sábado, 2 de novembro de 2013

A Gnose em Fernando Pessoa.... Fernando Pessoa, cristão gnóstico...

                     Da GNOSE em FERNANDO PESSOA... 
Uma tradição imemorial, provinda de reminiscência, intuição, clarividência ou revelação do Alto (de mestres, anjos), diz-nos que o ser humano na sua essência é um espírito, uma centelha de origem divina emanada do Ser e mundo Divino, tombada ou aprisionada num corpo animal, no mundo terreno, e que a sua missão principal é recuperar, ou redimir desse estado de amnésia e ignorância, a identificação espiritual e a ligação divina. E, após a morte física, retornar, no corpo glorioso ou transfigurado, a tal plenitude, ao pleroma, o que se consegue, desabrocha ou se desvenda pela vida justa e o auto-conhecimento interno, que é o reconhecimento e vivência do Ser real e espiritual…
                                        
Ora desta descida ou queda do mundo espiritual para o material e terreno Fernando  Pessoa tinha consciência e aludiu a ela frequentemente: («Aconteceu-me do alto do infinito// esta vida (...) Passos da Cruz, na revista Centauro, 1916, ou «Quando despertos deste sono, a vida/ Soubermos o que somos, e o que foi/ Essa queda até ao Corpo, esta descida/ Até à Noite que nos a alma obstrui», ou ainda, num belo texto de reminiscência espiritual, «súbitas confissões de outro que eu fui outrora/ Antes da vida, e viu Deus, e eu não o sou agora», afirmação que contudo poderemos questionar se foi mesmo experiência ou mais imaginação poética...
A palavra grega gnosis – conhecimento, assinala tanto o meio ou caminho como o objectivo ou estado auto-consciencial espiritual e, ao longo dos séculos, sempre houve a Gnose, assumida ora como o conhecimento iluminado da Verdade e da Unidade Divina e Espiritual, ora como uma via ou ciência iniciática, inspirada, libertadora, salvífica, capaz de despertar e iluminar, através da preparação e purificação gradual ou, em certos casos, numa revelação súbita.
Os Mistérios da Antiguidade, o discipulado de mestre a discípulo, as práticas ascéticas, devocionais, meditativas e contemplativas e a auto-consciencialização perseverante são os meios principais para este reconhecimento ígneo e etéreo acontecer em nós, e conservar-se, e o Gnóstico é  quem trabalha e mantém a tomada de conhecimento de si mesmo unido ao Espírito ou ainda à Divindade, ao Pai, ao Um, à Unidade, ao Princípio donde emanou….
Por Gnosticismo entende-se em especial os movimentos religiosos e salvíficos que, do I séc. d. C. em diante, e, mais especificamente no Médio Oriente e na Ásia Menor, se desenvolveram por vivência interior e ensinamentos, apoiados na sabedoria devedora do Helenismo e do Neoplatonismo,  bem como nas influências de ambientes, cultos e mistérios Orientais, a que se acrescenta por fim os ensinamentos directos ou indirectos de Jesus. 
Com efeito, se muitos destes movimentos se desenvolveram  a partir da Gnose mais pura, a do conhecimento directo espiritual, inefável, não mental ou discursivo, não de mera crença mas de visão e realização interior, também em alguns casos  filiavam-se ou apoiavam-se no ensinamento directo de Jesus ou no de mestres e seitas sírias e judaicas, enquanto outros ligavam-se mais à mística grega (com origens órficas e pitagóricas) e ao Neoplatonismo bem como ainda às influências dos ambientes ecuménicos de cultos, mistérios e iniciações do Egipto, especialmente em Alexandria.

