domingo, 29 de julho de 2018

Das azinheiras e árvores sacras de Valinhos, Fátima, dos Anjos e da Nossa Senhora. Peregrinação

Das azinheiras sagradas de Fátima e mais precisamente de Valinhos, eis o registo realizado a 28-VII-2018 da via sacra delas, nas margens que ladeiam a tradicional via sacra cristã e que as pessoas percorrem detendo-se em frente das capelinhas comemorativas dos passos da paixão de Jesus em orações, cantos ou reflexões.   
 Fazem-no, todavia, sem darem muita atenção ou mesmo admiração e amor às árvores centenárias que as rodeiam ou acompanham,  sagradas já que também elas consubstanciam a ligação ou intermediarização entre a Terra e o Céu, não só ao longo dos séculos ou mesmo milénios, mas no próprio processo das aparições marianas e angélicas, que sobre elas se realizaram, e que de um modo ou outro abençoam estas terras e gentes e, potencialmente, os muitos peregrinos que, com esta unidade consciencializada, poderiam mais ganhar energética e espiritualmente.
 
 Troncos trinitários, Pai, Mãe e Filho; Masculino, Feminino e unificado, passado, presente e futuro; Eu, tu, nós, ou outras trindades, mundos e trimurtis....
As árvores abrem-se no caminho, ou abrem alas e asas para os caminhantes, pois gostam de dar sombra refrescante, energia revigorante e som inspirador às almas peregrinas...
 Diálogos subtis de seres, formas, texturas, raízes, cores que vagamente vislumbramos...
 
 Que comunicações se estabeleceram ao longo dos anos entre as azinheiras, os pinheiros, as oliveiras, os sobreiros, os cedros que por aqui vivem sabemos pouco, e menos ainda dos espíritos da natureza que as habitam mas que se deixam intuir nas formas com que alguns troncos, cavidades ou protuberâncias assumem ao olhar do coração, aquele que vê os seres dentro das formas ou o invisível no visível.
 
 A via sacra arbórea está mais visível nos restos calcinados ou secos e que tanto podem indicar um raio do céu, como um fogo, como uma doença, fazendo-nos lembrar como a negligência em relação a elas e a ganância do dinheiro da pasta do papel obtida pela eucaliptização intensiva tem sido daninha em relação ao arvoredo autóctone e à harmonia das matas, bosquetes e campos.
 Estes restos secos, quase petrificados pelo sol ardente, criam esculturas que nos falam da elevação do túmulo vegetal ao corpo transfigurado espiritual, algo que se passa ou passou com os mestres, mormente com Jesus, mas que também cada ser deve fazer do seu corpo físico utilizado em prol do corpo espiritual, da realização divina e da comunhão no corpo místico ou universal da Humanidade, campo unificado de energia, consciência, informação e intenção.
O tronco da árvore como que levita, está angelizado e embora esteja no seu estado de menor vida biológica a sua potência espiritual de ressurreição em nós é grande.
   "Entrai mais em nós", dizem-nos os espíritos das árvores, bosques e campos...
 Esta azinheira destacou-se no caminho da peregrinação ou via sacra, do lado direito de quem a realiza e fez-me saltar o muro e correr para saudá-la, isto é, dar-lhe da minha aura e alma, abraçá-la, sintonizá-la e com ela comungar da sua função essencial de ligação entre a Terra e o Céu, no ser humano dotado de maior capacidade de auto-consciencialização, alargada à ligação entre a Humanidade e a Divindade...
Comunicação e certa comunhão com a azinheira... Fotografia do Pedro Teles que, com a Célia Delgado, originou a peregrinação dum pequeno grupo a Fátima e à maravilhosa gruta de Mira Aires.
 
 Encostado à azinheira imensa, que visão divina esta de mil ramos, mil neurónios, mil pétalas de luz, milhões de sinais de comunicação vivos, interactivos, pulsantes...
 
Danças e gestos fabulosos esculpidos de algum modo por esses grandes artistas invisíveis das formas da natureza e particularmente das árvores e pedras que são os espíritos da Natureza, que infelizmente ainda muito pouca gente acredita ou já conhece...
 
