quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

Maria Amália Vaz de Carvalho, "Pelo Mundo Fora" (1º cap.) e a homenagem-crítica à morte de Antero de Quental.

Embora Antero de Quental e Maria Amália Vaz de Carvalho nunca se tivessem encontrado, creio eu pois não há qualquer registo, Maria Amália, quando os Sonetos foram publicados em 1886, escreveu um ensaio acerca deles, onde alterna entre a admiradora da sua forma poética e da sua sinceridade com a crítica determinada da inacção e do budismo, do pessimismo e culto da morte que o poeta desenvolvera.
Tal livro serviu de ensejo a Antero de Quental agradecer numa simpática carta,  valiosa em especial para a compreensão das antevisões filosófico-espirituais que Antero via ou nutria em relação ao futuro da Humanidade, nessa época de Fevereiro de 1889.
Em 1896, no Pelo Mundo Fora,  Maria Amália Vaz de Carvalho publicará tal carta, antecedida pelas suas reflexões sobre a morte de Antero de Quental e as eventuais causas que a tinham provocado, desenvolvendo a sua argúcia psicológica...
Tal valiosa homenagem-crítica a Antero de Quental foi escrita em dois curtos capítulos e segue digitalizada, para já só no 1º capítulo, e anotada brevemente por mim no próprio exemplar, embora acrescente algumas reflexões nesta apresentação.
A origem do suicídio é vista pela escritora no domínio das ideias, da metafísica e na dolorosa incapacidade de equilibrar os vários pontos de vista contraditórios acolhidos ao longo da sua vida, bem como na sua atracção pela morte.
O texto mostra  compaixão e amor, tanto mais que ela nos diz que ficou muito impressionada pela sua morte e que só um mês depois é que conseguiu escrever. Mas também continua a mostrar a mesma grande incompreensão do Nirvana, do Budismo, do transcendentalismo ou da realização espiritual que Antero de Quental procurara, não discernindo bem os diversas realidades espirituais em causa.
É para reflexão todavia um bom texto, porque pioneiro na aproximação crítica ao Budismo em Portugal, e com alguns aspectos valiosos quanto aos sentimentos e ideias, perigos e seguranças para os que procuram a Verdade, tal como Antero de Quental.
Certamente que nos nossos dias temos muito mais facilidade de discernir as linhas de força que estão a unir a ciência, a filosofia, a religião e a mística, algo que Antero estoicamente demandou muito pioneiramente entre nós, sobretudo fora da religião católica, ou heterodoxamente.
Neste texto Maria Amália Vaz de Carvalho considera que ele falhou e que se suicidou por causas transcendentais, filosóficas, enredado no vazio e no pessimismo.
Todavia pelo que ele foi dizendo e escrevendo cremos que não foi assim pois ele suicidou-se por ter o corpo muito desgastado, sobretudo neurologicamente, e por estar desiludido em relação ao seu projecto esperançoso de se instalar nos Açores com as duas filhas de Germano Meireles, suas pupilas e a quem se afeiçoara. E não pela descrença da vida,  a agonia intelectual dilacerante e o amor da Morte que tanto desenvolvera...
Algumas das descrições ou caracterizações que traça do Antero metafísico são quase risíveis: «A ilusão, o vazio universal, que encarava ao sair das suas vertiginosas contemplações metafísicas, faziam-no recuar pávido e tremente». p. 175
Ou «a sua dor era uma destas dores de ordem aristocrática e rara, que não se originam como as da maioria dos homens no coração, mas que emanam do espírito cansado de cogitar em vão no mistério impenetrável das coisas...
Querem ver os espectros que enchiam de pavor sagrado as suas noites? Ouvi este soneto...». E transcreve os Espectros, como se tal não fosse mais que uma expressão literária decadentista e fantasmagórica:
«Espectros que velais, enquanto a custo
Adormeço um momento, e que inclinados
Sobre os meus sonos curtos e cansados
Me encheis as noites de agonia e susto!...» 

Mais ainda de assustar é a caracterização que dá do Nirvana a partir de extractos de referências em poemas de Antero, embora no último parágrafo se redima compreendendo-o um pouco melhor: «Aspirava ao Nirvana, à paz inconsciente; queria cair naquele oceano tenebroso onde na imobilidade indefinida termina o ser inerte, ocioso; e ao mesmo tempo a compreensão atávica da eternidade católica torturava-lhe em horas de luta e inquieto espírito.
Que aspiração intensa no ideal, a deste formoso espírito aliado! Que sublimes tormentos os seus, procurando sem descanso a verdade e a luz». p. 179.