 Alexandria e Médio Oriente que acolhiam também influências da Índia, de onde se conheciam então os gimnosofistas, desde o tempo Alexandre Magno,  e da qual o milenar Jnana Yoga, da Vedanta, é vivido ainda no séc. XX por um mestre Ramana Maharishi (na fotografia), num exemplo da gnose da não-dualidade,  e ensinamentos do Irão zoroástrico dualista e dos mistérios de Mitra, filosofia e sabedoria persa muito bem estudada no séc. XX por Henry Corbin, sobretudo no sufismo iraniano, Avicena, Sohrawardi e o Islão Shiita. Havia portanto uma Gnose forte na tradição Indo-europeia  embora encontremos  noutros povos e suas espiritualidades  algumas dessas características.  
Com efeito, sem doutrinas muito fixas ou rígidas, certos traços são contudo em geral característicos dos gnostikoi, tais como 1º, os dualismos, o Deus mau do Antigo Testamento e o Bom de Jesus (ou o Deus Desconhecido), o espírito e o corpo, o mundo espiritual e o material (repudiado ou contestado em geral), os filhos da luz e os das trevas, o redentor-salvador e o mundo ou a humanidade em perdição. 2º, complexos e imaginalmente criativos mitos ou cosmogéneses de emanações sucessivas dos Éons, Espíritos, Deuses ou Anjos. 3º, a desvalorização das hierarquias externas, dos rituais e sacramentos, ainda que os houvesse, por exemplo, nos Cristãos Gnósticos denominados valentinianos. 4º, desvalorização da moralidade externa (donde haver tanto a sublimação sexual como a licenciosidade) e das noções de bem e de mal, tão questionadas por Fernando    Pessoa, com a tão reiterada regra, clamada por S. Paulo, Rabelais e Aleister Crowley, "faz o que queres é a lei". 5º, ampla liberdade criativa e interpretativa das doutrinas, textos e experiências, tanto mais que o que se procurava era o transcender a ignorância, a ilusão, o emprisionamento. Na tradição indiana, Kaivalya e Moksha, eram o nome para essa libertação.
Estas são as principais características dos Gnósticos, vivendo baseados mais no auto-conhecimento espiritual, na revelação do Espírito ou do Mestre, e no desprendimento do mundo e da ilusão egóica, tudo desaguando num estado psico-espiritual ou realização libertadora, beatífica, frequentemente designado como o Repouso. "Um entre mil", dizia-se, do conhecedor do espírito luminoso, do Gnóstico unido ou mesmo identificado ao Espírito supra-pessoal, Um... 
Embora houvesse diversas tendências e características  nos Gnósticos, e S. Epifânio no começo do séc. V nomeia cerca de 30 seitas, vemos que Fernando  Pessoa coincidia com eles em vários pontos, nomeadamente no dualismo do espírito e matéria, na desvalorização deste mundo, onde o mal está tão presente («o Príncipe  deste mundo, como todos sabemos, é Satan, porque este mundo é o inferno de que falam», escreve), numa certa ascese e no menosprezo do seu Demiurgo ou Criador, identificado constantemente com o Deus inferior do Antigo Testamento, ignorante e limitado.  
Também a distinção entre o mestre Jesus  e o Logos ou Cristo Cósmico que nele se manifestara mais plenamente, é comum a Fernando Pessoa e aos Gnósticos, tal  como a da consciencialização iluminativa no autoconhecimento da centelha ou pérola perdida (referida por exemplo num fragmento que publiquei in Rosea Cruz, como "o encontro da alma consigo mesmo"), a qual a desprende ou liberta das ilusões e sonhos do oceano da existência terrena, o samsara hindu, ou a roda da vida medieval e do Tarot, após a sua queda através dos vários planos ou mundos subtis até este.
Em Fernando Pessoa vamos encontrar ao longo dos anos dezenas de textos nestes sentidos (por exemplo:«O Criador do Mundo não é o Criador da Realidade: em outras palavras, não é o Deus inefável, mas um Deus-homem ou Homem-Deus, análogo a nós mesmo mas a nós superior», que justificam plenamente a sua tentativa de união complementar do paganismo e do cristianismo e por fim a sua afirmação de cristão gnóstico.
 A Igreja Cristã nascente, ao colar ou unir a Lei e o Jeová do Antigo Testamento (concepção esta de Deus frequentemente criticada ou até ridicularizada por Fernando Pessoa..) à graça do Amor e Conhecimento libertadores da Boa Nova ou Evangelho de Jesus, ainda que tendo conservado uma certa Gnose, bem patente em Orígenes e Clemente de Alexandria, acabou por opor-se forte e dogmaticamente às pequenas mas numerosas igrejas ou grupos gnósticos, acabando por levar à destruição de quase todos os seus textos, que nos chegaram em parte apenas pelas refutações ou citações dos primeiros Padres da Igreja, ou então em obras dos maniqueus, os discípulos de Mani (216-276).
Ora desde a juventude (e para isso terá contribuído a leitura de textos de Clemente de Alexandria e de Fílon, bem como de autores já dos séculos XIX e XX Hargrave Jennings, J. M. Robertson, Ceasar Morgan, George Robert S. Mead e A. Siouville), encontramos em Fernando Pessoa uma preferência acentuada pela Gnose e, em vários fragmentos, escalona ascendentemente exotéricos, esotéricos e por fim os herméticos ou alquímicos ou gnósticos referindo ainda («os três modos de realização, mágico, místico e gnóstico», considerando estes últimos os verdadeiros detentores do Conhecimento. 
  Após os seus ensaios de desenvolvimento do Paganismo Transcendental, que culminou poeticamente em Alberto Caeiro e Ricardo Reis, Fernando Pessoa aprofundará a demanda iniciática e gnóstica e valorizará crescentemente a transmissão oculta no Cristianismo, concluindo, por exemplo, que «o Cristianismo, a exemplo da Grécia em que para além dos rituais visíveis e por assim dizer cívicos, havia o mundo subterrâneo dos Mistérios, formou-se com duas faces uma para a Luz, outra para a sombra, resultando da primeira as igrejas de Roma, Ortodoxa e Protestante. Da segunda face se formou uma única Igreja – a Igreja Gnóstica, possuidora dos íntimos mistérios; foi a ela a que mais tarde se haveria de chamar, na linguagem dos Rosicrucios, a Igreja Mística», dizendo dos Templários que «a esta Ordem Mística foram confiados os segredos e a tradição da Igreja Gnóstica», indicando assim que a antiga Gnose continuara entre nós como Igreja mística, com o Templários e, logo dada a sua extinção, com a Ordem de Cristo, fundada por bula papal em 1319 a pedido del-rei D. Diniz, e mais tarde ainda com o movimento da tradição Rosea Cruz.
 Fernando Pessoa estudou  então mais a Gnose dos (ou pelos) primeiros Padres da Igreja do que a dos Gnósticos principais, muitos deles de Alexandria, como Simão o Mago, Basilides, Valentino, Marcion (que afirma que «a Gnose é a redenção do homem interior e espiritual»), embora no bom livro Myth, Magic and Morals, a study of Christian origins, de Frederic Cornwallis Conybeare, que leu e anotou, haja um capítulo sobre Marcion, o primeiro a tentar preservar o ensinamento de Jesus fora dos quadros limitativos do Antigo Testamento e do Judaísmo.
Ora dentro das várias correntes que coexistiam na época áurea de Alexandria, de Antioquia e do Gnosticismo, Fernando    Pessoa desmarca-se de algumas delas e afirma as suas afinidades: «mais do que, propriamente, o dos neoplatónicos é meu o paganismo sincrético de Julião, o Apóstata».  
Todavia este imperador (361-62) romano Flávio Claudio Juliano (ou Julião), que abandonara o Cristianismo e estudara os ensinamentos Caldeus e de Máximo de Esmirna, era discípulo dos discípulos de Jâmblico (o iluminado sírio, autor de livros valiosos como os Mistérios do Egipto e a Vida de Pitágoras), o qual por sua vez era discípulo de Porfírio, autor do Tratado da Abstinência e secretário, biógrafo e editor (das Eneadas) de Plotino, o mais iluminado dos Neoplatónicos, por vezes crítico até dos Gnósticos. Ora o mestre de Plotino foi Amónio Saca, considerado por alguns como o primeiro Neoplatónico.
Esta seria a genealogia antiga iniciática da qual Fernando  Pessoa se reclamou, na sua fase neo-pagã, não se afirmando porém ainda cristão gnóstico. Aliás já noutro escrito dissera, «Juliano era, propriamente, um mitraísta, o que hoje se chamaria um teosofista ou um ocultista» (21-65), afirmação contextualizável  no sentido universal da palavra Teosofia, sabedoria divina, já que na época Fernando Pessoa  se distanciara (embora tivesse traduzido por encomenda de João Antunes seis obras) da Teosofia, enquanto Sociedade e movimento. Todavia ocultista  sempre foi Pessoa, enquanto estudioso das ditas ciências ocultas e das suas ordens e ensinamentos esotéricos, numa busca aturada de gnose ou conhecimento, seja espírita, astrológico, ocultista, kabala, tarot, alquimia, profecia, ordens mágicas, cosmogénese e antropogénese, teologia e o caminho de retorno e realização espiritual.
Na sua biblioteca, ainda hoje  mal catalogada na casa museu Fernando Pessoa, entre os cerca de oitenta livros sobre as origens do Cristianismo, encontramos as obras de Juliano (a quem consagrou aliás várias poesias e textos, uns dentro do seu projecto das Legendas, chegando a admitir que algo dele estivesse em si, o que cálculos ou adições numerológicas indiciariam), bem como livros contendo extractos dos textos dos primeiros Padres da Igreja, que durante muito tempo foram a fonte principal sobre a Gnose e os Gnósticos, tais como os livros de Edward Burton, John Kaye, Alfred Loisy e C. Morgan, lidos por Fernando Pessoa.
Historicamente a adopção de um conceito simples de fé (pisthis) mais do que de conhecimento (gnosis) que caracterizou o cristão da Igreja Católica nascente, que contudo tivera  a sua gnose profunda, bem expressa em Jesus (sobretudo mais patente no Evangelho de S. Tomé), em Orígenes e Clemente de Alexandria,  este tendo escrito mesmo: «a imagem de Deus é o seu Logos (e este divino Logos é o filho autêntico de Nous, luz arquétipa da luz) e imagem do Logos é o verdadeiro homem, o espírito que é no homem, e do qual se diz, por causa disso, de ter sido feito à imagem de Deus e à sua semelhança, assimilado ao Logos divino pela inteligência do seu coração e, por isso, razoável», Protreptico, X-98), suscitou a oposição do mais exigente e elevado (mas também muitas vezes complicado ou rebuscado) posicionamento dos Gnósticos, que começaram a dar origem a igrejas (sobretudo com Marcion e Valentino) ou a escolas e grupos, alguns com doutrinas ou aspectos considerados já heréticos (tal a negação da incarnação de Jesus ou da sua morte, e dos quais Fernando Pessoa fala), o que acabou por levar à destruição desses grupos gnósticos, tal como Fernando Pessoa descreve: «No conflito entre a Gnose e o Cristismo paganizado a Gnose foi vencida. Os gnósticos eram os  depositários da autêntica tradição cristista. ... O catolicismo destruiu a verdadeiro Cristismo.    Este porém, não morreu, porque a Gnose não se extinguiu».
Anote-se que a expressão "Cristismo paganizado", muito usado o 1º vocábulo por Pessoa mais jovem, corresponde à ideia que muitos dos ritos e costumes religiosos cristãos foram adaptações do que proveio do paganismo...
Ora se muitos dos textos gnósticos só nos chegaram, e apenas em parte, nas refutações dos primeiros Padres da Igreja (Justino, Ireneu, Hipólito, Epifânio), em certos textos Apócrifos não recolhidos no Novo Testamento”escolhido por S. Jerónimo, ou então nas obras do iraniano Mani (séc. III), o fundador de uma religião gnóstica que chegou até China e se perpetuou até ao Catarismo medieval, sendo de notar um ou outro poema de Fernando Pessoa dedicados à Mani ou ao Maniqueísmo, será só já nos meados do séc. XX que se descobrem finalmente cinquenta e nove textos gnósticos completos, de várias tendências ou magistérios cristãos coptas, em Nag Hammadi, no Alto Egipto, mas que Fernando Pessoa já não conheceu, dos quais se destaca o importante Evangelho de Tomé, um belo exemplar da Gnose, na tradição iniciática de Jesus, com enfâse no auto-conhecimento espiritual e na libertação em relação ao ego e às ilusões deste mundo…
 Ora a leitura das obras dos primeiros Padres cristãos, de Fílon e dos herméticos egípcios, de Alexandria, como sobretudo, já do séc. XIX, o livro The rosicrucian, their rites and mysteries, de Hargrave Jennings (1817-1890), onde o capítulo V se intitula Hermetic Philosophers, e talvez as obras do erudito teósofo  George R. S. Mead (1863-1933, na fotografia em cima), nomeadamente o Quests old and new (no qual leu a definição de Gnose, por Reitzenstein: «conhecimento imediato dos mistérios de Deus recebidos por contacto directo com a divindade – mistérios que devem permanecer ocultos ao homem natural»), terão contribuído para escrever os textos adolescentes, intitulados o Filósofo Hermético, ou o Desconhecido,  nos quais encontramos já uma valorização do Hermetismo (movimento gnóstico inicialmente não cristão e mais ligado à tradição egípcia) e da Gnose e onde escalona ascendentemente exotéricos, esotéricos (por vezes identificados aos gnósticos) e, por fim, os herméticos, alquímicos (ou também gnósticos), os verdadeiros detentores do conhecimento.  
