sábado, 29 de abril de 2017

Plataforma de Defesa das Árvores: uma visita guiada por Pedro Lérias ao Corredor Verde de Monsanto, Lisboa

A Plataforma de Defesa das Árvores organizou uma visita ao Corredor Verde de Monsanto, que liga o Parque Eduardo VII a Monsanto, guiada e muito bem por Pedro Lérias. 
Eis algumas imagens de belos momentos, convidativos de mais caminhadas verdes dos alfacinhas...
Ao Principio era e é o Céu, e depois as nuvens, a chuva e a água que bem falta fazem...
Cerca de trinta pessoas seguiram atentamente as explicações do Pedro Lérias, que realçou a existência ainda assim de um certo corredor verde no arvoredo da Avenida da Liberdade que permite ás aves terem um caminho seguro que poderia chegar ao Terreiro Paço, calvo de vegetação neste momento, e às Tágides nossas...
Mapa do percurso, muito fácil de realizar e saudável e que certamente ira sendo enriquecido com mais arbustos, aromáticas e árvores
Uma combinação muito perfeita de um arbusto aromático, o alecrim, e um sobreiro e uma oliveira, ambos variedades de quercus, dá e recebe as bênçãos  dos seres no campo unificado de energia consciência que desejamos mais harmonioso


A Serpente e o Cavalo como psicopompos, condudores ou estimuladores das almas na demanda e luta pela Justiça e a Verdade

O juniper, da família dos ciprestes: cultiva a esperança com um verde forte no que gostas, desejas, aspiras
Uma bétula, muito escolhida para reflorestar as cidades mas sem grande  duração...
Alecrim aos molhos, numa zona não regada, irradiando os seus aromas essenciais e medicinais muito utéis...
Da Luz da Oliveira no Nicho da Devoção e da Fé: Paz justa no Médio Oriente

Uma bela vista da Universidade Nova de Lisboa
Um dos últimos prédios erguido à revelia do Corredor Verde
As famosas novas hortas de Lisboa, biológicas ao que consta
Paixão do Amor... Como está ele ou ela em ti?
Uma amoreira, que bem podia de novo ser cultivada pois os seus frutos são salutares...
Caminhar entre o céu e a terra, entre a relva e as nuvens, dá saúde e faz crescer
Encontros, beijos, corações das nuvens e suas entidades...
Da geometria sagrada que resistiu ao terramoto e que além da água trazia a farinha dos 44 moinhos que abasteciam a cidade
Um campo de trigo ainda cultivado, quem sabe se mesmo biológico...
As nuvens a encarreirarem com os arcos do aqueduto, os sopros do vento a ondularem a campina
Da beleza Divina na Terra florida e grata, que permite a muitos insectos e aves alegrarem-se e alegrarem-nos

A árvore mais perfeita e irradiante de toda a visita: pujante de seiva luminosa, feliz de ter sobrevivido
Das oliveiras e sobreiros e das diferenças de folhas


As forças da terra no seu ciclo quase eterno de transformação-transmutação 
Sobre esta pedra te assentarás e com o fogo e o basalto da Terra comungarás
Espíritos das árvores, driades ou duendes convidam-nos a entrar 

Dos vários (cinco) tipos de carvalhos que existem em Monsanto


Folha do carvalho alvarinho

Basalto que emergiu do centro ardente da terra  e pelo homem ainda mais ao céu foi erguido, torres...
Um moinho que já foi na origem muito provavelmente um castro, atalaia de vigia sobre uma vista imensa

A Patrícia, a Leonor e Pinto Soares, o fundador da Associação Lisboa Verde, a dar o exemplo de que caminhar a pé pela Natureza e defender as árvores faz bem em todas as idades...

Três jovens que estavam em ladainhas-cantos, nas três Cruzes  do Monte, que seja Santo

Junto ao castro romano, uma das peregrinas verdes contempla, como há milhares de anos, a imensidade e sacraclidade do espaço tempo do Ser 
Dos momentos e seres mais luminosos da peregrinação a Monsanto
Um belo conubio da pedra e da árvore, com um espírito da natureza muito sábio a fazer jus ao Monte Santo...
Os zéfiros que fecundavam as éguas velozes, as dríades subtis, o raio verde
Gigantes... E o contemplar das nuvens, qual Dama de Elche,  o mundo espiritual e a Divindade...

domingo, 16 de abril de 2017

Tomar histórica, templária e iniciática. Uma proposta de visita, por Pedro Teixeira da Mota

Bem vindos os que se querem aproximar do Templo na Terra, merecidamente...
Tomar histórica e iniciática. Uma revisitação e peregrinação a realizar-se um dia destes....
O muito simbólico sigilo ou selo da milícia Templária, fraternidade de corpo e alma.

