domingo, 14 de janeiro de 2018

O "Soneto para Antero de Quental" de Leonard S. Downes. Comentado por Pedro Teixeira da Mota

Tendo estado em Portugal, o inglês Leonard S. Downes, em 1947, deu à luz em Lisboa um livro, Portuguese Poems and translations, com  dezanove traduções, nas quais inclui dois sonetos, Tormento do Ideal e Sepultura Romântica   de Antero de Quental (e entre outros dois de Fernando Pessoa e quatro de Campos Figueiredo, então vivo), e quinze poemas originais seus, um deles dedicado ao genial poeta filósofo, tentando cingir a essência da sua vida, obra e morte.
 
A dedicatória ao Prof. Gonçalves Rodrigues, numa caligrafia cerrada e ao alto
 Anote-se que já em 1944 Leonard S. Downes publicara Dona Briolanja and other poemas, from the portugueses of Eugénio de Castro, num in-4º de 51 páginas, com uma Introdução valiosa onde reafirma a ideia de que "uma tradução é um acto de humildade", já que é muito difícil reproduzir a forma e a música do original, evidente no caso de Eugénio de Castro que «fora um Simbolista na importância que atribuía a música da poesia, Parnasiano na sua imagética visual e clássico na perfeição cinzelada do estilo. Foi ainda um mestre do Português, usando ao máximo todos os recursos do ritmo e ritmo que tinham tornado essa linguagem um tão rico meio lírico desde o século XI.»

Voltando ao poema intitulado Soneto para Antero de Quental, ele leva uma citação de Balzac em epígrafe: «Cada suicídio é um poema sublime de melancolia», algo que podemos compreender até para Antero, pois entre desilusão, cansaço e frustração ou melancolia, tristeza e depressão podemos certamente considerar estados de alma próximos ou possíveis dos que rondavam a posse do eu decisório de Antero de Quental, nomeadamente nos dias, horas e momentos que antecederam o fim abrupto e voluntário da vida no corpo físico, já bastante desgastado. Todavia, tal sublime teórico e poético, elogiado por Balzac nem sempre o é e pode também esvair-se no estertor corporal do corpo e, quem sabe, da alma em transe... 
Avancemos antes para a alma espiritual e a demanda  imortal e perene de Antero...
Eis como Antero de Quental é cantado por Leonard S. Downes,  na tradução minha: 
 
«Não encontrou o Deus desconhecido que procurava;
 O puro Ideal escapou-lhe até ao fim,
 E ousado a pugnar pela Verdade, ardente a defender 
 Liberdade e Justiça, ele tombou onde combatera.

Rebelde a tudo que não fosse ensinado pela Beleza
Serviu a causa dela em cada uma das linhas que escreveu;
Apenas às suas leis  se dobrou o seu  coração
Para prestar homenagem na sua obra e pensamento.

Servindo o Belo, ele nunca soube
Que Beleza é Verdade, que ele encontrara a Verdade,
Mas procurou o seu Deus desconhecido até ao seu último sopro.

E apenas encontrou o Ideal no seu peito
Naquele altaneiro poema que finda a sua demanda sem esperança,
A melancólica épica da sua morte».