 Falas das árvores e das suas folhas sussurrantes ao vento, ou das cigarras e aves que as habitam ou visitam, quem as sabe ouvir e dialogar?
 
Corpos esbeltos ou mesmo angélicos podem sentir-se ou ver emergir das árvores, pois os espíritos da Natureza ligados a elas podem existir em várias gamas vibratórias e ir desde os duendes e anões a dríades e hamadríades já próximas de devas e anjos

 Por fim, a azinheira original na qual teriam pousado as plumas angelicais e diafanamente transmitido energias que se tornaram palavras e conceitos, orações e mensagens para os pastorinhos...
 
 O contraste entre a energia telúrica que perpassa a azinheira semi-calcinada pelas intempéries do tempo e da história contrasta bem com a brancura pura do espírito celestial que quer intensificar e desvendar a presença divina, ou o influxo divino nos seres humanos que, como crianças receptivas, se abrem ao mundo espiritual e não estão presas nos preconceitos sociais ou nas ambições materiais.
 Os humildes, os que são o húmus da terra, os que amam, cultivam e comungam com a Natureza, pura espelho da Divindade, podem mais facilmente ver os espíritos da Natureza ou mesmo os Anjos...
 Da visão angélica, rara, difícil mas maravilhosa...
 Pelo coração da árvore, pela abertura do teu coração, pela aspiração pura ou amorosa do teu ser, o Anjo ou o Arcanjo pode ser visto, em geral pela visão espiritual mas em certos casos também pela física...
 Neste local sacro oramos e meditamos,  saudamos e  invocamos os anjos da guarda e os arcanjos nacionais de cada um de nós.. 
A árvore é um grande espírito da natureza como que em dança, como o deus Pan, congraçando o culto imemorial da Natureza e seus seres e a nova desvendação divina cristã e fatimida que no século XXI se vai tornando mais inserida na Religião Universal do Espírito e do Amor Divinos, base e fim de todas as religiões...
 Apoios que por vezes devemos prestar às grandes árvores, algo muito comum no Japão e no Shintoísmo, onde as árvores são verdadeiramente respeitadas e cultuadas como capazes de conterem um Kami ou espírito da natureza, ou serem habitação ou local de irradiação de bênção dos Kami, de Deuses, ou seja, de espíritos, anjos e grandes seres.
 
 "Meu Deus, eu amo-vos de todo meu coração,de toda a minha alma de todas as minhas forças..."
 O Y pitagórico, iniciático, da escolha constante pela maior luz e bem comum com que nos defrontamos, é um dos sinais evidentes da origem das letras nas formas dos ramos e troncos, como já intuí e vi há alguns anos numa meditação mais prolongada diante de uma árvore centenária em Santa Valha. E assim diariamente nos vamos colorindo e avançando no Caminho do conhecimento e do amor das verdades e seres espirituais, maxime a Divindade...
 "Meu Deus, eu creio-vos, adoro-vos, espero-vos e amo-vos," e sinto-vos e contemplo-vos, certamente a grande oração das azinheiras, dos pastores, dos videntes, dos santos e mestres, dos Anjos, e transmitida por este mensageiro celestial, quem sabe se epifania do Arcanjo de Portugal...
Firme, forte, bem enraizada, a última azinheira e a sua dríade ou Espírito da Natureza, qual Deusa Mãe Terra, saúda-nos e pede-nos para defendermos mais as árvores, em especial as mais velhas, raras e sagradas... 

segunda-feira, 23 de julho de 2018

Um dos textos mais importantes de Fernando Pessoa:"Deixemo-nos de importar Deus, porque Deus está em toda a parte."