I - A ida a Santa Maria dos Olivais permitirá entrarmos em contacto com a zona mais antiga de Tomar, pois nela se erguia a antiga cidade romana de Sélio e no local houve desde o séc. VII um mosteiro beneditino, sobre o qual em 1160 se ergueu, sob a orientação de Gualdim Pais, a igreja que veio a servir de panteão aos Mestres das Ordens do Templo e de Cristo. Gualdim de Pais, quarto mestre da milícia do Templo em Portugal e doador do foral de Tomar, foi nela enterrado e uma lápide da época  assinala a sua morte nos idos de Outubro de 1195. Dos túmulos dos vinte e quatro Mestres só restam quatro lápides sepulcrais. Constantes obras alteraram as estruturas iniciais, das quais só resta o portal norte e, como é da época de D. Afonso III, a passagem para o estilo gótico predomina, destacando-se a fachada ocidental com uma rosácea de doze pétalas trilobadas e um "iniciático" pentagrama no frontão, sobre o portal. Dos acrescentos, realcemos ao tempo de D. Manuel o túmulo esculpido por João de Ruão para o 1º bispo do Funchal, o pregador e amigo do rei, D. Diogo Pinheiro, e algumas capelas maneiristas. São belas e valiosas algumas esculturas, tal uma Nossa Senhora do Leite quinhentista.
Esta igreja foi elevada a Sé Catedral de todas as Igrejas dos Descobrimentos, com autoridade ou irradiação espiritual sobre ou para todas elas.
Diz o padre e historiador oitocentista João Baptista de Castro que foi  o reformador da Ordem de Cristo Dom António de Lisboa, no séc. XVI, quem destruiu as sepulturas (consta que era bastante contra as duas ordens) e juntou as ossadas todas pondo-as na segunda capela das cinco laterais, colocando-se nas paredes as lápides de Gualdim Pais e do 23º mestre João Lourenço Martins. Dos mestres da Ordem de Cristo resta no altar-mor a lápide ou epitáfio do 1º,  D. Gil Martins. No exterior na parede sul está a lápide do 7º mestre templário Gomes Ramires, que desincarnou em 1212.
Diz-se que da cripta ou do poço parte um canal subterrâneo de ligação ao castelo de Tomar, que passaria debaixo do leito do rio Nabão, algo difícil de se comprovar. A torre sineira deve ter servido de atalaia nos primeiros tempos da regência templária deste local.
II - No caminho a pé de Santa Maria dos Olivais para a Igreja de São João Baptista, no centro da vila, veremos por fora o antigo convento de Santa Iria, santa bastante venerada pela Ordem de Cristo, e o sábio e simbolista Frei Isidoro Barreira escreveu sobre ela, com uma sua  estátua, sobre o rio Nabão. 
A igreja de S. João Baptista já existia no tempo do Infante D. Henrique e foi muito engrandecida no reinado de D. Manuel, tornando-se deste 1520 Colegiada Real, independente da jurisdição diocesana. Destacam-se nas mísulas de apoio da abóbada, no portal ocidental e no púlpito, os relevos naturalistas e simbólicos manuelinos, bem como o programa pictórico de Gregório Lopes que orna as paredes da igreja, uma das pinturas representando o mítico encontro entre Abraão de Ur e Melkitsedek rei da Paz, de quem virá a dizer S. Paulo que Jesus era sacerdote eternamente segundo a Ordem de Melkitsedek. Os altares laterais já são do séc. XVI, e do séc. XVIII é o retábulo no altar-mor, em talha dourada. 
A Charola de Tomar na Leitura Nova de D. Manuel e muito provavelmente a representação do Arcanjo de Portugal 
III - A visita à fortaleza e charola Templária e ao Convento de Cristo, local bem ígneo, e à sua cerca, terá como pontos fortes sentirmos o local como ligação entre a terra e o céu, e observarmos a geometria sagrada e os significados da simbologia dos portais, janela e parede exterior da sala do capítulo, lápides sepulcrais, vários fechos de abóbada e capitéis das colunas e, finalmente, as pinturas e esculturas, tradições e mitos que intensificam a mens-agem ética, anímica, religiosa e espiritual.
Entraremos na história contextualizada e vivida da Ordem Templária e da sua sucessora em Portugal a Ordem de Cristo  e de alguns dos seus símbolos e mistérios e tentaremos relacionar-nos de um modo espiritual e interior com todo este campo unificado de acontecimentos, energias, grandes almas, mahatmas, nomeadamente  D. Afonso Henriques e Gualdim Pais, D. Dinis e o Infante D. Henrique, anjos e Arcanjo e Divindade.
Faremos algumas referências aos Templários e aos cavaleiros e freires da Ordem de Cristo na Literatura e em especial em Fernando Pessoa, que se identificou bastante com a demanda iniciática e universalista que estas duas ordens e milícias patenteiam ou estimulam, e trabalharemos alguns dos lemas, mantras, orações e ensinamentos deste veio principal da Tradição Espiritual Portuguesa.
                                                 