O soneto, que  tenta cingir a alma de Antero na sua obra e vida, é belo e profundo;  e como na visão de Leonard destacam-se algumas linhas de força tentaremos nós agora seus leitores clarificá-las um pouco mais.
Inegavelmente, Antero não conseguiu encontrar Deus ou, como é dito, «o seu Deus desconhecido», qualquer que seja o sentido intencionado por Leonard para o "desconhecido"...
Já quanto ao ideal puro, ou melhor diríamos os ideais puros, poderemos admitir que em alguns momentos da sua vida ele tenha tido uma boa realização deles, seja vivendo-os, seja compreendendo-os, meditando-os, sentindo-os, visionando-os.  
Isto poderá ter sucedido, por exemplo, nos seus tempos de estudante, nos seus diálogos com amigos no Cenáculo lisboeta e ao longo da vida, ou ainda, quando retirado na sua tebaida de Vila do Conde, aprofundou a sua cosmovisão e deu a forma definitiva à sua obra poética, na qual o ideal da demanda da Verdade se encontra bem expresso, ainda que certamente com bastantes traços de não conseguimento da plenitude a que ansiava.
Admitamos o conteúdo do quarteto inicial como verdadeiro: não conseguiu adorar e amar, ver e sentir o seu Deus, talvez até porque não conhecera nem praticara adequada ou persistentemente a meditação, a mística (que conhecia e vivenciara, tanto mais que tinha em si bem tal dimensão) e a gnose iniciática, ficando então na luta ardorosa pelos seus ideais de Amor e Harmonia, Liberdade e Justiça, Verdade e Bem, os quais expressou mais na poesia, no ensaio e nos diálogos e cartas aos amigos do que numa profissão ou apostolado, como ao princípio se empenhara pelo socialismo nascente, e que de novo, em 1891, no último ano da sua vida, exerceu, saltando para a arena da acção cívica e política, com os estudantes e intelectuais do Porto, em defesa de Portugal perante o Ultimato do imperialismo inglês.
Poderemos ainda observar que ele tombar, cair, falecer no terreno da justiça e da liberdade onde combatera, como escreve Leonard, deve referir-se a desilusão em relação à última experiência na Liga Patriótica do Norte, já que a que terá sofrido nos últimos dias quando teve de submeter-se à perda do contacto com as suas duas pupilas ou filhas adoptivas, poderia ser apenas uma separação transitória...
O segundo quarteto põe-nos diante de um Antero como artista da perfeição estética e sacerdote da Beleza, o que certamente foi, embora tenha sido sempre bastante exigente no aprofundamento dela rumo à  Ideia, ao Ideal, à Verdade,  pensando e escrevendo muitas ideias e páginas por tais anseios exigentes, que apesar disso sofreram algumas destruições (tais o Programa dos Trabalhos para as Gerações Novas, ou a sua Teoria da Religião) por perfeccionismos sobretudo formais e ideológicos, ou por aguda consciência das suas limitações.
No 1º terceto Leonard quer fazer-nos  pensar que a Beleza em si é a Verdade, algo que nos parece exagerado, pois frequentemente ela é apenas, uma aparência, uma ilusão, como também parece errado a afirmação que Antero nessa Beleza já encontrara a Verdade mas que não se dera conta. A última obra de Antero, as Tendências Gerais da Filosofia na segunda metade do século XIX, é um testamento de busca muito conseguida da verdade ao nível da filosofia, bem além da Beleza que constitui apenas um dos aspectos da típica tríade do Bem, do Belo e do Bom.
E quando conclui o terceiro verso, de novo com o "Deus desconhecido" que procurou e não encontrou, Leonard S. Downes parece estar mais quase numa mera linha estética: Antero bastaria contentar-se com a Beleza, pois isso é a Verdade, em vez de andar na busca de Deus, que Leonard acentua "de Deus desconhecido", na qual esteve até ao fim da sua vida.
É bem difícil equacionarmos, visionarmos e sentirmos que tipo de visão e demanda anímica Antero de Quental tinha nos últimos tempos, mas pelos relatos ou mesmo por algumas cartas, ele não estava já numa busca muito forte de sentir ou ver Deus, ou de ter mais união com Deus, ainda que certamente qualidades divinas como a paz e a luz fossem almejadas e por vezes sentidas.
Não parece que a capacidade mística de amor e de aspiração a Deus pessoal  (ou seja, ao que de Deus  ele poderia receber) estivesse muito viva e a arder forte em Antero após tantos sofrimentos psico-somáticos e um consequente desgaste anímico.
Também não sabemos se ele orava a Deus, se meditava em Deus. em momentos específicos, ainda que certamente no seu dia a dia algo do Ideal e do sagrado perpassava e vibrava nele e em certos momentos mais contemplativos alguns vislumbres do infinito o pudessem bafejar, ou alguns segundos do som e vibração do silêncio o iluminassem e orientassem, ou alguma alegria do coração espiritual aflorasse...
Parece-nos talvez ainda assim que a Divindade era para Antero um Absoluto benigno, mas impessoal e que nele, quando morresse, reencontraria possivelmente a unidade e a paz. 
E sabemos que as visões da Unidade absoluta, seja na sua faceta do Advaita Vedanta indiano, em que o Absoluto é a Consciência única e é a Divindade, seja na do Budismo, em que o Absoluto é a extinção do eu e dos desejos, o nirvana, ou ainda um estado de Consciência cósmica supra-humana, não facilitam muito a mística da aproximação devocional, a qual implica  um Deus, pessoal, exterior-interior, ao qual se reza e pede, oferece e ama.
No último terceto, Leonard pensa que Antero foi fiel ao seu ideal e que morreu por ele ou nele, mesmo que suicidando-se. O "altaneiro ou fogoso" poema com que termina a sua demanda poderia e deverá ser o Na Mão de Deus, com o qual Antero encerra a sua compilação dos Sonetos, mas o soneto é tão humilde e devoto que pode não ser a ele que  Leonard alude.
Fica então a dúvida se ele entende o altaneiro pela epígrafe inicial do escritor e ocultista francês Balzac, ou seja, a morte trágica pelo suicídio é a sublimidade poética da melancolia, e o coração de Antero altaneiro, orgulhoso ou fogoso (a dificuldade de traduzir o "proud"...).
Melancolia e não tristeza, pois esta palavra refere mais um sentimento e tem bastante menos riqueza e tradição que a Melancolia, tão  vivenciada e sondada ao longo dos séculos (a acédia, referida pelos eremitas e monges cristãos), por vezes contudo vista talvez mais como saudade impotente do Divino ou do Amor, e sabiamente coroada na gravura de Albrecht Dürer.
Mas também podemos ver que Leonard está de novo a pôr em causa  como inútil, impossível ou sem esperança a demanda  que Antero de Quental teria assumido ao longo da vida, em busca da Verdade e do que poderia conhecer de Deus, e que morreu nesse ideal sublimemente mas tragicamente, e até, segundo Leonard,  enganado, pois na Beleza teria podido encontrar a Verdade...
Certamente que descontrairmos um pouco da constante inquietação e demanda metafísica ou espiritual é importante e que sabermos apreciar a Beleza do mundo e dos seres harmoniza-nos muito, mas ainda assim a procura de Deus em nós, e por vivência interior, é bem importante senão mesmo essencial, sabendo-se ainda por cima que a nossa passagem na Terra é breve e que o mundo psico-espiritual nos aguarda com mais ou menos luz, algo que Antero por mais de uma vez referiu, nomeadamente com os sonetos em que fala dos seus mortos.
Este poema de Leonard Downes, traduzido por mim e acompanhado das imagens e destas considerações rápidas, constitui apenas um contributo para sondarmos  a nossa demanda na vida, o que estamos a valorizar mais, o que devemos agradecer e cultivar melhor...
Ou ainda, se estamos a trabalhar bem, vencendo as melancolias e indecisões, e dando algum tempo à invocação do que da Divindade podemos conhecer e receber, adorar e amar e, logo, no Logos ou Corpo místico da Humanidade (ou, como se diz modernamente, Campo unificado de energia informação), comungar, irradiar e partilhar...
                                  LUX - AMOR - PAX 

sexta-feira, 12 de janeiro de 2018

Nascer do Sol, em Lisboa, no 12-I-2018 e nas nuvens seu fogo ardente e ensinante.

O Sol que nasce na Terra, pode ser acolhido em Portugal ou na Rússia com o mesmo amor e gratidão, que faz arder o coração. Rússia porque em Murmansk, mo Árctico, terminou a noite polar de 40 dias, com os primeiros raios de sol a serem saudados luminosamente: https://www.rt.com/news/415704-first-sunlight-in-40-days/
Um mar de fogo divino nos pode agraciar e a nossa aura ou alma purificar, intensificar
Sabermos recolher as nuvens e suas forças na alma e no olho espiritual, criando um cenário ou ambiente propício, na meditação posterior, à abertura aos mundo espirituais e à Divindade...
Ventos e vias, rios e canais, vermelhos ardentes e azuis calmantes e infinitizantes...
Comunicações afectivas entre terras, seres, mundos... Abrir as janelas e os braços..
Labaredas do Amor Divino espelhadas nas nuvens e a nós se transmitindo: Theos...
Olá, parece dizer-nos um ser flamejante...
                                                                                                                             
Danças e irradiações de braços abertos no céu...

segunda-feira, 1 de janeiro de 2018

Luso-Nipónica, 1ª. "Ichi-go ichi-e", "Um momento, um encontro". 1-I-2018...