Um dos textos mais substanciais e revolucionários espiritualmente de Fernando Pessoa, não datado mas que até poderia ser dos seus últimos anos de vida, dactilografado numa página, apenas com a breve frase final a lápis, a qual Joel Serrão e Paula Mourão, que publicaram pela primeira vez esse e muitos outros textos de temática nacional, sebastianista e do mítico V império, não transcreveram para o livro Sobre Portugal - Introdução ao Problema Nacional, Ática, 1979, é aquele em que Fernando Pessoa arremete contra a Igreja de Roma e defende a nossa própria religião nacional, numa linha já algo esotérica e espiritual, pois refere os romances de cavalaria e a Demanda do Santo Graal como  veios por onde a tradição secreta do Cristianismo e Portuguesa passou, até ganhar com o poeta vidente Bandarra e padre António Vieira a sua expressão literária mais profética, visão interpretativa ou valorativa que ele coroará na Mensagem, incluindo-se como o terceiro vidente ou profeta.
Este texto importante, embora transcrito no  arquivopessoa.net, encontra-se incompleto pela omissão do acrescento manuscrito de Fernando Pessoa e está também algo descontextualizado, ao acrescentarem em seguida outros pensamentos como se fossem do mesmo texto, que ocupa uma página apenas, pelo que merece ser publicado na íntegra.
Oiçamos então Fernando Pessoa:
«Libertemos o nacionalismo dos seus agregados espúrios.
O verdadeiro patrono do nosso País é esse sapateiro Bandarra. Abandonemos Fátima por Trancoso.
Esse humilde sapateiro de Trancoso é um dos mestres da nossa alma nacional, uma das razões de ser da nossa independência, um dos impulsionadores do nosso sentimento imperial.
 Esse Bandarra é a voz do Povo português, gritando, por cima da defecção dos nobres e dos clérigos, por cima da indiferença dos cautos e dos incautos, a existência sagrada de Portugal.
Quando António Vieira quis basear em qualquer coisa a sua fé natural nos destinos superiores da Pátria, que coisa foi a que encontrou? As profecias desse sapateiro de Trancoso. Amou-as e as comentou o maior artista da nossa terra, o Grão-Mestre, que foi, da Ordem Templária de Portugal.
  O Bandarra, símbolo eterno do que o Povo pensa de Portugal.
Túmulo de Bandarra, na igreja de S. Pedro em Trancoso. Fotografia tirada a 17-VII-2018
Que Portugal tome consciência de si mesmo. Que rejeite os elementos estranhos. Ponha de parte Roma e a sua religião. Entregue-se à sua própria alma. Nela encontrará a tradição dos romances de cavalaria, onde passa, próxima ou remota, a Tradição Secreta do Cristianismo, a Sucessão Super-Apostólica, a Demanda do Santo Graal. Todas essas coisas, necessariamente dadas em mistério, representam a verdade íntima da alma, a conversação com os símbolos,
Citam-se quadras populares, melhores ou piores, como sendo a voz do Povo. A voz do Povo, porém, não falou nunca tão alto como na voz do Bandarra.
Quebrar com Roma. Quebrar com a ideia monárquica. Quebrar com a ideia de Pátria como entidade oposta a qualquer outra coisa neste mundo.
Quebremos com Roma. Deitemos fora esse fardo de trevas e de desalento que há séculos pesa, mais ou menos, sobre as nossas inteligências e sobre as nossas decisões.
Não precisamos dos sete montes de Roma: também aqui, em Lisboa, temos sete montes. Edifiquemos sobre estes a nossa Igreja. Deixemo-nos de importar Deus, porque Deus está em toda a parte
 
Realcemos, para finalizar, a afirmação pessoana da sacralidade de Lisboa com os seus sete montes, quais sete chakras ou centros de força, e que nela se ergue a Igreja Portuguesa, já não dependente ou subordinada à Igreja de Roma, e que será tanto assembleia, como ordem templária, como tradição de realização espiritual, como abertura à universalidade. E a última frase, que sublinhei, já que Joel Serrão ou a Paula Morão não a transcreveram, e que é bem valiosa dentro da visão gnóstica e nacionalista de Fernando Pessoa: cada um, no seu sítio ou caminho tradicional, pode encontrar ou receber a bênção divina, sem estar dependente das Igrejas organizadas...
                           
