrinei. Da sua vasta obra espiritual e filosófica, citaremos: «É um erro pensar que vivemos só fisicamente, com a vida e a mente exteriores. Estamos sempre a viver e a agir nos outros planos de consciência, lá encontrando outros seres e agindo sobre eles, e o que nós lá fazemos e sentimos e pensamos, as forças que recolhemos, os resultados que preparamos tem uma incalculável importância e efeito, desconhecido para nós, sobre a nossa vida exterior». O seu centro espiritual ou ashram em Pondichery e a cidade utópica de Auroville continuam a atrair pessoas...
                                   
6-XII. Está a decorrer no convento de Tomar, em 1503, desde o dia quatro e até ao dia oito, um dos mais brilhantes capítulos gerais da Ordem de Cavalaria de Jesus Cristo, participando além do seu administrador D. Manuel, a frol da cavalaria portuguesa, que se destacará desde o Brasil até Malaca, não só em batalha, mas na diplomacia, nas letras, na religião ou na paz, ainda que alguns tenham sido vítimas da arrogância, ou de outros defeitos. Que diálogos se travaram, que conselhos espirituais se trocaram entre os da via contemplativa (que habitavam no convento) e os da via activa, só a grande memória do Mundo o saberá...
                                         
Nasce em Tânger em 1537 D. Duarte de Meneses, que se notabilizará no norte de África e em Alcácer Kibir, vindo a ser o 14º vice-rei na Índia, entre 1584 e 1588, irradiando constantemente a sua coragem e bom senso. Deu especial atenção a Timor, criando o cargo de capitão-mor. O notável historiador e esotérico Faria e Sousa dirá dele: «De ânimo e de conselho e de autoridade grande, bom em latim e italiano e aficionado à Poesia, tanto que escreveu bons versos».
                                        
Nasce Max Müller neste dia 6 de Dezembro em 1823, em Dessau, na Alemanha. Dedicará a sua vida ao estudo do sânscrito e da civilização indiana, bem como à tradução das escrituras sagradas do Oriente, realizando-as com certo rigor embora por vezes os aspectos mais subtis lhe escapassem. Na sua biografia de Ramakrishna afirma: «Dentro de certos limites Yoga parece ser uma disciplina excelente, e, num certo sentido, todos nós devemos ser yogins. Yoga, como um termo técnico, significa aplicação, concentração, esforço». O Instituto Max Müller é ainda hoje em Calcutá um importante centro cultural, embora sobretudo de língua e cultura alemã.
                                        
7-II. Nasce Hyacinthe Anquetil Duperron em Paris neste dia 7 de Dezembro de 1731, quarto filho de um importador de especiarias e assim já fadado por subtis emanações para as línguas e ambientes orientais. Estudou teologia mas começou a distinguir-se nas línguas e  tornou-se um grande conhecedor não só trilingue mas ainda do árabe e do persa e  dando contributos notáveis quanto aos escritos antigos da Pérsia e da Índia, já que é a ele que devemos a primeira tradução latina da versão persa dos Upanishads indianos, mandados traduzir pelo príncipe mogol universalista Dara Shikoh, um místico e iniciado em linhas espirituais sufis e yogis. Traduzi  e comentei de Dara Shikoh algumas obras, audíveis no Youtube.
                                      
Sarada Devi, a mulher de Ramakrishna, liberta-se do corpo físico em 1892, após uma vida inteira de casto serviço ao mestre e aos seus devotos e discípulos. Disse: «O mesmo Deus está presente em vós, em mim, e no mais baixo dos mais baixos». Swami Lokeswarananda comentará: «Ela praticou esta Verdade toda a sua vida. Deixou um exemplo de como permanecer devota e fiel a Deus, à Verdade e ao Amor sob as mais adversas circunstâncias». E o prof. Satchidananda Dhar, com quem trabalhei seis meses no Instituto de Cultura, da ordem de Ramakrishna, em Calcutá, que Swami Lokeswarananda dirigia, dirá: «Apenas o serviço duma mãe é verdadeiro serviço. O verdadeiro serviço não quer nada em troca. É sempre desinteressado. Uma mãe serve as suas crianças sinceramente sem qualquer motivo. Sacrificar-se a si própria por elas parece-lhe o maior prazer». O serviço de Sarada Devi foi deste tipo e ela dirá que desde que se juntou a Ramakrishna «senti sempre como um cântaro de felicidade no meu coração».
Timor é invadido neste dia pela Indonésia em 1975, e começa mais um calvário dum povo, como outros, sacrificado aos interesses económicos dos mais fortes, mas com uma resistência tão montanhosa e abnegada, que foi possível autonomizar-se e recuperar a sua independência em 2002, após uma sofrida batalha sacrificial, e a ser respeitado nas suas diferenças e identidade própria, que já por vezes perante os portugueses as reivindicara com fereza.

8-XII. O capitão do navio francês Sagrado Raul Parmentier, da expedição à Samatra, morre em 1530 perto desta ilha. Pedro Grignon, o poeta que participou na viagem épica e trágica, eterniza-o: «O corpo de Raul que deitado foi ao mar / Para demonstrar que é digno de amar, / Os deuses marinhos com grande convicção / Recolheram-no assim como um seu semelhante. / E transmutado num ligeiro golfinho / Para neste mar salgado tudo nadar / E advertir muitas barcas e galés / Do mau tempo e da tempestade que estão para chegar».
Em 1697 parte para a Índia o P. Appiani, da Congregação da Propaganda da Fé. No relatório final ao Papa em 1702, elogia os missionários jesuítas de Madurai por terem encontrado o segredo da conversão dos gentios, ao sujeitarem-se a viver à maneira estranha, mortificada e penitente dos religiosos gentios, não comendo carne nem peixe, nem álcool, e apenas arroz, vegetais e yogurte. Elogia também a obra no Ceilão, onde se destacou o P. José Vaz, hoje santo. Foi o P. Roberto da Nobili um dos que iniciou esta aproximação de espiritualidades e religiões e que ainda hoje tem os seus seguidores: padres cristãos que vivem e vestem-se como os renunciantes e monges indianos, usam orações e liturgias das várias tradições indianas, vivendo em ashrams, centros ou eremitérios, destacando-se (e neles estive) Shantivanam perto de Tiruchi, e o da irmã Vandana Mataji, em Laxman Jula, perto de Rishikesh, onde no mandir, templo, se encontram murtis, estátuas religiosas dos mestres, e se cantam os bhajan, hinos, das diferentes religiões, numa vivência ecuménica. 
                                            
É fundada por D. João V a Academia Real  da  História Portuguesa neste dia em 1720, nascida da aspiração e empenho de Francisco Xavier de Menezes, 4º conde da Ericeira, e de D. António Caetano de Sousa e contará entre os seus académicos pensadores que se distinguirão nas zonas  ou nos estudos orientais, e  publicará várias obras importantes. O insigne pintor Vieira Lusitano abrirá uma bela gravura alusiva à criação da Academia, que contudo terminará em 1776, com muitos dos seus membro a entrarem na Academia Real das Ciências de Lisboa, que se fundará  em 1780. 
                                         
 Nasce Charles Bennet, neste dia, de 1872, em Londres, e será um notável pesquisador  da verdade, do espírito, do caminho da libertação, passando pelo ocultismo, vivendo vários anos no Oriente,  e findando no Budismo, onde recebeu o nome de Ananda Metteyya que acabou por trazer do Ceilão para Inglaterra, e sendo amigo e inspirador de Aleisteir Crwley, Cassius Pereira, Christmas Humphreys, Paul Brunton, etc.  Morrerá cedo, pela saúde pulmonar fraca, aos 50 anos, mas  fundara a Buddhist Society of England and Ireland e proferido muitas conferências e publicado livros valiosos, tal The Wisdom of Aryas, sendo de certo modo o introdutor do Budismo em Inglaterra.
                                             
9-XII. Faz hoje anos o infante D. Pedro, o das Sete Partidas, nascido de D. João I e D. Filipa de Lencastre, em 1392. O corpo da sua empresa era uma balança, com a divisa Désir, desejo-aspiração-amor do Amor e do Bem, em ramos do áspero carvalho, uma das árvores mais características de Portugal. Fernando Pessoa cantou-o ou celebrou-o assim na Mensagem: «Claro no pensar, e claro no sentir, / E claro no querer; / Indiferente ao que há em conseguir / Que seja só obter; / Dúplice dono, sem me dividir, / De dever e de ser». Estudioso, culto, viajante e diplomata europeu, infausto no final da sua valiosa regência de Portugal de 1438 a 1448, ao ser morto em 1449 na batalha de Alfarrobeira, desproporcionada numericamente face às forças ou tropas do seu sobrinho, rei D. Afonso V, de 15 anos de idade então, muito manipulado pelo invejoso duque de Bragança. O próprio cronista real Rui de Pina dirá na Crónica de El-Rei D. Afonso V: «o juizo del-Rei por sua não madura idade e pelas falsas opiniões em que a criavam, andava de todo enovoado». D. Pedro respeitou as vozes municipais e apoiou os Descobrimentos, sempre sábio e independente, tal como afirmou no conselho reunido para deliberar a ida falhada a Tânger: «O principal intento é servir a Deus; peço-vos por mercê que saibais como o deveis fazer, e não como quereis ou podeis». Tinha por isso também como empresa um rochedo atravessado por uma espada, empunhada por uma mão saindo das nuvens, símbolo da união da sua vontade, na matéria mais densa, com a vontade divina, ou da sua acção e intuição. Deixou-nos o Livro da Virtuosa Benfeitoria, a arte de fazer e viver o bem firmemente, em grande parte uma tradução de Cícero, escrevendo na dedicatória a seu irmão e rei D. Duarte: «o sabedor de feitos alheios não tem em costume julgar de ligeiro (...) e assim as nossas vontades sempre fundemos em as perfeições mais altas e maiores das nobres virtudes». O Livro das Sete Partidas do Infante D. Pedro, de Gomes Santo Estevão, de 1515, ou mesmo de antes,  narra as suas viagens e feitos miticamente e será um livro de imenso sucesso na Península Ibérica, um popular livro de cordel de cavalaria durante séculos, que o próprio D. Quixote, de Miguel de Cervantes, citará. Nas últimas décadas muitos estudos lhe têm sido dedicados, tendo sido publicadas as Actas do Congresso Comemorativo do 6º Centenário do Infante D. Pedro, 1992, com 27 comunicações de reconhecidos historiadores, mas mencionaremos ainda as obras de Lita Scarlati, Artur Moreira de Sá, Júlio Gonçalves, Fernanda Durão Ferreira e Alfredo Pinheiro Marques. D. Pedro das Sete Partidas, um cavaleiro ou fiel do Amor, é um dos mestres da grande Alma Portuguesa e da sua Tradição Espiritual.
André de Resende, um dos maiores humanistas portugueses, formado em Salamanca, Paris e Lovaina, autor dum elogio de Erasmo, educador de príncipes, poeta, antiquário, morre em 1573 em Évora, onde por mais de uma vez pregara sobre a Igreja que é o corpo místico de Cristo, e por isso sempre pura e verdadeira, e a Igreja dos eclesiásticos, corrompida, dissoluta e a precisar duma urgente santificação. Seguindo Cícero, considerou «o fazer guerras mais próprio das feras que dos homens». Um estudo valioso foi-lhe dedicado pelo nosso sábio humanista e autor da Utopia III, José Vitorino de Pina Martins.
Morre a Sóror Maria da Ressurreição, prioresa do convento de Santa Mónica em Goa, em 1658, deixando uma relação da sua vida. A prioresa seguinte foi uma das duas filhas do governador do Estado Fernão de Albuquerque, a Madre Sóror Guiomar da Presentação que tanto soube ser prelada varonil na defesa do convento, como vidente, pois meditando na Paixão, terá conseguido ver o mestre Jesus, ouvindo-o responder aos seus anseios compassivos e amorosos «que não só lhe dava a Sua cruz, mas a si mesmo», no que muito se fortaleceu. A ocorrência destas visões de Jesus nas biografias de muitas das místicas tanto pode indicar a ligação delas ao Mestre no seu corpo espiritual, como ser o produto do condicionamento das imaginações e almas.
Denunciada e abortada em Goa a conjuração dos Pintos (vários da mesma família), são sentenciados em 1788, quinze réus a pena máxima, cinco a degredo e cinco a açoites. Quatorze padres são remetidos para Lisboa, sendo mais tarde vários absolvidos por D. Maria I. Pouco antes da revolução de 1789 em França, e da Inconfidência de Ouro Preto no Brasil, era sinal da crescente consciência do desassossego legítimo perante muitas incúrias e injustiças. O Abade de Faria foi um dos inconfidentes e que emigrado para França se destacará no campo do sono lúcido e do magnetismo adquirindo grande fama e influenciado muitos curadores e magnetizadores. A sua obra Le sommeil lucide é ainda hoje de referência.