Ichi-go ichi-e é uma expressão típica japonesa, significando literalmente "um momento, um encontro". Ou seja, um momento, oportunidade, encontro único na nossa vida. O que acontece, pela sua singularidade impressiva ou unitiva, uma vez na vida, ou raramente...
 Algo de inesperado, de extraordinário, seja um fenómeno da natureza, um animal que se aproxima, uma queda de água purificante, uma pessoa muito valiosa que se  cruza connosco por uns minutos...
Um encontro por vezes há muito se talhando no invisível, e sem se sabe o que vai resultar, mas eis que subitamente se revela oiro sobre azul, graça sobre graça. 
  É sem dúvida uma expressão típica e famosa da tradição japonesa, que recebeu boas contextualizações, nomeadamente de pensadores e filósofos japoneses, tais como as do famoso monge zen e mestre do chá Sen no Rikyū (1522-1591) ao escrever acerca da impermanência da vida mas que alberga a especificidade única de cada momento e ambiente e, portanto, da atenção amorosa e simplicidade sábia que nela devemos fazer brilhar. 
 E se podemos entender no sentido de estarmos preparados, unificados e transparentes para uma vivência e apreciação plena dum momento e encontro, "o aqui e agora", ou o "é a Hora" da Tradição Espiritual Portuguesa, também a podemos assumir retrospectivamente, quando um determinado encontro foi sentido como um momento ou  acontecimento extraordinário, único, que nunca mais se repetirá pela sua qualidade e importância, pelo que deve ser  relembrado, cultivado, numa arte anamnésica mais do que saudosa, geradora de efeitos luminosos perenes para os intervenientes.
 Muitos outros sentidos e ensinamentos se podem encontrar e apreciar nesta frase e um dos que me parece valioso é o da valorização plena do nosso estado de vida, da nossa capacidade consciencial de criar ou acolher encontros, certamente impermanentes, mutáveis, de diversos valores e sabores, mas de qualquer modo possíveis, escolhíveis, importantes ou mesmo decisivos e, quem sabe, se tornar-se-ão ichi-go ichi-e...
  Estarmos conscientes de ichi-go ichi-e é como  levares   a  tua vida,  alma, aura, com tudo o que fizeste, sentiste e sentes em peregrinação ao cimo da montanha, onde paramos e nos encontramos com algo ou alguém, num momento transformador que não se repetirá e que deve ser vivido com frescura e pureza, plena atenção e entrega, agilidade e iluminação.
É a celebração da criatividade da vida e dos seus encontros, o apelo quase imperioso de não nos deixarmos limitar por comodismos nem atar por instintos nem alienar por preconceitos, e sairmos do estado passivo, parado e solitário para o movimento, o encontro, a abertura de todos os sentidos ao presente abrangente, profundo.
Movimento para a luz, para a harmonia, o  necessário e justo quando temos de entrar nas sombras e dores para aí levarmos claridade, ou nos embates e confrontos para os vencermos, harmonizarmos.
                        
Movimento para encontros seja com nós próprios, e os estados superiores do ser, seja com os outros, na infinita e maravilhosa Natureza e Cosmos em que estamos todos envolvidos, e seja na acção seja na meditação; assim, encontros de ideias e imagens, de formas e sons, de perfumes e alimentos, de livrarias e seus seres e livros, de locais e santuários, de árvores e penedos, das nuvens e dos astros e, sobretudo, de pessoas e de seres subtis que saberemos acolher e amar ou venerar harmoniosamente.
  Ici-go ichi-e. Uma vez, uma oportunidade única, pode-se ainda dizer deste dito, sobretudo quando se dá ou se vai dar o primeiro encontro entre dois seres e, subitamente, duas consciências, cada uma com um passado mais ou menos valioso, se encontram e cruzam, se unem e intensificam no caminho da beleza e do amor, da criatividade e da verdade...
Não desperdiçarmos então as possibilidades de encontro com os outros seres, estarmos plenos nesse momento único, é não nos lamentarmos posteriormente do que falhámos e do que não completámos. 
                                                     
Também as partilhas e as vivências diárias com os nossos próximos se ligam a este dito, pois nunca sabemos quando tempo durará essa união, ou mesmo se algum partirá subitamente, pelo que de novo se ergue  a celebração da nossa passagem pela Terra  como uma constante graça de momentos únicos de atenção e amor acima da impermanência, insensibilidade, vulgaridade, e nesse sentido ichi-go ichi-e é um apelo à intensidade, à virtude, à excelência, ao encontro transfigurante, unindo a Terra e o Céu na Luz.
 A visão lúcida da nossa vida e dos seus grandes momentos embora durante a vida a possamos ter parcelarmente, no fim da nossa vida e já no além tê-la-emos plenamente; todavia, estarmos conscientes deste dito já diariamente auxilia-nos a estarmos mais despertos para cada movimento e encontro, para a novidade e criatividade da vida, para a riqueza espantosa de possibilidades e oportunidades que não devemos diminuir ou desperdiçar para que seja bela e vasta a abrangência e inclusão das nossas alma perenemente e no corpo místico da Humanidade a que pertencem todos os que da lei da morte se vão libertando.
E não nos esqueçamos que todos nós temos na vida alguns contributos a dar, filhos a gerar, investigações a fazer, alguns textos ou poemas a escrever, obras a criar, objectos ou afectos a dar e que alguns desses momentos ou realizações serão uma única vez na vida, serão o resultado dessa oportunidade única, assumida corajosamente e não desperdiçada…
Todos nós entramos e passamos idealistas pelos bancos da escola e as primeiras amizades mas,  mesmo durante a vida, apesar de já qualificados profissionalmente, deveremos continuar a investigar e a trabalhar sempre alguns assuntos ou linhas de força que mais nos dizem respeito, e devemos continuar a empenhar-nos em ideais e conhecimentos, causas e amizades...
Assim, continuemos investigando, criando, trabalhando, exercitando, ajudando, amando, com a atenção e a motivação justa e com a esperança, aspiração e gratidão de podermos vivenciar  mais alguns ici-go ichi-e, e deste modo melhorarmos a aura da Terra, a evolução das almas, a história da Humanidade...
Relembre-se dos ichi go ichi e vivenciados, aspire a merecer mais nas três graças da Graça Divina... 
E como hoje é 1 do I de 2108, votos de um ano pleno de ichi go ichi e, de vivências despertas e luminosas na Unidade, num mundo mais em paz justa...