 Anote-se a exaltação do Portugal profundo e popular, com a invocação de Bandarra e suas trovas, elevado a voz independente do povo português, e o seu reconhecimento pelo padre António Vieira, erguido miticamente a Grão-Mestre da Ordem Templária de Portugal...
Como sabemos a Ordem Templária de Portugal foi dissolvida em 1312, embora bastante continuada como a Ordem de Cristo de Portugal por obra e graça de D. Dinis, e Fernando Pessoa trabalhou bastante nelas, deixando inúmeros fragmentos e procurando provavelmente fazê-las ressurgir,  afirmando com algum mistério na sua nota auto-biográfica de 30-III-1935:
"Posição iniciática: Iniciado, por comunicação directa de Mestre a Discípulo, nos três graus menores da (aparentemente extinta) Ordem Templária de Portugal."
Anote-se  que a uns meses de morrer num pequeno texto desvalorizou ou riscou a posição do padre António Vieira como Grão-Mestre da Ordem Templária, provavelmente em consequência da sua ruptura maior com a Igreja Católica aquando do ataque que jornais do Estado Novo e católicos lhe fizeram  por defender a ameaçada liberdade das Associações Secretas, nomeadamente da Maçonaria, da qual ele, não pertencendo, era um profundo conhecedor...
Como floração final e mais dirigida a quem quer aprofundar o caminho da vida,  realcemos o parágrafo, com sublinhados nossos, iniciado assim: «Que Portugal tome consciência de si mesmo (...) Todas essas coisas, necessariamente dadas em mistério, representam a verdade íntima da alma, a conversação com os símbolos,» pois apela à nossa meditação e despertar espiritual, bem como ao desenvolvimento da sensibilidade mais subtil do coração e do olho espiritual, que por detrás da forma simbólica intui, sente ou vê a essência e realidade espiritual. 
O santo Graal do coração, numa pintura antroposófica, ou um portador do Graal, na esfera da respiração e comunhão dos mestres, anjos e Divindade...
Daí a importância do acrescento manuscrito final que implica ou exalta já a mente e alma unificadas que permitem a visão psico-espiritual da presença Divina no multi-universo... 

sábado, 21 de julho de 2018

Abenházan, de Córdova, os Anjos e o Arcanjo (ou enviado) Gabriel, e o Paraíso, com as Huries.