                                       
10-XII. Morre em Goa, com 74 anos de idade e 60 de Índia, em 1616, Diogo de Couto, estudante brilhante, soldado valeroso, poeta, cronista-mor, guarda-mor da Torre do Tombo. Autor das melhores descrições críticas dos portugueses no Oriente, tanto nas suas Décadas, que continuaram as de João de Barros, como na visão muito realista das causas da decadência lusa expressa nas suas duas versões do Soldado Prático. Foi amigo e protector de Camões, a quem chamava o «Príncipe dos Poetas». Traumatizado por tanta negatividade na expansão lusa, desabafará: «O pior que lá há fomos nós, que fomos danar terra tão maravilhosa com nossas mentiras, falsidades, burlas, trapaças, cobiças, injustiças e outros vício que calo».
Decreto da proibição de exportação de escravos em todos os domínios portugueses em 1836. A abolição desta situação humana verdadeiramente má só virá em 1858. Foi uma das actividades que não se coadunava com o cristianismo de reis ditos tão católicos, como D. Manuel, D. João III e seus sucessores, se bem que fosse prática mais ou menos comum em África, entre tribos e sobretudo pelos árabes e islâmicos que os vendiam aos europeus, e as condições de vida de alguns pudessem por vezes em certos aspectos até melhorar, se tivessem a sorte de encontrar quem fosse mais humano ou mesmo gostasse deles. Se o cronista Gomes Eanes Azurara, fundador da historiografia portuguesa, já se condoera com a sorte das famílias separadas, será o sábio e austero humanista Sá de Miranda quem mais lapidarmente eternizará tal tragédia: «Spritos vindos céu, postos a lanços na praça», frase que o meu ilustre amigo e especialista de Sá de Miranda prof. José V. de Pina Martins, gostava de citar de cor, empaticamente com tal trágica e condenável situação.
Chega a Goa neste dia em 1871 num vapor inglês o infante D. Augusto, o primeiro príncipe europeu a vir a Goa, para ajudar a apaziguar a contestação (para não serem extintos, e por melhores condições) de algumas unidades do Exército da Índia, e para ser o executor do decreto de Jaime Moniz da extinção do Exército. Distingue-se mais nos banquetes e festas, tentando ainda resolver o problema dos militares que iriam para o desemprego, a pedido das suas famílias.

11-XII. Parecer do Conselho de Estado reunido em Madrid, em 1623: «É forçoso procurar ajudar a Índia com algum dinheiro, e apertar os ministros de Portugal para que façam as diligências que possam para este socorro, e principalmente ordenando-lhes que se tenha muito cuidado, com que a gente que enviarem seja efectiva e lúcida, e não canalha tomada à força, e homens condenados à morte por seus delitos, como costumam fazer, pois se vê, que estes tais não podem ser de proveito, para nenhuma coisa boa». Contudo, uma lei dos Reis Católicos em 1497 concedera «perdão geral aos delinquentes que iriam servir à sua própria custa dois anos, os que mereceram morte, e um os que mereceram menos».
                                     
Sri Bhagavan Rajneesh nasce neste dia em 1931 na Índia. Um dos mestres mais controvertidos deste século, com grande capacidade de discurso ou satsang mas também com um ego talvez subtilmente inflacionável, iniciou milhares ocidentais em práticas espirituais das mais diversas proveniências em vivências e ambientes, ora de descondicionamento total ora de certa manipulação, suscitando grandes momentos de amor e de luz e também desequilíbrios e escândalos, perseguições e opressões, na Índia e nos Estados Unidos da América, onde esteve mesmo preso, vindo a deixar o corpo em 1990. Também conhecido por Osho, os seus livros obtêm grande sucesso e, mesmo depois da morte, centros em vários países e discípulos mantêm, ainda que mais capitalisticamente, a gestão do património de técnicas e práticas por ele aconselhadas. «Eu digo que o homem é mais do que todas as suas acções e todos os seus pensamentos. E a não ser que este mais seja conhecido, ninguém se conhece... O pensamento está sempre no conhecido. Deitá-lo fora e entrar em contacto com o desconhecido é o que eu chamo meditação», apontando para a superação da discursividade mental e a importância da autoconsciencialização e unificação, no silêncio, no amor, na contemplação, nas aspiração do coração...
12-XII. Começa o assédio a Goa de dez meses, em 1570, por um exército do Âdhil Khân comandado por Nori Khân, da coligação de príncipes do Malabar que atacava simultaneamente Chaul e Cochim. Seriam mais de cem mil homens, mas D. Luís de Ataíde, reforçado pela esquadra de Malaca, vai constantemente fazer surtidas vitoriosas e acabará por impor-lhes uma contundente derrota. Pouco depois, este cavaleiro da Ordem de Cristo, que fora armado cavaleiro junto ao monte Sinai por D. Estêvão da Gama, regressava a Lisboa e era recebido com grandes honras, em procissão à direita do rei. Mas não aprovando a incursão ao norte de África, voltará em 1577 para a Índia a fim de cumprir mais três anos como vice-rei.
D. Ana de Espanholim, mulher do governador da Índia (1588-591) Manuel de Sousa Coutinho, em 1591 confessa as culpas de «tratar misticamente com feiticeiros gentios», abjura e paga mil pardaus de multa. O governador, então cessante, e o filho escapam pela sua alta posição, embora os processos sejam enviadas para Lisboa, onde se juntariam a um inquérito sobre os seus actos de administração. Mas. na viagem de regresso, um naufrágio em Gujarau poupa dos sinistros interrogatórios o arrojado Manuel de Sousa Coutinho e envia-o com a mulher e os três filhos para as dimensões subtis do mundo, restando a dúvida sobre o que teria perguntado aos brâmanes de Goa., provavelmente astrólogos.                  
António Manuel Vilhena, grão-mestre da Ordem de Malta desde 1722, distinto pela coragem, o humanitarismo e as grandes obras de arquitectura e fortificação que fez edificar na ilha, morre neste dia em 1736, com 73 anos, deixando gratas memórias e o seu nome numa pequena ilha onde erguera uma fortaleza.
                                          
13-XII. O rei D. Manuel morre em 1521, ao fim de 26 anos de reinado, deixando Portugal transformado num vasto império marítimo, à custa de bravos navegadores, guerreiros, governadores, missionários e comerciantes, mas no qual os gérmenes da decadência se avolumavam pela incapacidade de adequarem-se os objectivos aos meios e de controlarem-se as grandezas, luxos e improdutividade que a riqueza dos monopólios das especiarias alimentava por um fugaz momento, para além de faltar-lhe uma base universalizante que pudesse conter ou receber as vários povos com as suas tradições e religiões, com o mínimo de opressões e destruições, algo que o humanismo de Erasmo propunha mais do que o missionarismo de Loyola e de vários dos jesuítas. A arquitectura manuelina é sem dúvida o seu melhor testamento e nela ficaram inscritos, por sábios construtores nos cânones sagrados, tanto  símbolos de sonhos imperiais e até  messiânico, já que um Em manu el, pode ler-se como  "ser divino está connosco", como os sinais de uma demanda iniciática ou de mais plenitude espiritual, que alguns poucos prosseguiram, os denominados Fiéis ou Cavaleiros do Amor.
                                          
Nicholas Roerich, o genial artista e mestre russo, morre neste dia em 1947 em Kulu Valey, nos Himalaias, onde passou os últimos 20 anos de vida (nascera em 1874) no seu Instituto Urusvati, base de partida para grandes expedições à Ásia Central. Adepto da unidade essencial do espírito na diversidade das religiões e tradições, pintou mais de 7.000 pinturas e escreveu sobre as suas viagens, as tradições religiosas e espirituais mais valiosas e sobre os mestres do Oriente e do Ocidente, ou mesmo inspirado por eles, considerando-os fazerem parte duma pan-humanidade. Sobre o ser feminino dirá: «Mulheres, sem dúvida vós tecereis e desfraldareis o estandarte da Paz. Destemidamente erguer-vos-eis para proteger os aperfeiçoamentos na vida. Acendereis um belo fogo em cada coração que criará e encorajará. Direis às crianças a primeira palavra sobre a beleza. Pronunciareis a palavra sagrada, Cultura». Os seus livros são dedicados aquela que com ele escreveu os livros de Agni Yoga e um rico epistolário, hoje em parte publicado, a «Helena, minha mulher, amiga, companheira de viagem, inspiradora. Cada um destes conceitos foi testado no fogo da vida. Juntos criámos e alargámos a consciência». Saibamos prosseguir na senda luminosa inspirados por estas grandes almas, sós, em casal ou em grupo, inspirados até por esta bela pintura de Nicholai Roerich,  "O Mensageiro".
  Vasco da Gama, o Grande Argonauta e Almirante dos Mares da Índia será o título do discurso do Monsenhor Dr. José Filipe Mendeiros, proferido no V centenário do nascimento de Vasco da Gama, na Escola Industrial e Comercial Vasco da Gama, neste dia 13 de Dezembro, em 1969. Depois de biografar Vasco da Gama e contextualizar a origem do feito, passa a enaltecê-lo, comparando-o aos profetas, e afirmará, já depois da reintegração de Goa na União Indiana, e  que o Cristianismo não se perderá na Índia. Nascera em 1911 em Estremoz, doutorara-se em Teologia e foi professor, reitor e director em várias instituições de ensino.
                                        Fotografia do Monsenhor José Filipe Mendeiros
14-XII. O jesuíta Antão Proença morre neste dia em 1666, após 19 anos de apostolado em Madurai, riquíssima região de templos e de yogis, com quem se viu confrontado por vezes em debates difíceis. Nesta zona os jesuítas iniciaram uma missionização apresentando-se como os renunciantes conhecidos no hinduísmo como pandaras. que podiam conversar com as castas superiores e os párias, passando também a chamar-se pandaras, e vestindo-se como eles. Em Tricherapali conseguiu mil e tal baptismos em populações sempre prontas a seguir mestres e a ser iniciadas no que as possa aproximar mais da salvação e da felicidade. Diz-se que o seu corpo, transladado, ao fim de 27 dias estava ainda flexível.
Carta do padre missionário santificado S. José Vaz escrita neste dia em 1688 no Ceilão: «Para minha reforma e aproveitamento espiritual entranhavelmente desejo recolher-me a essa clausura e viver nesse pequeno rebanho, à vista de Superior e irmãos; porque, por meio do bom exemplo e santo exercício que nele há, poderei alcançar de Deus o fogo luminoso com que o frio do meu coração se possa aquentar, e esclarecer o escuro do entendimento, e queimar-se o vicioso do apetite voluntário. Mas, quando vejo o desamparo desta cristandade, me acho mais desejoso e obrigado a não largá-la, senão quanto, e enquanto, com a ajuda de Deus, posso ajudá-la». Os dilemas da vida contemplativa e da vida activa, e a tripla divisão da alma: sensitiva, intelectiva e voluntária, com as suas questões de harmonização.
 
