sexta-feira, 17 de março de 2017

"Contemplação", soneto de Antero Quental, do ciclo final de 1880-1884, comentado.

Antero de Quental, na fotografia de que mais gostava..
Contemplação é o título dum poema do ciclo final da estrutura organizativa dos Sonetos de Antero de Quental, estando portanto incluído, embora não datado, nos que foram escritos entre 1880 e 1884, em Vila de Conde, e dedicado ao seu conterrâneo, companheiro em Coimbra e grande amigo Francisco Machado de Faria e Maia (1841-1923).
O soneto, com um título elevado e difícil em termos de realização espiritual efectiva, pois podemos dizer metodologicamente que primeiro há a concentração (focalização de atenção mental em algo), depois a meditação (continuidade desse fluxo unitivo) e por fim a contemplação (visão da essência, unidade de quem vê com o que é visto), acaba contudo por revelar-se como fruto mais de uma sensibilidade desiludida e de uma visão intelectual da vida senão pessimista pelo menos triste e vazia, e assim contrastar com a ideia repetida de que os seus últimos sonetos (de 1883, 1884) seriam já uma antevisão de unidade entre espírito e matéria, unidade que ele continuaria a cogitar e a demandar, e mesmo a demonstrar melhor apenas no penúltimo ano de vida, no seu seminal texto Tendências gerais da Filosofia na segunda metade do século XIX, publicado em 1890 na Revista de Portugal.
Na ordenação dos sonetos da edição de 1886 realizada por Oliveira Martins, mas a ela anuindo Antero (saindo mesmo uma segunda edição, enriquecida de várias traduções, em vida do poeta),  este soneto é o quarto da série final, seguindo-se a um primeiro, Transcendentalismo, onde anuncia um "espírito impassível" que terá avistado acima do bem e do mal terrenos; e a um segundo soneto, Evolução, onde afirma a sua crença na metempsicose dos seres através dos vários reinos da Natureza, até se chegar ao estado em que o ser ergue os braços e aspira só à Liberdade;  e a um terceiro poema, o longo Elogio da Morte, composto de seis sonetos, nos quais (muito sumariamente resumidos aqui por mim) sente e poetiza a sua imaginação-visão da Morte como uma amada Beatriz (a amada e guia de Dante na Divina Comédia), de mão gélida mas consoladora e que no seu nível mais elevado simbolizaria  a Paz universal e o regresso ao Não-Ser, o qual seria o único Ser Absoluto, como ele afirmou ou pensava então.
Estamos a ver que as forças psico-espirituais convocadas ou trabalhadas para entrar no elevado nível da contemplação não eram as melhores: Antero de Quental, no término dos seus esforços, vai apenas, e já foi muito na época e pela demanda filosófica e social em que se embrenhou, conseguir aspirar a, e intuir, um nível psico-espiritual do Universo impassível e libertador, que é no fundo semelhante ao estado da morte,  e que fora apontado pelos textos budistas que lera e pelos filósofos do Inconsciente, embora de modos  vagos ou superficiais em relação, por exemplo, aos níveis de consciência mais elevados ou subtis conhecidos dos místicos ocidentais e dos mestres espirituais orientais e admitidos e estudados hoje  pela psicologia moderna transpessoal e outras.
Com a morte, acontece para ele,  um regresso ao Não-Ser, estado este que tem uma avatarização (da palavra sânscrita avatar, descida divina à manifestação), formalmente cristã no soneto final da ordenação do livro, mas que de facto foi escrito em 1882, Na Mão de Deus, devendo esta expressão e imagem ser vista dentro da realização por Antero de Quental de Deus  como Justiça, Libertação e Paz, e não tanto referindo um Ser divino pessoal (Deus), como ele aliás explica em duas cartas, a primeira a Alberto Sampaio, de Maio de 1882: «Fiz depois que aqui estiveste mais um Soneto, que aí vai. Não te assuste a palavra Deus. É um símbolo para exprimir uma certa coisa, que doutro feitio não caberia num verso. Pura liberdade poética.» E segunda a João de Deus, a 20-VII-1882: «E agora aí vai um Soneto. Será talvez o primeiro de que gostes por mais alguma coisa do que só pela forma. O meu pessimismo tem-se desvanecido com esta vida contemplativa no meio da boa natureza. Reconheci que andar por toda a parte a proclamar, com voz lúgubre, que o mundo é vão, era ainda uma última vaidade...».
Muito significativo este afirmar do abandono de uma visão niilista, pessimista ou mesmo "oriental" do mundo como ilusão, e a valorização, no meio de uma natureza boa (Vila do Conde, o oceano, a praia, a maresia),  de um certo tipo de contemplação, ou seja, de unidade sentida da alma tanto com o Cosmos como com um ambiente que se lhe revelava muito benéfico, saudável mesmo, como alguns dos seus amigos que o visitaram afirmavam em cartas...
Foi pena ter de abandonar Vila de Conde, onde esteve dez anos bem harmonizadores e até contemplativos,  com as últimas desilusões: a da falta de reacção política ao levantamento popular nortenho que ele liderara contra o imperialismo inglês, com o Ultimatum de 1890, e a da falta de perspectivas afectivas, ambas a contribuirem para afunilarem o seu percurso para uma trágica morte voluntária, entregando-se a esse misterioso Não-Ser no qual anteveria a paz, tanto mais que a sua ideia de ter cumprido a sua missão, ou melhor, de que pouco mais teria para fazer, com os seus desgastados nervos, para tal o inclinavam.
Oiçamos então o soneto Contemplação, que se segue ao Elogio da Morte, e que significativamente foi um dos dois escolhidos para adornar o excelente busto realizado por Canto Maia, para o jardim Antero de Quental em Ponta Delgada...
«Sonho de olhos abertos, caminhando 
Não entre as formas já e as aparências, 
Mas vendo a face imóvel das essências, 
Entre ideias e espíritos pairando... 