 É em verdade aos meios gnósticos de Alexandria que se deve atribuir, nos séc. II, III e IV, a criação do Hermetismo (donde a equiparação frequente de herméticos, gnósticos e alquímicos realizada por Fernando Pessoa), com a redacção do Corpo Hermético, no qual a cosmogonia dos antigos Egípcios (sobretudo visível no tratado do Poimandros), e as influências e práticas de astrologia, magia, soteorologia e alquimia se fundiram com  o neo-platonismo e tiveram uma fortuna longa, quer pela sua divulgação no Renascimento pela tradução de Marsílio Ficino do grego para latim (1ª edição, em 1497, por Aldo Manuzio, e depois muito lida e traduzida nas línguas vulgares), quer através das  especulações acerca da Philosophia perennis, quer das práticas alquímicas, algo que Fernando  Pessoa acolherá utilizando ou estudando em alguns fragmentos a linguagem processual da alquimia como simbólica da purificação e transmutação anímica, ou mesmo como símbolos da concentração e revelação espiritual e da libertação universal.
Na sua fase mais forte de anti-cristianismo (ou anti-cristismo romano), tão influenciada por livres-pensadores e descrentes como Binet-Sanglé e J. M. Robertson, ou mesmo de filósofos como Nieztche e Tolstoi (fotografia em baixo), e com o desenvolvimento do Paganismo Transcendental, que desabrocha poeticamente em Alberto Caeiro e Ricardo Reis, surgem na prosa deste último até críticas ao misticismo e à espiritualidade seja neoplatónica seja gnóstica, afirmando em certo momento, por exemplo, «a decadência do helenismo representada pelo neoplatonismo alexandrino». 
 Contudo, reconhece Ricardo Reis, em 1917, num dos prefácios à obra de Alberto Caeiro, que o cristianismo ou cristismo inicial «no conflito com o misticismo neoplatónico, outra coisa, porém, aconteceu. Esse misticismo produziu, entrando em conflito ante-sincrético com o cristismo, a heresia célebre da Gnose. Esta heresia não desapareceu nunca. Opressa, esmagada exteriormente, essa seita ocultista tornou-se secreta, desapareceu da evidência histórica, mas não da vida. Não é impossível encontrar, aqui e ali, evidências da sua permanência secreta. E essa permanência oferece aspectos de conflito com o cristismo oficial e sobretudo com o católico. A par do cristismo oficial, com os seus vários misticismos e ascetismos e as suas magias várias, nós notamos, episodicamente vindo à superfície, uma corrente que data sem dúvida da Gnose (isto é da junção da cabala judaica com o neoplatonismo) e que ora nos aparece com o aspecto dos cavaleiros de Malta, ou dos Templários, ora, desaparecendo, nos torna a surgir nos Rosa-Cruz para, finalmente, surgir à plena superfície na Maçonaria. Os maçons são os descendentes remotos, mas segundo uma tradição nunca quebrada, dos esotéricos espíritos que compunham a Gnose...».
 De realçar as ideias ou entendimentos de Fernando Pessoa de que a Gnose resulta do sincretismo do Neoplatonismo com o Misticismo cristão e também com a Cabala (que na altura ainda não surgira…), e que no final do séc. XIX veio ao de cima «na moderna revivescência dos sistemas ocultistas, notável sobretudo pela importação, nos países de língua inglesa, do chamado Budismo esotérico, atroz amálgama de superstições de selvagens, de humanitarismo decadente e de gnosticismo atrapalhado, trouxe outra vez superfície o que pela Europa havia de restos da tradição oculta da Gnose».
Entenda-se que o “Budismo esotérico” designado e criticado é a Teosofia, ou a visão de parte da gnose oriental apresentada por ela sob tal designação e que fora mesmo o título de uma obra de um dos teósofos principais de então, A. P. Sinnet e que viria a ser traduzida também na mesma colecção da editora A. M. Teixeira em que Fernando Pessoa colaborara, Teosofia que criticou, como se sabe e acabámos de ler.
Fernando Pessoa no aprofundamento da demanda iniciática, valorizará constantemente a transmissão oculta no Cristianismo, concluindo, por exemplo, que «o Cristianismo, a exemplo da Grécia em que para além dos rituais visíveis e por assim dizer cívicos, havia o mundo subterrâneo dos Mistérios, formou-se com duas faces, uma para a Luz, outra para a sombra, resultando da primeira as igrejas de Roma, Ortodoxa e Protestante. Da segunda face se formou uma única Igreja – a Igreja gnóstica, possuidora dos íntimos mistérios; foi a ela a que mais tarde se haveria de chamar, na linguagem dos Rosicrucios, a Igreja Mística», dizendo dos Templários que «a esta Ordem Mística foram confiados os segredos e a tradição da Igreja Gnóstica».
À passagem, algo obscurecida nos séculos XVIII e XIX, da Gnose dos antigos e míticos rosacruzes para os maçónicos teceu Fernando Pessoa críticas, tal como em França fizera o mistagogo ocultista Eliphas Lévi,  devido à falta de conhecimento dos maçónicos em relação aos sentidos profundos e transformadores que os símbolos e rituais contêm potencialmente, afirmando mesmo a sua desilusão da Maçonaria da época: «fomos esmagados por liberais para quem a liberdade era a simples palavra de passe de uma seita reaccionária, por livres-pensadores para quem o cúmulo do livre pensamento era impedir uma procissão de sair, de Maçons para quem a Maçonaria (longe de reconhecerem nela a depositária da herança sagrada da Gnose) nunca foi mais do que uma carbonária ritual», ou ainda «a Ordem, em vez de ser, como supremamente lhe competia a depositária consciente das doutrinas sagradas da Gnose e da Kabbalah nas suas transmissões templária e rosicruciana, ficou uma simples Carbonária ritual, um anticlericalismo secreto, católico-romano em espírito até à medula, na sua chateza, na sua intolerância, na sua ignorância das mesmas consequências superiores da sua própria constituição e dos seus próprios Mistérios», algo que se conservou em parte até aos nossos dias pois sabemos bem como as egrégoras ou formas de pensamento colectivo não mudam tão fácil nem rapidamente…
Esta crítica forte mas construtiva à Maçonaria não o impedirá porém em 1935 de sair em defesa dela, escrevendo um longo artigo no Diário de Notícias, aquando da perseguição às Associações Secretas pelo  Estado Novo de Salazar, através da proposta de lei do deputado José Cabral de 19 de Janeiro, ora porque sabia do valor ocultista e gnóstico dela ora porque tal perseguição fora também aplaudida por católicos reaccionários, segundo Fernando Pessoa escreve em textos em resposta a artigos de jornais publicados pelo jornal católico A Voz, nomeadamente, referindo os «encómios com que o projecto foi afagado pela imprensa pseudo-cristã, que as "associações secretas", que ele verdadeiramente visa, são aquelas que envolvem o que se chama "iniciação"».
 No fim da sua vida, na nota autobiográfica de Janeiro de 1935, afirma-se Cristão gnóstico e iniciado na Ordem Templária de Portugal, esclarecendo deste modo definitivamente a sua religiosidade e o seu laço de amor iniciático. Isto já fora antes frequentemente enunciado, como, por exemplo, na 3ª das condições para a iniciação na Ordem Templária de Portugal: «crença (indefinida) na divindade de Cristo e da Trindade Santa», ou por exemplo num texto em que conclui «só podemos ser um com Deus, em e através de Cristo».
Mas Cristão Gnóstico em que sentidos?
Seria pela sua ampla liberdade gnósica e hermenêutica dos textos tradicionais, sem se coagir por cânones e dogmas externos?
Seria pelos seus estudos e realizações da Tradição secreta do Cristianismo, da Gnose cristã, presente em Jesus, e em seguida na tradição Templária, Rosicruciana e ocultista em que se iniciara e avançara, ou ainda da gnose Cabalística e Maçónica, que também conhecia e aprofundara, e que afirma expressamente serem veios dessa tradição secreta?
Seria pelo seu reconhecimento não só do Cristo (em um ou outro texto identificando-o mesmo com Sophia, a Sabedoria feminina, a papisa do Tarot), o Logos, intermediário entre Deus e os homens, como cada vez mais até de Jesus, como o Mestre, o Salvador, o pináculo da hierarquia dos mestres?
Certamente por algumas destas razões e mais algumas…
Além das afinidades íntimas que desde o início da sua demanda tinha com os Gnósticos, nomeadamente a desvalorização deste mundo, do mal e das limitações que ele nos impõe, e do seu Demiurgo criador, em verdade, Fernando    Pessoa ao investigar fortemente a natureza de Jesus e do Cristo (bem como dos seus ensinamentos, tal como já vimos antes, referidos nas transmissões gnósticas, templárias e rosicrucianas), em muitas, por vezes desassosegadas, horas e páginas, conseguirá que a fase frequentemente virulenta de anti-cristismo de 1907 a 1915 se vá transformando numa percepção cada vez mais profunda e conhecedora, gnóstica, fazendo-o afirmar: «A natureza de Jesus Cristo é dupla – para os ocultistas como para os teológos cristãos... Os Gnósticos, que eram ocultistas, ou pelo menos místicos superiores, assim viram, mas separaram as duas naturezas, adorando só a divina, que lhe será necessariamente superior, e não a humana, que, quanto muito, só em grau, que não em género, o poderia ser».
Mas talvez tenhamos que reconhecer que no fim do seu percurso precocemente terminado ao morrer com 47 anos, Jesus, o Cristos, o ungido, «em quem a dupla natureza de Homem e de Deus incarna numa pessoa só» já não é apenas um grau, o mais elevado, da escala iniciática, sobre a qual Fernando Pessoa tantas vezes laborou, admitido também noutro texto e escala no qual o grau ou nível supremo é ocupado pelo Senhor (Jesus), mestre do Templo,  (e em que no 1º nível, designado como o dos construtores "makers and builders", curiosamente nos dá os exemplos do rei D. Dinis e de Bandarra, consagrando assim a poesia e a profecia, a que ele tanto se dedicou também), mas sim «o laço entre o Mundo e Deus».
Quanto à questão da Divindade, sempre essencial na Gnose, sabemos quão crítico foi Fernando Pessoa do Jeová bíblico, ou seja da concepção de Deus judaico-cristã, tribal, violenta e possessiva, estando antes em linhas próximas do Gnosticismo, nomeadamente de Marcion, e mesmo no fim da vida, ao contrário da sua relação com Jesus e Maria,  na qual se dera uma aproximação grande ao aceitá-los como grandes seres intermediários (algo que ainda não foi compreendido pela generalidade dos pessoanos), Fernando Pessoa continuará a desvalorizar o Demiurgo ou criador deste mundo, provavelmente apontando para uma visão ou um entendimento emanacionista cíclico e não criacionista: «E isto tudo durará o tempo que tiver que durar, porque nada há perene ou eterno, e o mesmo Deus que criou este mundo não é porventura mais que um de muitos «deuses», criador de um de muitos «universos», misteriosamente coexistentes, todos eles porventura descritíveis como infinitos e eternos. O mistério – di-lo o mais alto ocultismo – é maior não só que o Universo, mas que o mesmo Deus».
De realçar aqui as expressões “alto ocultismo”, referida em parte às Ordens Secretas e seus ensinamentos a que teve acesso (nomeadamente a Golden Dawn e a Astra Astrarium), e o “mistério”, que na Gnose mais tradicional é designado pelo Um, o Espírito perene e absoluto, o Princípio de Tudo, o Absoluto, donde emanam ciclicamente as manifestações cósmicas, onde se erguerão os deuses e as individualidade…
 Fernando   Pessoa contudo talvez se tenha autolimitado nesta captação do Absoluto, o que está também patente na sua tragédia subjectiva Fausto (mito arquétipo até com raízes na vida do gnóstico Simão, o Mago), pois vê ou visualiza acima de Deus, o Destino, a Inteligência: «acima da ânsia de fusão com os produtos de Deus, está, com efeito, a ânsia mística de fusão com Deus, que é a base do ocultismo (quase) todo. Mas acima desta mesma ânsia está a ânsia de fugir a Deus e ao mundo – a ânsia de fusão com o Destino. (...) A Inteligência não é deste mundo, é estranha à substância do mundo: deriva do Destino, superior aos Homens e a Deus», concepção esta que desenvolverá nos textos intitulados Caminho da Serpente, nos quais diminuía a sua relação viva com a Divindade, ou com o seu Logos salvador, mas que acabará por repudiar, tal como abdicadas foram a via da magia e da alquimia, conforme ele próprio confessa no fim da sua vida: «pensar o que fazer do caminho da serpente agora repudiado», fragmento este que não tem sido tomado em conta pelos poucos que se debruçaram, e em geral insuficientemente, sobre este caminho da Serpente, ascensional mas que se pode tornar demasiado luciferino, isto é, intelectual e sem a devoção e amor às manifestações libertadora possíveis da Divindade…
 