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2015

Aniversário de sri Ramakrishna Paramahansa, grande místico indiano (n. 1836).

                                           Sri Ramakrishna Paramahansa...
Em Karmapur, Bengala, nasce no dia de 18 de Fevereiro de 1836 (mas em 2015, pelo calendário lunar indiano acontece a 20 de Fevereiro, às 5:15 a.m.) Ramakrishna, um dos últimos grandes mestres da Índia, por muitos considerado um avatar, (do sânscrito avat, descida) uma manifestação maior da Divindade. Sacerdote no templo de Dakshineswar, em Calcutá, cheio de espírito e alegria, percorrerá em vivências interiores e por vezes até exteriores os vários yogas e religiões para em todos encontrar, com nomes diferentes, a Divindade única. 
Dirá: «Há muitos que falam do Conhecimento Divino, mas permanecem ocupados em coisas inferiores ou menores como a casa, o dinheiro, a fama, os prazeres. Enquanto permanecerdes em baixo do monumento apenas vereis os transeuntes, os carros, as casas, mas quando subis ao cimo dele, contemplareis apenas o céu expandindo-se no infinito, e então não vos satisfareis com as pequenas coisas em baixo, que surgem como pequenos insectos... Quanto mais vos aproximardes de Deus, mais obtereis Paz (Shanti), Paz, a Suprema Paz».
                                                    
Uma das características mais valiosas de Ramakrishna Paramhansa (1836- 1886) era a sua capacidade de sentir intensamente e mesmo chegar a ver pelo seu olho espiritual a Presença Divina em todos os seres, ou mesmo em tudo...
Por muitos modos ele explicou o que via e vivenciava, nomeadamente Deus:
"Como é Deus tudo, ou como está em tudo? - É a Divindade que está dentro de nós como a Consciência Pura, a Inteligência Pura.. Neste nível nós somos como a casa e Ele o morador...."  Eis uma boa proposta de meditação.....
Sri Ramakrishna considerava a mera busca intelectual insuficiente, pois o mais importante era a inquietação ou desassossego por Deus, a aspiração (mumuksha) que culmina no amor, na visão, na união...
Um dos aspectos modernos ou, melhor, perenes de Ramakrishna era o de cantar versos tradicionais e dançar, criando à sua volta, com os devotos e amigos, grande entusiasmo místico e alegria...
                                                      
Ramakrishna considerava que este mundo tinha sido criado por Deus para seu prazer ou jogo (lila), e salpicara-o de atractivos para manter as pessoas envolvidas nele mas à medida que os desejos fossem sendo cumpridos e o ego dissolvido a vontade de retornar a Deus crescia nas pessoas e então elas conseguiam-no amar e ver, e libertavam-se das malhas de maya, do jogo ilusório da manifestação.
Vivendo nos arredores de Calcutá, como sacerdote do templo de Kali em Dakshineswar, teve muitos discípulos, um dos quais redigiu quase o dia a dia do mestre, numa obra que se tornará o famoso e belíssimo livro O Evangelho de Ramakrishna traduzido em todas as línguas, em Portugal existindo ainda apenas através da tradução e impressão brasileira, embora eu tenho estado em em 1996, seis meses em Calcutá, a meditar e a dialogar, tendo sido iniciado pelo presidente da Ordem Swami Ranganathananda (1908-2005), e a estudar e a traduzir textos indianos com Satchitananda Dhar, no Instituto de Cultura da Ordem de Ramakrishna, tendo traduzido partes do Evangelho de Ramakrishna que se conservam em manuscrito, talvez à espera de alguma alma caridosa ou engenhosa que as queira computorizar...
                                             