Que é o mundo ante mim? Fumo ondeando, 
Visões sem ser, fragmentos de existências... 
Uma névoa de enganos e impotências… 
Sobre vácuo insondável rastejando... 

E dentre a névoa e a sombra universais 
Só me chega um murmúrio, feito de ais... 
É a queixa, o profundíssimo gemido 

Das coisas, que procuram cegamente 
Na sua noite e dolorosamente 
Outra luz, outro fim só pressentido...» 

Realçaremos numa hermenêutica simples e espiritual, a rica expressão inicial de sonhar de olhos abertos e ir caminhando, já não por entre as formas materiais mas por entre essências, ideias e espíritos.
Este "sonhar de olhos abertos" tanto aponta para o sonhar no qual estamos conscientes ou mesmo bem lúcidos do que sonhamos ou vemos, como ainda para um acto imaginativo, no qual, de olhos abertos ele sonha, visualiza-se ou sente-se, caminhando por entre ideias e espíritos, ou seja entre vibrações, entidades psíquicas e seres. 

Poderia ainda referir-se ao olho espiritual aberto, o denominado 3º olho, mas não cremos que ele estivesse tão consciente de tal, embora certamente a sua capacidade visionária e imaginal possa ao longo da vida ter-lhe dado intuições, imagens ou fulgores rápidos de visão subtil...
Antero de Quental tem a franqueza de não dizer que é uma visão verdadeiramente clarividente e assim podemos deduzir que a sua descrição corresponderá em grande parte ao que ele sobretudo sente e pensa, e assim dá-nos uma visão de abertura ao mundo subtil intensa e sentida mas na qual, embora com uma alma ou psique bondosa e de compaixão e aberta ao universal e ao infinito, não consegue ver senão um umbral subtil do universo material transitório e perecível, sem alcançar o nível espiritual dele, pois não conseguira gerar e desenvolver em si vibrações e órgãos subtis correspondentes ou afins dos planos espirituais elevados.
Deste modo a descrição dada do Além e do mundo subtil e espiritual tem as suas limitações, deriva das suas leituras e tendências, experiências e configuração psico-corporal e portanto do seu difícil e doloroso caminho e demanda.
A visão que nos oferece é então por um lado niilista e pessimista, pois tem por base um vácuo insondável, um tipo de vazio correspondente ao Não-Ser, ao qual sobrepõe um mundo de névoas e sombras transitórias, donde só lhe chegam os gemidos das coisas e seres que contudo ainda assim, diz-nos ele, procuram outra luz e outro fim.