Pedro Teixeira da Mota, Domingo de Páscoa de 2017.

terça-feira, 11 de abril de 2017

Ensayo sobre los Alfabhetos de las Letras Desconocidas, por Don Luis Joseph Velasquez. Das escritas antigas...

Digitalização de algumas tabelas de tentativa de leitura de alfabetos antigos apresentadas no século XVIII, em 1752,  por Don Luis Joseph Velasquez... Que inspirem artistas ou investigadores...




domingo, 9 de abril de 2017

"Antero de Quental e Michelet", por José V. de Pina Martins. Os caminhos da escrita histórico-poética dos dois.

A amizade ou amor de José Vitorino de Pina Martins (1920-2010) por Antero de Quental (1842-1891) nasceu cedo, e ainda na Coimbra universitária, em 1948, um ano depois de ter apresentado a sua tese de Licenciatura  sobre Pascal, e antes de se tornar leitor de Língua e Literatura Portuguesa na Universidade La Sapienza em Roma, escreveu uma extensa dissertação ou monografia crítica intitulada A Ideia de Deus e da Morte na poesia de Antero, ainda hoje inédita e quase desconhecida.  
Realce-se que na altura Pina Martins, sob o nome literário de Duarte Montalegre, exprimia-se como poeta, tendo publicado vários livros onde derramou o seu grande amor e aspiração ao sagrado mas também a uma sociedade mais justa, tal como Antero. Mais tarde, por mais de uma vez, confessava ou declarava meio a brincar serem tais obras "pecadilhos de juventude", tendo singrado antes numa via rigorosa e profunda de investigador e historiador das ideias, dos humanistas e do livro, sobretudo do Humanismo e especializando-se nos séculos XIV, XV e XVI com estudos muito conseguidos sobre Petrarca, Pico della Mirandola, Erasmo, Thomas More, Damião de Goes, Camões, Bernardim Ribeiro, Sá de Miranda, entre outros.
Jules Michelet (21-X-1798 a 9-II-1874)
Em 1974, quando dirigia o Centro Cultural Português, da Fundação Calouste Gulbenkian, em Paris, tarefa que cumpriu durante anos com uma qualidade inexcedível e dinamizando dezenas de colóquios e publicações que ficam a enriquecer para sempre o património cultural humanista, europeu e português, ao comemorar-se o centenário da morte de Jules Michelet (1798-1874) escreveu um texto de homenagem a ele intitulao Antero de Quental e Michelet, publicado no vol. VIII dos Arquivos do Centro Cultural Português, da Fundação Calouste Gulbenkian, e depois em separata, no qual fazendo uma análise das obras do historiador francês, ainda algo romântico, e citando Saint Beuve, Dhiez e Roland Barthes (várias vezes, algumas criticando-o) aponta as suas limitações, em especial a falta de rigor metodológico na apreciação da documentação recolhida, uso exagerado da imaginação e de um estilo poético e profético e uma certa opção pela sua verdade e não uma verdade imparcial.
E relembra que Antero de Quental fora a Paris em 1867, que se considerava seu discípulo e escrevera sobre ele nessa altura um texto, Jules Michelet, para a revista Dois Mundos (incluído posteriormente nas Prosas Filosóficas,  vol. II, Coimbra, 1926), mas que sofria de alguns dos mesmos defeitos de Michelet, realçando que, embora Antero de Quental tivesse uma cultura geral invulgar, escrevia muitas vezes rapidamente, num estilo oratório e sem suficiente e sólida documentação, apontando como exemplo as famosas Causas da Decadência dos Povos Peninsulares nos últimos três séculos, onde haveria «uma falta de preocupação de rigor e de documentação mediante a prova dos textos e das fontes - com a discursividade vigorosa, mas vazia, e repleta de afirmações históricas inconsistentes», acrescentando que o vago e "o mais ou menos" surgem com frequência na obra de Antero.
Pina Martins nesse seu texto considera Antero de Quental sobretudo «um prosador de ideias, um pensador, um ensaísta», sem os recursos imaginativos e estéticos de um romancista ou novelista (por exemplo, Eça de Queiroz), pelo que a leitura da sua obra, embora com ideias actuais e não exposta de forma confusa ou hermética, ainda assim ressente-se «porque as repetições monotonizam invencivelmente o ritmo discursivo, os lugares comuns se sucedem, as expressões estereotipadas de gosto duvidoso se acumulam. O estilista não quer ou não sabe apurar o discurso, que lhe sai e se fixa como nasce, ao sabor de uma inspiração perigosamente espontânea.»
Pina Martins, à direita, em diálogo com Marcel Bataillon, em Paris.
Esta última afirmação do ilustre prof. Pina Martins é discutível e se não soubéssemos que ele era também um espiritual quase que poderíamos considerá-la algo conservadora e petrificadora, não recusando ab initio o valor da inspiração mas alarmando-se demasiado com o perigo de haver pouca base para que a pomba do Espírito Santo levante voo e, sobretudo depois, pouco trabalho de aperfeiçoamento, fundamentação e burilamento. Ora sabemos que Antero de Quental se destacou mais como poeta e como orador, onde a inspiração prima e  só na sua última obra Tendências Gerais da Filosofia na segunda metade do séc. XIX, a sua demanda filosófica e gnóstica atingiu uma profundidade e extensão de conhecimentos e raciocínios, e vividos interior, que tornaram tal ensaio o seu testamento filosófico, como lhe chamou Sant'Anna Dionísio, embora certamente os Sonetos já estivessem rodeados ou alimentados por profundas leituras filosóficas e cogitações sobre os grandes mistérios da existência, sentidos por Antero visceralmente e animicamente e vazados nos moldes perfeitos dos seus sonetos.