15-XII. É impresso em casa de João Barreira, à rua de São Mamede, em Lisboa, em 1563, o Tratado que compôs o nobre e notável capitão António Galvão, dos diversos e desvairados caminhos, por onde nos tempos passados a pimenta e a especiaria veio das Índias às nossa partes, e assim de todos os descobrimentos antigos e modernos, que são feitos até à era de mil quinhentos e cinquenta. Com os nomes particulares das pessoas que o fizeram: e em que tempos e as suas alturas, obra certo muito notável e copiosa. Nas edições posteriores passou a intitular-se mais sinteticamente o Tratado dos Descobrimentos e não o dos Desvairados Caminhos das especiarias. Nele António Galvão recua bem as origens da história: «Diz Platão, nos Diálogos de Timeu Eclísio, que houve antigamente no mar oceano Atlântico grandes ilhas e terras chamadas Atlântidas, maiores que África e Europa, e que os reis daquelas senhorearam muita parte desta nossa... A mesma ilha de Cádis se afirma ser tamanha que se juntava à terra de Espanha, e que as ilhas dos Açores eram uma ponta das serras da Estrela, que se mete no mar na vila de Sintra». Os feitos dos navegadores relatados na obra não se restringem aos portugueses.
O jesuíta Manuel Godinho (1630 ou 1634-1712), natural de Montalvão, retorna de Goa por terra a Lisboa em 1662-1663, numa viagem de nove meses, pela Pérsia, Mesopotâmia, Síria, Alepo, Marselha, em missão diplomática patriótica, enviado pelo Vice Rei D. António de Mello de Castro, para descrever as fraquezas da defesa portuguesa na Índia e para impedir a entrega de Bombaim aos ingleses. E publica em 1665 a sua Relação do novo caminho que fez por terra e mar vindo da Índia para Portugal, obra repleta de argutas informações históricas e antropológicas. Sobre a sabedoria da Índia dirá que para ela «a alma do homem não é natural e verdadeira forma do corpo humano, senão que lhe assenta somente, governando-o como um arrais a barca, ou ao cavalo o que vai em cima», e que há "traspassação" ou transmigração das almas de uns corpos para outros. Demitiu-se de ser jesuíta, pois o Geral Oliva não aprovara o seu patriotismo, e foi prior da Vila Santarém,  e da paróquia de Loures, que recebeu da rainha regente D. Maria Luísa de Gusmão, onde morrerá com 78 anos de idade, em 1712, tendo deixado ainda algumas obras religiosas publicadas.
Neste dia, em 1640, o rei D. João IV presta juramento, no Terreiro do Paço, em Lisboa: «Juramos e prometemos com a Graça de Nosso Senhor, vos reger e governar bem, e direitamente, e vos administrar inteiramente justiça, quanto a humana fraqueza permite, e de vos guardar os vossos bons costumes, privilégios, e graças, mercês, liberdades, e franquezas, que pelos Reis passados, nossos antecessores, foram dadas, outorgados e conferidos». Antes dele, o Dr. Francisco de Andrade Leitão, declara que todos poriam pelo Rei fazenda, sangue e cabeça, porque estão persuadidos, certificados, e muito inteirados, que defendem justiça, porque sem ela nenhuma república pode ir em crescimento; que os há Vossa Majestade de os sustentar e manter em paz, quando for possível, porque com ela crescem as coisas pequenas, as grandes se fazem maiores, e com discórdia e mau governo, se extinguem, perecem e acabam os impérios; e que lhes guardará, e fará Vossa Majestade guardar suas leis, seus usos e costumes louváveis, seus foros, seus privilégios, isenções, suas liberdades, prerrogativas, proeminências, e franquezas, fazendo-lhe em tudo honra e mercê, porque com elas se concilia mais o amor dos vassalos, em que consiste a maior riqueza, e a maior opulência dos Reis».
Tratado em 1678 entre os portugueses e a rainha Chennamma de Keladi, no qual aqueles são autorizados a erguer igrejas na zona da sua feitoria de Mangalore, a viajar pelo reino, os cristãos a serem julgados pelo feitor e os sacerdotes sendo só proibidos de converterem à força.
                                  
John George Woodroffe nasce neste dia 15 de Dezembro de 1865 e depois de ter estudado e licenciar-se em Oxford começou a advogar , mas partindo para a Índia foi juiz e jurista e tornou-se um notável estudioso e especialista do Tantrismo, publicando e comentando pela primeira vez para o Ocidente alguns dos textos clássicos desta tradição mais heterodoxa do hinduísmo, sendo ainda hoje valiosos. Foi mais conhecido pelo seu pseudónimo de Arthur Avalon.
                                    

Swami Ranganathananda nasce neste dia de 15 de Dezembro de 1908, no sul da Índia, em Kerala, e ainda na escola (na qual gostava mais das pessoas e dos jogos que dos estudos) recebeu aos dez anos um sonho forte no qual viu o Deus, ou a forma divina de Shiva, no cimo de uma montanha, o que intensificou muito a sua devoção. Depois, ao ler aos quatorze anos o Evangelho de Sri Ramakrishna (1836-1886), ficou tão impressionado pela pureza e espiritualidade da vida do mestre, o que aumentou ainda ao ler os discursos do seu discípulo Swami Vivekananda, que resolveu entrar na Ordem de Ramakrishna aos 17 anos sendo ordenado monge  pelo swami Shivananda (1854-1934) que era um discípulo directo de Sri Ramakrishna. Acentuará em vários livros que a cultura ocidental tem desenvolvido a sua dimensão profunda graças também aos contactos com a sabedoria milenária do Oriente, pois a Humanidade é una, e na obra Ciência e Religião afirma: «O ambiente moderno e os problemas ecológicos talvez estejam a tornar impopular a tecnologia, ou melhor a tecnologia a mais, especialmente nos países avançados; mas ciência pura, com a sua paixão pela verdade e pelo bem estar humano, permanecerá sempre como uma das mais nobres demandas do ser humano; e o nosso país que nutriu este amor e demanda da verdade nos campos das ciências físicas, religião e filosofia no passado, deve continuá-la a alimentar em todos os campos na idade moderna. Religião e Filosofia na Índia, como nos são dados pela nossa tradição dos Upanishads, são apenas a continuação da procura científica da verdade ao nível dos dados sensoriais, nos níveis de experiência mais elevados de estética, ética e espiritualidade». Esta complementaridade entre o conhecimento mental e objectivo e o intuitivo e espiritual é indispensável ao nosso desenvolvimento harmonioso de seres espirituais incarnados em sociedades cada vez mais regidas pelos parâmetros realistas, pragmáticos, e mais recentemente tão opressivos, para não sermos alienados e massificados por eles, e para abrirmos espaço anímico para novas energias, informações e valores, e que tanto a meditação unitiva com o espírito (ou Atman) como a acção dharmica, a baseada no dever que está acima do egoísmo genético e animal, proporcionam ou geram bem criativamente..

16-XII. A chegada a Goa do emissário do Preste João, o arménio Mateus, leva o governador Afonso de Albuquerque a escrever ao rei D. Manuel neste dia em 1512: «Recebemos o Embaixador com procissão e viemos até à igreja com ele e ali pregou um frade pregador, e nos mostraram a Vera Cruz e no-la deram a beijar a todos, e tocámos muitas jóias nela». «Se Vossa Alteza visse o que vai na Índia depois que souberam que este era embaixador do Preste João parecer-lhe-ia prognóstico de alguma mudança grande — tão assombrada está a gente da Índia. Prazerá a Nosso Senhor que será começo da destruição da casa de Meca, que a mim parece mui pequeno feito de acabar, porque é terra muito fraca, e gente sem armas; os alarves vivem muito longe; na cidade de Meca não há senão gente de contas de rezar na mão, e alfenados sem nenhuma arma. Em Judá haverá aí 150 mamelucos que assenhoreiam e colhem esses direitos». Assim contribuía Albuquerque para a continuação da mitificação dum reino cristão aliado no Oriente, mas oposições não faltaram ao embaixador, desde o intérprete Gaspar da Gama, que levanta as mais graves e falsas acusações, aos que o levaram de barco e com tal brutalidade até Portugal, que o rei teve de os prender. Quanto à conquista de Meca não estava nos desígnios da Providência certamente...
                                   
Deixa o campo de batalha terrestre o terrível, mas íntegro, Afonso de Albuquerque em 1515, neste dia, à entrada de Goa, regressando da reconquista de Ormuz e já sabendo que os que vêm para o substituir eram contra ele. Manda arrear a bandeira da nau à entrada da barra de Dabul e a sua alma liberta-se por fim dos conflitos terrenos. Na carta ao ingrato ou manipulável rei D. Manuel, diz-lhe: «Senhor, esta última escrevo a Vossa Alteza com os soluços precursores da morte. Um filho, por nome Brás de Albuquerque deixei nesses reinos, peço-lhe mo faça grande como meus serviços merecem, os quais eu fiz por minha serviçal condição; pelo que a ele mando que, sob pena de minha bênção, vo-lo requeira. Quanto às coisas da Índia elas falarão por si e por mim». Os choros pela sua morte, de todas as nações e religiões, particularmente das mouras que tinha casado, falaram logo dele. A Brás de Albuquerque devemos os Comentários ao Grande Afonso de Albuquerque e a casa dos Bicos, construída com algo dos méritos e frutos de Afonso de Albuquerque, e uma das poucas que resistiu ao terramoto de Novembro de 1755, hoje transformada em casa museu Saramago. 
 O orientalista Francisco Esteves Pereira, na sua notável apresentação de uma versão setecentista resumida  da Bhagavad Gita, transcrita e publicada pela 1ª vez em Lisboa em 1922, diz-nos: «A Bhagavad-Gîtâ não tem para os habitantes do Estado da Índia Portuguesa um interesse meramente filológico e literário; esta obra é tida em grandíssima veneração, e considerada como livro sagrado pelos que professam como religião o Hinduísmo, particularmente o Vixnuísmo. E o Estado reconheceu o seu carácter sagrado, pois que por um bando (ordenança) foi determinado que « dos Bramanes se devem tomar os juramentos sobre o Livro ou Pustaca de Xri Bhagavat Guitá»; o que foi confirmado pelo artigo 27.º do Decreto de 16 de Dezembro de 1880, nos seguintes termos: « Os hindus brahmanes prestarão sempre em juízo juramento da Pustaca de Xri Bhagavat Guitâ, e os de outras castas o de coco, betle, areca e arroz»
                                  