Há aqui a admissão, e é o lado luminoso deste poema, de que a Natureza procura a Luz e um fim perene, divino ou de Bem, algo que ele no início do soneto afirmou de certo modo para si mesmo quando disse: contempla, as faces imóveis das essências, por entre ideias e espíritos pairando, fechando com este final de aspiração à luz o círculo do soneto.
                                 
Podemos perguntar, que filosofias e autores, que leituras e conhecimentos estão por detrás desta tríade composta de ideias, essências e espíritos, que paira acima do vácuo e dos gemidos do mundo, e é certamente difícil de responder-se com segurança, embora possamos apontar o dedo aos filósofos gregos, nomeadamente Sócrates e Platão, ao Oriente e aos autores das suas leituras mais espirituais.
É valiosa esta tríade, com as essências vistas por Antero como imóveis e fixas (e que para outras visões não o serão), atribuindo depois o movimento de, ele, a sua alma ou a visão, pairarem por entre as ideias e os espíritos, aqui aludindo ao espaço onde elas têm a sua existência designado na Antiguidade como a Alma do Mundo, referida por vezes na sua obra e que de certo modo corresponde ao que é hoje denominado Campo Unificado de energia informação consciência. 
Antero de Quental também experiencialmente intuíra e deduzira tal das experiências de magnetismo e transmissão de pensamento em que participou ou que conheceu, tal como refere na conhecida carta a Carlos Cirilo Machado, enviada precisamente em 1886, de Vila de Conde, nomeadamente quando diz: «O magnetismo parece estabelecer uma unidade de consciência entre várias pessoas, ainda que separadas por grandes distâncias, de sorte que o que uma sabe, sabem-no as outras logo».
Talvez o verbo "pairar" aplicado às ideias e aos espíritos não seja o mais exacto, pois o dinamismo intrínseco (aliás bem valorizado nas Tendências Gerais da Filosofia na segunda metade do séc. XIX) dos espíritos individuais fora de corpos físicos não os reduz a pairarem, notando-se assim uma certa visão do Além fruto de uma justaposição ou compromisso entre a dissolução no Não-Ser e um provavelmente relativo pairar dos espíritos por algum tempo, não na fase post mortem que é vivida frequentemente semi-consciência, mas como maneira de se estar ou sentir na leveza do corpo subtil. 
Não é de excluir contudo em  tal pairar  alguma sugestão bíblica do Génesis de descida do "espírito que pairava sobre as águas", embora precisamente nos tercetos finais do 2º soneto do Redenção, encontremos de novo o pairar, mas no sentido bem ascensional da tradição neo-platónica e mesmo da metempsicose oriental, como transcreveremos mais extensamente no fim: «Almas ... E pairando, já puro pensamento»...
Não poderemos pois dizer que tenha sido muito elevada a visão contemplativa luminosa alcançada ou gerada por Antero de Quental, embora seja a sua, sofrida e ansiosamente vivida e demandada, quem sabe se mesmo sacrificialmente enquanto consequência do envolvimento empático com todas as aspirações e demandas de uma época de embates e crises.
Seria melhor outra contemplação do mundo espiritual, mais luminosa, interactiva e unitiva, na qual estivesse mais clarividente e com o coração flamejante, em comunhão maior e mais dialogante seja com os espíritos seja com as ideias arquétipas primordiais, certamente desprendido das formas ilusórias.
Assim a sua grande alma, plena de compaixão e de solidariedade, de aspiração à liberdade e à justiça e, logo, ao amor, ao bem e à felicidade, apenas vê, adivinha, intui ou pressente nas coisas ou seres «que procuram cegamente/ Na sua noite e dolorosamente/, Outra luz, outro fim só pressentido...»
Anote-se que os sonetos seguintes desta edição definitiva ou completa dos Sonetos de 1886 são todos bem significativos no tormentoso desvendamento da busca de Antero, estando intitulados Lacrimae rerum e Redenção (que em manuscrito se chamara Panpsiquismo), dedicados a Tommasso Cannizzaro e a Celeste Batalha Reis, e sendo a Contemplação e a Redenção por ele valorizados em carta a Carolina Michaelis, de 25.X.1886, já que esta  notara "concordância" da sua poesia com o Hino ao Sol de S. Francisco de Assis e as epístolas de S. Paulo, replicando Antero que embora tendo lido o Hino e algo das epístolas de S. Paulo, «a concordância que V. Ex.ª. encontrou não pode ser senão fortuita, ou antes filha de um estado análogo daqueles grandes místicos. Justamente aqueles dois sonetos (Redenção), juntos com o outro (Contemplação) representam em forma de imagem e sentimentalmente uma das ideias fundamentais da compreensão das coisas, a que cheguei e em que fiquei, e que espero ainda desenvolver em prosa e com rigor de exposição filosófica». 
Será na carta a Jaime de Magalhães Lima, de 15-X-1886 que ele explicitará melhor a sua síntese do naturalismo e da natureza humana de modo a chegar ao mais «completo espiritualismo, a um panpsiquismo»  que ele intuíra reger dinamicamente tanto os seres como a Natureza, e que os faz encaminhar para o Bem e a Liberdade moral. 
Ressalve-se contudo ser o Lacrimae rerum  de uma desolação grande na busca de certezas e que só os dois sonetos da Redempção, esses sim (sobretudo o último), numa sentida imaginação, a partir da ânsia que já haveria nas coisas pelo espírito universal, e sendo por isso almas cativas suas irmãs, concluem numa ascensionalidade elevada ou libertadora, panpsíquica, e com o tal pairar: 
"Almas no limbo ainda da existência,
Acordareis um dia na Consciência,
E pairando, já puro pensamento,