Abu Muhammad `Ali ibn Ahmad ibn Sa`id ibn Hazm ou, ocidentalmente, Abenházan, ou ainda Ibn Hazm, foi um escritor, pedagogo, historiador, filósofo, poeta e teólogo  que nasceu em Córdoba em 994 e morreu em 1064, em Huelva. A sua obra mais conhecida e apreciada é o Colar da Pomba, já que trata ou se aproxima da riqueza do fogo do Amor, em linhas neo-platónicas, havendo tradução bem comentada em espanhol.
O notável islamólogo (1871-1944) Miguel Asín Palacios (as iniciais MAP, no texto, sendo as minhas explicações ou questões, com a sigla PTM) publicou a obra  Abenházan de Córdoba y su Historia Crítica de las Ideas Religiosas, em 5 volumes, o primeiro contendo a biografia dele e os quatro seguintes a tradução do Kitab al-Fisal fi al-milal wa-al-ahwa',  Livro da Separação acerca das Religiões, Heresias e Seitas.
Ora do quarto volume, comprado hoje solto. na feira alfarrabista da rua Anchieta. ao amigo Júlio Carreira, da livraria antiquária, hoje ambulante, Arquimedes, retirei um extracto  interessante sobre os Anjos e o "arcanjo" Gabriel, que transcrevi e que merecerá alguma cogitação (e PTM assinalará um comentário meu), pois Abenházan comenta algumas passagens significativas do Alcorão respeitantes aos Anjos e também as três escassas menções a Gabriel e Miguel, que misteriosamente são apresentados como que pertencendo a um nível superior aos Anjos, e aos enviados ou profetas, algo que esperamos um dia poder aprofundar mais e partilhar...
Das quatro atribuições angélicas, segundo Abenházan, destacaremos a de «comunicar aos profetas a revelação da sua missão divina», no sentido que os Anjos podem-nos inspirar quando  pedimos em oração mais claridade sobre a nossa missão ou, como dizem os indianos, swadharma
Capítulo 7. Polémica acerca da religiosidade dos Anjos, as Huris e os donzéis que serão criados na vida futura. Pecam por caso os Anjos ou não?
Deus afirma textualmente que os anjos obedecem-lhe religiosamente, pois de eles se diz: "E executam o que se lhes manda". (Alcorão, 26:52).
Também assegura textualmente que Ele ordenou-lhes prostrarem-se para adorar a Adão, e disse (21:26,27): Afirmam [os Cristãos, MAP] que o Misericordioso teve filhos [quer dizer que os Anjos são seus filhos, MAP]. Glorificado seja! Antes pelo contrário, eles não são mais que servidores seus, dignos de honra, que jamais se adiantam a falar-lhe, mas que executam as suas ordens.
E mais adiante acrescenta (21:30): «E a quem de eles disser: Eu sou um Deus aparte de Deus, dar-lhe-mos por recompensa a gehena [ardência dolorosa purgatorial infernal. PTM]. Assim é como recompensamos os malvados».
Noutro lugar diz (16:51): "Ante Deus se prostra tudo o que há nos céus e na terra, tanto os animais como os Anjos; eles não se deixam dominar pelo orgulho; temem ao seu Senhor, que está sobre eles, e fazem quanto lhes ordena".
Textualmente, Deus afirma que os Anjos são seres capazes de receber preceitos e proibições, ameaças, honras e promessas de alcançarem o carisma divino por toda a eternidade; que a eles confiou  o encargo de registarem por escrito as acções dos seres humanos, separarem as almas dos seus corpos no momento da morte, comunicarem aos profetas a revelação da sua missão divina, levar [será realizar ou apenas inspirar? PTM] a gerência de tudo o que há no mundo superior e inferior, etc, tal como o seu Criador o conhece na sua eterna sabedoria.
 Noutro lugar diz (81-19/21): "O Alcorão é a palavra do Enviado ilustre, dotado de força aos olhos do Senhor do trono, firme, obedecido e além disso fiel".
Aqui refere Deus que Gabriel é obedecido nos céus e que é além disso fiel. Logo resulta que ali [nos céus, MAP] existem ordens e preceitos, governos, encargos que se confiam, obediência e graus hierárquicos. [Algo de que se sabe pouco e do qual mesmo as nove hierarquias angélicas do Cristianismo são uma construção sobretudo intelectual, PTM]
Por outro lado, Deus afirma também textualmente que os Anjos estão todos preservados de pecado, pois diz (21:27)  "que são servidores seus, dignos dignos de honra, que jamais se adiantam a falar-lhe, mas que executam as suas ordens". E noutro lugar (7:205), acrescenta: "E junto a ele não se desdenham por orgulho de servir-lhe, nem se cansam de louvá-lo sem cessar noite e dia"
Assim também diz (41:38): "Os que estão junto a Ele louvam-no noite e dia e não se cansam." De modo que Deus assegura taxativamente que todos eles o servem incansavelmente, louvam e obedecem, sem cessar nisso nem um só momento.
Ora bem, isto implica a graça auxiliadora de Deus que jamais deixa de existir, e exige ainda por força que os anjos encontrem nele o seu bem estar e se sintam honrados e cheios do favor divino em tal estado e deleite que experienciam por ele, [ou vivenciam nele, PTM]. 
 Textualmente também afirma Deus que os Anjos estão todos isentos de pecado, e que a respeito deles se realiza com toda a verdade a amizade do seu Senhor, por eternidade de eternidade sem fim; assim diz (2:98): O que seja inimigo de Deus, de seus Anjos, de seus enviados, de Gabriel e de Miguel, então também Deus é inimigo dos infiéis [ou descrentes, PTM]". De modo que Deus "excomunga" [ou afasta, ou ignora, ou fica inacessível, PTM]  a quem se faz inimigo deles.»
Acrescentamos ainda o resumo das três considerações que Abenházan faz, para finalizar o 7º capítulo, já na forma de objecções e respostas, afirma que os Anjos não se rebelam contra Deus, que estão sujeitos tanto a preceitos positivos como a proibições, e que são sobretudo os profetas que os conseguem ver. 
Por fim, refere as «Huries, as mulheres honradas, criadas por Deus no Paraíso para os amigos de Deus, dotadas de inteligência e razão discursiva, e obedientes a Deus na vida feliz em que são criadas, na qual eternamente e sem fim há-de viver, sem ofendê-lo jamais, pois o paraíso para todos quanto entram nele, não é uma mansão de pecado. Por isso os habitantes do paraíso não pecam jamais nele, pois vivem em felicidade eterna, consagrados a louvar a Deus, a tê-lo presente na memória, e, em certas alturas a deleitarem-se com manjares, bebidas, vestidos e prazeres sexuais, que nenhum dos muçulmanos discute, porque o Alcorão os consigna». Muito interessante esta descrição dos níveis subtis já elevados, paradisíacos, realizada por um homem do Al-Andaluz do séc. XI.
Quanto aos wildán, que servem no Paraíso os bem-aventurados, «os donzéis, eternamente jovens, são os filhos dos seres humanos que morreram antes da idade da razão.
Também os jinns, ou génios, ou espíritos da natureza que acreditam («ou ouvem a direcção correcta», já que «o Profeta foi enviado por Deus para revelar-lhes a religião do Islão», têm lugar no mítico e tão subtil Paraíso (73:13), com uma imagem diagramática do qual terminamos o texto. Lembramos ainda a vasta obra de Miguel Asín Palacios que fez um excelente trabalho sobre a influência do Islão, nomeadamente de Ibn Masarra e de Ibn Arabi, na visão do Paraíso de Dante, La Escatologia Mussulmana en la Divina Comédia, 4ª edição em 1984, nas boas Ediciones Hisperion; embora, em verdade, ainda se sabe relativamente pouco com segurança sobre os múltiplos níveis ou estados de ser e de vida subtil e espiritual por onde peregrinamos rumo à realização ou religação Divina...

