terça-feira, 8 de novembro de 2016

Livros antigos belos, sábios, raros e valiosos em exposição para leilão na Livraria Ecléctica.

                          
Livros antigos belos e sábios, raros e valiosos em exposição.
Realiza-se no dia 9 de Novembro pelas 19 horas um leilão de livros na Ecléctica Livraria Alfarrabista, sala de Leilões na Trav. André Valente, 26, Lisboa. Tel. 968088216.
Pela sua insigne beleza e substância reproduzimos algumas obras com a autorização do Nuno Gonçalves, autor do magnífico catálogo.

Destacaremos:
nº 2 de Pedro de Alcalá, a Arte para ligeiramente saber la lengua raviga emendada y anadida... Granada, Juan Varela de Salamanca, 1505.
Obra que assinala o universalismo da época e do 1º arcebispo da cidade de Granada (reconquistada em 1492), o humanista Hernando de Talavera,  que aprendeu o árabe e fez que surgisse esta gramática.
nº 6 A Elegia à deplorável morte do insigne poeta Manoel Maria de Barboza du Bocage, por Manuel Pedro Tomás Pinheiro e Aragão. Lisboa, Impressão Régia, 1805. Já que deixaram os ossos de Bocage ir para a vala comum fiquem-nos ao menos alguns prantos d de amigos na ocasião da sua partida para os Campos Elíseos.

nº 27  As Imagini delli Dei de gl'antichi, de Vicenzo Cartari. Venetia, 1647, muito ilustrada com imagens dos deuses e deusas das diversas religiões, com maior ou maior fidelidade, mas com bastante conhecimento nos deuses e personificações greco-romanos.

nº 32. As Epistole et Orationes de Cataldo Sículo, impresso em Lisboa, por Valentim Fernandes, em 21 de Fevereiro de 1500, contendo várias cartas para D. João II e D. Manuel e para outras personagens importantes da época.
nº 43. Uma das obras consideradas das mais belas e profundas de sempre da História do Livro e da Psique humana é a atribuída ao frade Francesco de Colonna e intitulada Hypnerotomachia Poliphili, traduzível por O Sonho de Polifilo, ou ainda A Batalha Onírica de Polifilo, aqui na sua primeira edição, Veneza, pelo famoso  e sábio impressor Aldo Manucio, em 1499. Narram-se os amores e aventuras de Polifilo e Polia, em sonho, com belíssimas imagens amorosas, arquitectónicas e de procissões alegóricas. Aldo Manúcio recebeu Erasmo durante alguns meses e obrigavam-se a falar em grego, sob pena de pagarem alimentos para os convívios da academia aldina de impressores e escritores, todos eles humanistas em grande camaradagem.
nº 69. De Robert Holcot, o Super Librum Sapientie. Basileia, 1489. Um incunábulo, livros publicados na cunha ou berço da tipografia, de comentário ao livro bíblico da Sapiência.
nº 86. De Raimundo Lulio,  Arbor Scientia venerabilis celitus illuminati patris... Lugduni: opera Gilberti de Villiers, 1515.
nº 92. Calendário e Regra de S. Bento, manuscrito iluminado de finais do séc. XIII, a 1ª parte e a 2ª parte do séc. XV, realizado por Frei Pedro de Salamanca, no mosteiro de S. João de Tarouca, perto de Viseu.
nº 117 de D. Leonor de Noronha, a Coronica Geral Marco Antonio Locio Sabelico des ho começo do mundo au nosso tempo. Coimbra, João Alvarez e João Barreira, 1550-1553. Humanista, discípula de Cataldo Sículo, traduz do latim esta Crónica ou História do mundo, muito assente nas lendas bíblicas e nos cronistas grecos-latinos; obra de grande labor de D. Leonor.
nº 119. De Cesar Oudin, Refranes o Proverbios Castellanos. Traduzidos en lengua Francesa. A Paris, Pierre Billaine, 1624. A sabedoria paremiológica castelhana em edição bilingue.
nº 122. De António Pinto Pereira, História da India no Tempo em que a Governou o VisoRey Dom Luis de Ataide. Coimbra, na impressam de Nicolao Carvalho, 1616. Cerca de 400 páginas dedicadas ao vice-reinado de um dos grandes heróis e estrategas da presença portuguesa no Oriente.
nº 123. De Fernando Pires, a Cronica da fundaçam do moesteyro de san Vicente dos cónegos regrantes: da hordem do aurelio doctor scto Augustinho, em a cidade de Lisboa. Coimbra: Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra, 1538. Um dos poucos livros quinhentistas impressos no mosteiro conimbricense de Santa Cruz, o frontispício e a última folha com xilogravuras belas.
nº 140. De Hartmann Schedel, a famosa Crónica de Nuremberga, Registrum huius operis libri cronicarum cum figuris et ymagibus ab initio mundi. Nuremberg: Anthon Koberger, 1493. Obra chave do séc. XVI  ao narrar a história do mundo, com mais de 1800 gravuras no seu interior, uma obra prima para a época, certamente com bastante irrealidade ou pouca fidelidade em muitas das personagens ou cidades representadas, tal como a de Lisboa, pela 1ª vez  em gravura.
nº 149. As Relaciones de Pedro Teixeira d'el origem, descendencia y sucession de los Reyes de Persia, y de Harmuz, y de un viage heccho por el mismo autor desde la India Oriental hasta Italia per tierra. En Ambres: En casa de Hieronymus Versussen, 1610. Importante clássico da literatura de viagens na época dos Descobrimentos, muito apreciado pelas descrições pioneiras das gentes e da história Persa, por um português.