Vereis as formas, filhas da Ilusão,
Cair desfeitas, como um sonho vão...
E acabará por fim o vosso tormento."

Será na importante carta auto-biográfica a Wilhelm Storck, de 14-V-1887, que Antero de Quental explicitará melhor a sua filosofia, e como o espírito ou pensamento moderno «não pode sair do naturalismo, cada vez mais em estado de bancarrota, senão por esta porta do psicodinamismo ou panpsiquismo».
Possamos nós em comunhão com Antero de Quental e com os demais espíritos luminosos demandarmos, menos inconscientemente, alienada ou limitadamente, e mais amorosa, sábia e clarividentemente, a Luz, a Divindade, o Bem, a Realidade e, no caso prático, tentando volta e meia contemplarmos com algum tempo e concentradamente uma paisagem, um cristal, uma flor, uma pintura, uma ideia, o espírito, o anjo, o mestre, a Divindade...
   
Visão dos mundo espirituais pintada por Bô Yin Râ (1876-1943).

domingo, 12 de março de 2017

Giordano Bruno, "Dos Furores Heróicos", e com Antero de Quental e S. Francisco de Assis, panteístas, no jardim, zimboório e céus da Estrela.

 
Lermos um bom livro é ainda do que melhor se pode fazer num Domingo. No meu caso, hoje e em parte, no jardim da Estrela, em Lisboa, espaço paradisíaco que alberga uma evocação de Antero de Quental e patos conviviais, um aberto coreto e dois lagos refrescantes, além de criança e passeantes, flores, arbustos e algumas grandes árvores que aqui encontram protecção para as suas várias missões tão benéficas ao planeta e à humanidade...
O nosso Antero de Quental refere o sábio italiano Giordano Bruno (I.1548-17.II.1600), numa carta de Vila Conde de 5 de Setembro de 1886 para Tommazo Cannizaro, onde depois de agradecer-lhe os dois livros que recebeu sobre S. Francisco de Assis, de Luigi Palomes e Ruggiero Bonghi, afirma: «Considero-o [S. Francisco] como o primeiro dos precursores do espírito moderno, digo, o espírito moderno como representado por Bruno, Schelling e Hartmann, do Panteísmo espiritualista. Neste ponto de vista haveria um paradoxo (no fundo nada paradoxal) a desenvolver, que S. Francisco de Assis não fora cristão; e a fazer sobressair o contraste entre a sua concepção do mundo e da vida, toda ela dum optimismo poético e panteísta, e a trágica e sombria concepção pessimista da Igreja, de um mundo radicalmente mau e condenado por Deus»... 
Ora ler autores panteístas, que sentem ou reconhecem o influxo ou a omnipresença divina na Natureza num jardim, e da Estrela, é certamente sempre bom...
O livro que estive a ler e a meditar é um dos mais valiosos de Giordano Bruno, Dos Furores Heróicos, na edição bilingue franco-italiana da editora parisiense Les Belles Lettres, dada à luz em 1954, numa cuidada edição e tradução anotada de Paul-Henri Michel. Eis alguns pensamentos valiosos:
«Tal como acto da vontade que tende para o Bem não tem termo, assim é infinito o acto de cognição que tende para a Verdade»... 
Bem desafiante proposição de Giordano Bruno: a nós de conseguirmos destilar o elixir da persistente demanda da infinidade do Bem e da Verdade...