                                           
Ramakrishna tinha grande intuição em reconhecer nas faces ou mesmo formas das pessoas as qualidades interiores, e conta-nos uma história interessante nesse sentido, quando ele era um jovem que estava a começar o seu caminho espiritual: "Alguns dias depois de ter a minha primeira experiência de samadhi (um estado de unificação beatífica espiritual ou divina), em Dakshineswar, uma mulher de família brâmane veio cá, e tinha muitos traços belos. Logo que pusemos uma grinalda de flores à volta do seu pescoço e a queimarmos incenso diante dela, ela entrou em estado de samadhi (ou ainda, êxtase ou inebriamento). Uns momentos depois ela sentiu uma felicidade tão grande que as lágrimas saltavam dos seus olhos. Eu saudei-a e perguntei-lhe: Mãe, será que eu vou conseguir? Sim, replicou ela."
Neste pequeno acontecimento temos vários aspectos valiosos para reflectirmos: a intensificação espiritual de uma pessoa que se pode fazer ungindo-a de incenso e de flores, algo que em geral no Ocidente se faz apenas para os mortos e que julgo ter causado da parte deles algum reparo irónico, já nos seus corpos psico-espirituais: "Nunca nos deram uma flor em vida e agora é que o fazem..." Saibamos então presentear melhor os seres que amamos ou que o merecem com flores e incensos, bons sentimentos, pensamentos, energias...
Voltando aos ensinamentos do episódio da vida de Ramakrishna, vemo-lo em seguida a ter intensificado o estado espiritual (bhava) da visitante, humilde e sinceramente ver nessa mulher a Mãe Divina, algo que é um arquétipo interno de toda a mulher, mas que naquele momento de elevação espiritual mais se concretizava, e perguntar-lhe o sucesso seja da sua profissão de sacerdote ou da realização espiritual futurante, aceitando-a como uma sibila, uma voz oracular...
A influência de Ramakrishna no reconhecimento da Religião Universal ou da Unidades das Religiões é muito importante, não só pela sua experiência das várias religiões por experiência directa, como pelo seu pioneirismo e pelos que, a partir dele, têm ora experimentado internamente ora aprofundado comparativamente as semelhanças e pontos comuns entre as várias religiões e tradições, ou ainda finalmente os que místicos ou iniciados têm experimentado ou vivenciado a Divindade única, a Fonte Primordial, o Sol do Amor Divino...
A descrição da sua passagem intima pelo Islão e pelo Cristianismo tem certamente interesse em ser relembrada, e utilizaremos alguns excertos das traduções feitas no Ramakrisna Institute of Culture, em Calcutá, em 1996:
"O conhecimento pessoal das diversas práticas de cada religião e da essência dos seus fundadores foi sendo paulatinamente revelada a Ramakrishna. Pouco depois da sua iniciação com Tota Puri [um mestre advaita Vedanta, ou seja da Unicidade Divina], um faquir muçulmano chegou ao oásis no deserto que era Dakineswara, parou a sua caravana, e entregou-se às suas práticas no bosque, asseguradas que estavam as suas refeições pela generosidade da organização de Mathur [o superintendente do templo de Ramakrishna].
Govinda Rah, assim se chamava, não passou despercebido ao olhar arguto do mestre e revelou-se n verdade um companheiro de Deus. Quase que imediatamente Ramakrishna sentiu vontade de praticar a sadhana [os exercícios e metodologias psico-espirituais] islâmica sufi, ou seja, as práticas desses místicos que constituem o centro mais puro da religião islâmica.
Iniciado por Govinda, começou a vestir-se e a comer como os muçulmanos, obrigando um cozinheiro árabe a explicar ao cozinheiro bramane como devia fazer a comida e passou a rejeitar espontaneamente as divindades hindus e a repetir o nome de Allah e a dizer o Namaz [as orações preceituadas pelo Islão] as três vezes ao dia. Após três dias neste bhava [sentimento, modulação ou onda interior], Ramakrishna teve uma visão de uma homem luminoso e impressionante, com uma barba longa, e depois viu-realizou a Divindade com atributos e por fim a Divindade pura sem atributos."...
"Pouco depois de ter conseguido realizar a adoração da Mãe Divina pura, Ramakrishna veio a conhecer pessoalmente a religião Cristã. Costumava por vezes visitar um vizinho do templo que era cristão e que tinha na parede uns quadros religiosos em que Jesus surgia. De um deles, criança, ao colo de Maria. Um dia que o examinava cuidadosamente, surgiram como que raios que o trespassavam e o alteravam completamente, fazendo com que as suas impressões hindus fossem como que encerradas num cantinho do cérebro. Algo assustado por não estar a conseguir relacionar-se com a sua religião, pois agora eram outras impressões as que submergiam a sua mente, Ramakrishna orou profundamente à Mãe divina: "Oh Mãe, que mudanças estranhas me estás a causar", mas infrutiferamente. Pelo contrário, imagens de padres e fiéis em oração e adoração profunda, oferecendo incenso, luz e corações ardentes a Jesus nas igrejas surgiam, ao mesmo tempo que uma grande fé e reverência por Jesus e a sua religião o inundava.
Durante três dias este estado manteve-se, sendo-lhe impossível entrar no templo de Kali e por fim ao passear no bosque sagrado viu um homem de compleição bela e profundamente espiritual, ainda que com o nariz levemente achatado, avançar para ele sorridente.
Do seu peito brotaram então as palavras: "Jesus, Jesus o Cristo, o grande Yogi, o amoroso filho de Deus, um com o Pai, que deu o sangue do seu coração e se entregou à morte por tortura para libertar os seres humanos da dor e da miséria. Jesus então abraçou-o e introduziu-se dentro do seu corpo e Ramakrishna entrou em extâse, realizando Deus com atributos e não tendo mais qualquer dúvida em ele ser uma incarnação divina"...
                                                 