Antero de Quental e Jaime de Magalhães Lima. Carta de 13-X-1886. Lida, e em vídeo

Na arejada ou mesmo ventosa mas tão simpática Vila do Conde, em 13 de Outubro de 1886, Antero de Quental, imaginamos que sentado à sua secretária, ou de pé, escreve a Jaime de Magalhães Lima a agradecer-lhe a sua apreciação do novel livro Sonetos, tecendo algumas valiosas considerações não só auto-biográficas como também futurantes  para a Tradição Espiritual de Portugal, na qual participamos e temos o nosso ser, em especial quando escreve: «Outros virão, cheios de uma vida fresca e ágil, receberão sem esforço o tesouro do novo Idealismo, tão dolorosamente desentranhado das profundezas da Razão, por nós outros, seus antecessores; e, ricos sem trabalho, poderão ser pródigos de cantos, fecundos como tudo que brote fácil e espontâneo...».
Em verdade, estamos pouco conscientes de como os que caminham nas sendas evolutivas da Tradição Espiritual Portuguesa têm uma dívida de gratidão bem grande e profunda pelos antepassados e antecessores, os quais desentranharam com dificuldades e lutas por vezes grandes o que para nós já é inato, natural e evidente, seja no domínio social, psíquico e cultural, seja no religioso e espiritual.
Pouquíssima gente tem percepção das finas camadas de ideias forças que compõem o ambiente anímico de Portugal e como nele se abrem, formam e crescem ou enfraquecem e morrem os psicomorfismos (as ideias e crenças que modelam as formas) mais importantes e necessários em épocas sucessivas e como cada geração se eleva à custa do sofrimento dos outros, não tendo já que repetir os mesmos erros ou fazer as mesmas batalhas...
Antero de Quental, tal como Jaime de Magalhães Lima, este um vegetariano, pacifista, agricultor biológico, amante das árvores, tolstoiano, foram seres muito empenhados em usarem o seu tempo terreno na busca e realização da Verdade (Magalhães Lima foi mesmo até à Isnaia Poliana, na Rússia, para dialogar com Tolstoi) e deixaram-nos múltiplos testemunho das suas realizações ou sinais das suas intuições e cabe a nós hoje avançarmos em sintonia com eles.
                                                               