sábado, 30 de dezembro de 2017

O que é a Verdade, em si, em nós, no Cosmos. Aproximações espirituais e éticas à sua realidade e exequibilidade

  Aproximar-nos da Verdade, Aletheia, Veritas, Satya, ou, talvez melhor, não nos afastarmos da Verdade, significará não nos deixarmos enredar e obscurecer por mentiras, dúvidas e conflitos, nossos e do mundo, e antes estarmos em studium, estudo-esforço de demanda de acesso e comunhão à Verdade, a qual é a essência dos seres e a correspondência justa entre o que é e somos verdadeiramente, a Realidade nossa ou em si mesma, ainda que por vezes seja um ideal pois o Eu superior ou divino está algo distante do que se pensa e sente, diz e se faz na vida vivida. 
A Verdade, no seu nível talvez mais elevado humano, é estarmos em ligação harmoniosa e união com o Espírito e com a Ordem do Universo em que estamos inseridos,  numa arte e esforço criativo pela saúde, educação, liberdade, plenitude e felicidade nossa e dos outros, tanto dos mais próximos como dos seres e povos oprimidos, e ainda da Natureza, com as suas terras e águas, virtualidades, eco-sistemas e animais por vezes tão explorados e violentados...
Através de uma vida ética e justa, a Verdade,  a realização e desabrochar maior do Ser,  alcança-se ou estabiliza no  interior, na alma espiritual e no coração e, quando conseguimos sentir, intuir e estabilizar-nos mais nela, então as nossas actividades e diálogos serão bem mais proporcionados, transparentes, reflectores e verdadeiros, no cristal multifacetado do Cosmos.
                                                        
Quando demandamos no Mundo e na História a Verdade, se no nosso interior houver transparência, sintonia  e abertura comungante (nomeadamente pela atenção, respiração, oração e meditação) tanto ao exterior como ao interior do nosso ser e à sua verticalidade espiritual e até divina, os resultados ou frutos psico-físicos serão acertados, claros, melhores e mais frutíferos para a vida eterna. dir-se-á até...
A inter-actividade, frequentemente conflituosa, com as outras aproximações ou realizações das  verdades da Verdade, já que estamos num mundo cada vez mais globalizado e no qual biliões de egos, com as suas relativas tendências, informações, conhecimentos e verdades, se encontram e confrontam, é um campo de trabalho bem complexo e desafiante, obrigando-nos constantemente a discernir melhor o que devemos apoiar ou recusar, aprofundar ou desvalorizar.
Em termos históricos, o sentimento de que há a Verdade, e que portanto se a deve  demandar, é uma característica essencial do ser humano e provavelmente da consciência colectiva da Humanidade, e não tentaremos cingir mais de onde ela vem, senão apontando seja para a Unidade donde provimos, seja para os campos morfogenéticos que se constituíram, seja para o núcleo mais profundo do nosso ser verdadeiro,  e será a partir dessa imanência sentida tanto psíquica, como energética ou mesmo imunitária e sanguínea, que se deverá compreender tanto  a busca do conhecimento e harmonia de cada dum desses biliões de seres como também a violência, quando o sentido de justiça, irmão-gémeo da verdade, é afectado: a pessoa indignada perante a falsidade ou violência, sai do amor e usa a força-violência  ora para estabelecer limites e castigos aos erros e falsidades, numa sede de justiça, que se pode porém tornar vontade cruel de vingança, tão visível nos nossos dias, tanto mais que essa força é demasiado usada pelos mais poderosos para abusarem e explorarem os outros.
A demanda da Verdade  deve ser então realizada  na realidade do dia a dia e das relações humanas e sociais, desde a geo-política à  alimentação e saúde, com discernimento, equanimidade, justiça e com perspectiva contextualizante histórica e ética.
 Como a demanda do conhecimento e verdade da civilização moderna ergueu-se até a níveis tão desafiantes mentalmente, como por exemplo os da física quântica, e tais descobertas devem ser equacionadas   na demanda de auto-realização pelo conhecimento psíquico e espiritual, acima das limitações dogmáticas tanto das ditas Escrituras sagradas das  religiões como também da própria a ciência moderna, que com a sua objectividade confirmada e replicável instrumental ou laboratorial deveria tanto não se limitar nela, como ainda estar acima de suspeitas de manipulações interesseiras, algo que infelizmente nos últimos anos temos visto pelos muitos indícios e suspeitas de falsidades e corrupção, nomeadamente com os vírus e as vacinas. 
Embora seja um facto a quase impossível acessibilidade humana à Verdade absoluta e cósmica, seja como compreensão seja como visão, embora alguns iluminados da Índia tenham sido creditados com ela,  em níveis mais diminutos poderemos ter acesso a ela, ainda que as condições  limitadoras e dispersivas que os Estados, as políticas, os media e as redes sociais fornecem ou impõem sejam insidiosas. Devemos então com esforço e determinação prosseguir as verdades específicas, próprias, nossas, o swadharma de cada ser na sua humanidade e temporalidade, nomeadamente nos campos do saber e de agir que cada um sente mais afinidade de investigar, aprofundar e partilhar...
- "O que é a Verdade?", perguntou Pôncio Pilatos, a Jesus, este respondendo com o silêncio, e provavelmente com a irradiação psico-espiritual da Unidade e Divindade que realizara, e poderia transmitir aos que acreditando nele se abrissem ao que em si  brilhava. Consta que a mulher de Pilatos era mais sensível a tal aura, o que é natural pois a mulher é em geral mais sensitiva, estrutural e psiquicamente, dentro da lei cósmica da polaridade. Dessa realização da Veritas, Satya, Aletheia algo transmitido foi em testamento aos que se reunissem em seu Nome, que além de Iesus, é o de Espírito, Verdade e a Vida, isto é, o Amor Sábio e Justo provindo do coração do Espírito e da Divindade.
Já Gautama, o Buddha, o iluminado,  acentuou na procura da Verdade o Caminho do Meio, como um processo de libertação  da ignorância, do desejo e do sofrimento, e a ser vivido num posicionamento ora activo ora introspectivo correcto, desprendido, sem ego conflituoso antes dialogante, perspectivante, compassivo, tipificando-o como o famoso óctuplo Caminho Nobre.
                                   