Certamente que os Gnósticos, também conhecidos, na divisão valentiniana (do gnóstico Valentino), por pneumáticos (de pneuma, espírito e sopro, em grego, com o qual se identificavam e a partir do qual se libertavam das prisões terrenas) serão uns poucos e isolados, em comparação com os hílicos, ou terrenos, e os psíquicos ou mentais (os envoltos na dualidade, no ego, no pensamento discursivo ou na vaidade do ensinar), isolamento este que estava bem para a aristocracia de espírito ainda que vagabunda, pobre e desassossegada do individualista e modernista Fernando    Pessoa.
Ele lembra-nos, porém, que a Gnose, a Iniciação, não é meramente uma torre de marfim intelectual mas um estado intensificado de vida e de intuição, em que «os graus de iniciação representam estados de conhecimento que são simultaneamente estados de vida», afirmação esta numa analogia de grau superior ou complementar à frase “o que em mim está pensando está sentindo”.
A vertente ou eixo mais directo ou essencial da desvendação e auto-conhecimento salvífico ou libertador, característico da Gnose universal, será também transmitido por Fernando Pessoa quer em poemas, como os do ciclo de Isaac Luria e de Jesus, quer em fragmentos, nomeadamente o importantíssimo dos últimos meses da sua caminhada na Terra: «o conhecimento de Deus não depende do hebreu, nem de anagramas, nem de símbolos. Nem de língua alguma, falada ou pensada (variante: figurada); faz-se pela ascensão univocal da alma, pelo encontro final da alma consigo mesmo, do Deus em nós consigo mesmo».
Certamente que estas palavras finais apelam a uma Gnose exigente nossa, iniciática, auto-consciente e profunda e perseverante para alcançar a dimensão espiritual a a ligação unitiva e divina. E, para nos lembrar e estimular a tal, serve a tradição Gnóstica, na qual Fernando Pessoa se inseriu e nós também...
Vale!
Alguma bibliografia sobre a Gnose:
Gasparo, Giulia Sfameni. Gnostica et hermetica. Saggi sullo Gnosticismo e sull’ Ermetismo. Roma, ed. dell’Ateneo, 1982.   Puech, Henri-Charles. En quête de la Gnose. I, II. Paris, Gallimard, 1978.  Grant, Robert M. La Gnose et les origines chrétiennes. Trad. Paris, Seuil, 1964.   E os textos que editei em Fernando Pessoa, Rosea Cruz. Lisboa, 1989. E a Poesia Profética, Mágica e espiritual. 1989.
Bibliografia, apenas com os nomes de autores:
Obras de Louis Ménard, G. R. S. Mead, Hans Leisegang, A. Siouville, Bô Yin Râ, A. J. Festugière, E. Bonaiuti, Hans Jonas, Mircea Eliade, I. Couliano, Valentin Tomberg, Duncan Greenlees, A.-J. Festugière, Simone Pétrement, Henri-Charles Puech, Jean Doresse, Yuri Stoyanov, Bedde Griffiths, Karlfried Graf Dürckeim, Henry Corbin, Giulia Sfameni Gasparo, Serge Hutin, Robert Ambelain, Émile Gillabert, Jacques Ménard, Robert M. Grant, Raimon Panikkar, André Wautier, Elaine Pagels, Benjamin Walker, Antonio Piñero, Pedro Teixeira da Mota..., etc.