Esta carta de Antero foi então lida e comentada em homenagem e sintoni
a com Antero de Quental e Jaime de Magalhães Lima e com a aspiração de clarificar melhor, para os portugueses (ou os que compreendem a nossa língua e cultura), a Tradição Espiritual Portuguesa e o Caminho espiritual presentes nestes dois nossos escritores, ainda hoje presentes subtilmente e dialogantes...
Link para o vídeo, já que o antigo surge como indisponível:  https://youtu.be/UnhPP_n0Yxk
                            

terça-feira, 1 de novembro de 2016

Visita a Antero de Quental no jardim da Estrela no 1º dia de Novembro de 2016

Ida ao jardim da Estrela para comungar um pouco com a Natureza e em seguida visita à estátua de Antero de Quental no dia 1 de Novembro de 2016, com breve improviso relativo a este dia do Samahin, celtam de ligação entre incarnados e desencarnados, gravado no pequeno vídeo que se encontra no fim das imagens...

                               
Árvores que ligam o céu e a terra humildemente e a tempo inteiro, e que nos permitem encostar-nos, lermos, meditarmos e darmos-lhes graças lá para o alto, onde as folhas abanam levemente...
Como Antero de Quental nos diz: «o trabalho é santo, porque é o modo de amar da inteligência. Não sei ainda se é para isso que nos deixaram cair lá de cima sobre este planeta ridículo»
                    
Antero de Quental, no crepúsculo de todos os santos, na gruta anteriana do Jardim da Estrela lisboeta, recebe-nos, escuta os nossos pensamentos e sentimentos e fala-nos pioneiramente do campo unificado de energia consciência:«As obras do bem, ligadas indissoluvelmente à substância do Universo, absorvidas, desde o momento da sua produção, para nunca mais saírem dele, vinculadas, pela cadeia duma casualidade superior, a todas as suas evoluções através dos tempos, dos espaços, dos mundos, vão aumentar o tesouro da energia espiritual das coisas fecundá-las nos seus mais íntimos recessos e, sempre presentes, sempre activas, eternizam, nessa sua perene influência, a alma donde uma vez saíram. O Universo só dura pelo bem que nele se produz».
                  
Grave, o sonhador e pensador da Justiça, da Liberdade e da Verdade anima a estátua, e diz-nos: «o que nos salva é a obediência cada vez maior às sugestões daquele demónio interior, é a união cada vez maior do nosso ser natural com o seu princípio não-natural, é o alargamento crescente da nossa vida moral nas outras vidas não morais, é a fé na espiritualidade latente mas fundamental do universo, é o amor e a prática do bem, para tudo dizer numa palavra».
                          
Como que retraído na sua sensibilidade imensa, Antero de Quental contempla o estado do mundo moderno, e diz-nos: «sem paixão nem cegueira não há um único acto da vida real que não se possa fazer com um ânimo sereno e superior, conservando-se o espírito virado para a contemplação do absoluto no meio das ocupações mais estreitas e particulares do viver comum».
                            
No peito do ser humano está a potencialidade Divina, diz-nos Antero... Ou ainda: «Lá no fundo do seu coração há uma voz humilde, mas que nada faz calar, a protestar, a dizer-lhe que há alguma coisa porque se existe e porque vale a pena existir. Escute essa voz: provoque-a, familiarize-se com ela,e verá como cada vez mais se lhe torna perceptível, cada vez fala mais alto, ao ponto de não a ouvir senão a ela e de o rumor do mundo, por ela abafado, não lhe chegar já senão como um zumbido, um murmúrio, de que até se duvida se terá verdadeira realidade. Essa, meu amigo, é a verdadeira revelação, é o Evangelho eterno, porque é a expressão da essência pura e última do homem, e até de todas as coisas, mas só no homem tornada consciente e dotada de voz. Ouça essa voz e não se entristeça».
                   