Nasce em 1906 Bede Griffiths, monge beneditino inglês que manterá vivo o ashram cristão de Shantivanam, perto de Tiruchi e que, se como S. João de Brito se vestia à monge indiano, foi muito mais longe que este na compreensão da unidade espiritual subjacente às religiões, colaborando no crescente diálogo inter-religioso, na sua longa vida de 87 anos. Baseado no precedente do neo-platonismo de Plotino adaptado por S. Gregório de Niza e Dionísio Aeropagita, dever-se-ia agora desenvolver uma espiritualidade cristã indiana, recorrendo à imensa sabedoria indiana, que considerou de uma profundidade superior até à grega. Tentando ultrapassar a oposição vida activa e vida contemplativa, Marta e Maria, dir-nos-á: «A contemplação é um hábito da mente que permite à alma manter-se num estado de recolhimento na presença de Deus qualquer que seja o trabalho em que está ocupado». Com Bede Griffiths dialoguei e meditei algumas vezes, ao passar um mês no seu ashram, em que as actividades do dia a dia combinavam bem o cristianismo e os contributos indianos, que ele com grande sinceridade demandava na sua busca de síntese e de realização íntima... 
17-XII. O grande mestre espiritual Mawlana Jallaludin Muhammad Balkhi Rumi, nesta noite de 17 de Dezembro, mas de 1273, deixou o corpo e a terra física, em Konya, e elevou-se para os mundos espirituais, onde certamente Sham de Tabriz e outros mestres o esperavam e saudaram, na fraternidade dos Irradiantes da Luz Primordial e na comunhão com a Divindade. É uma noite de meditação maior para os sufis. Nascera em Balk na Pérsia, em 30 de Setembro de 1207, duma família já de seres dedicados à busca espiritual e religiosa, pois o seu pai era discípulo da linha do mestre Najm al Kubra (grande teorizador das cores vistas na meditação), e é considerado um dos maiores mestres sufis de sempre, tendo deixado uma vasta obra de poesia amorosa-espiritual, o Masnavi, em persa, que atravessará os séculos. Fora inspirado fortemente pelos poetas espirituais Attar e Sanai e depois pelo discípulo-irmão de coração de Shams de Tabriz, de tal encontro e amizade resultando vários ghazals, poemas, reunidos no Diwan Shams Tabrizi. Viajou ou peregrinou bastante pelo seu país natal o Irão, e também  Iraque,  Síria e Turquia (actuais...), encontrando-se, dialogando e meditando com muitos sufis, e fundou a Ordem Mevlana, de derviches, em Konya, na Turquia, onde ainda hoje o seu ensinamento se perpetua e celebra, bem como em várias partes do mundo. E muito da sua vibração e bênção está  no fabuloso mausoléu dele e dos seus discípulos, aonde eu peregrinei e meditei há já uns anos, vindo por terra da Índia, e sentindo bem fortemente o infinito e invencível Amor divino que o animou e em nós pode também ser vivenciado. 
Eis uma escolha final de alguns dos seus ditos perenes ou imortais: «É no campo de batalha que dançam e rodopiam os homens. É no seu próprio sangue que eles rodopiam».«O ser de Deus está para além da infidelidade e da religião. / Para o ser de Deus o certo e o errado são iguais». «O peixe que conhece a água não volta à terra».«Olha para a face do Amor, para que possas ser verdadeiramente um ser humano».
 Carta do Vigário de Malaca em 1514: «E eles claramente me disseram que a principal coisa porque vinham à Índia não era senão levarem muitos cruzados, dizendo o padre que se não contentaria se ao cabo de três anos não tivesse feito 5.000 cruzados e muitas pérolas e muitos rubis».
Os padres jesuítas António de Almeida e Miguel Ruggieri internam-se de barco por formosos rios rumo a Pequim e o primeiro observa, em carta datada deste dia em 1585, «que passada a província de Cantão não tem a China aqueles assombramentos de estrangeiros, antes todos nos tratam com mais reverência que em Xauquim». Em Janeiro 1586 chegam ao seu objectivo, a corte imperial de Pequim, mas será com dificuldades que catequizarão. Serão porém o P. Mateo Ricci e em seguida os jesuítas cientistas que conseguirão ver-se aceites pela corte, transmitindo a cultura ocidental, recebendo a sabedoria oriental e convertendo algumas pessoas.
Os estudantes indianos da Universidade de Coimbra, Joaquim de Santa Rita Colaço, Matias Micael E. de Lemos, José P. Santana Desiderio Lucas Teles, Júlio F. Adeodato Barreto e João dos R. Reis e Costa, neste dia 17-XII, em 1926, considerando a necessidade um intercâmbio indo-português, escrevem ao reitor Mendes dos Remédios, propondo «a fundação de um Instituto Indiano na Faculdade de Letras, com Biblioteca, Sala de Estudos, e, oportunamente, cadeiras de sânscrito e Literatura Indú em geral». «Reputamos deprimente para o brio português o não haver ainda nesta terra, à falta de orientalistas da envergadura dum Max Müller, dum Paul Deussen ou dum Sylvain Levi, pelo menos uma atmosfera de interesse pelos estudos indianos. O fanatismo religioso que levava em Goa o Santo Ofício a queimar livros de toda a espécie sob a crença apriorística de serem tratados de feitiçaria - e cuja tradição leva talvez hoje em dia a pôr uma barreira cultural entre a Índia e Portugal - não tem nenhuma razão de existir, como nós cremos que o espírito culto de V. Exª. entende, (...). Portugal saldaria assim uma dívida antiga para com a Índia.» Contudo seja por desapoio de Mendes dos Remédios, seja pelo nascente regime salazarista, o Instituto não passou de uma utopia...  
O capitão António de Noronha Paulino, irmão de minha avó, natural de Pangim, no seu livro Relembrando Goa, dado à luz em Lisboa, em 1963, escreve, ainda entristecido pela inevitável passagem de Goa para a União Indiana: «Consumatum est!... 17 de Dezembro de 1961! Dia terrivelmente fatídico, de dobre de finados, dia tenebroso que jamais sairá do pensamento e do coração dos portugueses, por mais anos que rolem! Dia de luto, de pesado luto, que vai até ao mais íntimo do nosso ser  e que nos amarfanha a alma! Dia em que Goa, a nossa querida Goa, nossa há mais de quatro séculos, foi invadida e tomada brutalmente por um imenso exército de 30 mil homens, com um material bélico dos mais modernos - navios de guerra, aviação a jacto, tanques, artilharia de longo alcance, armas automáticas, etc, etc., ... contra 3 mil portugueses mal armados, com deficiência de tudo! E isso - pasmai, oh gentes! - por ordem, por determinação desse «pacifista», discípulo directo do Mahatma Gandhi,  que deambulava por aí com uma pomba de paz nos ombros!!» (...) « Mas através dessa vilania praticada contra Portugal, ficou e ficará, sabe Deus até quando, o terrível drama do goês! Goês, nosso irmão - que a alma lusa, aliada ao velho espírito hindu, realizou, através dos séculos, um tipo curioso de simbiose espiritual euro-asiático. O goês, ou melhor, o indo-português, tem hoje - como bem diz Lúcio de Miranda no seu interessante livro Índia e Indianos - uma feição moral própria, que se distingue dos outros indianos, quer sejam cristãos, quer sejam hindus, há sempre nele um traço psicológico que denota a longa influência portuguesa, exercida em mais de quatro séculos de íntimo convívio, e isso constitui a linha predominante da sua personalidade».
18-XII. A cruz de S. Tomé, encontrada em 1547 ao cavarem-se os alicerces da igreja a dedicar a Nossa Senhora da Expectação no local do seu martírio em Meliapor, em 1561, dia de Nossa Senhora da Expectação, exuda um líquido, entre o suor e sangue, e repeti-lo-á em outros anos. O jesuíta Hipólito Desideri (21-12-1684 a 14-4-1773), um dos missionários pioneiros do Tibete, que por aqui passou em 1726, ouve dizer que «quando muda a sua cor do cinzento original para um castanho avermelhado e um branco brilhante, e é envolvida num líquido espesso e sua, pressagia alguma infelicidade para a nação portuguesa». 
Nasce Heinrich Roth, em 1620, em Dillinguen, Alemanha, onde estudará no colégio e universidade, até se tornar jesuíta e professor de Filosofia. Foi enviado para missionar a Etiópia mas como estava fechada já a missão, chegou a Goa em 1652 onde pastorou em Salsete e aprendeu sânscrito, persa, canada e urdu, vindo a ser desde 1659 o superior do colégio dos Jesuitas na capital do reino mogol em Agra. Escreveu algumas obras, tal uma pioneira gramática de sânscrito, e copiou e estudou o famoso   tratado básicoVedantasara, que também eu nos meus começos yoguicos traduzi, mas de uma versão inglesa. Só em 1988 é que asuas obras e estudos foram publicados pela erudita editora Brill The Sanskrit Grammar and Manuscripts of Father Heinrich Roth S. J,  que permitiu  a sua partilha no fabuloso Internet Archive. Os manuscritos encontram-se na Livraria Real da Bélgica. Henrique Roa ainda veio ao Ocidente por terra, via Cabul, na companhia Johann Grueber que regressava da China, chegando a Roma em Fevereiro de 1664. Ensinou sobre a Índia e o império Mogol, em Neuburg, passando  alguns dos seus conhecimentos ao P. Athanasius Kircher que os utilizou na sua China Illustrata, mas quando estava para imprimir com o apoio do imperador Leopoldo I a sua gramática de sânscrito foi impedido de o fazer e obrigado a regressar à Índia pelo seu superior Giovanni Paolo Oliva, para abrir uma missão no Nepal, mas acabou por morrer prematuramente em 20 de Junho de 1668, em Agra quando, certamente contrariado mas obediente, se preparava para partir para o Nepal.  
                                          
Nasce Antonio Floriano de Noronha em Lotulim, Salsete, neste dia em 1873. Após os estudos em Goa formou-se em Direito na Universidade de Coimbra, onde se notabilizou pela sua erudição. Seguiu a carreira judicial chegando a juiz da Relação de Goa. Foi o grande dinamizador do Instituto Vasco da Gama, da Biblioteca Nacional e colaborou em diversos jornais como o Era Nova, Debate, Heraldo e sobretudo no Boletim do Instituto Vasco da Gama. Publicou vários livros jurídicos, históricos e sociais destacando-se a descrição da Universidade de Coimbra e dos seus tipos de professores e praxes, e o «livro de combate pacífico de ideias (...) batalhar por aquilo que se me afigura verdadeiro e justo», com serenidade e tenacidade, Em Boa Paz, escrito dois anos após a proclamação da República a propósito da Questão Religiosa, ou seja da Separação entre o Estado e a Igreja, mostra as polémicas que se acenderam com uma sua decisão judicial e por afirmar que «o Antigo Testamento estava cheio de obscenidades e mentiras». Na obra  historia algumas perseguições à verdade que a crença literal no conteúdo da Bíblia provocou em relação a grandes cientistas, ideias, seres. Numa das suas obras, de educação estética, Os Nossos Interiores, Nova Goa, 1928,  cita Antero de Quental na capa: "Eu por mim assento que nesta nossa terra ... estamos todos em família, e por isso o que tantos pensam ou dizem em voz baixa é melhor e mais franco repeti-lo alto e claramente para que todos nos entendamos».
A União Indiana, neste dia 18, em 1961, decide recuperar os territórios que constituíam o Estado Português na Índia e lança um ataque em múltiplas frentes. O que restava das antigas armadas portuguesas resiste ao avanço da armada indiana: a fragata “Afonso de Albuquerque”, cumprindo as tradições da Marinha portuguesa, combateu até ao limite das suas possibilidades. Em Diu, a lancha “Vega” enfrenta a aviação indiana até afundar-se, morrendo o 2º tenente Jorge Catalão de Oliveira e Carmo. As guarnições militares de Damão, Diu e ilha de Angediva lutam também, mas de facto foi mais uma representação final e pequena de honra guerreira face à inevitável aceitação dos factos que faziam Goa entrar no seio da grande Índia unificada.