Na sua recensão ao texto de Antero sobre Michelet, Pina Martins acrescenta em nota de rodapé: «Essa espontaneidade nota-se imediatamente não só pela verificação de uma falta de selecção verbal, como pela adjectivação monótona, repetitiva, pouco cuidada e sobretudo não dominada. Claro que todos estes aspectos são, por outro lado, um indício de facilidade na manipulação na palavra [eu aqui não diria manipulação mas em deixar-se inspirar e empolgar] e na fixação de uma linguagem mas esta é mais a expressão de uma criação verbal transitória, efémera, de que o meditado e vigiado labor artístico de um prosador. Não deve esquecer-se também que estes artigos são de simples divulgação e apareceram em publicações periódicas (revistas e jornais)».
E na verdade o elogio de Michelet por Antero, que foi assinado a "4 de Agosto de 1877", quando estava em Paris para consulta com Charcot e termas hidroterapêuticas, certamente sem livros consigo, e que saiu à luz uns dias depois no nº 1 da revista Dois Mundos, publicado em Paris a 31 de Agosto, foi referido com bastante auto-consciência crítica a Oliveira Martins numa carta de Julho: «Esse 1º número terá um artiguito meu sobre Michelet, cujo retrato se publica»...
E continua Pina Martins:«neste ângulo de análise, o prosador continua a ser um romântico, em período de superação do Romantismo. Mas o que importava para ele eram as ideias. Decerto as ideias são o mais importante, mas como é possível transmiti-las sem o veículo da palavra que as revela ou, então, as oculta ainda mais, sob a explicitação aparente, que não é mais do que a certeza ilusória de as revelar?»
Eis de novo  José V. de Pina Martins a exigir que a inspiração seja completada, considerando-a que pode causar certezas ilusórias embora a passagem do nível de raciocínio mental discursivo e ponderado para o da inspiração tende a utilizar o que o orador tem dentro de si de conhecimentos e tende a descobrir novas relações, quando as consegue, levado ou elevado a tal por aspectos energéticos, do momento histórico, de forças afectivas e de entusiasmo. 
O Espírito Santo, considerado como fonte de inspiração na tradição portuguesa,   pode ser visto em nós como a capacidade de sairmos das limitações da personalidade e obtermos ideias, relações e imagens novas, ou desconhecidas, seja pelo funcionamento intensificado do nosso espírito e pela nossa alma e mente, seja, por uma expansão do nosso corpo espiritual ou consciencial, seja por uma intensificação dos neurónios e suas sinapses criando novas relações. Mas claro, há depois que saber escrever bem e trabalhar aprofundando a perfeição da expressão, como Pina Martins exige...
Anota ainda Pina Martins que Antero elogiou com grandes superlativos Michelet, descrevendo-o como um «profeta do passado, e agitava-o um sopro de ardente inspiração: o Espírito da humanidade» e que o seu exemplo é o de «existência nobre e pura até à santidade», mas que ambos não souberam temperar com uma certa austeridade, o perigo das fantasias aventurosas nas incursões na História, algo que o próprio Antero discerniu e apontou em Michelet, como veremos em seguida.
Talvez possamos dar agora a palavra a Antero, exactamente no artigo analisado por Pina Martins e publicado para a revista Dois Mundos, transcrevendo o 1º parágrafo: «Não cabe nas dimensões Não cabe nas dimensões, nem quadra à índole desta publicação um estudo crítico sobre Michelet, historiador e filosofo. Não tentamos pois aqui explicar o pensamento e aquilatar o alto valor cientifico e filosófico de uma das obras literárias mais vastas deste século - aliás tão fecundo cm obras vastas - uma das mais ricas de originalidade criadora, de intuição e profundeza, ao mesmo tempo que assombrosa de erudição renovadora e variadíssima. Contentar-nos-emos apenas com encarar (e ainda assim quase de relance) pelo seu lado mais acessível ao grande público, pelo lado por assim dizer exterior, esta grande e simpática personalidade literária.» 
Justificado assim o seu limitado escopo, que Antero torna a afirmar alguns parágrafos à frente: «Não cabe aqui, já o dissemos, estudar uma por uma todas as obras, algumas profundas, outras formosíssimas, criticando-as e separando as ideias fecundas e resultados positivos de certas fantasias brilhantes, mas aventurosas, que por ventura nelas se encontrem. Basta-nos caracterizar, duma maneira geral, a maneira do grande historiador e filósofo, indicando aquilo que dá à sua obra e à sua personalidade literária uma fisionomia tão particular, aquilo por que se distinguem entre todas. 