Pela ética e justiça e pelo amor e a aspiração ressuscita, sê uma luz nas trevas! «Meu amigo, tenho visto que a mais árdua das ciências, a mais difícil das artes, não é a metafísica nem a poesia - é a Moral», lembra-nos ainda Antero
                      
Numa carta enviada de Coimbra em 7-VIII-1861: «Bem sabes: quem crê na Arte crê no belo, no bom, isto é, no Amor e em Deus, e com estes elementos pode tudo perder-se mil vezes, que mil vezes será tudo salvo. É por isso que tantas esperança ponho na arte; é já um culto antecipado da religião que ainda está por nascer para uma sociedade de que só por aqui terão alguns uma vaga intuição. Desses alguns quero eu ser, como tu és, meu apóstolo e precursor de novos mundos, como são todos os que, depondo ambições do dia, viram os olhos da sua alma para o horizonte longínquo, aonde tem de raiar a Aurora do Dia novo».
                               
Numa carta de 1884: «A nossa vida, verdadeiramente, é só a vida da nossa alma, do misterioso e sublime eu que somos no fundo: ora esse eu ou essa alma tem a sua esfera na região do impessoal: o seu mundo é o da abnegação, da pureza, da paciência, do contentamento, na renúncia do indivíduo natural e de tudo quanto o limita, algema e obscurece é que consiste a sua misteriosa individualidade»
                 

sexta-feira, 28 de outubro de 2016

Erasmo de Roterdão, nasce a 28 de Outubro de 1467, ou 1469. Psicomorfismos de mestre, ou seja, forças luminosas dinâmicas...

                     Erasmo, mestre e amigo, ontem, hoje e sempre, perenemente...