sexta-feira, 20 de julho de 2018

Aprenda a sentir a paz e a serenidade. Liberte-se de depressões e comprimidos. Ribeira do Carril. Com video de 7 minutos eficaz.

   Acalmar a mente e as emoções, e desenvolver a paz interior, é fortificar o sistema imunitário e a alma, abrindo-a a vibrações níveis mais harmoniosos, espirituais e divinos.
 
A contemplação da natureza pura ou harmoniosa e em especial dos ribeiros é muito benéfica, vitalizadora, purificadora, salutar. Felizes os que conseguem comungar com ela com regularidade
                           A folha que tomba da árvore e levada pelo vento se une à pedra firme por momentos é uma bela imagem da importância de conseguirmos escolher uma base sólida para as nossas orações, práticas, concentrações, aonde se podem depositar e acalmar as folhas flutuantes dos pensamentos e emoções...
 Como encontrei, nomeadamente nesta recente peregrinação pelo Gerês, algumas pessoas tristes, deprimidas e a tomarem anti-depressivos e a começarem (ou a continuarem) assim a perder o controle da sua alma e a danificarem o cérebro, eis um pequeno vídeo pelo qual associei um belo ribeiro, não longe do lagar de azeite do Carril, a um conjunto de frases e pensamentos instrutivos e iluminantes que poderão ajudar as pessoas a melhorarem ou mesmo vencerem tais desânimos, tais perdas da alma e bloqueamento do acesso ao espírito.
 
"Deus, Deus, Deus", pode ser um mantra, pedra de fundação, que se apela ou a que se agradece...
 
 Quem diz desânimo, diz sem ânimo, a parte mais activa da alma, ou seja momentos em que perdemos o controle de nós próprios, isto é, não conseguimos dominar ou unificar as nossas forças anímicas, as quais são as emoções, os sentimentos e os pensamentos. 
A nossa força de vontade esvai-se ou está tão enfraquecida que não consegue controlar o estado da alma, ainda que a pessoa possa desejar ou dizer que quer reagir e vencer.
Certamente que uma pessoa pode ver então um bom filme ou comer o que gosta e de algum modo ultrapassar a situação, o que é bom por um lado (e melhor ainda seria um livro ou música espiritual) embora não resolva a causa da situação, que por vezes está já bastante enraizada na vida de uma pessoa e exige um auto-conhecimento e discernimento grande, algo difícil nesse estado de se conseguir, pelo que é recomendável o diálogo franco com pessoas ou mesmo a consulta de psicólogos...
Este vídeo é apenas um meio de veicular energias luminosas e calmantes, pelas frases e ideias, sentimentos e espiritualidade transmitidos e assim possibilitar um certo despertar interior, uma certa ligação maior com a essência espiritual de cada um de nós, a qual é a base e pedra de fundação de todos os seres.
Valerá a pena ouvir mais de uma vez o que é dito, pois contém a sabedoria de várias tradições, e que é a do ensinamento perene dos mestres e que eu tenho vivenciado e partilhado dentro das minhas limitações em vários textos no blogue ou videos, além de livros, e aqui num breve improviso de cerca de 7 minutos...
                                        
São poucos minutos mas bem sentidos, meditados e assimilados  poderão dar frutos bons, saborosos ou sábios, de Paz, Pax, Shanti...
                                     

quinta-feira, 19 de julho de 2018

"Amare": inauguração da exposição de Maria de Fátima Sílva, sobre o Amor de Inês e Pedro. Alcobaça.