Michelet possuiu, como ninguém neste século, o sentimento da realidade viva, da verdade natural, esse condão dos grandes poetas e dos grandes artistas, que lhes faz adivinhar, com uma intuição quase infalível como um instinto o ser íntimo de quanto tem ou teve vida, na natureza e na humanidade. A larga e lúcida simpatia do seu génio fazia-lhe descobrir, através das formas opacas, a energia interna na qual reside o segredo da actividade e originalidade dos seres capazes de acção própria. Como que sabia sair de si, para viver momentaneamente a vida dos outros seres reproduzindo-a depois inteira, palpitante e actual. A erudição e a ciência não eram para ele um fim, mas um meio; o instrumento com que penetrar além da realidade exterior e morta, até à realidade íntima. a alma das coisas, dos homens, das idades históricas. Como Platão, procurava em tudo a ideia: mas essa ideia em vez de ser abstracta, como a do filósofo grego, era concreta e activa, era a essência mesma das coisas.
Foi com estes dons de poeta e vidente que Michelet escreveu a história. Animar, ao calor duma imaginação inspirada e profunda, as idades idas, evocá-las, tal foi o condão originalíssimo do seu génio. Ele mesmo, vendo na História mais do que uma fria narração de factos, ou uma seca análise de instituições, ousou defini-la uma ressurreição.»
Referindo depois o magistério dos "altos espíritos" franceses, entre os quais se inclui Michelet, que pela largueza e generalidade dos conceitos, pela atitude propagandista e filosófica, sobretudo pela simpatia fácil e franca com que abrangem o lado humano e universal das ideias e acontecimentos, se afirmaram em vários países europeus, refere que também em Portugal ele é um dos mestres de mais incontestada autoridade para a geração nova. «Não há uma única inteligência, dotada de certa elevação e cultura, entre os homens que hoje não contam ainda 40 anos, que não recebesse, mais ou menos intensamente, o influxo daquela palavra eloquente e penetrante (...) Foi com ele que aprenderam a ver e a amar na Natureza uma existência espontânea, uma vida universal, e não uma sucessão de formas inertes, e na Humanidade, uma razão e uma consciência colectivas, uma alma, e não um mecanismo ou uma abstracção.»
Há que portanto contextualizar bem o escrito publicado inicialmente na revista Dois Mundos, uma homenagem a Jules Michelet, quão humilde como entusiástica, dedicada, «à memória daquele que a deu [lição], não só com a palavra, mas com o exemplo de uma existência nobre e pura até à santidade», e que termina assim, numa das poucas incursões de Antero fora de Portugal: «Aqui, nesta grande capital da inteligência, onde ele trabalhou e ensinou, um dos seus discípulos portugueses folga de poder assinar esta página humilde, consagrada à memória dum dos primeiros e, porventura, o mais querido entre os mestres da nova geração. Paris, 4 de Agosto de 1877.»
Anote-se ainda que Antero encontrou-se com Michelet para lhe oferecer um exemplar dos seus Sonetos, entregando-o contudo como sendo de um seu amigo...
Relembre-se, finalmente, que Michelet foi bastante traduzido em Portugal por Teixeira de Bastos, Domingos Guimarães, Rebelo de Bettencourt e Fernando Leal, grande amigo de Antero (e a quem já dedicamos um texto biográfico no blogue), com os Soldados da Revolução, 1889, e que Antero de Quental já publicara nove anos antes, em Janeiro de 1865, então com os seus 23 anos, na revista de Penafiel O Século XIX, (1864-1883), três sucessivos artigos, intitulados A Bíblia da Humanidade de Michelet. Ensaio crítico, onde faz uma síntese intensamente espiritual da evolução da Humanidade, e que, embora com algumas inexactidões nas citações ou analogias entusiastas, que Pina Martins certamente referiria se tivesse alargado à sua crítica a este texto, contém das melhores transmissões espirituais feitas por Antero na sua obra e que seria bem valioso de se cotejarem com as que estão contidas e culminam a sua última obra, as Tendências Gerais da Filosofia na segunda metade do séc. XIX, escrita 23 anos depois, para a revista Portugal, em 1889.
Esperamos um dia destes apresentar um pequeno contributo nesta direcção, mas terminemos com as primeira sete linhas de tal belo texto poético, filosófico, histórico, espiritual, místico:   «Dentro do homem existe um Deus desconhecido: não sei qual, mas existe - dizia Sócrates soletrando com os olhos da razão, à luz serena do céu da Grécia, o problema do destino humano. E Cristo com os olhos da fé lia no horizonte anuveado das visões do profeta esta outra palavra de consolação - dentro do homem está o reino dos céus.
Pintura de Bô Yin Râ...
Saibamos trabalhar na linha destes grandes seres,  tanto para o nascimento ou reconhecimento da Divindade interna em cada um de nós, como para  a harmonia e a paz, a justiça e a força amorosa estarem mais vivas e brilhantes na Humanidade.