"No seu quarto teve sempre ao lado das imagens hindus, uma estátua em pedra de Mahavira, o último tirtankara Jaina e uma imagem de Cristo na parede, e oferecia-lhes incenso todas as manhãs."
Se quiser meditar mais no dia 20, e nos seguintes conforme o programa, certamente que estará em maior sintonia com ele e com os milhares de devotos ou amigos no mundo....
                                                      

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2015

"Tese e Antítese nos Sonetos de Antero", por António Sérgio. 1937.

António Sérgio, nascido em Damão, na Índia, em 3.IX.1883, filho do então Governador-Geral da Índia Portuguesa, e morrendo em 12.III.1969, foi um pedagogo, livre-pensador e democrata, com vasta obra publicada, tendo sido preso várias vezes e exilado pelo regime de Salazar, mas mesmo assim a sua obra era lida, discutida e sentida como uma luz na obscuridade política e do livre-pensamento nas décadas de 30 a 70 no século vinte. Foi um grande propugnador dos princípios do cooperativismo em Portugal, fazendo pequenas publicações de divulgação. O movimento da Seara Nova e a sua revista devem-lhe muito, e as suas tertúlias literárias eram fecundas. Os seus estudos de história e os vários volumes dos Ensaios foram contributos importantes para equilibrar a mitificação exagerada da História de Portugal, embora por vezes sofrendo dum excessivo pendor positivista, como aconteceu, por exemplo, nas polémicas acerca do Sebastianismo e do Messianismo e mais tarde acerca de Leonardo Coimbra. Os seus comentários tecidos à História Trágico-Marítima foram dedicados «À memória do Infante D. Pedro, de D. Francisco de Almeida, de D. João de Castro, de Diogo de Couto, de Luís Mendes de Vasconcelos, contrários à ideia de fazer conquistas, de multiplicar fortalezas», e ilustram os seus desejos ou aspirações de um entendimento pacífico e lúcido e de uma sociedade cooperativa e equitativa. Editou os Sonetos de Antero, amplamente comentados, e foi quem mais tentou caracterizar e fundamentar uma polaridade apolínea e dionisíaca existente em Antero de Quental.
Em 1937, na importante Revista de Portugal, fundada por Vitorino Nemésio e Alberto Serpa, e que durará até 1940, publicou um valioso texto que vamos partilhar. Se houver comentários logo se fará diálogo, agora apenas transcrevendo a conclusão de Antero e de Sérgio:
«Todo o dialecta há-de pensar com Antero [citado das suas Tendências Gerais da Filosofia na segunda metade do século XX], que «o Universo, análogo no fundo ao espírito, só pelas suas ideias imanentes existe e se governa» e que «a evolução, vista desta altura, não é somente o processo mecânico e  obscuro da realidade: é o próprio processo dialéctíco do ser, tem as suas raízes, comuns com as raízes da razão, na inconsciente mas fundíssima aspiração da natureza a um fim soberano, a consciência de si mesma, a plenitude do ser e a ideal perfeição»...












Um pouco difícil de ler... Logo que possa, fotografo de novo...íí

                         
Escreve António Sérgio, e repetimos: «Todo o dialecta há-de pensar com Antero que «o Universo, análogo no fundo ao espírito, só pelas suas ideias imanentes existe e se governa» e que a evolução, vista desta altura, não é somente o processo mecânico e obscuro da realidade: é o próprio processo dialéctico do ser, tem as suas raízes, comuns com as raízes da razão, na inconsciente mas fundíssima aspiração da natureza a um fim soberano, a consciência de si mesma, a plenitude do ser e a ideal perfeição»...
Eis algumas afirmações correctas e outras incorrectas, que nos desafiam a cogitarmos com calma, pois nem Antero nem Sérgio estão aqui a ver ou a admitir a descida do espírito à natureza, algo materialistas vendo o espírito apenas numa medida idealista, na qual se compraz António Sérgio, vendo-a implícita no materialismo dialéctico, ainda que estes não se considerassem idealistas. Ora o espírito é tão real como uma coisa e não é uma simples ideia. E tem de ser experienciado interiormente por cada um de nós...