Consciência, práticas espirituais, o Espírito, o Divino. Como meditarmos e nos fortalecermos.

 Quando tentamos aprofundar a consciência e o pensamento que nela ocorre apercebemos-nos mentalmente que no nosso pensar há vários tipos de consciência ou, se assim conseguirmos observar, que na nossa consciência há vários direccionamentos da atenção-pensamento, que poderemos dizer sobreponíveis ou complementares, e que com objectivos de auto-consciencialização espiritual discriminaremos assim:
Em 1º lugar podemos consciencializar-nos da nossa situação corporal, e temos a consciência postural, corporal e vertebral: se está mais ou menos alinhada, direita, tensa ou descontraída, com problemas ou dores aqui ou acolá, podendo mesmo acontecer descontrairmos ou harmonizarmos pela consciência e respiração tais zonas.
Em 2º lugar temos a consciência respiratória: ou seja, sobre a respiração lançamos ou deixamos cair a nossa consciência ou consciencialização (num ver e sentir interior) e observamos, concentramos-nos nela e desfrutamos dos seus efeitos benéficos mais acentuadamente, que vão desaguando na energetização global e na diminuição dos pensamentos dispersivos que em geral ocupam a mente...
Em 3º lugar passamos para a consciencialização energética e vibratória: sentimos o nosso corpo a vibrar, sentirmos-nos mesmo num corpo subtil vibratório.
Em 4º lugar, começamos a observar melhor os pensamentos, ou mesmo a sentir ou até ver as imagens vivas que estão em nós e à nossa volta, mais ou menos provenientes de pensamentos, emoções, desejos, em suma caminhos reais ou fantasiosos, nossos e dos outros. São de certo modo os planos astrais e psíquicos, evanescentes, mutáveis, e nos quais não nos devemos deter demasiado, se não para desanuviar e dissolver, de modo a prosseguirmos pondo mais a consciência, o olhar interior e a alma no mundo espiritual e divino...
Em 5º lugar começamos a ter mais presente a consciência da auto-consciência, ou seja, ao estarmos conscientes de nós próprios, num corpo físico, utilizando um cérebro e uma alma, com os seus órgãos de percepção que estão mais ou menos harmonizados, começamos a sentir a consciência pura em nós e a intuir o mundo espiritual, a consciência infinita ou divina que perpassa por nós, e começamos a desfrutar a sua paz clarividente..
E tal como sabemos que as redes neuronais se desenvolvem com o exercício mental a que as submetemos, assim também a luminosidade do nosso ser ou os órgãos de percepção e irradiação da nossa entidade espiritual, chamados chakras em sânscrito, ou rodas de energia, se desenvolvem ou harmonizam nestes momentos de maior auto-consciência e ligação divina...
Quais as melhores práticas de trabalharmos e desenvolvermos tanto o nosso ser espiritual como os seus órgãos de percepção e comunicação, tanto mais que os vamos utilizar ou depender deles com a saída do corpo físico na morte, é então uma questão  importante e em grande parte a Religião deve facultar e estimular tal despertar interno psico-espiritual...
Em 6º lugar, como resultado da abertura e alinhamento da alma e do aprofundamento da consciência temos a consciência da presença do espírito e dos seus sinais ou atributos em nós, nomeadamente a luz, o silêncio, a paz, o amor. São níveis e realidades em geral só vivenciáveis durante a inspiração, o amor, a concentração, a meditação, a oração e contemplação, embora depois se tornem mais presentes no que fazemos no dia a dia, se conseguimos manter tal alinhamento. A técnica islâmica de se rezar 5 vezes ao dia certamente ajuda bastante a tal auto-consciencialização espiritual e abertura ao Divino...