A tradição indiana yoguica, que o nutrira, antes de Sidhata Gautama fundar a sua religião-filosofia, sempre valorizou muito a Verdade, Satya, repudiando a mentira, a falsidade, a hipocrisia e caracterizando mesmo o núcleo essencial do ser humano como Sat, Chit, Ananda, Ser Verdadeiro, Consciência pura e Beatitude, nível profundo cognoscível por quem estuda, se disciplina, é justo e aspira a tal unificação.
Poderemos então admitir que a Verdade Absoluta é primacial ou primordialmente o Divino Ser-Consciência-Felicidade, numa grandeza que nos ultrapassa, e depois a Consciência, a Vida cósmica e o Amor sábio divino que subjazem tudo e todos, aqui e acolá aflorando mais. 
Ao nível humano e relativo, a Verdade é também a unificação harmoniosa do que é e se conhece e se ama e se faz, cada um de nós sentindo ou vivendo, mais ou menos, tal vera Unidade,  e assim se aproximando ou desviando mais dela.
A Verdade em si mesma na imensidade do tempo e do espaço é  algo de tão infinito, incomensurável e  transcendente que apenas é acessível parcialmente em experiências imanentes místicas ou de expansão de consciência, pelo que deveremos acolher e trabalhar bem, com sabedoria e amor, os aspectos manifestados na realidade física, energética e psíquica e que nos desafiam ao sim e ao não, à verdade e à mentira, à dispersão ou à unificação anímica. 
Tais desafios ou testes, se são bem resolvidos ou respondidos, permitirão intuir e sentir, conhecer, amar e vivenciar mais a Verdade e a Unidade, o Amor e a Divindade.
Nesta vivência entramos ou estamos na Sabedoria-Amor, a qual é uma abertura a esse nível subtil e elevado e que é potenciada pela relação da destilação interior da nossa experiência exterior com a arte de conseguirmos unir harmoniosamente o céu e a terra, o universal e o particular, os princípios e os factos, a teoria e a prática, o idealismo e o pragmatismo, o espírito e o corpo, o múltiplo e o essencial, nós e os outros, a pessoa e a família ou grupo, o eu e o tu, o anjo ou o mestre e cada um de nós.
A Verdade  subjaz e circula em toda a parte e sobretudo está mais manifesta psíquica e humanamente em cada ser que a admite e se abre a ela, e a acende no seu coração como chama da aspiração-realização-irradiação. E tenta relacionar-se correctamente com as ideias, as energias, os seres, ou ainda o sagrado. Os grandes seres, os mestres e sábios, serão os seres que mais plenamente a realizaram e a vivem...
Tal vivência da Verdade manifesta-se em geral num estado de amor e alegria interna e no aprofundamento da luz do discernimento, pois trabalha-se a visão espiritual dissipadora das ilusões e desenvolve-se uma vida ecológica, ética e aprofundante das relações justas e até amorosas entre as partes na Natureza, infelizmente ainda tão dilacerada, no Todo e na Unidade, no Infinito Divino...
Para aprofundar a consciência da Unidade, que é a mais elevada fonte da Verdade, há então que expandir a consciência, fazendo-a sair de uma dependência corporal e personalística distorcedora (a concha fechada ou a coisificação, como dizia Leonardo Coimbra) e permitindo-lhe ser banhada pelas águas da inspiração e da intuição dos campos psico-mórficos que nos rodeiam e ainda da grande Unidade e da Divindade, o que se alcança pela meditação e contemplação, visão e sonho,  artes e  esforços,  serenidade e  amor, abnegação e criatividade.
A Verdade, o Bem e o Belo foi e é uma trindade famosa filosófica, e nela somos chamados a cultivar o conhecimento, a ética e a estética ou beleza. E inegavelmente a Verdade está intimamente dependente de uma vivência ética e estética, se queremos vivenciar a sua plenitude libertadora. 
Maat, a palavra justa e verdadeira no Egipto, marcava essa coincidência entre o que se pensava e conhecia, sentia e amava e, finalmente, o que se fazia, dizia e vivenciava...
A busca da Verdade, e sobretudo do que deve ser o nosso agir, ou o que vai acontecer, leva muitas pessoas a entrarem em técnicas, saberes e mistagogias de adivinhação, em geral deixando-se explorar por intermediários semi-ignorantes, quando a melhor forma de nos alinharmos mais com a Verdade será sempre o silêncio meditativo e o alinhamento ou sintonização receptiva com o sub-campo unificado de energia-informação-consciência, ou os campos morfogenéticos que nos envolvem, ou ainda o corpo místico da Humanidade, para discernirmos o nosso papel funcional e criativo, e sob a invocação dos mestres, dos anjos e da Divindade. Mais humanamente, contribui também para a demanda feliz da Verdade  o diálogo com as pessoas afins e sábias, algo muito desenvolvido no Oriente com a ideia de sangha, comunidade, e satsanga, companhia da Verdade. Ou então os  livros...
Sermos verdadeiros é então o caminho estreito ou árduo de não nos deixarmos submeter ou influenciar demasiado pela sociedade e os outros, a violência, a falsidade, a desinformação e manipulação, e não trocarmos  a Verdade e a comunhão com Ela pela dispersão consumista, seja de notícias ou de bens, pois o mundo é regido demasiado pela oligarquia e tende a alienar as pessoas do que é mais fundamental ou verdadeiro em termos de valores e de práticas.  Sintonizemos então antes, com mais frequência, com o nosso génio e mundo interior e o que do mundo subtil, espiritual e ético do Cosmos, do Bem e da Divindade (adorada e acolhida seja) possa chegar a nós, e ser transmitido  criativa, sábia e amorosamente como centelhas, partículas, raios, flechas e palavras da Verdade...

quinta-feira, 28 de dezembro de 2017

Deus, Al-Wadud, O que ama primordialmente; a fonte do Amor. Caligrafia sagrada do Islão.