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

Da morte e da amizade e espiritualidade imortalizadoras. Despedidas num cemitério...

Ommm  A morte de uma pessoa amiga é sempre um momento especial na vida dela e, logo, quando podemos acompnahá-la, também na nossa. Assim partimos para o cemitério dos Olivais, uma parte de Lisboa ainda com oliveiras e um monte donde as almas se transformam ou se reconhecem (mais ou menos...) em fogo e luz da vida...
As nuvens são sempre anunciadoras, mensageiras, nem que seja da existência do firmamento, Aditi, na tradição védica a mãe de todos os deuses, os Adityas, tais como Surya, o Sol, e Varuna, a água..., e é uma das melhores realidades e imagem da Divindade, imensa e matriz de tudo...
Os cedros apontam ao céu e são árvores sagradas consagradas à imortalidade, porque estão sempre verdes e se dispõem em forma cónica e piramidal, manifestando a sua natureza poderosamente ígnea. As nuvens, essas, em cima de um cemitério e crematório, certamente que assumem formas  por vários motivos, ou conforme as subjectividades observadores e modeladoras...
Um pequeno dragão (ryu, na tradição nipónica bem referida pelo nosso Wenceslau de Moraes) lança uma labareda, ou não estivesse um corpo a ser queimado e as suas energias a alimentarem os mundo subtis e a consciência a encaminhar-se para o mundo espiritual...
Nos muros que rodeiam os jardins, também chamados "cercas" à volta dos conventos, quem se avista com frequência são as aves  (aqui dois melros) saltitantes e livres, para as quais não há fonteiras e lembrando-nos que também nós somos cidadãos dos dois mundos e em nenhum deles nos devemos fechar ou limitar mas na Unidade Divina (Tawid, na mística Islâmica) nos assumir...
Poucos mas bons: a Suzana, o António e o Xucha, mais invisíveis Carlota e eu, debruçados sobre a sebe separadora, ainda banhada pelo sol, após a curta celebração e oração pela partida luminosa da alma amiga desfalecida corporalmente, renascida espiritualmente...
Os augúrios ou auspícios tirados pela direcção para onde corre o fumo do corpo a arder, sobretudo se há orações ou mantras a elevarem-se para os céus, muito provavelmente aconteceram nas margens do Ganges como aqui nas do Tejo ("o Ganges também passa pela rua dos Douradores", Fernando Pessoa, Livro do Desassossego), quando o vimos subitamente, no meio do nosso diálogo sobre a convergência das religiões, a erguer-se direito, atraído para o alto...
A Brihadaranyaka Upanishad, que o António Barahona acabara de traduzir ou transcriar, para as Publicações Maitreya, e que eu levara para eventuais leituras-orações, na longa espera até nos entregarem as cinzas, passou de mãos em mãos até o António a dedicar...
Uma bela imagem deste poeta e espiritual, com o lenço da causa Palestiniana, após um longo e variado percurso espiritual,  hoje sendo um islâmico, sufi com o seu Pir ou Sheikh, e pai de nove filhos e dezenas de livros, poemas e traduções...
Imagens de horizontes simples mas muito cósmicos e imortalizantes...
Umas pequenas flores coloridas e odoríferas, brotando da relva verde e humilde da esperança, os muros e fronteiras entre os mundos e as árvores, que ligam a terra e o céu e são eixos do mundo, tal como nós nas nossas colunas vertebrais e aspirações espirituais...
Já de novo no centro de Lisboa, a grata sensação de levar uma alma em cima da aura, sobre o vaso com as cinzas que levo na mochila às costas (posteriormente serão depositadas  nas raízes de uma árvore) e, subitamente, uma nuvem bela a aparecer sobre um vaso-urna, e o fogo da aspiração a religar os mundos, qual raio celestial bem flamejante...
Assim, que a alma da Maria João, ser bem sensível e bondoso, esteja luminosa, desperta e a avançar para os melhores estados possíveis nos mundos espirituais, com as bênçãos dos Mestres, Anjos e da Divindade... Lux!
 

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015

Da morte e do além, e dos modos de orar por quem partiu. Com video.