E assim com o tempo, quando fechamos os olhos e meditamos ou oramos, por vezes conseguimos logo sentir a sua Graça, isto é, a Sua presença no nosso peito, ou o Seu omnipresente espírito harmonizando-nos. Ou podemos sentir um dos órgãos espirituais a trabalhar, o coração, com a abertura, invocação, adoração, amor e por fim certa unificação e irradiação divina...
Podemos avançar então mais para o mistério do divino e em especial de Deus em nós. Donde vem a presença de Deus, ou de onde emanam os seus eflúvios? Do Cosmos infinito, do centro do Sol, do centro do Cosmos, do mais íntimo de nós? Não será a simultaneidade, a instantaneidade, a plenitude que melhor o caracterizam, mas só no nosso mais íntimo vivenciável?
Como podemos aumentar a receptividade a Deus, para além de levarmos um modo de viva harmonioso, justo, puro, elevado? Que aspiração e chama de amor acesa são necessárias em nós?
As nossas utilizações dos pensamentos e sentimentos e as nossas práticas espirituais poderão levar a quantificações possíveis, de tal forma que podemos dizer que às 11:00 tenho quatro unidades de presença, amor ou luz Divina e que às 12:00 isso aumentou? Sim...

Certamente que o estado da nossa aura e do nosso corpo espiritual melhora e clarifica-se ao receber forças e correntes luminosas dos mundos e seres espirituais, quando fazemos tais meditações e práticas. E por consequência vamos abrindo-nos mais a Ele, seja enquanto Espírito Absoluto Original, seja enquanto Logos ou Inteligência-Amor coesivo omnipresente, seja enquanto Espírito que está em nós, centelha, chispa, sol de amor, confiança, força, alegria...
É com este nível que devemos trabalhar e identificar-nos mais. E assim conseguirmos sentir ou mesmo afirmar convictamente: Eu sou um Espírito divino. Ou, Eu sou um Sol (ou uma centelha do Sol) divino, e irradiarmos tal realidade íntima como luz e amor para próximos e distantes, vivos e mortos...
E finalizemos este pequeno escrito saudando e invocando a Divindade enquanto Espírito Primordial, da qual uma imagem material evocadora será o espaço infinito, e que é em nós mais perceptível quando estamos numa frequência mental de consciência não-dual, quando saímos de uma meditação ou de um recolhimento, ou perante um horizonte imenso...
Aprofundar este sentir é certamente uma outra prática importante não só para inspirarmos e expirarmos beneficamente por entre os prédios citadinos, as tensões das sociedades, as opressões e os sofrimentos da Humanidade, mas também para cultuar e trazer mais à dimensão humana a (ou algo da) Unidade cósmica Divina não só salvífica mas também salutar...
Saibamos pois resistir à crise mantendo a nossa ligação vertical com o Divino, fortalecendo o nosso sistema imunitário e desenvolvendo um relacionamento horizontal de compaixão e justiça, amor e sabedoria com os seres que vamos encontrando no Caminho da Vida, presencialmente ou virtualmente...

sexta-feira, 1 de novembro de 2013

Lisboa, my best photos. As melhores fotografias de Lisboa, das que recebi dela...


I- Ó Tágides nossas, Ó Musas camoneanas, inspirai-nos e fortificai-nos... Yom...
Naiades or Tagides, spirits of the river Tagus, and of Camões, inspire us...





      II- A água tágica que ainda escorre livre é certamente de uma outra época...                  The water that still comes free is from old sources, muses and kings...



III- Saber caminhar em Lisboa consciente da sobreposição dos vários níveis da Realidade. Walking in Lisbon aware of the diferent levels of Reality...
       
IV- Esta Lisboa das sete colinas reflecte-se à noite sob lampiões imemoriais, talvez mesmo como as estrelas vistas de Marte, no chão molhado e quadrado que cruzamos...
The magic of the night in Lisbon, with her seven hils, make us navigate under immemorial beams of Light, projecting us to the reflections of the stars in distant planets...

quarta-feira, 30 de outubro de 2013

Hallowen, Samain, ou as celebrações sacras celtas e pré-cristãs...


                         Samain, Hallowen no ar e nas almas...
Esta celebração celta e druídica, dentro da imemorial religiosidade pré-cristã europeia, realiza-se entre o equinócio do Outono e o solstício do Inverno, em especial entre 29/10 e2/11, desenrolando-se em festejos, danças, rituais e orações que marcavam o fim e o começo do novo Ano. 
Eram os dias de entrada no Inverno e nas trevas maiores do tempo, difíceis e que exigiam certas energias acumuladas para um renascimento posterior. Seja a Divindade, sejam os Deuses e Espíritos da Natureza, eram evocados como protectores do novo ano e presenteados com energias aplacantes, sendo-lhes oferecidos rituais, poesias, danças e sacrifícios. 
As lutas entre as forças do bem e mal adivinhavam-se nas tempestades e raios, e os Deuses e espíritos da Natureza desciam mais à Terra e à visibilidade: o mundo de Sid (do além) estava aberto, as fronteiras esfumavam-se, as visitações, inspirações e oráculos podiam suceder...
Esta abertura ao Sid, ao mundo subtil e espiritual, era um dos traços mais distintivos dos dias da celebração do Samaim, algo que se conservou no Cristianismo, com os dias de Todos os Santos e o dos Mortos, que assinalam e apelam a esta abertura e sintonia maior entre os mundos e seres, na sintonia de frequências luminosas ou  vibratórias que conseguirmos...
Haveria uma tradição de localização de entradas para o Sid ou tal podia acontecer em toda a parte para todo aquele que o merecesse? 
Tradicionalmente sendo o lado do Sol poente, ou Ocidente, a terra para onde  também se encaminhavam os mortos e portanto da entrada no mundo subtil era para esta direcção que se sintonizava e,  portanto, quemnestes dias quem quiser orar ou meditar nestas linhas, poderá fazê-lo virado nesta direcção e aproveitando o balanço ou a corrente energética… 
Ou mesmo virar a cama para tal eixo e, ao adormecer, orar, sonhar e deixar-se levar ou activamente partir para o mundo intermediário e subtil, ou mesmo para a Ilha Afortunada, no meio do imenso Oceano da Manifestação, também denominada Avalon, a ilha da imortalidade ou das maçãs pentagonais que a propiciam...
Ou seja, a ilha ou reino utópico d da consciência mais perfeita do espírito que somos e dos que nos rodeiam e que se manifesta harmoniosamente nos mundos, sob o Um Divino e a sua Graça branca e nos sete planos...