O Amor da Divindade para os seres, Al-Wadud, O que ama originalmente e por excelência, é a flor primordial ou arquétipa, a fonte da beleza eterna e do amor. Pouquíssimo são porém os que conseguem aproximar-se de tal amor, senti-lo e respirar a sua força luminosa , manifestando-a depois nos seus actos, sentimentos e pensamentos...
        A Divindade, como a Geradora amorosa dos mundos e de seres, Al-Wadud, é para uns  maternal e envolvente, para outros um Sol ardente e arrebatante, ou raios e partículas circulantes, uma chama transfigurante, ou humanamente uma seta  disparada do coração, ou  a que trespassa esse órgão espiritual por excelência na ligação dos mundos. Que raios ou flechas desfere ele em ti?
O Amor do Ser Divino amante, Al-Wadud, é o centro da mandala do Cosmos, do Campo Unificado de Energia e Consciência, do Espírito  e ainda do corpo Místico dos que o invocam e meditam, adoram e amam... Tens tal Amor no teu centro? Trabalhas tal sentir e amar? Procuras comungar com este centro do Cosmos? Sabes perseverar e ressuscitar o amor divino no teu intimo, e seres assim verdadeiramente uma alma Fiel a Deus?
Al-Wadud, o Ser Divino Amoroso, é tão belo que atrai a si algumas das almas mais sensíveis, que se tornam os amigos ou amigas da Divindade, a qual sustenta o Cosmos, que significa um todo ordenado e belo, o que é sentido visto sobretudo pela intimidade e proximidade, nos círculos próximos dos que mais o amam e conhecem...
A grande maioria dos fiéis das religiões adoram a Deus quase que só corporalmente, ou quando estão  aflitos ou de acordo com hábitos, leis e ritos. Poucos são os que se conhecem a si próprios e  chegam ao seu espírito e corpo espiritual e aí se abrem ao Ser que é a fonte do Amor  e nos ama primordialmente, Al-Wadud, e se transformam nessa fornalha ardente, deixando para trás ou baixo a violência, a mentira, a intolerância, o medo.
Poucos são os amigos e amigas da Divindade e dos Seus nomes, atributos e faces, mas são eles que se constituem como colunas do Templo Divino que liga a Terra e o Céu...
Saudemos esta irmandade de amantes de Al-Wadud, a Divindade que nos ama e abramos-lhe o coração e o olho espiritual, no Amor Divino...

domingo, 24 de dezembro de 2017

Amor, o que é, donde vem e para onde vai. Aproximações, reflexões, mistérios.

  Duas aproximações ao Amor, uma escrita no Outono-Inverno de 2017 e melhorada em 14-I-2019 e a outra improvisada, inspirada,  satsanguizada, na manhã de 24-XII-2017.
O que é o Amor?
É a irradiação mais íntima e profunda, elevada e abrangente de cada ser?
Brota naturalmente, requer o esforço ou nasce sobretudo da reciprocidade e da gratidão?
É a energia, vibração, som, força primordial, substancial e unitiva de toda vida?
É nos seres a atracção e apreciação geradora e afectiva, futurante ou frutificante?
É a capacidade ou faculdade mais valiosa  determinante na evolução do ser humano?
Tentemos sondar, aproximar, aprofundar esta qualidade ou força, ainda assim, apesar de tantos grande seres de amor ao longo dos séculos, tão limitada, ferida e sequestrada neste planeta...
Embora ultrapassando as capacidades cognitivas da mente limitada humana e de todas as suas ciências, podemos ousar dizer que a nascente, fonte e origem do Amor é a Divindade,  o Espírito Primordial...
É do Seu seio ardente abismal e inconceptualizável que a Divindade como Amor emanou a imensidade infinita dos seres e mundos e os une. 
 A Divindade é então Amor, beatitude, felicidade, em si e em nós...
E, certamente, invocarmos, sentirmos e intuirmos,   ou mesmo vermos e partilharmos algo Dela é já uma graça Divina e uma certa intensificação do fogo íntimo do Amor em nós, levando-nos ao senti-lo a dar graças à Divindade e partilhar as graças recebidas, através do diálogo,  escrita,  arte,  música,  canto,  acção...
Daí as Três Graças da Antiguidade: recebemos a graça do amor, partilhamos tal fogo da graça, darmos graças pela unidade da graça, e nesta dança da roda dialéctica, artística e amorosa, neste anel das graças, o Amor circula fortalecendo as essências, almas e uniões dos seres e coisas, das ideias e movimentos, ultrapassando distâncias e diferenças, obstáculos e conflitos...
O amor-gratidão é então um sentimento amoroso e unitivo que se deve cultivar, já que por ele comungamos com as Graças do mundo espiritual, intensificamo-las, alinhamo-nos e reentramos na corrente ascendente e interiorizante que nos religa à Divindade, à fonte do Amor.
A oração incessante, muito valorizada por alguns místicos e mestres, pode ser entendida como a simples mas íntima consciencialização da presença do amor vivo em nós e portanto da graça  divina. E logo o cuidado ou talento ou arte da sustentação da correnteza do amor grato e benfazejo no nosso ser interior e coração e irradiando...
                   