    Pintura de Quentin Matsijs....
Pequena homenagem e evocação neste seu dia de anos, pois nasceu perto de Roterdão e a 28 de Outubro, provavelmente em 1467 (ano incerto, todavia), co-lembrando e homenageando também José Vitorino de Pina Martins, um erasmiano amigo e mestre sábio com quem muito dialoguei, há poucos anos (28-IV-2010) partido para a comunhão mais directa das almas....
Gravura a sépia representando Erasmo oferecida por José V. de Pina Martins. 
                    “No que foi mestre nos seus dias, Erasmo será mestre para sempre.” 
A expressão mestre é complexa, pois se no Oriente o guru tem um sentido claro de dispersador das trevas, ou ainda de pesado, em termos de conhecimento e sabedoria, o magister latino (provindo do magis, mais, significando o que dirige, ensina, comanda, preside), acabou por ser na época do Renascimento um conceito palco de sátiras e lutas e assim se dizia os magisters nostris, aqueles dum saber escolástico, dogmático e não dialogante, e que foram criticados ou ridicularizados por Erasmo, em especial nos seus tão divertidos Colóquios, 
embora ele próprio se tenha tornado um mestre para milhares de seres pois, ao lermos as três mil duzentas e tal cartas que chegaram até aos nossos dias da sua correspondência, veremos que muitos se dirigiam a ele nesses termos e com imensa devoção e gratidão. 
Deveremos certamente entre eles referir o nosso Damião de Goes, que não só era seu admirador e amigo e se carteou com ele, como esteve mesmo a viver em sua casa cinco meses em 1533 que foram provavelmente como que uma antevisão do paraíso, ou seja, de mais diálogos quando ambos se reencontrarem nos mundos espirituais, onde já estão aliás há bastante tempo, inspirando-nos ora hoje ora amanhã, no corpo místico da humanidade, alma do mundo ou, como se diz hoje, no campo unificado de energia consciência informação
Ora em verdade, Erasmo de Roterdão foi um mestre, no bom sentido de clarificador e impulsionador, por várias facetas que passo a enumerar:
Mestre viajante, dialogante sábio nas cartas e nas polémicas (nomeadamente na fulcral com Lutero, em defesa do livre-arbítrio), pioneiro do amor aos estudos das Belas-Letras ou das literaturas clássicas greco-latinas, e da Poesia e Eloquência à Retórica e à Gramática, mestre na Pedagogia (tendo vivido várias vezes de dar aulas), mestre no acesso das mulheres ao estudo e à educação, mestre enquanto dominava o latim e o grego, mestre na firmeza da sua posição por si mesmo e não se deixando influenciar demasiado pelas pressões viessem de quem viessem. 
Por vezes acabou por retirar algo, ou retractar-se da sua ousadia, tal como a designação de Novo Instrumentum, para a sua edição corrigida (segundo manuscritos antigos) em 1515 do Novo Testamento, ou ainda "o coma joanino", uma interpolação tardia no Evangelho de S. João por ele assinalada e pelo qual se introduzia o Espírito Santo na Trindade, antes de ela ter desabrochado como doutrina na nascente instituição Católica romana, mas que não tinha essa confirmação nas Escrituras...
Mestre da união da sabedoria dos antigos e pagãos com as fontes autênticas do Cristianismo, os Evangelhos e os escritos dos primeiros Padres da Igreja, dos quais muitos ele traduzira e purificara, comentara e editara.
Mestre da crítica e da ironia, bem desenvolvida no Julius Exclusus, a um papa guerreiro (publicada anonimamente, pois Erasmo apesar de certas dispensas era um clérigo da Igreja...), nos Colóquios e na sua obra-prima o Elogio da Loucura, mestre da cultura europeia letrada (que está ficar cada vez mais longe de tal, pragmatizada, "bolonhizada", confinada, superficializada), mestre de príncipes e letrados, mestre dos cristãos (frase de um correspondente em Espanha, onde teve grande sucesso, tal como Marcel Bataillon narra magistralmente no seu Erasme et l'Espagne, 1937), mestre da concórdia, da paz (na altura designada mais pela palavra grega irene), e portanto da corrente de irenismo ou pacifismo europeu da qual é um exemplo a sua obra Consulta acerca da utilidade da guerra contra os Turcos, e que hoje continua tão actual face ao que por lá se passa e face ao imperialismo tão criminoso e inepto norte-americano e dos seus aliados e coligados, sempre prontos a bombardear e matar, oprimir e manipular... 
Neste sentido irenaico, crítico da guerra e fomentador da paz (e da economia e  educação, que era o que o Ocidente devia incentivar e exportar...), escreveu: "O importante, onde se deve aplicar toda a nossa energia, é a curar a nossa alma das paixões: Inveja, ódio, orgulho, avareza, concupiscência. Se não tenho o coração puro, não verei a Deus. Se não perdoar ao meu irmão, Deus não me perdoará... S. Agostinho encontrou um ou outro caso onde não se reprova a guerra: mas toda a filosofia de Cristo a condena. Os apóstolos reprovam-na sempre, e os doutores santos que a admitiram em certos casos, em quantos outros não a condenam? Porquê procurarmos à custa duma passagem evangélica o com que autorizar os nossos vícios?"
Nesta linha seguirá também no séc. XXI entre nós Agostinho da Silva, apelando a reconhecermos que o infiel está dentro de nós e é com ele que devemos travar a guerra santa....