«O corpo não é o local da alma porque a alma não está no corpo localmente, mas como forma intrínseca e formador extrínseco, como formadora. O corpo está portanto na alma, a alma na mente-intelecto, e este intelecto-mente ou é Deus, ou está em Deus, como disse Plotino. E assim como por essência está em Deus, que é a sua vida, semelhantemente, pela operação intelectual e pelo acto de vontade consequente, relaciona-se com a sua luz e beatífico propósito [da Divindade]» Parte I. Diálogo III.
Que luzinha se terá acendido ou avistada de lá em cima, das nuvens no céu, ou na Alma do Mundo, no Campo unificado de energia-informação-mente, sinalizando que em Portugal alguém está a ler com studium aquela magnífica obra, publicada pela primeira vez em Paris, em 1585, numa audaciosa e bela  síntese humanista filosófica, teológica e espiritual, tão sábia e profunda na sua abordagem em diálogo das relações do corpo, alma, intelecto e espírito, nomeadamente a partir das suas potências de vontade, conhecimento e amor,  e que constituem a base do caminho espiritual do auto-conhecimento harmonizador e da religação divina..

Perante os pensamentos e desejos em dispersão ou luta, como se produz a conversão geradora de luz?
«Por três preparações, que o contemplativo Plotino anota no livro Da Beleza inteligível, das quais a primeira é propor-se conformar-se a uma semelhança divina desviando a vista das coisas que estão abaixo da própria perfeição e comuns às espécies iguais e inferiores; a segunda é aplicar-se com toda a intenção e a atenção às espécies superiores; a terceira, cativar toda a vontade e afecto a Deus. Porque disto recebe sem dúvida o influxo da Divindade, a qual está presente em tudo e pronta a interferir naquele que se volta com um acto do intelecto e se expõe abertamente com o afecto da vontade.» I parte, V Diálogo.

E Giordano Bruno, tão perseguido na Terra, como estará ele nos mundos espirituais? Chegar-lhe-ão alguns raios do meu ou seu agrado ou amor, esforço ou visão, levando-o a esboçar um leve sorriso? No Campo unificador das almas acima e por dentro de espaço-tempo linear, o que conseguiremos nós alcançar pelo coração espiritual, "o afecto da vontade" das Cavaleiras e Cavaleiros Fiéis do Amor?
Giordano Bruno foi um erasmiano e leu muito Marsilio Ficino, nomeadamente as suas traduções de Platão e Plotino, Jâmblico e Pitágoras, as quais cita com frequência... 
 
Um belo livro e da mais elevada espiritualidade que bem merecia ser traduzido em português e entrar mais no zimbório da grande Alma Portuguesa, tão aberta ao Universal e ao Infinito, ao Bem e à Verdade, valores que Giordano Bruno cultivou com grande coragem, pioneirismo e profundidade ...
«Pois que eu desfraldei as asas ao belo desejo/ Quando mais sob os meus pés descubro o ar// mais ofereço ao vento a minha plumagem rápida/ e menosprezo o mundo e para o céu me envio.///
E nem o fim trágico do filho de Dédalo/ faz com que eu retorne, antes mais me elevo./Que ele caiu morto na terra bem me recordo:/ Mas que vida se equiparará à morte minha?///
A voz do meu coração através do ar sinto [que frase maravilhosa...]
Onde me levas, temerário? desce
Pois raro é sem dor muito ardimento (ou audácia)///
Não temer, respondo eu, a alta ruína.
Fende seguro as nuvens, e morre contente;
Se o céu a tal ilustre morte nos destina.»
 