Coração de carne e sangue mas sobretudo psíquico e
espiritual, na zona do peito, subtil filigrana de irradiações douradas e rosadas, coração do nosso coração, alma da nossa alma, sir e-sir, lhe chamavam os místicos persas...
E pode-se, para quem gosta de exercícios ou práticas de aprofundamento, por exemplo, fechar os olhos, juntar as mãos diante do centro subtil da garganta ou do coração e afirmar, meditando: «Eu invoco  a graça do Amor Divino e partilho-a nesta corrente de luz amorosa e calorosa», até enviando-a ou direccionando-a até para esta ou aquela pessoa ou local.
Mas será mesmo o Amor a força substancial e unitiva de toda a vida, o substracto subtil omnipenetrante e supra-coroante?
Embora tal nível escape à mente limitada e à ciência moderna, é natural que a emanação subtil criadora da Divindade, que se torna a sua infinita túnica e tessitura de intencionalidade unitiva amorosa, seja o fundamento da manifestação e o catalizador da dança da atracção e interacção dos seres nas polaridades complementares,  e seja a vera providência divina com os seus agentes próprios, tais os Anjos e demais espíritos subtis e celestiais, mais vibrantes e conscientes de tal fogo interior que os anima e que eles derramam e comunicam. Daí que a nossa tenção ou talento comunicativo com os anjos tenha de estar nessa afinidade ígnea amorosa...
O amor é então a força divina primordial, supra-pessoal, cósmica, uma energia inteligente e previdente que prossegue os seus fins internos unitivos, mas que também pede de nós uma actualização pessoal, uma vibração psíquica, a qual é então vivida, cultivada e comungada por certos seres mais conscientemente.  E que se  consubstancia em partículas, ondas e raios que se transmitem e irradiam pelas intenções, pensamentos e actos, na unicidade da realidade ou existência.
Podemos dizer que a unidade da vida, a intercomunicação actualizadora entre todos os seres e partículas se apoia num espaço vibratório acolhedor do seu movimento, numa inteligência das partículas e dos seres para se associarem correctamente, amorosamente, com frutificações energéticas derivadas das afinidades conjuntas e intensificadoras delas próprias e das suas expansões, destinadas a despertarem espiritualmente e a sentirem mais o amor e a unidade, co-gerando a frutificação das potencialidades infinitas dos seres deste Cosmos Divino...
E como há muitas tonalidades e graus da energia do Amor, ou seja, de se querer fazer o Bem, o Belo e o Bom, tal é estimulado pela afinidade e complementaridade entre os seres, com tantos sub-campos ou níveis da vida na seara da Terra tão necessitados que o Amor os atinja e harmonize, ilumine e plenifique.
O Amor é também o nome que damos à mais forte ou poderosa ligação e união entre dois seres, a qual convoca então a energia mais profunda, unitiva e divina do Universo.
                           

Se cada pessoa tivesse em si mesma um barómetro ou termómetro do Amor seria muito bom, pois certamente evitaria muitas doenças ou dificuldades e estaria mais consciente do seu coração e irradiação, e não deixaria que tantas nuvens ou esmorecimentos a diminuíssem e a impedissem de realizar a sua missão, a sua realização espiritual, a sua ardência amorosa, qual um Sol...
 Sol que pode por vezes ser visto e sentido como a fonte donde vem o Amor para a Terra e daí a importância das adorações e comunhões solares, nem que seja ao nascer ou pôr do Sol, ou quando subitamente os seus raios brilham por entre as "nuvens e céus de Portugal"...
 Se cada ser conseguisse medir a emanação do seu coração e do seu ser mais íntimo para a Divindade, para outra pessoa, um livro,  uma causa, um animal, um objecto, uma leira de terra, uma árvores, esse poderia discernir melhor como está o amor nele,  quem ama e de que profundidade tal vem, com que força e talvez até com que durabilidade e perfectibilidade.
Mas sabe-se ainda pouco do que do amor sentido, enviado ou partilhado, se conserva ou acumula , subtilmente mas valiosamente e até quantificável, pois pouca gente ainda aprofunda a memória do amor e o descobre imperecível no santo Graal, ou centro íntimo do nosso coração...
O Amor,  sendo irradiação divina natural e supra-pessoal, assume contudo em geral no relacionamento humano duas faces ou fontes: o amante e o amado ou amada, e portanto a reciprocidade e eco, ou não, do amor. 
Quando há a reciprocidade podemos dizer que o Amor se espelha e se intensifica mais plenamente. Se não, embora haja amor de um, o facto do outro não gostar ou amar tanto, faz com que esse Amor como Unidade e circulação das três Graças não exista plenamente, havendo mais desejo e atracção, aspiração e dedicação, ou mesmo Amor, de um, mas sem a correspondência plenificante do outro...
Mas temos de admitir que amor em que está em alguém, que é um estado de ser e irradiação, ainda que não correspondido, pode ser muito intenso e persistente e ser ainda intensificado pela corrente divina do Amor que passa por tal alma, aproximando-a assim do Amor de dádiva incondicional, o tal invencível e imperecível...
Saibamos pois então mais fluir no Amor divino, no amor angélico, no amor humano, no amor da terra e seus seres subtis, animais e eco-sistemas, numa só corrente ígnea... 
Cremos que o amor  não é uma capacidade especial do ser humano, pois está já embrionária  na sensibilidade da vida vegetal, e podemos observar reacções de medo ou de amor nas plantas, bem como de preferências de proximidades, e está bem desenvolvida no reino animal, onde se observam tantos comportamentos afectivos ou  casos de grande carinho ou afinidade, mostrando bem que os afectos também existem neles, pelo que a tal podemos chamar também ou já Amor.
A luta pela ajuda do outro, o amor que leva alguns a sacrificar-se por outrem, não são comuns no reino animal e assinalam de facto uma capacidade humana mais desenvolvida, a de sentirmos o outro e valorizá-lo mais que nós, seja por noções morais ou éticas aprendidas, e com sacrifício assumidas, seja por natural espontaneidade comungativa-compassiva-sacrificial amorosa, seja pela existência de um espírito mais (do que nos animais) plenamente individualizado.
 Se admitirmos, contudo, que a Divindade é a fonte do Amor e que a sua inteligência e vida permeiam todo o Universo, não poderemos recusar aos animais sentirem e manifestarem o Amor, certamente com as suas limitações, comparados aos humanos...
O Amor incondicional, sobretudo presente nas mães para os filhos, é também bastante evidente na história humana. Mas poderemos falar de uma capacidade de Amor mais desenvolvida por elas? Parece bem que sim, seja pela capacidade geradora ou maternal, e logo educativa, seja pela sua misteriosa constituição anímico-espiritual, tão receptiva quão intuitiva e logo unitiva, amorosa.
 E no caso do amor espiritual, do amor devocional a Deus, que alguns seres desenvolvem mais, deveremos considerar tal também uma capacidade apurada da psique humana, a partir de uma relação do ser humano com o espírito, com os mestres, os anjos, os deuses ou formas divinas e a Divindade?
Em ambos os casos, maternais e devocionais, há como que uma intensificação energética do coração, e da energia nervosa, ou um alargamento e expansão da consciência, que deixa de se limitar apenas a si e se entrega, sacrifica, alonga, entusiasma no outro ou outros e são certamente fulgurações valiosas do amor, por entre tanto egoísmo e materialismo...
Também se pode cogitar que o Amor se desenvolve pela relação da mente e alma humana com a bênção ou graça Divina, que a inicia e reveste então de Amor, o fogo invencível da Unidade e da Verdade e que portanto incessantemente devemos meditar e orar, ou estarmos mais atentos ao íntimo do coração, para estarmos mais em Amor.
Mas será que tem de ser outra pessoa, mãe, mestre, amada-amado, anjo a despertar mais, ou a fazer sentir mais o Amor em nós, considerando-se que nós estamos num certo grau dele e que precisamos da relação para que outras pessoas intensifiquem tal chama e luz?
Ou podemos nós acender mais a chama do amor em si mesma, pelos nossos actos e meditações, transmitindo-a ou ainda dirigindo-a para certos seres e fins, humanos e divinos?
Ambos os casos, ambos os meios, convergem para o aumento da irradiação do coração espiritual, ou pelo menos para a consciencialização de tal. E se é no amor aos seres e pessoas que sentimos mais o Amor, também ele pode ser sentido com os animais ou mesmo com certas actividades, e por todos estes modos  aproximando-nos de um estado de amor mais permanentemente assumido, incessantemente...
                      