Mestre de Cristianismo, nomeadamente com o seu super-lido Manual do Cavaleiro (ou Soldado) Cristão, de espiritualidade, tal como com o seu Modo de Orar a Deus (que traduzi, com Álvaro Mendes, do latim e comentei, em 2008, nas Publicações Maitreya), de mística ao Divino, esta considerada como o sumo Bem a ser procurado e que nos aponta em vários textos religiosos, nos encontros com Jean Vitrier (narrado na vida que escreveu do mesmo, bem como de John Colet) e sobretudo (ainda que pouco reconhecido) no Elogio da Loucura (Stultitae Laus), na loucura dos amantes, na abnegação dos compassivos ou no êxtase dos místicos.
Frontispício do Elogio da Loucura
Os desenhos nas margens, de Holbein, tornam esta obra ainda mais forte...
 A sua modernidade está bem visível na profunda auto-consciência crítica (seja a ironizar consigo próprio no Elogio da Loucura ou no Ciceroniano), na percepção da relatividade das coisas e costumes,  da moral e da própria verdade, na fragilidade do conhecimento humano, nomeadamente nos seus aspectos espirituais e religiosos (“anotação ridícula, lapso miserável, engano”, surgem nas notas que inseriu no Novo Testamento, em relação às interpretações que S. Tomás de Aquino fizera), donde uma reserva quanto ao valor e eficácia de superstições, rituais, dogmas, fanatismos e seitas, discernimento hoje mais do que nunca necessária quando vemos a expansão que nas populações mais desfavorecidas têm as muitas seitas manipuladoras e redutoras do Cristianismo ou da Religião, tal como vemos em tantas igrejas do reino de Deus, ou dos Últimos dias ou ainda Baptistas e outras...
Mestre na valorização da transformação interior, da metanóia a partir da experiência espiritual, da vida vivida em relação às doutrinas e ensinamentos.
Na valorização da convicção pessoal obtida por esforço ou studium, nomeadamente dos textos sagrados para se poder transformar a mente e o coração, a postura e a acção.
Neste sentido dirá: Ego aliam artem notoriam non novi nisi curam, amorem, et assiduitatem. Fácil de compreender em português mas que traduzimos com variantes de sinónimos: " Eu não conheço outra Arte de Conhecimento que o tomar de dores, amar o assunto e perseverança.”
Mesmo a sua actualidade em termos de política é impressionante e terminamos com ela para nos rirmos um pouco dos reis ou governantes e políticos modernos que nus sempre estão e vão e despojam a muitos, e para ver se eles fazem alguma metanóia, ou seja, se os pressionamos a tornarem-se mais justos e servidores do bem comum:
Sobre o adágio A Mortuo I, IX. 12, comenta: «Não há pacto nem limite, cada dia eles inventam novas formas de impostos, e o que quer que tenha sido introduzido para satisfazer uma necessidade momentânea é retido muito agressivamente”, o que podemos ver bem nos preços que as companhias petrolíferas, sem dúvida um dos cartéis ou grupos de pressão mais gananciosos do mundo, continuam a exigir aos consumidores, e que são bem dobrados pelas alcavalas impostas pelo Estado, fazendo com que estejamos a sustentar com os consumos de tais combustíveis, e por isso se recomenda andarmos  a pé sempre que se possa...
Para nos fortalecermos nestes tempos de crises múltiplas nada há então como o Amor, a Oração, a contemplação, a acção justa e solidária com o Bem Comum, e certamente o studium e o diálogo, como neste momento estamos aqui a fazer, a convergir na taça comum que Erasmo nos oferece a beber...
Oiçamos então Erasmo, num extracto do Modo de orar a Deus, uma obra  boa mas que não teve grande sucesso entre nós, apesar das dedicatórias esforçadas que fiz então e que reproduzo: 
                                                         Modus orandi Deum:
«Também Tiago recomenda, a quem necessita de sabedoria (sapientia), pedir (postulare) a Deus. Se alguém está aflito e triste, recomenda orar-lhe. Atribui, com efeito, à oração uma importância tal que o que ora pede para si mas também para os outros, por quem Deus é rogado. Se alguma pessoa está doente, ordena que os presbíteros sejam chamados para ela ficar livre da doença do corpo e da alma, através das suas preces. Deseja, finalmente, que todos os cristãos se socorram mutuamente com preces recíprocas a Deus: «orai, diz, mutuamente por vós, para que nos salvemos. A oração assídua do justo tem muito poder em verdade». 
Deve-se agora considerar como o Senhor Jesus, que se entregou com tanta diligência, que se esforçou (conatus) com tanto entusiasmo (studio) por transformar (infigere) as almas dos seus, provocava frequentemente com o seu exemplo os seus discípulos a orarem, tal como a ave que incita as suas crias a voarem. Muitas vezes, nas letras evangélicas, repete-se que o Senhor se recolheu para um lugar deserto ou ascendeu a um monte para orar e, algumas vezes (interdum) mesmo, sozinho. E não se deve ignorar que orou quotidianamente com os seus discípulos, tal quando se lê como, antes da comida, abençoou e deu graças e, depois do alimento, entoou hinos em louvor de Deus.
Sempre que, porém, tendo abandonado a multidão, se recolheu para orar, ensinou-os a orarem frequentemente ao Senhor em favor daqueles que foram encarregados de guiarem, sabendo que é infrutífera a obra do doutor ou do preceptor (monitoris) se nele não é infundido (adspiraverit) o favor celestial. 
E, de facto, não há prejuízo para uma boa obra, se, por vezes, ela é interrompida para se realizarem preces secretas, pois o que assim se isolou volta ao seu serviço mais pronto...»
Terminemos esta pequena invocação e  evocação com quatro dos seus valiosos ditos, que publiquei nas folhas iniciais do Modo de Orar a Deus:
                                                Sancte Erasme, ora pro nobis