Este poema, da Prima parte, Dialogo III, revelou-se profético quanto ao seu destino e morte, como mártir do conhecimento, da verdade e da liberdade...
A nós de o lermos e meditarmos mais, para comungarmos com o seu alto espírito imortal e ganharmos forças para as lutas contras as forças manipuladoras, opressivas ou mesmo destrutivas de tantas almas e grupos, meios de informação, instituições e Estado.
Saibamos contemplar os níveis superiores e mais harmoniosos e sob tal influxo mais claramante divino vivermos e agirmos, em lutas vitoriosas sobre nós e as narrativas tendenciosas que nos tentam impor, persistindo destemidamente na comunhão com o Infinito bem, como Giordano Bruno, S. Francisco de Assis e Antro de Quental tanto demandaram e realizaram! 

quarta-feira, 8 de março de 2017

Dia da Mulher, um ramo de flores. Imagens e pensamentos, psicomorfismos. 2017 e sempre..

A Primavera de Sandro Botticelli, com os anjos, Espíritos da Natureza e as três Graças 
O Dia da Mulher, como que anunciando ou desvendando a Primavera perene, é sempre uma afortunada ocasião anual de encaminhar-nos para o templo da sua essência, poder e grandeza e aí eventualmente contemplarmos a Divindade manifestada nela, a Grande Deusa, o Princípio Feminino Divino, e da qual cada Mulher é uma incarnação, mais ou menos, luminosa e transparente, activa e benfazeja, inspiradora e despertante.
Eis então um ramalhete odorífero e colorido de imagens belas e profundas da Mulher-Deusa, na verdade quase infinitas: 
Dança
Do grande poder fértil da Grande Deusa, Mãe e Ventre na Terra e na Humanidade 
De Susa, no Irão, 2ª metade do II milénio A. C. Concentração e irradiação amorosa. 
Ó ISIS, HIS, SIS, sê, liga... 
Astarte, Vénus, Divino Amor sábio em nós... 
Sacerdotisa de Creta, com o poder da serpente energética e dos seios vitais, coroada e geradora na cabeça.. 
Do Irão Zoroástrico e das suas Fravashi, Dagvidye 
Das mil faces de Grande Deusa ou Deusa Mãe, imagem partilhada pela Rosa Pedro 
Numa época em que a brutalidade e machismo de alguns homens, grupos e governos-países ainda se exerce tão violentamente no mundo e nas sociedades, nomeadamente fomentando tantas guerras e tanto tipo de mercenários, de opressões, de injustiças e de crimes, é imperioso unir-nos mais conscientemente na vivência, culto e defesa das energias e valores que as mulheres consubstanciam e representam, nomeadamente os de paz, amor, diálogo, maternidade, compaixão, pureza, doçura, inspiração, beleza, solidariedade, resistência e paciência e, em grupos e comunidades de Mulheres e Homens na demanda da Verdade e do Bem, agirmos, aprofundarmos, dinamizarmos...
Dos pré-Rafaelitas e a intuição do poder de luz da mulher...
Joana d'Arc, uma clarividente e clauriaudiente corajosa e sacrificada.. 
Inês de Castro, do amor imenso cortado precocemente mas imortal, por Maria Da Fátima Silva 
A guerra e o terrorismo no Iraque, Síria, Palestina e Yemen, quem a fomentou e apoia, quanta destruição e morte de crianças e mulheres? 
A revolução e a evolução, a opressão e a libertação coexistem na marcha da Humanidade e cada um de nós deve contribuir, pelo seu modo de vida pacífico e sábio e pela sua irradiação psíquica e acção, para os Governantes e dirigentes serem mais puros, sensíveis, cultos e a Mãe Terra ser mais respeitada e menos destruída, com todos os seus seres e eco-sistemas, no fundo para uma Humanidade mais harmoniosa coexistir nela... 
De Bilibin, da grande alma Russa, mais europeia do que a dos dirigentes todos (ou quase...) da União Europeia e que tanto nos desgovernam... 
Do Amor imenso e divino que a Mulher incarna, suscita e transmite.