Que a tua alma no além seja rapidamente harmonizada pelos bálsamos e arco-íris dos Anjos e da Divindade
A meditação da morte sempre foi recomendada pelos espirituais em todas as tradições, pois com ela aprendemos o despreendimento e identificamo-nos mais com o nosso ser espiritual e o seu corpo próprio que vamos talhando ao longo da vida.
De igual modo as orações pelos mortos surgem quase todas as tradições e assim quando alguma pessoa amiga parte devemos renovar essa meditação e oração para aprofundarmos tal mistério, germinarmos suas sementes e flores odoríferas e irradiarmos assim centelhas de luz e de amor que iluminem e aqueçam quem partiu e nós próprios, evocando-se ainda as bençãos espirituais e divinas sobre todos, pois cada meditação é sempre reflexiva, espelhante, interconectante entre o que está em baixo e o que está em cima, entre o nós e os outros...
Neste sentido no fim deste texto vão algumas orações e indicações, num video gravado hoje de manhã, pouco depois de ter sabido que uma amiga (Maria João), após doença ou diminuição já suficiente, partira...
Na verdade, todos  devemos tentar viver o melhor possível para que a morte venha na altura certa e conseguirmos dizer: “eu sei aceitar a morte, mesmo se tiver que ser voluntária por alguma causa ou por coerência. Pois a morte é uma libertação, em que deixamos o corpo e as limitações terrenas e passamos a respirar e a evoluir num mundo mais luminoso e espiritual…”
Saberei ou sei atravessar os purgatórios e purificações e entrar nas ondas dos mundos subtis e espirituais, quando vier a morte e seja despenhando-me de uma altura considerável, seja voando para a Divindade, estarei em calma ou em máxima intensificação  energética, arrancando o corpo espiritual do físico, quem sabe numa sensação talvez conhecida daqueles que já se lançaram em pára-quedas e de repente sentem o esticão e aí estão eles a flutuar num novo corpo semi-alado, uma  oval transparente de miríades de ondas e partículas de luz e e de cor..."
                                                
Assim é o nosso corpo psico-espiritual, com o qual viajaremos pelos mundos subtis após a separação do corpo físico. E se não nos acontece mais em vida terrena a consciência da experiência de sairmos do corpo terreno (ainda que algo fique nos sonhos, como a descida a pique, de elevador, ou em saltos e voos) isso deve-se à agitação da sobrevivência, à dispersão informativa e manipulada e à excessiva identificação corporal que nos impedem de estarmos mais firmes e fortes conscientemente como Eu no corpo espiritual, seja nos gestos e actos do quotidiano, seja nos diálogos e meditação, seja já nos sonhos e, por fim, quando morrermos fisicamente e partirmos renascendo espiritualmente...
Por isso, por vezes, a morte é antecedida de sofrimento despojador e libertador mais ou menos prolongado, para que a alma se desprenda dos seus apegos e saiba estar mais nua e em maior aspiração à Paz, ao Amor, à Unidade (até com os que já partiram...), à presença pura Divina, à identificação com o seu próprio Espírito...
A morte libertadora e para o Alto apontada é  o desenlace natural de uma vida mais ou menos harmoniosamente trilhada, e devemos então estar sempre preparados
para a enfrentarmos corajosa e luminosamente, não nos deixando abraçar por medos ou míticas figuras mas antes nos elevando qual chama alada, ave misteriosa ou companheiro dos Anjos...

Claro que as nossas orações, meditações e ligações verticais ao longo da vida são sempre influenciadoras dos seres que poderão aproximar-se mais de nós quando partirmos da terra física e passarmos por um entorpecimento e neblina intermediária e pelos reajustamentos das consciências e memórias ou impregnações cerebrais, oníricas e espirituais,  até estarmos e entrarmos mais consciente e clarividentemente nos mundos psico-espirituais, na chamada Terra Lúcida pelos Persas antigos...
Mas, certamente, sabemos ainda muito pouco da vida já fora da incarnação terrena, por isso o que podemos mais fazer é viver harmoniosamente, meditar bem, cuidar e meditar dos que vão morrendo e invocar e evocar os que imortais nos amam e nos podem inspirar, de amigos e antepassados aos mestres e Anjos, ou mesmo às faces e Sol do Amor da Divindade...                                                             

Desafios para que o nosso coração arda mais luminosamente e vença a ignorância e os apegos e assim a nossa consciência se polarize mais no seu centro espiritual...
Eis a gravação, com algumas orações e mantras...