segunda-feira, 24 de outubro de 2016

Plataformas em defesa das árvores lisboetas e os seus psicomorfismos. Entrecampos. 24/10/2016

Realizou-se hoje em Lisboa, em Entrecampos, uma pequena manifestação contra mais um abate municipal de árvores, previsto para a zona, e que levou alguns olisiponenses a imaginarem que existirá mesmo um matadouro ambulante, pelo menos imaginal, após várias árvores assassinadas na sua pujança vital (no jardim junto à Assembleia Nacional,  choupos na Fontes Pereira de Melo, e Tipuanas no Saldanha) ou então horrivelmente desfiguradas (por vezes em podas fatais), como aconteceu ainda há dias à histórica "Bela Sombra" do Limoeiro, donde séculos atrás algumas almas se envolaram para estados mais paradisíacos... 
Haverá ainda alguma possibilidade de consciencialização nos responsáveis e vereadores das Juntas ou da Câmara Municipal de que as árvores são seres vivo e dotados de sensibilidade e  consciência e que são absolutamente indispensáaveis à vida humana, mormente à já tão poluída citadina, ou o pragmatismo desumano que os parece animar fá-los pensar que basta à grande alma de Lisboa e aos cidadão apenas as vias e os circos dos Romanos ?  

Diante do edifício da Câmara Municipal, em Entrecampos, com as predestinadas vítimas por detrás, juntaram-se alguns membros da Plataforma em Defesa das Árvores, da Comissão dos Moradores do Campo Grande, do Forum Cidadania Lx, mais alguns amantes das árvores e fadas, bem revoltados com mais esta machadada nas árvores e almas...
Só um partido se fez representar mais graduadamente (o CDS, embora também estivesse um do PAN, António Lobo) e teve os seus momentos de diálogo televisível... 
                         
A Manuel Correia, Presidente da Liga dos Amigos do Jardim Botânico, a Ana Cristina Figueiredo, ex-dirigente da Quercus, que não esteve representada, e agora bem mais animada na Plataforma em Defesa das Árvores, e outros amantes da Natureza.

Alguns amantes das árvores, corações vivos que saíram das preguiças e comodismos, na alba lisboeta.
Pinto Soares, um dos clássicos do amor arbóreo nos séculos XX e XXI, da associação Lisboa Verde, e uma criança a ser iniciada pela Mãe a olhar com profundidade e holismo para o século XXII, com árvoredo...

Quem terá sido o master-mind do letreiro disfarçante do abate injustificado de árvores, para dar mais uns tostões de estacionamentos?