quinta-feira, 6 de abril de 2017

Revelações de Sabedoria Inca, Antón Ponce de Léon Paiva. Samana Wasi. Inti. Ensinamentos andinos.

Antón Ponce de Léon Paiva é o autor de um livro intitulado E ... O Ancião falou. Revelações de Sabedoria Inca, publicado originalmente em 1990, e que adquiri na versão brasileira impressa em 1994, pela Editora Aquariana, num sebo de Porto Alegre quando fui em 2016 participar num congresso sobre Literatura e Media na Universidade do Rio Grande do Sul, Brasil.
Na obra, Antón Ponce de Léon narra a experiência de ter sido levado a uma comunidade inca nos Andes, oculta, onde recebeu alguns ensinamentos, uma iniciação e a missão de fundar uma casa de acolhimento de crianças e anciãos, na língua quechua Samana Wasi, Casa de Descanso, que acabará por construir e desenvolver com a sua mulher Regia e que está a funcionar como obra luminosa de amor e tradição, harmonia e assistência.
Já aos sete anos fora com o seu pai, pessoa muito bondosa, sábia e conceituada na região, assistir nas montanhas andinas à morte de um Illac Uma, cabeça de luz, mente iluminada, o ancião Amaru Yupanqui Puma, descendente da nobreza Inca, chefe supremo da religião Quechua.
Mas será trinta anos depois que é chamado inesperadamente a voltar a esse local oculto nas montanhas dos Incas, onde chega ao fim de três dias, muitas vezes de olhos fechados para não saber o caminho, e reencontrar essa aldeia estilo Shangri-La.
Serão sete dias de imersão numa natureza pura e belíssima e recebendo ensinamentos  que não sendo muito extraordinários para quem já está dentro do Caminho espiritual tem contudo o valor de representarem uma tradição muito antiga da América e dos Andes, a veiculada pela língua Quechua, a qual segundo Antón provém  do antiquíssimo continente da Lemúria ou, na palavra original, Mu, que significa mátria-pátria.
Resumamos brevemente os ensinamentos recebidos nesses sete dias andinos por Antón Ponce de Léon Paiva:
A Divindade Wiracocha criou o Sol, Inti, vivendo este não só no centro do sistema solar como dentro de cada um, para além de que ao longo da história também fez as suas aparições (na Índia dir-se-ia avatarizações), até antropomórficas.
Parte central da Porta do Sol, em Tiahuanaco., com a efígie de Titi Wiracocha
«Sabermos quem somos, é o caminho. E a resposta é Eu Sou, Noccan Kani. Temos de aprofundar esta meditação e descoberta dentro de nós próprios, no centro do nosso peito, do Inti imortal.
«É importante que sejas o que és no íntimo do teu ser e não o que aparentas ser. Já é tempo de Ser o que se é. Ser é estar no Todo, o tempo e o espaço desaparecerão».
Consciencializar-nos desta presença Divina (Inti) em nós será então o nosso trabalho para o qual devemos amarmos os nossos corpos pois se não o tratamos bem sofreremos. Devemos ser felizes para podermos tornar os outros felizes. Devemos estar centrados no Eu Sou para não cairmos nos extremos e partidarismos. E ao identificar-nos mais com ele uma aura luminosa crescerá à nossa volta.
Como o pensamento é criador devemos ter muita atenção a ele, pois o que pensamos tornamo-nos: «Estás onde está o teu pensamento. Faz com que este se ocupe do que És e Serás».
A vida existe para sermos felizes e não deprimidos, para transmutarmos o negativo em positivo.
A energia vital respira-se melhor no campo e nas primeiras horas da manhã e por isso as pessoas deviam de quando quando recarregar mais as energias na Natureza.
Uma das páginas que nos parece ser da autoria de Antón Leon e não do seu mestre Nina Soncco é a que fala dos Sete Raios, pertencendo cada pessoa a um deles e sendo ainda estes Sete Raios «signos de sete ordens iniciáticas e que, de alguma forma, regem e influenciam a marcha do mundo, nomeadamente Essénios, Gnósticos, Templários, Rosacruzes e Maçons», uma afirmação superficial e generalista. 