19-XII. O 41º vice-rei da Índia (1725-1732) João de Saldanha da Gama (1654-1752), em 1729, bom estratega e guerreiro, e sábio, oficia ao rei: «Toda a ruína deste Estado consiste visivelmente na falta de comércio» pelo «horror que todos os mercadores têm ao procedimento do Santo Ofício, não só pela diabólica paixão com que sentem verem ultrajados os seus ritos, mas também pelo que padecem nos cárceres».
Ao fim de um ano de prisão, em 1760, 228 jesuítas embarcam em duas naus, uns com a alma missionária de rastos, alguns poucos talvez com algum peso ou sombra na consciência, regressando a Lisboa, o cais dos desembarques gloriosos ou trágicos. Mas como já eram muitas e de há longa data as invejas, e  reclamações contra os os religiosos da Companhia, o machado abateu a árvore. Portugal, devido ao marquês de Pombal, acérrimo anti-jesuíta, será o país europeu onde eles mais sofrerão.
Goa, Damão e Diu, após alguma resistência dos portugueses, passam para a administração da União Indiana, em 1961, permitindo assim a completa reunificação política da Terra Mãe indiana. Se desde a independência desta tal seria de esperar, ao pôr-se a questão se poderia a trilogia sobrevivente ter sido entregue de forma mais harmoniosa para todos os interesses e tradições em causa, parece que a lei do karma se afirmou e quem pela espada conquistou, pelas armas foi vencido. Salazar pedira a resistência para obrigar os indianos a uma invasão em larga escala, esperando que o mundo reagisse; o arcebispo da Índia recomendou a entrega; e o governador general Vassalo e Silva escolheu esta, sem organizar qualquer tipo de defesa, apenas com pequenas lutas. A desproporção era enorme e as hipóteses de intervenção internacional esfumaram-se porque o veto da Rússia nas Nações Unidas a isso obstou. Por outro lado, os aliados ingleses demoraram nove dias para dizer que não podiam disponibilizar aeroportos. Assim terminavam quase quinhentos anos de presença e poder político na Índia, em que, sobretudo pelos conflitos de religiões e de interesses económicos, se frustraram em  parte as expectativas e potencialidades do que poderia ter sido um interrelacionamento mais harmonioso e profundo entre o Oriente e o Ocidente, a Índia e Portugal, as religiões indianas e o cristianismo.

20-XII. Carta de Goa do mestre orador Pedro Sardinha ao rei, em 1545: «Martim Afonso vindimou a Índia de tal maneira, que não há que rebiscar nela daqui a muito tempo... Dou esta conta a Vossa Alteza não com intenção de mexericar, nem de praguejar de ninguém, porque são duas coisas contra meu ofício e condição natural, senão por me parecer razão que Vossa. Alteza saiba em quanta apreensão ficam todos por culpa e cobiça de um... Espero em Deus na Boa dita de Vossa Alteza mui cedo toda esta terra se converta a Cristo e se cumpra aquilo que diz S. Paulo que todo o mundo seja súbdito a Deus; ao qual fico sempre rogando em meus sacrifícios que acrescente a vida e real estado de Vossa Alteza».
Cosme Anes, vedor da Fazenda na Índia e principal obreiro do Colégio de S. Paulo em Goa, é elogiado pelo reitor do mesmo em carta de 1548: «Não posso exagerar o amor e afeição que tem a esta casa, porque, do seu, nos dá e empresta, quando há necessidade e sem ele não se pode fazer nada. Bem se pode dizer que nem pedra sobre pedra estivera nesta casa, se ele não fora». Infelizmente, como relata Gaspar Correia, nem todos os rapazes recolhidos pelos padres Diogo de Borba e Miguel Vaz o eram por livre vontade, sendo alguns a isso constrangidos.
Carta do 8º vice-rei da Índia D. Francisco Coutinho, «aquele único exemplo / de fortaleza heróica», como lhe chama Luís de Camões, dirigida neste dia em 1561 ao rei D. Sebastião: «Mas Vossa Alteza, por amor de Nosso Senhor que tenha mão nos muitos ordenados e desordenados que Vossa Alteza cá manda passar, porque passa muita a despesa pela receita».
O jesuíta que viverá mais tempo no Tibete, Hipólito Desideri, nasce em Pistoia, Itália, em 1684, e tornar-se-á na Terra dos Deuses um especialista do budismo tibetano, podendo pregar e estudar livremente, escrevendo então três livros acerca da transmigração das almas, Deus e a religião cristã, que provocaram grande animação depois de terem sido lidos em audiência na corte: «A minha casa subitamente tornou-se o cenário de saídas e chegadas incessantes de todo tipo de pessoas, principalmente homens eruditos, professores, que vinham de mosteiros e universidades, especialmente de Sera e de Dreepung, os principais, para pedirem permissão de verem e lerem o livro». Os manuscritos existem ainda hoje em Roma, pois em 1721, cinco anos depois de ter chegado ao Tecto do Mundo, o P. Desideri foi mandado regressar a Roma. A sua relação do Tibete (e das viagens e das missões, frequentemente acompanhado de portugueses), é certamente a melhor descrição feita até então por um ocidental, embora se deva realçar também o valor da primeira, realizada em 1624 pelo P. António de Andrade, natural de Oleiros.

21-XII. Dia de S.Tomé. Segundo a hagiografia lendária o seu martírio teria ocorrido pelo ano de 68, depois de ter cavado ou semeado as fundações do cristianismo indiano. Os monumentos ligados à sua vida em Meliapor e Madrasta são ainda hoje ícones poderosos. O "seu" Evangelho, aparecido nos meados deste século em Nag Hamadi, numa biblioteca de cristão coptas gnósticos, consta de  apenas  palavras directas de Jesus: cento e quatorze logia ou ditos alguns deles desconhecidos e poderosos na potencialidade despertante espiritual.
                                     
Babur (14/2/1483  a 26/12/1530, o 1º imperador mogol e de grande sennsibilidade artistíca, chega neste dia ao seu Jardim de Lótus, em Dholpur no Rajasthan, em 1529, para festejar a sua finalização  mesmo e provavelmente para se deliciar a ler, respirar as suas fragrâncias e contemplar as harmonias da natureza ordenada. Para os orientais, o Paraíso é o jardim da frutificação eterna, e a fonte de água que brota no centro é o Espírito divino que guia os peregrinos e sacia os corações purificados e intensificados segundo as leis do Cosmos. A contemplação do jardim geométrico, ou realizada dentro dele, clarifica. 
O cardeal Egídio da Viterbo (1472 a 12/11/152, notável humanista, que dominava o grego, latim, hebreu, caldaico, persa e árabe, e era um conhecedor e expositor do Talmude, de Platão e de Aristóteles, admirador de Pico Mirandulano e de Marsílio Ficino, em 1507, neste dia, pronuncia diante do papa uma Oração para celebrar a chegada ao Ceilão dos portugueses no qual elogia «o muito e de há longa data trabalho da gente portuguesa, para abalar o poderio muçulmano e pregar o Evangelho, e na qual se encontra providencialmente unido o império político e o espiritual, sendo o seu piedoso rei Emanuel senão apóstolo, apostólico». Era quase a consagração duma concepção idealista do império português que, embora tivesse sido desejada pelo rei e alguns da sua corte e Ordem, e vivida nos seus requisitos internos por poucos, se foi tornando antes uma grande aventura de confrontos, que respondeu e moveu-se frequentemente, ainda que em geral em resposta às circunstâncias agressivas ou competitivas, mais por actuações egoístas do que pela fraternidade e ecumenismo, que só alguns realizavam. 
 Carlos Malheiro Dias (13/8-1875 a 19/10/1941), portuense, académico, tradicionalista e monárquico, numa conferência pronunciada neste dia em 1912 no Grémio Literário, no dia da Esgrima, sob o título, A Espada ao serviço do Amor e da Honra, traça a sua evolução e define-a: «um ferro para ser movido por uma musculatura e animado por um sentimento; ferro inerte a que um homem transmite a sua vontade e a sua energia. (...) A espada era a grande cúmplice dos amores e a zelosa procuradora das demandas da honra. Esse prestígio vinha-lhe de longe, consagrado pela própria legislação. O duelo fora uma fórmula judiciária, que implicava a crença de que a espada do justo era a mais forte. É essa crença sobrenatural, exaltada pelo delírio cavalheiresco do cristianismo medieval, que provoca e expande o cavaleiro andante. A espada era como que uma dádiva de Deus. A mão pura que a empunhava era invencível. A arma celestial era o instrumento milagroso da justiça do Creador. E vê-se então dessa enraizada crença nascer, expandir-se, bafejada pelas fábulas legendárias, a dinastia dos paladinos, extinta na caricatura sublime do D. Quixote. Os Amadis e Lohengrins deixam de ser heróis lendários. Existem. As novelas do ciclo bretão levam por toda a parte o desvario do ideal. O homem quer ser uma espécie de Arcanjo: invulnerável e casto. Faltam-lhe só as asas. A valentia está ao serviço de Deus, na defesa da inocência. Esses terríveis brandidores de espadas são uns iluminados saturados de misticismo, vestidos de brocado de ouro, com plumas brancas nos elmos. É o tempo do rei Artur e de Palmeirim». Referirá Nuno Alvares Pereira, o Magriço e os 12 de Inglaterra, o Infante santo, D. Sebastião, e alguns dos nomeados no Nobiliário do Conde Dom Pedro. Acaba por não referir os muitos casos da Espada ao serviço da Pátria, e reconhece que nos últimos séculos a mulher ou a honra passou a ser cortejada ou defendida mais pela palavra e o espírito de que pela força da espada.
Nas celebrações do dia de S. Tomé, em 1955, oDr. Rajenda Prasad, 1º Presidente da República da Índia:«- Lembrem-se que S. Tomé chegou à Índia quando muito dos países da Europa ainda não se tinham tornado cristãos e portanto estes indianos que remontam o seu cristianismo a ele tem uma história mais longa que muitos dos países europeus, e é verdadeiramente um ponto de orgulho que assim seja».

22-XII. Carta de Afonso de Albuquerque a D. Manuel escrita neste dia em 1510, em Goa:
«Aqui se tomaram algumas mouras, mulheres alvas e de bom parecer e alguns homens limpos e de bem quiseram casar com elas e ficar aqui nesta terra, e me pediram fazenda, e eu os casei com elas e lhes dei o casamento ordenado de Vossa Alteza, e a cada um o seu cavalo e casas e terras e gado, aquilo que arrazoadamente me parecia bem». Mas dois anos depois Afonso de Albuquerque escreve ao rei: «por outro capítulo diz Vossa Alteza que cessem os casamentos, assim os de Goa como os de Cochim e de Cananor; por este capítulo e por outra carta digo, Senhor, que há um ano que esse feito está de cala, porque aí não havia dinheiro; alguns fizeram vossos oficiais neste tempo, não sendo eu na Índia, porque querem também governar e mandar; agora que Vossa Alteza manda que cesse este feito, far-se-á.» Eram as retracções na política universalizante, provindas provavelmente dos sectores religiosos de maior rigidez ortodoxa, que não queriam casamentos civis segundo o mandamento de Afonso de Albuquerque, nem fusões de povos.
O P. João Nunes Barreto, portuense, jesuíta, depois de andar pelas prisões do norte de África consolando uns e tentando converter outros seis anos, foi nomeado patriarca da Etiópia, mas ficará antes por Goa pregando e meditando no nada dos títulos. Cinco anos viverá na Roma do Oriente, até em 1562 o ardor duma febre lhe lançar a alma para as regiões do além-mar e além terra..
Sai em 1821 o primeiro número da Gazeta de Goa, uma folha oficial dirigida por  Lima Leitão, físico-mor ou médico, e impressa num parque tipográfico trazido de Bombaim, instalado no andar inferior do palácio do Governo.
                                      