Daí em algumas pessoas aflorar algum tipo de mantra ou oração, que é o próprio coração a irradiar o amor em sentimento e palavra dinâmica, fazendo eco em almas afins e não só...
Sendo então o Amor uma energia omnipresente, potencialmente reconhecível ou sensível por todos, já que une os seres e as coisas, devemos intensificá-lo querendo o bem com persistência às pessoas, seres, coisas, causas, e logo pondo o amor em acção no que fazemos, pensamos e sentimos, deste modo irradiando mais o Amor e dinamizando assim a corrente amorosa da vida...
Resulta tal de uma decisão, de uma determinação de nos mantermos elevados e unificados mas trata-se também de uma sensibilidade consciencial profunda e unitiva consigo próprio e com o outro, certamente difícil de ser desenvolvida e que exige certa disciplina, atenção e trabalho purificador, que cerceie a nossa superficialidade consciencial egoísta e até violenta e que acolha antes a dimensão interior e até voz da consciência que parte do coração e que nos segreda ou impulsiona ao bem, tal como entre nós Antero de Quental tanto valorizou, nomeadamente nas cartas a Fernando Leal, e demandou.
                            
Em verdade, o Amor, ainda que provindo do interior de nós, do espírito e do cosmos solar e divino, é intensificado pela psique humana na sua actividade ou movimentação para algo ou alguém e é portanto um querer e um acreditar futurante benéfico para o que quer que seja, desde os dois aos muitos seres envolvidos no amor, projecto, causa e acção...
Não falarei agora do amor familiar, sanguíneo, que é natural, aquele "sangue do meu sangue", conforme dizem alguns
pais dos filhos, talvez podendo até dizer "almas da minha alma", família onde a genética convergência unitiva original faz brotar uma proximidade-afinidade de amor  natural e instintivo, não necessitando de determinação e esforço, pois há essa unidade de origens e afinidades e que se pode considerar tanto mais amorosa quanto mais na origem do acto fusional sexual o amor esteve presente, amor como acolhimento e entrega recíproca frutífera plena e futurante, o mistério do acto da união ou da geração como a correspondência amorosa humana do acto da fundação-emanação-criação Divina.
Interroguemos ainda o amor que as pessoas são, têm, ou podem desenvolver, mais ou menos, em si, sozinhas, na sua vida interior e anímica, tentando até compreendermos ou intuirmos que o amor se torna o criador e preservador do nosso corpo luminoso e perene
«Amo a Divindade, amo os Anjos, amo os Mestres, amo a Humanidade, amo a Natureza e as árvores, o Cosmos e as estrelas». 
 Será então possível que o amor em nós seja uma soma de todos estes valores-amores, e de renúncias dos "desamores",  donde vai resultando uma intensificação do Amor em nós, ou da consciencialização dele em nós, sem que contudo se possa falar de quantidades ou dimensões mas antes de uma qualidade direccionada, de uma irradiação, de uma abertura, seja do coração seja dum corpo espiritual desperto, luminoso, benfazejo por onde esse Amor passa mais...
Será então que a intensidade do nosso amor depende muito da consciência de que o Amor arde mais em nós, que somos Amor, que a nossa essência é uma centelha do Amor divino, e que estamos a criar um corpo de luz e de amor?
E que é pela vida justa e dialogante, a atenção, a meditação e contemplação, oração e adoração, sintonização e união amorosa, acção e irradiação abnegada que o Amor mais desperta, se afirma, cresce ou passa em nós?
Aproveitemos então o nosso escasso tempo para tentar diminuir o sofrimento, a ignorância e a alienação e tentemos estar e vivenciar mais o Amor, em nós e com os outros, na Natureza e no Cosmos com seus espíritos luminosos, e na Divindade. 
  Gravação, de 14 minutos.. Quem a quiser um dia passar a escrito, agradece-se muito...