Apresenta ainda uma descrição dos sete chakras ligados aos Sete Raios com aspectos originais, divergentes ou fraquinhos em relação ao que tem sido veiculado pelos textos indianos e pelos livros e seguidores de Alice Bailey e dos ditos Mestres Ascensos, no fundo todos eles algo esquemáticos e redutores pois sabemos que as cores e raios anímico-espirituais são muito mais subtis e inclassificáveis. Transcrevamos o que nos diz (algo discutível, então...) sobre « O Segundo Raio, amarelo dourado, está relacionado ao centro cardíaco e ao timo; representa a sabedoria, a iluminação, e portanto, o amor. A ele pertencem os mestres [Todos? E então a individualidade de cada um?] mas também aqueles que ostentam orgulho intelectual. (...) O Quinto Raio, o verde, tem a ver com o chakra frontal e a pituitária. É o raio da Verdade, por conseguinte da saúde, intervindo na cura e no conhecimento concreto. Os médicos em geral, assim como os interventores, pertencem a esse Raio, mas também os ateus [Todos?...], pois, como todas as coisas, têm dois aspectos: branco-preto, positivo-negativo».  É a parte mais frágil do livro, sobretudo na equiparação dos pretensos Sete Raios com tipos de pessoas...
É realçada pelo seu instrutor a necessidade de termos mais atenção à acumulação de informação que vai entrando no inconsciente, e que depois determina os nossos pensamentos e actos. E que devemos pensar nos nossos semelhantes a partir da chama Divina (Inti) que está em nós e que deseja o bem de todos, e que devemos agir a partir do nosso Eu Sou, o qual está contudo influenciado pelas vidas anteriores, crença ou conhecimento que por duas ou três vezes surge reafirmado nestes ensinamentos Incas.
Na página quarenta encontramos dois ensinamentos atribuídos a Pitágoras e a Shakespeare, os quais, embora belos, não foram escritos ou ensinados por eles e são portanto pseudo-citações. Há um terceiro texto e cuja autoria está atribuída a Khrisnamurti, que pode ser ou está próximo do que ele diria, embora a parte inicial não seja certamente dele e tem que se lhe diga, pois para ser verdadeira implica um nível de auto-conhecimento profundíssimo:«Cada pessoa é um universo. Se conheces a ti mesmo, conheces todos. Não me preocupa o passado, nem tão pouco me preocupa o futuro. Penso, actuo e vivo para o presente, que foi criado pelo passado e está criando o futuro».
Também o elogio ao mistificador livro Kybalion, tido como muito antigo e sendo um dos primeiros livros estilo new age, bem como as referências a Hermes Trismegisto têm alguma incorrecções ou parecem algo exageradas, mas é Antón Ponce de Léon que fala e provavelmente segundo os estudos que fez e a sua sensibilidade...
A propósito do poder da mente, Nina Soncco diz: «Tudo começa na cabeça; conforme pensas assim és. Tudo o que desejardes será, se assim o quiseres. Começa com uma ideia, que vai adquirindo forma mediante a força e o amor que nela imprimires, até se materializar», concluindo depois que cada ser é responsável pelo que vai deixando entrar e crescer no seu subconsciente de que sairão posteriormente as consequências, pelo que o melhor é sermos já positivos e felizes e estarmos conscientes de que fazemos parte do Macrocosmos.
Tudo é vibração: corpo, alma e espírito tem o seu nível vibratório: quando alguém está mal disposto a sua aura irradia forças negativas para os outros, como que golpeando-os e fazendo-os sentir mal, dizendo que da cabeça saem as vibrações e ondas, com as suas respectivas cores, Assim, devemos aprender a transmutar as energias do ódio no amor, da inactividade na acção, etc.
                                                  