Pague, e cale-se...
Mortos famosos ou árvores vivas, removem-se ou matam-se...

A SIC e TVI estiveram presentes. A RTP estaria mais interessada se fosse bola e disponibilizaria então comentadores e doutores, serviço publico educativo, na visão alienante que a parece reger em vários sectores...

Diálogos entre conhecedores-amantes e jornalistas sensíveis e interessados
                      
Chá de Tília, quanto de nós não recolheram já e desfrutaram das flores tão perfumadas desta árvore medicinal tão benigna em Portugal?

Suzana Neves, boa conhecedora e escritora sobre as árvores, defendendo-as para uma jornalista televisiva.

                                       
A Tipuana, junto à Biblioteca Nacional, que tantas vezes toquei (ou me encostei) no caminho a pé do Metro para a consulta do espólio de Fernando Pessoa, ou de outras obras, parece que afinal vai sobreviver. Só pela proximidade desse grande centro espiritual de Portugal, formado de livros feitos de árvores, esta árvore, se fosse no Japão, estaria protegida por um shimenawa (isto é, envolvida por uma corda entrançada) e seria considerada sagrada, ligada ou habitada pela Divindade, pelos Kami, e como tal ora tocada ora cultuada, em especial dentro da cosmovisão e religião Shintoísta. 
Quando acontecerá tal em Portugal? 
Quando haverá mais do que meia centena de árvores consideradas de interesse público e protegida, o que é ridículo com o património fabuloso que temos, como por vezes tenha mostado na página do Facebook Culto das pedras, das árvores e das águas? 
Nem vale a pena contarmos as milhares que há no Japão... 
Eis um dos índices da qualidade anímica de um povo e dos seus governantes, o respeito, amor e relacionamento harmonizante e elevante com as árvores...

Há que ter cuidado com as promessas de transplante  destas árvores pois pode ser apenas um eufemismo de deixá-las morrer fora das vistas. 

Árvores sagradas, grande seres, dríades subtis. Será que a sua humildade gigante e natural faz sombra aos políticos da artificialidade e consumismo?

Alguns membros da candidatura cívica de Henrique Neto, tal como a Rosário Paulo Carvalho e o Rui Martins, estavam presentes e dialogantes.
Algumas das almas mais dinâmicas e empáticas com as árvores e a Natureza, tão menosprezada em geral pela política urbanística lisboeta e portuguesa. Porque não há consultas a grupos e a  mulheres sensíveis à Natureza, como a Manuela Correia e a Ana Cristina Figueiredo, a Rosa Casimiro e a Beleza Barreiros, estas almas axiais da Plataforma da Defesa das Árvores, com alguns milhares de pessoas já no Facebook?

Algumas das pessoas mais entusiastas, isto é, en Theos, em Deus, na Divindade, que une a natureza e o ser humano, também designada na Tradição Espiritual Portuguesa como o Espírito Santo, que aflui onde dois ou três se reunem em seu nome, isto é no Espírito da Verdade e do Amor...

Tudo vale a pena se a alma não é pequena, e portanto mesmo com poucos se a Verdade e Amor os anima, os resultados podem ser grandes. 
Assim consta que as árvores e os espíritos da Natureza de Lisboa estão gratos aos que deram algo do seu ser, para que elas e elas sobrevivessem e invisívelmente continuem a harmonizar-nos...

             
O PAN, o BE e os Verdes não estiveram, quanto a personalidades mais conhecidas, mas pelo menos o verde da Esperança está presente nos cartazes ainda vivos algures a esta hora, tanto mais que algum diálogo com o responsável Urbanístico (e da tragédia que se antevia)  parece que dará frutos para a vida senão eterna pelo menos mais prolongada de algumas árvores e seus espíritos da Natureza. E, claro, para a harmonia da grande Alma Lisboeta e seus seres..

A árvore interior de cada um, e a árvore cósmico-divina e eixo dos mundos agradecem, subtilmente...