Sri Ananda Acharya nasce neste dia em 1881 em Hugli, a antiga cidade dos portugueses em Bengala. Educado na escola da igreja portuguesa de Bandel, licenciado em filosofia em Calcutá, parte para Londres para dar conferências e, por fim, estabiliza na Noruega onde durante 35 anos será mestre, poeta e escritor, morrendo significativamente, pois que para isso tanto meditara e orara, no dia do armistício, 8 de Maio de 1945. Dirá, na linha da tão importante multipolaridade e universalidade: «A ideia de considerarmos o mundo inteiro como a nossa própria alma é a verdadeira Bíblia dos lábios do homem interno».
O mestre e poeta Rabindranath Tagore (7-5-1861 a 7/8/1941) inaugura a escola ou universidade ao ar livre, de Shantiniketan (a Abóbada da Paz), a norte de Calcuta, neste dia em 1901. Dirá: «A educação não consiste em ensinar coisas que os jovens esquecerão, logo que possam, sem perigo de serem reprovados nos exames, mas em auxiliá-los a desenvolver os seus caracteres pela forma que lhes é peculiar». Sem autoridade despótica, estimulando a criatividade dos alunos, numa atmosfera natural única, abençoada pelos mestres que ali passaram, e onde eu peregrinei em 1995, ainda hoje é um valioso centro de cultura aberta, na vizinhança de Calcutá, e onde anualmente pelo Natal se reúnem os Bauls, os bardos de Bengala, nos ardores místicos ao divino.
O mestre sufi Sai Qutab Ali Shah deixa a sua vestimenta terrena em 1910, perto de Hyderabad, Paquistão, onde se encontra hojje o seu mausoléu. Nascera em 1805 em Hyderabad, Sindh, e era ainda descendente do 10 Imam Shia, o Imam Naqi Ali al-Hadi, mais conhecido por Ali al-Naqi, e que vivera entre 827–830 e 868. Deixou muitos poemas e ensinamentos, tais estes: «Conhece o teu eu, Oh! peregrino, pois o teu Senhor está dentro de ti». Insistia no dormir-se o menos possível, pois os momentos passados com Deus retiram a fadiga. Considerava as conversões despropositadas e aconselhava a permanecer-se firme na sua religião, pois se Deus aí o fizera nascer, aí estaria o seu caminho de crescimento. Acreditava que a auto-realização é o objectivo da vida e que o ego deve ser aniquilado, para uma pessoa atingir a unidade, pois Deus come ou alimenta-se da vaidade.
                                          
23-XII. João de Barros em 1533 recebe o cargo de feitor da Casa da Índia, em Lisboa, o posto ideal para recolher informações dos seres e coisas, fulgores e fumos do Oriente, aproveitáveis para as suas famosas Décadas, onde, evitando nomear os piores actores na gesta dos Descobrimentos, segue um critério objectivo de verdade e deixando uma história geral da expansão portuguesa muito lida ao longo dos séculos. A sua obra Ropica Pnefma, de filosofia moral e avançado humanismo reformista, é ainda hoje bem valiosa de ser lida.
Tratado de cedência, aos portugueses, de Baçaim e Bombaim assinado por Bahadur Shah e Nuno da Cunha, em recompensa da ajuda portuguesa contra os mogóis, em 1534. Garcia de Orta, então médico de Martim Afonso de Sousa, na armada de quem viera para a Índia, escapando à proibição (1532) dos cristãos-novos saírem de Portugal, onde se preparava a instalação da Inquisição (1534), assiste à assinatura na nau S. Mateus, como médico humanista e amigo de ambos. 
 O Prepósito Geral (ou superior) da Companhia de Jesus, Inácio de Loiola, de Roma, concede por patente a Francisco Xavier, Prepósito da mesma Companhia nas regiões da Índia, sujeitas ao rei de Portugal e fora delas, a autoridade de conceder por si e por aqueles dos seus discípulos que julgar idóneos as mesmas graças espirituais que ele Inácio de Loiola pode conceder, segundo os títulos e as excepções que enumera,  podendo ser tal autorização ampliada ao Reitor do Colégio de Goa, caso seja necessário.
O egiptologo frncês Jean-François Champolion nasce neste dia 23 de Dezembro de 1790. Conhecendo várias línguas, consegue cortar o nó górdio dos sons e ideias dos hieróglifos egípcios. Foi secretário do grande conhecedor da sabedoria clássica, em especial grega, M. Dacier.
                                   
Antero de Quental, numa carta escrita de Vila de Conde neste dia em 1882 para o seu amigo, poeta e publicista Joaquim de Araújo, e que termina no fim por "Do seu do Coração, Antero de Q.", mostra o seu espírito oriental de desprendimento (vairagya) e impassibilidade: «Meu caro Joaquim. Ando há bastantes dias para lhe escrever, mas o frio põe-me em estado que o mais pequeno esforço se me torna dificílimo, e escrever é sempre para mim coisa de esforço. Agora mesmo, aproveitando um momento de coragem, tomo a pena só para lhe dizer que sou sempre seu amigo e dos mesmo feitio. Você atribui a frieza o que em mim é simplesmente o resultado de um certo abatimento de espírito, que com os 40 anos se tem pronunciado, arrefecimento da imaginação, que já não me mostra, como mostrava, o mundo através de um caleidoscópio, cujas imagens ora me atraíam vivamente, ora com a mesma vivacidade me repeliam, e dando por conseguinte ao meu modo de ser uma animação particular. Hoje, fora das coisas mortais e do ponto de vista moral, tudo me parece igualmente curioso e igualmente indiferente.» 
Morre o notável e mavioso poeta Paulino Dias, em Goa, neste dia 23 de Dezembro, de 1919, com apenas 45 anos de idade quando muito se esperava dele. Formado em Medicina, professor liceal, publicista e sobretudo poeta, «de escrupulosa metrificação, facilidade e riqueza de rima, delicadeza e elevação dos conceitos, sobriedade de imagens», como transcreve de uma crítica num jornal da época, Aleixo Manuel da Costa, no seu valioso Dicionário de Literatura Goesa, editado pela Fundação Oriente, em 1997. Vicente de Bragança e Cunha, na sua Literatura Indo-Portuguesa, Figuras e Factos, de 1926, enaltece-o muito:«A Lyra da Sciencia, embora vazada nos moldes da balofa musa de Guerra Junqueiro, já tinha denunciado de quanto era capaz o belo talento do poeta indiano. Na Deusa de Bronze se afirmou porém, original o temperamento dum poeta que pugnava com primorosa correcção em prol dos artigos do seu credo (...) Talento de alta intuição artística, Paulino Dias sabia colorir com mestria as cenas que feriam a sua sensibilidade de artista.» Bem recentemente, Duarte Drumond Braga reuniu e editou a sua obra sob o título O País de Súria, na Alameda Editora.
                                     
O Dr. R. P. Kaushik (1926-1981), médico durante 23 anos, tornou-se depois um notável pensador e guru indiano, independente,  e que valorizava muito o falar e ser-se escutado, como forma de se criar um campo psíquico forte de satsanga ou agrupamento de verdade, esclarece certos aspectos da sadhana, relativos ao som, aos chakras, à elevação das energias, num retiro em Goa, neste dia em 1973: «Qualquer mente que depende de drogas ou da identificação com um objecto, pessoa ou conceito é uma mente pesada, lenta, porque não tem energia própria, não tem luz de si mesma (...) Kundalini é uma consciência, uma energia presa nos centros inferiores da coluna vertebral, praticamente o tempo inteiro na pessoa normal materialista. Quando Kundalini desperta, então torna-se o Om, que é o símbolo da consciência e da realidade total, humana ou divina». Aum,  Aum, Aum... Saibamos orar e meditar com esta Palvra, Verbo, Sermo, Logos...
Neste dia 23 de Dezembro de 2020 liberta-se da Terra, já com 94 anos, o mestre do som Ishwar C. Puri, natural do Punjab, um mestre da tradição da observação ou audição do som interior, do Surat ou Shabda Yoga, a qual considera, e bem profunda e instrutivamente, ser (ou ser ouvida em nós como) a ressonância interior da nossa consciência, ou mesmo a voz do Eu espiritual. Foi discípulo do Baba Sawan Singh Ji, o guru do movimento Radha Soami Satsang Beas. Fundou o movimento Isha, estando bastantes vídeos valiosos das suas palestras, por vezes algo repetitivas, na internet.
 
24-XII. O mestre Jesus nasce na Palestina, no Médio Oriente, no ano 0, às 24.00, se fosse exacta a data, pois sabemos que ela foi inventada simbolicamente e está ligada com a noite mais longa do ano. Nasceu para trazer à Terrae e à Humanidade  o máximo possível de amor e luz espiritual, mostrando o caminho amoroso da ligação ao Pai e Mãe, e o caminho da verdade que liberta do egoísmo, ignorância e violência. Pena foi que judeus do Sinédrio e depois o povo não o aceitassem e logo os romanos o crucificassem, cortando o tempo de avançar na sua missão, pelo que os seus seguidores, não tiveram tempo para realizar bem o seu ensinamento, e assim a história do Cristianismo teve bastantes páginas negras,  bem visíveis  nas cruzadas contra as heresias e o Islão, ou na expansão europeia pelos outros continentes ou ainda nas lutas religiosas da Reforma. Passado esse tempo de ignorante fanatismo, hoje para o cristão ecuménico que consegue cultivar a oração e a meditação e abrir-se à Presença Divina, não se dispersando demasiado nos presentes e nas comidas na quadra natalícia, os raios da corrente espiritual divina descerão e iluminarão a alma que aspira realmente a que o amor e consciência renasçam. Nestas décadas iniciais do século XXI a Terra Santa tem-se tornado cada vez mais uma terra de opressão e genocídio do povo palestiniano por sucessivos governos israelitas sionistas e anti-semitas, ou seja anti-árabes e judeus, com maus efeitos  incalculáveis em todo o mundo. No anos de 2023, 2024 e agora 2025 Israel tornou-se o país mais criminoso do mundo, ao lado dos norte-americanos,  e acima pelo genocídio e urbanocídio racista e sádico perpretado na Terra Santa, e em especial em Gaza e arredores, tais como Líbano, Síria e Irão. Até quando...
O presépio de Natal construído em Lahore em 1597 pelo irmão Bento de Góis, o explorador da Alta Ásia, «tão lindo como os de Goa», brilha para os milhares de visitantes que após a missa do Galo penetram no recinto sagrado e assistem a um auto teatral em persa. Tal como no presépio na capital do império mogol, Agra, a devoção é tão grande que palhas da manjedoura são levadas como relíquias e os pés dos padres tocados, tal como se faz na veneração aos mestres orientais.
                                        
Nasce em Lisboa Jaime Batalha Reis em 1847, e foi companheiro de Antero Quental em Coimbra, formando-se em Agronomia e ao longo da sua longa vida de 88 anos foi agrónomo, professor, escritor, geógrafo e diplomata, nomeadamente na Inglaterra e na Rússia, de 1912 a 1918, durante a revolução. Estudou e trabalhou muito o Portugal Ultramarin,o destacando-se na luta contra o imperialismo inglês e na fundação da Sociedade de Geografia de Lisboa. Nos seus Estudos Geográficos e Históricos, refere os dois sistemas e concepções da expansão portuguesa nos Descobrimentos, um assente em feitorias e fortes, com domínio do mar, e o outro assente na conquista de cidades importantes e estratégicas, tal como se fez com Goa, Diu, Ormuz, Áden (no actual Yémen, tão violentado pelo criminoso regime da Arábia Saudita), Malaca e Sofala.
                                    