Para Nina Soncco cada ser é um Sol em busca do Grande Sol, «somos fogo, línguas de fogo revestidas de matéria alojada em nossa fronte», um sol em miniatura que crescerá até converter-se no Deus que levamos dentro de nós... Nosso Sol interno se desdobrará... Terás que aprender a relacionar o Sol com o Pai Criador de todas as coisas e as chamas divinas com o homem. Somos filhos do Sol (Intic Churincuna) somos sua imagem e semelhança... O ser humano tem a obrigação e o dever de lutar contra a materialização do seu ser, contra a cristalização do seu corpo, buscando a sua purificação e libertação, isto é, salvar sua vida das ruínas do seu templo e elevá-la para que ocupe seu verdadeiro lugar na evolução».
A valorização do serviço desinteressado aos outros, da harmonia com as leis cósmicas, da busca do silêncio interior, da irradiação do calor do amor, da vivência da fraternidade, dos três preceitos comunitários (veracidade, honradez e trabalho), de uma agricultura biológica, de uma medicina preventiva e de saberes tradicionais surgem a par da condenação dos extremos, dos imperialismos, dos egoísmos, da alienação massificante da sociedade moderna.
Para enfrentar este perigo é fundamental uma tripla meditação: O que sou ou quem sou? O que é a vida? Que pretendo da vida, no futuro? 
Ao fazermos esta auto-inquérito (vichara), numa linha que se aproxima da que o mestre Ramana Maharishi ensinava junto à montanha de Arunachala na Índia no século passado, poderemos compreender que viemos à luz para ser felizes e que os obstáculos são meios para crescermos,  desenvolver-nos,  fazermos o bem e  universalizar-nos.
Cusco
Antón Ponce de Léon Paiva narra por fim a sua iniciação no último dia da semana passada na oculta aldeia andina quando, rodeado pelos anciãos que cantavam sons sagrados em quechua, sentiu a unidade da vida, «a força única que atravessa todas as coisas» e na qual se viu como luz, num tempo primordial, no ser que somos essencialmente, e que vive «no dar e não no obter; o caminho do amor, o interesse autêntico pelos demais».
A cerimonia iniciática, junto ao corpo preservado do antigo mestre Amaru Yupanqui Puma, fá-lo ainda sentir entrar pela sua mão esquerda, passar pela coluna vertebral, e sair pela sua mão direita uma corrente eléctrica que assim percorria e enchia todo o seu corpo. Depois de beber uma poção mágica dada pela jovem Chaksha tem uma experiência de saída do corpo físico e visões de grande beleza. E quando é acordado no dia seguinte pelo chefe e mestre da aldeia Nina Soncco este dá-lhe os últimos conselhos: «Mantêm-te constantemente equilibrado, harmónico e em paz contigo mesmo, em qualquer circunstância da tua vida, por mais difícil que ela seja. Que brote do teu íntimo [a tua acção], pois somente assim poderás ser justo e equitativo», sem dúvidas bons conselhos...
Por fim, pela frente de Antón, está de novo o caminho do regresso, em parte de olhos vendados, e para começar a Samana Wasi, Casa de Harmonização, um oásis para crianças e anciãos desprotegidos, e na qual deverá falar com muita cautela, com discernimento, sem ofender ninguém; ou, fundamentalmente, falar para dizer algo que seja benéfico para os outros. Trabalhar com humildade e rectidão. Que o ensinamento seja também para ti um aprendizado: o exemplo é a melhor escola».
Em 2017 Antón Ponce de Léon Paiva orienta não só a Fundação Samana Wasi, em Cuscu, no Peru, como vai com frequência falar sobre a sabedoria ameríndia, andina, inca e da língua quechua, estando presente em vários vídeos no Youtube. Em Samana Wasi há um pequeno albergue para quem quiser vivenciar esta experiência e a sabedoria dos povos nativos dos Andes... 
                             Inti.... O espírito divino brilhe em ti....