 O Amor em Inês e Pedro, "Amare": inauguração da exposição de pintura de Maria de Fátima Silva, em  8 de Julho de 2018, no Museu do Vinho em Alcobaça, realizada  pela  vereadora da Cultura, Educação e Turismo de Alcobaça, Dra. Inês Maria Lopes Silva e pelo director do Museu de Vinho Alberto Guerreiro, com palavras ainda da Maria de Fátima Silva e algumas minhas.
 "Esta é uma iniciativa especial e pertinente tendo em conta a sua ligação temática com a História do concelho de Alcobaça, assente nas figuras de D. Pedro e D. Inês que são um património imaterial deste território. Saudamos e acolhemos com muita honra estas iniciativas que valorizam esse mesmo património, assim como o próprio Museu do Vinho", dirá a vereadora da Cultura também ela Inês e portanto bem sensível íntima e animicamente.
 
O director do Museu de Vinho, Alberto Guerreiro.
 
     Do texto que escrevi para a magnífica exposição, num local tão adequado para uma comemoração de musas e vates do Vinho do Amor imortal,  não longe de onde os  maravilhosos túmulos esculpidos de Inês e de Pedro se encontram para contemplação nossa, seguem-se algumas partes: 
  «O Amor de Inês e de Pedro, no século XIV, foi tão intenso, mas também tão trágico, que se tornou lendário, imortalizou-se, evoluiu para um mito sempre presente e fundador de maior consciência do valor do amor espontâneo, livre, pleno e que, apesar dos perigos mortais que frequentemente o ameaçam, é perene, imortal.
     Um mito verídico e dinâmico, não baseado apenas em especulações e imaginações mas fundado na realidade, testemunhado na vida e ampliado ao longo dos séculos por todos, nacionais e estrangeiros, e foram muitos, os que se deixaram comover, inspirar e tocar por tal sintonia, entrega e vivência de amor e paixão, acima das convencionalidades e pseudo-razões que se opõem à união livre dos seres que se atraem e ressoam, dedicam e amam.
      Esta história amorosa, tornada legendária e perene pela literatura  e a arte, continua a fecundar-nos e não podemos deixar de congratular-nos pelo seu arquetipismo operativo, já que, apesar do longo tempo decorrido de oito séculos, estes dois seres ainda estão tão vivos no imaginário e na alma dos portugueses que podem surgir a qualquer momento recriações da sua vida, amor e paixão.
     A Maria de Fátima Silva, muito dada à investigação e ao culto da memória histórica, mítica e espiritual dos locais, tendo recentemente realizado algumas exposições consagradas à Atlântida e ao Portugal megalítico, teve a varinha de condão de sentir na floresta imaginal portuguesa a necessidade de mais uma vez vir ao de cima este veio do Amor que ultrapassa as razões sociais, os ditames convencionais e assume a sua chama de conflagração libertadora e unificadora, tão valiosa face à massificação consumista e superficializante que acinzenta ou oprime as pessoas nas sociedades modernas, pouco espaço ou valor dando ao amor, à poesia, à liberdade, à Unidade».
 
 
  «A vida, amor e a morte destes dois apaixonados, para além do seu registo em crónicas e em poemas, adquiriu cedo nos túmulos uma materialidade artística tão radiosa e impressionante, nomeadamente ao serem erguidos no ambiente de um estilo gótico tão austero como o da igreja da abadia de Alcobaça, que facilitou eles serem agradavelmente admirados, contemplados e assimilados pela sensibilidade anímica de qualquer época e pessoa.
A Maria de Fátima Silva aproximou-se deste mito fundamental de Portugal com o triplo trabalho do artista, pois não só pôs as mãos, os pincéis e a paleta das cores em acção mas foi tanto lendo e meditando muitas das valiosas obras, crónicas e dramas, poemas e ensaios, dedicadas ao amor de Inês e de Pedro, como também visitando locais associados à vida e e peregrinação inesiana, na busca de se impregnar mais dos eflúvios ou inspirações que ainda hoje se transmitem a quem souber sintonizar e sentir.»
                         