                                                                         Branca de Neve, por Leonor B

Quanto às festas, às comidas, às cabaças escavadas (ou cabeças sacrificadas e iluminadas), talvez possamos lembrar que muito provavelmente nestes dias, os sacrifícios primitivos passaram a ser também refeições ou banquetes nos quais algumas comidas eram oferecidas aos deuses, aos antepassados e protectores dos grupos e que chamas (ou velas..), perfumes de flores, odores de ervas ou incensos, poções e alimentos, preces, danças e cantos elevavam-se para o Sid, com amor e gratidão, e podiam assim fazer descer alguma presença, inspiração ou bênção, que enchia o silencioso círculo ou família, mesa ou cabeça, de que a cabaça aberta e luminosa é símbolo,algo que hoje se toma mais ou menos consciência por aqui e acolá...
Mas porque será que as pessoas hoje sentem tão pouco do Sid ou do além, à excepção de alguns grupos espíritas ou esotéricos ou certas pessoas mais sensitivas? 
Basicamente porque estão demasiado cheias do mundo e das suas futilidades, roubos e desgraças, sendo os meios de informação e a televisão os principais causadores de tal crescente insensibilidade e incapacidade de se sentir ou ver mais os mundos subtis e espirituais e os seus seres...
Morre tanta gente nossa amiga ou próxima, queixamo-nos da tragédia que foi e da sua falta, mas depois embebedamo-nos de informação televisiva ou revisteira e desenvolvemos pouco silêncio e escuta interior para os poder sentir e escutar ou orar e iluminar… 
Passe então a ver ou contemplar mais com o olho espiritual, e deixe de o encher de lixo televisivo, informativo ou de conversas.. 
Abra-se mais aos sonhos, visões, telepatias e oráculos, nestes dias de transparência e ligação maior entre as almas na terra e os espíritos e a Divindade... 
O Samain está de novo entre nós e, mesmo que sob a forma ruidosa e superficial do Hallowen, poderemos intuir os aspectos tradicionais e luminosos que estão por detrás dele e, se os aprofundarmos e aplicarmos amorosamente conseguiremos, despertar mais o espírito que está em cada um de nós e naqueles com quem nos relacionarmos, seja vivos ou já desencarnados, na Unidade Divina, ou sob a Sua Graça... 

segunda-feira, 28 de outubro de 2013

Erasmo, pedagogo do Renascimento e a actualidade das suas propostas. Homenagem no dia do seu aniversário de 2013 e de 2021

                                      

Erasmo de Roterdão (1466 ou 1467-1537), ainda hoje passados cerca de 500 anos da sua vida na Terra sobrevive no coração e alma de quem o lê, estuda e ama, numa aura de graça e de luz, de sabedoria e amor à verdade, fazendo juz ao que alguns, como ao nosso Antero Quental, ou a Sócrates, clamaram: Sancte Erasme, ora pro nobis...Ou seja, possamos comungar com a tua sabedoria e espírito libertador, ou o que da Sabedoria Divina conseguiu passar por ti...

No dia do seu aniversário destacaremos, entre os muitos aspectos da sua riquíssima personalidade e individualidade,  o pedagogo, o educador em latim e de latim, tarefa que iniciou  cedo por ter de pagar os seus estudos de grego em Paris, prosseguindo-a mais tarde pelo natural fluir da sua imensa erudição, ironia e amor.

Ora como pedagogo Erasmo inseriu-se na corrente humanista da península itálica, que vinha de Coluccio Salutati, Lorenzo Valla (a sua maior fonte e que editou e parafraseou), Angelo Poliziano, Pico della Mirandola, Marsilio Ficino, mvalorizadora da individualidade e dignidade Humana, da Tradição Perene universal, e da metodologia filológica crítica  dos textos de autores sagrados e profanos, nomeadamente os cristãos da patrística (deles dizendo "o melhor Orígenes, o mais agradável Crisóstomo, o mais santo Basílio", e dos latinos ("Ambrósio, extraordinário nas suas alegorias, e Jerónimo, tão prático nas Escrituras santas")  e não-cristãos (tal "Platão, Aristóteles e o seu discípulo Teofrasto e depois Plotino, que une as duas correntes"), e foi bastante pioneiro não só nos autores abordados como nos métodos, que partilhou com os seus alunos, e depois em livros, em especial no De Ratione Studi,  De Pueris instituendis, De duplici copia verborum, Como escrever cartasAdágios e Colóquios

A segunda edição dos Adágios, bem mais alargada, impressa em Veneza, com Aldo Manuzio, em 1508, como Graal da Sabedoria perene, e sobre a empresa aldina: Festina lenta. Apressa-te lentamente.

Poderemos realçar certos aspectos, tais como no seu plano de estudos, desvalorizar a memorização, preferindo a compreensão ("o essencial da memória, é ter-se compreendido algo a fundo"), pois fórmulas decoradas não são tão duradouras como as aprendidas pela descoberta sentida e livre do aluno.  Desenvolver o sentido crítico em vez da submissão, oferecendo uma variedade de autores e soluções, deixando aos alunos a escolha das suas vias e preferências e impulsionando também o estudo da retórica e da argumentação (sobre as quais escreveu bastante) para fortificarem a capacidade de discernimento e julgamento. 

Valorizava ainda o estudo da etimologia e da elegância das palavras e frases, bem como a escrita, mesmo que em pequenos ensaios e poemas, e o dialogar-se na língua que se estuda, considerando-as práticas fundamentais, pois depois viriam  as teorias abstractas e as regras. Propôs que o estudo “seja visto como lúdico e não labor», escrevendo por isso muito dos seus Colóquios, nos quais ensina pelos exemplos, diálogo,  paradoxo,  ironia, estética ou decoro, alguns sendo muito divertidos e ainda actuais, embora na época tivessem enfurecido muitos religiosos ou monges por troçar de aspectos comportamentais pouco coerentes.
Assim a auto-consciência crítica, e nomeadamente do que exteriormente condiciona e manipula, e logo esmaga e destrói as melhores potencialidades humanos, é muito valorizada e desenvolvida por Erasmo que, na linha de Luciano, de quem traduz as obras com Thomas More aquando da sua estadia em Londres, e publica em 1506 com o fim de exaltar a ironia e o sentimento crítico que desmascaram os vícios e hipocrisias, vai  imortalizá-la no Elogio da Loucura como a grande libertadora social e a geradora de uma mente ou alma mais sincera, desperta, criativa, irenaica (irene-paz, em grego), capaz de não se prender nas limitações e modas, superstições e dogmas reinantes.

Realçou Desidério Erasmo ainda muito a sacralidade e amor que estão na essência da Educação, apresentando a paternidade-maternidade como o meio mais natural e nobre dela e de tal modo que o ensino ou a transmissão de mestre a aluno, ou a discípulo, deve ser como a de um pai, e visar,  com o recurso a exemplos e modelos valiosos ou esforçados do passado,  ao desabrochamento do génio próprio, ou seja, da individualidade pelo seu livre arbítrio e aspiração sábia modelada e manifestada com decoro, ética, harmoniosamente. Pioneiro também ao afirmar o direito das mulheres a uma educação mais completa e que se emancipassem da tutela patriarcal asfixiadora.
                                                                      