Sadhu Sundar Sing (3/IX/1883-1929), um indiano convertido ao Cristianismo, após uma demanda grande e uma visão forte de Jesus, e que se tornou (ou já era) verdadeiramente mais cristão que muitos dos cristãos que à Índia chegaram, transmitirá,  num discurso não datado de véspera do Natal, algo do que a via do bhakti yoga, ou união devocional, lhe permitira atingir ao direcionar o seu amor e coração espiritual  para  o Cristo: «Hoje não desejo nem fortuna, nem posição, nem honras. Não desejo mesmo o céu. Mas tenho necessidade de Quem estabeleceu o Céu no meu coração. Muitos cristãos não podem realizar a Sua presença preciosa e vivificante, porque, para eles, Cristo vive na sua inteligência ou na Bíblia e não no seu coração. É preciso que um homem dê o seu coração para encontrar o Cristo. O coração é o trono do Rei dos Reis. A capital do Céu é o coração onde reina o Rei».
                                        
25-XII. D. Vasco da Gama, o corajoso descobridor, o íntegro mas justiceiro e até cruel almirante e governador, corpo adoentado, renasce para o mundo espiritual em Cochim em 1524, numa data auspiciosa, poucos meses depois de regressado à Índia pela terceira vez para pôr em ordem a governação, no ano provavelmente em que nasceu Luís de Camões, que o virá a imortalizar nos Lusíadas. Já levava muita energia anímica unificada pela sua vontade poderosa, e a experiência vária, desde o sublime ao cruel, para assimilar no além desta viagem iniciática que é a vida, transitória fisicamente e eterna espiritualmente.
D. Agostinho Konixi Setsu-no-cami Iuquinaga, capitão-geral do mar do imperador Taicoçama do Japão, cristão, celebra o Natal de 1599, dando de comer a mais de mil pessoas e convidando-as depois a ajudarem os padres que acabavam de chegar, oferecendo elas muitas coisas com vontade e amor. Resplendeceu em obras piedosas e protecção cristã, dando exemplo a muita gente. Mal sabia que já o machado estava posto à sua raiz e que no ano seguinte seria executado, ao ser derrotado na invasão da Coreia, iniciando-se um calvário para os milhares de cristãos e camponeses daquelas zonas e que em 1637 não poderão fazer mais do que se rebelar em Shimabara, liderados por Amakussa Shiro, o cristão Jerónimo, e lutar 4 meses contra as prepotências dos governadores Nangato, Catataca e Xigeharu, com os mantras de "Jesus, Maria e Santiago", e "Louvado seja o Santíssimo Sacramento", desfraldados nas bandeiras, que jazerão depois no solo empapadas de sangue. Os sonhos da evangelização do mundo goraram-se e hoje, ainda com muitos retrocessos devidos em grande parte ao desgraçado imperialismo do petrodólar e ao fanatismo de alguns muçulmanos, a espiritualidade de todas as tradições, religiões e povos paulatinamente vai avançando para o centro divino, no âmago de cada ser, onde o Natal é a revelação da perenidade do fraterno Espírito divino. 
O orientalista italinao Leone Caetani deixa a terra neste dia de Natal de 1935, com 66 anos de idade, nascido numa família de papas, sábios e artistas, e  depois de uma vida de grande domínio das línguas e viagens, de ter sido deputado de esquerda e de ter publicado estudos sobre as religiões cristãs e islâmica, destacando-se o que realizou com rigorosa metodologia histórica pioneira e fino discernimento sobre a origem do Islão (os 10 tomos dos Annali dell Islam, 1905-1926),  onde foi levado a afirmar que o Corão não existiu em manuscrito ao tempo do profeta Mohammad e que só foi fixado pelos três primeiros califas,
Abu Bakr, 'Umar e 'Uthman, com grande dificuldades e com cortes determinados por 'Uthman de algumas versões, não escritas em Medina.  Considerou como sendo em grande parte apócrifos os famosos hadits, ou os Ditos atribuídos ao profeta. Certamente proposições algo heréticas para muitos...
                                
26-XII. Zahir-ud-din Muahammad Babur, o soberano de Cabul descendente pelo lado materno do mongol Gengis Khan e pelo lado paterno de Timur ou Tamerlão (1336-1405), morre em 1530, com 47 anos, na bela cidade de Agra, já como imperador mogol na Índia e «tendo feito a ligação entre a Ásia Central e a Índia, entre as hordas predadoras e o governo imperial», sucedendo-lhe o seu filho Humayun, na imagem com o pai. Três anos antes, Babur, um sábio e artista, dissera aos seus guerreiros, turcos, mongóis e uzbeques: «Cada homem que vem a este mundo tem de o deixar: só Deus é imortal e imutável. Quem se senta para a festa da vida tem de terminar bebendo o cálice da morte. Todos os visitantes desta estalagem da mortalidade têm um dia de deixar esta casa de tristezas. Morramos com honra em vez de vivermos em desgraça». Na imagem vemo-lo com o seu filho Humayun. O seu neto Akbar, aspirando mais espiritualmente ainda, fundará, algo utopicamente, uma religião, Din Ilahi, a Visão ou Fé Divina. E o bisneto deste, Dara Shikoh, filho de Shah Jahan, será já um gnóstico ou auto-conhecedor e vivente conscientemente do espírito imortal. No Youtube, um dos seus tratados de comparativismo religioso e espiritual entre o Yoga Vedanta indiano e o Sufismo do Islão está traduzido e comentado por Pedro Teixeira da Mota.
O padre Lancilotto escreve a S. Inácio de Loiola de Cochim em 1548 dizendo que o Japão e a China têm uma mesma lei, que pelas suas semelhanças com a cristã deve ter sido pregada há muito pelos cristãos de S. Tomé e que têm uma profecia que hão-de receber uma lei mais perfeita. O humanista e messianista Guillaume Postel, com base nesta carta, escreve em 1552 a entusiástica obra Milagres ou Maravilhas do Mundo apelando à Concórdia mundial, na base da unidade da fé e da reforma da vida.
Realiza-se neste dia em 1916 o Congresso do "Partido de Toda a Índia" em Lucknow. Tilak, Kaparde, Besant, Wadia, Arundale, Malavya, Gandhi e Polak distinguem-se, em encontros de líderes do movimento da independência da Índia. A unidade hindu-islâmica é obtida. O mestre Shuddhananda Bharati, com quem vivi alguns meses no final da sua vida, participa, mas como poeta e yogi prosseguirá sobretudo a pesquisa interna. Assim no seu ensinamento do Sama Yoga explica que acima da mente existem e podem ser experimentados planos ou níveis espirituais caracterizados pelo equilíbrio gnóstico, a felicidade, o conhecimento e a verdade. Mas mais acima e profundamente estão os da Pureza, Unidade e Divindade (Shudha Shakti Aum), pelo que, a partir duma vida simples e justa para toda a gente, há muito descobrimento ainda a fazer-se. 
Swami Prabhavananda nasce neste dia, em 1896, na Índia, e depois de se formar em filosofia entrou na Ordem de Ramakrishna, 1914, sendo iniciado por Swami Brahamananda e enviado para USA em 1924, onde veio a fundar vários centros e mosteiros e tornar-se um destacado escritor e divulgador da filosofia Vedanta no Ocidente, tendo cooperadores valiosos tais como Aldoux Huxley, Cristopher Irsherwood e Gerald Heard, publicando os quatro numerosos artigos no importante livro de 1946, Vedanta for the Western World, e num deles, Samadhi or Transcendental Consciousness,  afirma  que «a filosofia da religião indiana se baseia na experiência transcendental ou suprasensível dos sábios e videntes», denominada samadhi, na qual todos os pensamentos cessam e a pessoa vê Deus. Mas citará seu paramguru: «Porque estás tão ansioso em teres visões? Pensas que as visões constituem a substância total da iluminação? Tenta cultivara  a devoção a Deus e a prende o controle perfeito do ego. Estes requisitos são muito mais grandiosos que visões». Distinguira assim entre as visões que não modificam a consciência e aquelas que levam-nos aos estados mais elevados de consciência têm efeitos transformadores e duradouros...
27-XII. Carta do padre Mestre flamengo Gaspar Barzeu, de Goa, para Dom Leão, de Coimbra em 1552: «Determinei de vos escrever estas poucas regras alembrando-vos quão suave é a cruz no desejo e quão pesada é levada nas costas para que o amor vos mova a terdes cuidado daqueles que andam seguindo as bandeiras de Cristo estendidas pelos campos deste Egipto em contínua batalha contra o rei faraó e o seu exército... Ó pater, se visses tu aquelas coisas que não posso escrever, como se dilataria o nosso espírito nesta matéria; por não dar ocasião de alguma tentação não me quero mais estender... Ó caríssimos padres e frades, de todo esse santo colégio, agora é tempo de rogardes ao Senhor por mim para que, se fôr Seu serviço, de me tirar este jugo tão grave que trago aos ombro, e mandar-me ao Preste João como eu confio que será. Nosso Senhor, que nos ajuntou aqui sobre a terra, nos ajunte na glória e nos confirme em Seu amor».
                                
Em Macau, em 1783, devido às desgraças sucedidas nos últimos três anos, desde que o Senado retirara o soldo de soldado a S. António, foi decidido de novo evocar-se a sua protecção, atribuindo-se-lhe o posto e o soldo de capitão. Também no Brasil, em Lagos e em outras terras com fiéis seus, S. António assentou praça e foi promovido, ele que provavelmente seria um objector de consciência, ou um servidor cívico... 
 28-XII. Carta, em 1519, do rei D. Manuel dirigida ao Capitão-mór e Governador da Índia Diogo Lopes de Sequeira, declarando que as terras que não foram dos mouros ficassem, como dantes, pertencendo aos naturais, e explicando que só as que eram do Mouros é que podiam ser dadas aos portugueses que se casassem na cidade de Goa. Ao longo dos anos foram muitos os portugueses que se foram afeiçoando à Índia e por lá ficaram, por vezes deixando mesmo o exército e entrando nos conventos, tanto mais que alguma relaxação da austeridade e do conhecimento religioso se foi acentuando, nomeadamente nos conventos da Ordem Franciscana, que a dado momento teve mesmo de entregar muitas igrejas de Bardez aos clérigos naturais já que não tinham religiosos que falassem o concanim, conforme o Arcebispo de Goa se queixava em 1627, pois as recomendações do Concílios Provinciais de 1557, 1575 e 1585 de os sacerdotes aprenderem as línguas do país, e nelas os Evangelhos serem explicados e as pregações dadas. Conta-nos J. Amancio Gracias (Na sua introdução ao Bosquejo Histórico das Comunidades, de Nery Xavier, 1903) que em 1672 era informado «El-Rei de que em Bardez os Franciscanos não se cansavam com a fé, pois as igrejas  eram casas e descanso  recreio, e já não existiam coadjutores que soubessem a língua da terra. E o Vice-rei confirmava (1673) que tudo era assim, e ainda passavam muito mais avante os excesso do Frades, entre os quais nãos e encontrava quem tivesse boa vida, como havia muitos entre os sacerdotes naturais, aos quais se podia convenientemente entregar  reitoria das igrejas», como veio a suceder em 1766 quando o Arcebispo de Goa tirou dezanove paróquias aos franciscanos e entregou-as aos naturais da terra ou aos que soubessem a língua, assim se preservando o concanim. Faltou uma multipolaridade linguística na estratégia portuguesa, ora por determinações superiores ora por incumprimento ou incapacidades dos religiosos portugueses.
Carta do bispo de Dume, de Cochim, nesta dia 28, em 1523, ao rei: «Vejo outra coisa ser bem pouco serviço de Deus e de Vossa Alteza: muitos infiéis se tornariam à nossa fé católica, e por os cativarem, vindo-se fazer cristãos, muitos o não são. Sentença é do Sacro Canône que todos os infiéis que fugirem para a nossa fé católica sejam livres... Quanto ao viver dos clérigos e dos frades que estão fora destes mosteiros, por a maior parte é muito corrupta e por seu mau exemplo se perde muito a devoção dos cristãos da terra... Quanto a Cananor está por capitão D. João da Silveira, muito bom fidalgo e de sã consciência e rege a sua fortaleza com muita prudência e amor, assim para os nossos como para os da terra, e não há homem que dele tenha querela, e é zeloso e aproveitador das coisas de Vossa Alteza, como pode saber». Eis exemplos de cristãos, ou fiéis, que não foram para Índia só para enriquecer, rapinar, matar ou converter, e que conseguiram desbastar o seu egoísmo suficientemente para reconhecerem os valores dos outros e descobrirem que o Espírito Divino é o mesmo, ainda que manifestado com diferentes aspectos e denominações nas várias tradições, e é a base da Religião e Filosofia Perene universal.
                                