Se a luta pela sobrevivência de milhões de seres explica a destruição das florestas, a morte dos animais, a extinção das espécies, a poluição asfixiante do planeta, podemos ainda assim pôr em causa o modo tão violento, desregrado e anti-ecológico com que se exerce tal luta, e sobretudo todo o dinheiro desperdiçado em armamentos, guerras, construções megalómanas, desportos, agro-químicos, offshores, ordenados e seres milionários, tudo o que poderia ser muito mais bem canalizado para a criação de condições que diminuíssem as carências materiais e culturais, as violências e as guerras, a destruição da natureza e da sua fauna, o rebaixamento da dignidade e da potencialidade humana. 
Brasil e Amazónia, Índia e Ganges, shaman, pagé, tecendo fios de orações e vestes luminosas 
Da Mulher Verde, que emerge da Terra ou se contempla e afirma nas fadas e ninfas, agricultoras, consumidoras biológicas e mulheres das ervas medicinais, mães, enfermeiras, professoras, médicas, escritoras, artistas e aspiram ao Bem e Ser Divino: Om Tat Sat!
Amaterasu o mi Kami e o santo Fuji enviando paz e harmonia para todos os seres da Terra 
O culto da Mulher, relembrado e intensificado neste dia, e aqui e agora, é a afirmação da confiança de que o Amor, a Beleza, a Maternidade, a Cultura, a Arte, a Dança e a Paz triunfarão face a todas as crises e opressões e que devemos manter-nos activos no desabrochamento das melhores qualidades, inspirados pelas Mulheres que sempre foram e serão Musas e Sibilas portadoras do Santo Graal, do Amor, da Luz, da Divindade...
Graal......Graallll....Graal... 
Zahra, Fatimah, Nossa Senhora de Fátima... 
O apoio maior à maternidade e a uma educação  em contacto e harmonia com a Natureza, e mais livre e espiritual das crianças, para que desenvolvam harmoniosamente as suas imensas capacidades, é fundamental e as professoras e professores não devem estar tão amarrados em coletes de forças de programas e de burocracias que acabam por diminuir as forças luminosas que poderiam desabrochar nas escolas e no interior de todos. 
Para que se possa culminar em seres mais plenos e felizes, que vivem ludica e criativamente, em aprendizagem livre e harmoniosa, a descoberta e o nascimento crescente da verdade e do amor, do espírito e da divindade na alma de cada um e dos outros...
Da educação dos seres sensíveis ou neo-platónicos pelas Musas e Professoras 
Dos canais de ligação entre os vários níveis do Cosmos, ou da Sabedoria Perene dos antigos que deve ser aprofundada nos nossos dias... 
Dos diálogos angélicos, das danças silenciosas e musicais que todos podemos cultivar com frutos luminosos já na, e pela, vida eterna 
Dos montes Hermínios, de Hermes, ou serra da Estrela, com o casal responsável pela minha encarnação terrena. Muita luz e amor para eles, no mistério da comunhão no corpo místico ou campo unificado de energia-informação-consciência...
Da estrela divina que paira sobre cada ser, e que a mãe atrai, ou que a mulher aponta e inspira. Via Ana Moura. 
Sendo cada ser uma centelha divina, como a imagem recebida da Ana Moura, meiga galega, mostra, há que ligar-nos mais a ela, fazendo desabrochar e harmonizar a alma e as suas energias psico-físicas pelo abraço, o amor, a meditação, a contemplação, a ascese, o esforço, a vida justa ou abnegada, a devoção, a leitura e estudo e o amor aos seres espirituais e à Divindade.
Uma Sibila lendo ou relendo o que intui, viu ou escreveu: Ora, lege, relege et invenies! 
Da meditação, oração ou irradiação vista subtilmente 
Yoni, Shakti, matriz e energia, no Oriente sagrada e cultuada 
A mulher como sacerdotisa no templo da elevação psico-energética, rumo à coroa da comunhão do conhecimento, do amor, da Divindade. 
Toca-me, sente-me, ilumina-me... 
Do equilíbrio e união dos opostos alquímicos, complementares... 
Os encontros, os abraços, os beijos e o seu potencial.. 
Dos mestres Nicholai e Helena Roerich, a Mãe do Mundo 
Cada alma é um canal entre o céu e a terra, uma estrela entre as infinitas estrelas e derramando as suas energias na temperança do Amor e da Sabedoria, do Bem e da Verdade, face ao mistério infinito, mas sábio e amoroso, da Divindade...