Na formação da sensibilidade na Educação, Erasmo realçou muito o valor da poesia, do subjectivismo, da imaginação poética, da leitura e do culto dos grandes poetas e escritores clássicos greco-latinos (tendo sido por isso criticado, já que eram pagãos), da escolha e colheita das palavras e ditos mais valiosos, e se  compôs inicialmente uns poucos de poemas, ao longo da sua vida  desenvolveu bastante mais a prosa e a epistolografia, esta sendo vista como um diário afectivo e intelectual dialogante, e que teve um sucesso enorme (cerca de 3.200 cartas e publicadas em 1958 The Complete Letters of Erasmus, por Allen, em latim, em 12 volumes, hoje já com tradução francesa) e por onde perpassa muito da sua argúcia e amizade, liberdade e sabedoria, além de todas as perseguições que lhe fizeram ou polémicas em que se envolveu, sobretudo no começo da Reforma, sem dúvida afirmando-se como o pedagogo ou mestre principal da Cristandade não só pela qualidade das suas obras e intervenções como pela extensão dos seus dialogantes ou destinatários.
Na pedagogia erasmiana uma das ideias forças é a do irenismo, a não-violência, o pacifismo, a tolerância activa, a conciliação. Uma forte oposição e condenação da resolução dos conflitos pelo recurso às armas, considerando que mesmo os animais da mesma espécie raramente lutam entre si, pelo que o ser humano deve procurar pelo diálogo chegar à concórdia. Por conhecimentos transmitidos a ele pelo seu amigo, confabulador e discípulo Damião de Goes, Erasmo criticou a cristianização forçada dos Lapões pagões, tal como, e já não por Goes (algo envolvido ou comprometido nos Descobrimentos dos portugueses e suas lutas), se opôs a mais guerras com os Islâmicos e Turcos, pois os cristãos  é que eram frequentemente os infiéis e violentos, entre si e contra os não-cristãos. Anote-se a publicação entre nós em 1990 da valiosa tradução do adágio  Dulce Bellum e da Querela da Paz, por A. Guimarães Pinto, sob o títulos A Guerra e  Queixa da Paz, no qual está condensada muito da sua imensa sabedoria justificadora da não-violência.

São os pedagogos, os professores, os cultores das belas letras, os humanistas (por vezes unidos em círculos, as sodalidades, na grande república literária), hoje diríamos os intelectuais, os professores, os cientistas, artistas, psicoterapeutas e os espirituais, quem deve exercer o papel de mediador ou de esclarecedor nos grandes conflitos de opiniões, interesses, partidos, povos, estados, religiões. E se no Renascimento durante alguns anos algo disso se passara no aconselhamento dos reis e governantes, com a Reforma e a Contra-Reforma muito se impossibilitou e extremizou, desvanecendo-se essa concórdia ou unidade entre sábios e governantes da Europa.

Erasmo, num altar lisboeta. Que nos inspire. Aum, Amen..

Nestes últimos sentidos considerará, por exemplo, que na frase de Jesus ”Ninguém vai ao Pai senão através de mim”, o mim, é o Logos, ou  Jesus, o Cristo, e que tal corresponde à Ratio,  a Razão, e Sermo (que sempre preferiu a Verbo), a Palavra, a Língua, ou ainda que é pelo diálogo verdadeiro, amoroso, unificador que nos podemos religar à Divindade. Neste sentido corre também a expressão paradigmática do mestre:”Onde dois ou três se reunirem em meu nome eu estarei no meio deles”. Reunirem, ou seja, em diálogo, em colóquio, silencioso ou na palavra luminosa audível, e com a presença da Razão e Inteligência Divina que nos torna verdadeiramente seres humanos e nos unifica. 

A pedagogia irenaica ou educação pela não-violência, contra as guerras, os fanatismos e autoritarismos, desagua numa ideia de religião interior, pura, simples, que Jesus transmitiu e cuja base de simplicidade, amor, douta piedade e verdade é universal e subjaz a todas as outras religiões. Assim diremos que é fundamental que desde cedo isso seja ensinado, e idealmente poderemos pensar até com o apoio da Unesco, embora esta esteja ainda muito atada por pressões e interesses negativos, e pelo laicismo neutro das modernas democracias. Isto dá azo a que a ignorância, o fundamentalismo e o fanatismo grassem de Oriente a Ocidente, ainda que o ecumenismo e o diálogo inter-religioso floresçam em alguns pontos, e cada vez mais tudo esteja em rede reveladora ou denunciadora instantânea, para a verdade ou para a desinformação, pesem as censuras, frequentemente vendidas e opressivas exercidos pelos meios e redes de comunicação digitais.

Para Erasmo, muito mais do que organização, dogmas e sacramentos, a religião ou a Igreja é a prática do amor ao próximo e a Deus, e é a assembleia ou congregação da fé e vontade de ligação amorosa à Divindade e à Humanidade, sendo por isso universal e apoia-se no estudo profundo e sentido dos textos sagrados, na oração (incessante, explicará mesmo enquanto modo de vida e aspiração ao Amor divino, como publiquei em 2008 no seu Modo de Orar a Deus) e  na comunhão com o corpo místico em que todos fazemos ou podemos fazer parte. 

Tal constante abertura e manifestação do bem desagua na metanóia, ou transformação interior, na reforma das mentalidades e costumes, na defesa dos oprimidos e perseguidos, na distribuição mais justa dos bens, e na menor valorização das hierarquias e autoridades exteriores, e nesse desprendimento consegue-se o recolhimento e uma maior capacidade de sentir o espírito, o amor ou  mesmo a Divindade no centro da alma e coração e sermos portanto melhores nas relações com os outros e a Natureza,
As suas propostas de Educação são vastíssimas e apenas partilhamos uma pequena amostra ou introdução à leitura das suas imensas e riquíssimas obras…
Concluamos com algumas das frases que são testamentos deste humanista, de quem o notável sábio francês Lefévre d'Étaples escreveu em 1514, "Quem é que não admira, ama, honra Erasmo?", ou de quem Rabelais disse ser "campeão invencível da liberdade" (e lembremo-nos da sua intervenção, a pedido do Papa,  de polémica com Lutero, na qual defendeu convincentemente o Livre-arbítrio ou liberdade), ou de quem o nosso Damião de Goes, seu grande amigo, afirmou em 1538, pouco após a sua morte (11 Julho de 1535):”aquele prudentíssimo e gravíssimo Erasmo de Roterdão, neste nosso áureo e doutíssimo século, príncipe de toda a doutrina e eloquência”.

    Eis então alguns dos seus ditos, à altura das centenas de adágios da antiguidade que ele coligiu e comentou e que considerava o “arsenal de Minerva”:

Um homem não nasce homem, torna-se”, dito este extraído do seu tratado Da Educação das Crianças, o De Pueris.

E os que epigrafei nas páginas ante-prefaciais do livro dele que publiquei em 2008, Modo de Orar a Deus

"As pessoas de engenho generoso e livre gostam de ser guiadas, não de ser coagidas”

Ego mundi civis esse cupio, communis omnium vel peregrinus magis”, “Eu desejo ser cidadão do mundo, em comunhão com tudo ou mesmo mais peregrino”

E finalmente, de grande pedagogia e actualidade: “Não nego que procuro a paz sempre que possível. Sou a favor de ouvir ambos os lados com ouvidos bem abertos. Amo a liberdade. Não servirei, nem posso servir, nenhum partido”

Assinatura de Damião de Goes num exemplar da sua Crónica do rei D. Manuel.

Dedicado a Erasmo e aos seus discípulos Damião de Goes e José Vitorino de Pina Martins, neste dia 28 de Outubro de 2013 e bem ampliado no de 2021, no qual Erasmo faria  555 anos, a ter nascido em 1466, já que não é certo. E como disse o deão da igreja de S. Paulo em Londres, seu amigo e sábio John Colet: Nomen Erasmi nunquam peribit, "O nome [e espírito] de Erasmo nunca perecerá…"  Saibamos sintonizá-lo, acolhê-lo e frutificá-lo…