29-XII. O licenciado Estevâo Lopes, representante do Almirante Vasco da Gama, apresenta-se neste dia, em 15... na Câmara da Vidigueira, com o diploma régio da entrega da povoação a Vasco da Gama. Estão "presentes além das pessoas gradas da terra muitos cavaleiros, escudeiros, homens bons e povo". Luciano Cordeiro relata-nos a partir do auto da cerimónia: «Apresentados pelo procurador, e lidos e ouvidos por todos, os documentos, os representantes da terra tomaram a carta Real da doeação - «e a beijaram e puseram em suas cabeças e disseram que cumpriam e obedeciam aos mandados de seu rei e senho". Em seguida, pegaram na bandeira do concelho, nas chaves do castelo, nas das racas do concelho, nas da cadeia e nas dos celeiros e adegas municipais, bem como nas varas e cartas de nomeação dos respectivos oficiais, - "e como leais vassalos, sem nenhum rumor nem turvação, nem contradição de pessoa alguma" - entregaram tudo ao procurador (Estêvão Lopes), significando que davam ao Almirante todo o senhorio e jurisdição, havendo-o -"por admitido e investido na posse da dita vila e do castelo e paço que nele estão". Tomou o licenciado a bandeira, as chaves, as varas e as cartas, - " e terra, e pedra e telha e ramos e pão, em suas mãos» [que bela e tão simbólica cerimónia] - fechou e abriu as portas - "sobre si"- - e declarando que se dava por empossado e investido em nome - "de sua senhoria", - restitui aos oficiais as chaves, varas e cartas-». Seguirão ainda para a Igreja de Santa Clara, com entrega simbólica do calíce e galhetas para Vasco da Gama ficar investido no padroado. Depois castelo, celeiro e adegas comuns, findando com uma volta à vila, o desfraldar da bandeira no paço e o arrepicar dos sinos. Assim se homenageava o primeiro navegador ocidental a chegar à Índia.
                                     
Um dos mais fulgurantes pensadores e pedagogos portugueses, Leonardo Coimbra, nasce em 1883, na Lixa, Amarante. Companheiro de Teixeira de Pascoais (na imagem, seis anos mais velho) e Jaime Cortesão (1884-1960) na fundação em 1911 da tão importante revista Águia, será com estes pensadores, o inspirador e mestre de Agostinho da Silva, Sant’Anna Dionísio, José Marinho e Álvaro Ribeiro, Delfim Santos, Ângelo Ribeiro e por eles, mais ou menos algo chegará a António Quadros, Afonso Botelho, Pinharanda Gomes, Brás Teixeira, Dalila Pereira da Costa, Santiago Naud, António Telmo e outros, cultores das especificidades da alma lusitana, embora por vezes acantonados  numa escola da Filosofia Portuguesa mitificada, ou noutros sectarismos. Estudioso da tradição filosófica e espiritual portuguesa, onde se destaca o seu trabalho sobre Antero de Quental, e da europeia, da antiguidade à contemporaneidade, nomeadamente de Platão a Henry Bergson, também estará atento e estudará a tradição espiritual do Oriente e dirá: «Os sábios orientais, os misteriosos magos do Tibete, dirigem as forças planetárias por meio de correntes de pensamento e, no Ocidente, qualquer de nós tem recebido cadeias de sorte, geradoras, pela força do pensamento, que acumulam, do bem ou do mal, conforme as apoiamos do nosso bem-querer energético ou lhe subtraímos a energia cortando-lhe o curso da sorte pela recusa da força do nosso concordante pensamento». Eis, um mestre do criacionismo anímico validando a unidade luminosa psico-espiritual do Oriente e do Ocidente, na Filosofia Perene. Conseguira ser ministro da Instrução Pública por duas vezes, professor na Faculdade de Letras do Porto que fundara, e pena foi ter morrido aos 52 anos, de acidente de automóvel, quando tanto ainda se podia esperar dele. A sua obra é porém vasta e muito rica ainda de ser trabalhada...
Na tarde deste dia 29, em 1972, em Pangim, no Instituto Menezes Bragança, Renato de Sá pronuncia uma conferência sobre Goa, nos Lusíadas, onde refere os 17 anos passados por Camões no Oriente, a maior parte deles em Goa, onde tinha a sua modesta república de convivência de camaradas de letras, com Calisto Sequeira, Luís Franco Correia, João Toscano, Manuel Ferrão e como foi protegido pelos Vice-reis D. Constantino de Bragança, D. Francisco Coutinho, protegendo por sua vez Garcia da Orta, já que intercedeu pela publicação que estava muito difícil dos valiosos, e hoje raríssimos, Colóquios dos Simples..., e onde surgiu impressa a sua primeira poesia. Os cantos finais dos Lusíadas teriam aqui sido compostos tal como varias poesias e o auto ou peça teatral Filodemo. Renato de Sá, era farmacêutico e um grande amante da cultura portuguesa na Índia, tendo fundado o Centro de Cultura Latina em Panjim, a partir do qual publicava a Revista Harpa Goesa, de cujo nº 5 tiramos esta notícia e fotografia. Ainda o conheci em Goa...

30-XII. Zarpam de Goa em 1605 duas naus capitaneadas por Brás Telles de Meneses e Pêro da Silva Meneses, seguindo numa delas o franciscano Gaspar de S. Bernardino que regista como à despedida a saudade se aumentava ao tocar da frauta e charamela e «meneando o brando vento nas galés e navios, os galhardos pendões, e estandartes, cuja vista tanto acrescentava a mágoa em todos». O facto de chover grossamente, impedindo de tomar pelo astrolábio a altura do sol foi a causa do naufrágio e da sobrevivência trabalhosa até que, em Mombaça, Frei Gaspar decide viajar por terra com um companheiro rumo a Portugal, resultando disso o judicioso Itinerário da Índia por terra até à ilha de ChipreNeste dia em 1741 o papa Bento XIV expede uma Bula e Constituição em defesa dos Índios pedindo que sejam castigados com gravíssimas penas os «homens, que, fazendo profissão da Fé Catholica, vivem tão inteiramente esquecidos da Caridade infusa pelo Espírito Santo nos nossos corações e sentidos, que reduzem a cativeiro; vendem como escravos; e privam de todos os seus bens não só aos miseráveis Índios, que ainda não alumiou a luz do Evangelho, mas até os mesmos, que já se acham bautizados, e habitão nos Sertões do mesmo Brasil, e nas terras Ocidentais, Meridionais, e outras daquele Continente; atrevendo-se a tratá-los com uma desumanidade tal que, apartando-os de virem buscar a Fé de Cristo, os fazem antes endurecer no ódio, que contra ela concebem por aqueles motivos.»
Começa neste dia o primeiro curso médico em 1804 em Goa,  dirigido pelo   Físico-Mor António José de Miranda e Almeida, na Faculdade de Medicina criada neste mesmo ano. Dos formados seguirão alguns para se aperfeiçoar em Coimbra. Médicos dos corpos, mestres das almas, todos nós devemos ser um pouco e para isso a Sabedoria tem as suas musas e museus, universidades e mestres, médicos e enfermeiras, bálsamos nas chagas do Ecce Homo.
                                
O mestre Ramana Maharishi nasce em 1879 em Tiruchi, no sul da Índia, e será um dos últimos grande realizados na tradição não-dualista (Advaita Vedanta). Recomendava a meditação na pergunta «Quem sou Eu?». O seu centro junto à montanha sagrada de Arunachala continua a ser um valioso local de peregrinação e meditação, onde estive por duas vezes. Em relação às experiências espirituais e apontando para a continuidade da consciência espiritual, que podemos equiparar a oração incessante enaltecida por Erasmo no seu Modo de Orar, que traduzi com Álvaro Mendes, dirá: «O que vem num clarão desaparece como tal. O que tem um começo tem de ter um fim. Só quando a consciência omnipresente é realizada é que será permanente. De facto a Consciência está sempre connosco. Toda a gente sabe, Eu sou... Ninguém pode negar o seu ser... O corpo é o eu, é o erro. Este sentido falso do eu deve ir-se. O verdadeiro Eu está sempre aqui. É aqui e agora. Nunca aparece de novo ou desaparece... O conhecimento errado "Eu sou o corpo" é a causa de todos os problemas. Este conhecimento errado tem de se ir. Isto é a Realização. A Realização não é a aquisição de algo novo ou uma nova faculdade. É apenas a remoção da camuflagem».
                                 
Romain Roland, prémio Nobel da Literatura em 1915, admirador ou amante da Índia perene, biógrafo de Ramakrishna, Vivekananda e de Gandhi, amigo de Rabindranath Tagore, outro prémio Nobel da Literatura (na imagem), deixa a vestimenta terrena neste dia em 1944. Disse: «Se Cristo foi o Príncipe da Paz, Gandhi não é menos digno desse nobre título. Mas a paz que ambos trouxeram aos homens não é a paz da aceitação passiva, mas a paz do amor activo e do auto-sacrifício».

31-XII. De Cochim, escreve o P. Mestre Belchior em 1561 aos padres e irmãos da Companhia de Jesus: «Assim os simples e os idiotas arrebatam o céu, e nós, com nossas letras, praza a Deus que não sejamos lançados nos infernos, porque sabeis, irmãos, quanto mal faz ter espírito limitado e não infinito e universal a todas as partes». Eis uma confissão bem lúcida das trevas a que as doutrinas e dogmas podem acabar por desterrar e densificar o ser humano, alienando-o das suas potencialidades e dons de Filho ou Filha de Deus.
O vice-rei Manuel Saldanha e Albuquerque, conde de Ega, troca a sua residência de Panelim em Velha Goa para Pangim, em 1759, embora só em 1835 é que a mudança é definitiva, ficando o palácio transformado em Hospital, e o que restava da Goa Dourada e da Roma do Oriente, como disse Orlando Ribeiro, «a maior cidade portuguesa dos séculos XVI e XVII, três vezes mais extensa que Lisboa e com mais do triplo da sua população, computada, muito por alto, em 300.000 habitantes», cada vez mais entregue a padres e frades e às sombras tutelares, dum passado tanto grandioso e imortal, como cruel e imoral. Como com o decorrer do tempo o casamento das pedras e da natureza santifica os lugares, Velha Goa é hoje sem dúvida um local de peregrinação para todo aquele que se interessa pela tradição portuguesa e goesa, pela união do Oriente e do Ocidente. Uma aura indizível de não-raça, não-tempo, não-nacionalidade, não-religião parece ter-se originado do encontro indo-português, e pairar subtilmente sobre os campos, rios, templos e pessoas de Goa e da Índia portuguesa   convidando-nos a aprender com as lições do passado, a aperfeiçoar-nos, e a comungar na grande Unidade Original  e na sua derivada Fraternidade cooperante humana, de que o BRICS, onde a Índia participa com a Rússia, a China, a Índia, a África do Sul, o Irão, a Etiópia, a Indonésia, o Egipto, é a semente que floresce, e onde, infelizmente, os portugueses mais uma vez falham ao venderem-se ao dólar e ao euro, e alinhando-se miseravelmente com a oligarquia imperialista ocidental.  Uma desgraça a classe política que tem desgovernado Portugal nas últimas décadas, numa decadência evidente e lastimável. Como reagir?
É a luta titânica pela hegemonia da oligarquia ocidental e do seu inesgotável e injusto dólar que leva a NATO e a UE cerrarem filas atrás dos USA na sua batalha (através de triliões de doláres, armas e mercenários) por manterem de pé o regime fantoche do psicopata Zelensky à custa de já mais de um milhão de ucranianos mortos.... Lux Pax...