Durante as explicações na visita guiada quadro a quadro, com diálogos valiosos comigo e com outros participantes, Maria de Fátima Silva partilhou muito da sua sensibilidade e simbologia, bem inserida na Tradição Espiritual Portuguesa que por mais de uma vez invocou, e da qual tantos vates prestaram a Inês e a Pedro o seu preito ou abertura do peito, tal como por exemplo, um dos seus mais ilustres vates, Bocage, cantou:
«Da triste, bela Inês inda os clamores// Andas, Eco choroso, repetindo;//Inda aos piedosos Céus andas pedindo// Justiça contra os ímpios matadores.  
«Ouvem-se ainda na Fonte dos Amores//De quando em quando, as náiades carpindo;// E o Mondego, no caso reflectindo,// Rompe irado a barreira, alaga as flores.  
«Inda altos hinos o Universo entoa// A Pedro, que da morte formosura/ Convosco, Amores, ao sepulcro voa.
 «Milagre de beleza e da ternura!// Abre, desce, olhe, geme, abraça e c'roa//A malfadada Inês na sepultura».
 
  Ora é na monumental e poderosa Real Abadia de S. Maria de Alcobaça, no transepto da sua Igreja, que encontramos o testemunho mais imortalizante: os túmulos magistralmente esculpidos em pedra calcárea, e que mais do que servirem para darem guarida aos ossos e serem uma memória, são antes maravilhosas chamas historicizadas celebrando e invocando um amor que, embora fisicamente truncado na Terra, animico-espiritualmente viverá «até ao fim do mundo», tal como o justiceiro rei D. Pedro I (1320-1367) pediu ao escultor para gravar na cabeceira do seu túmulo jacente, e certamente numa encomenda tanto transmitida como esculpida com muita carga psíquica, pathos, já após a feitura do túmulo da sua amada e mulher Inês de Castro (1325/7-I-1355).

 «Estes dois túmulos góticos, nos quais um mestre provavelmente de Coimbra, e quase que num estilo de miniaturas iluminadas de Livro de Horas, ou hoje de banda desenhada, esculpiu magistralmente (embora mutilados em algumas partes pelos invasores franceses) nas edículas cenas da vida e morte de Inês e de Pedro, e de passos da vida de Jesus e da tradição cristã, estando as esculturas em tamanho natural acompanhadas de Anjos, serão a fonte mais consultada ou inspiradora da forte pintura, histórica e cromaticamente, psicológica e espiritualmente, de Maria Fátima, a qual certamente ao longo dos dois anos do trabalho criativo de trazer o potencial à tela e nos seus sonhos e devaneios, pensamentos e meditações, comungou com o mundo histórico e trágico, amoroso e divino de Pedro e Inês e, quem sabe, com as suas almas espirituais, agora livres de todos ou muitos dos constrangimentos.
Poderemos talvez dizer que a bela e doce Inês é erguida, tanto pela cultura portuguesa como sobretudo pela pintura de Fátima, a um ser crístico, um ser ungido de amor, um ser sacrificado e martirizado, mas para que amor desabroche imparavelmente, perenemente.
É um Cristo (um ser ungido) feminino português, amparado pelos Anjos, abraçado pelo marido e cuidando das suas crianças que contemplamos.»
                                                                                 
    «A pintura de Maria de Fátima Silva, ainda que com muitos laivos de amor cortês ou de religiosidade gótica e angélica, está carregada de tal intensidade amorosa, que se torna carnal, musculada, de mãos, pés, seios, cabelos, sorrisos e ora em fusão amorosa ora em pieta de compaixão, e surge para a nossa contemplação apoiada nas geometrias e rosáceas góticas da época que ela soube sentir e recolher, recriando os ambientes do mundo histórico e da natureza que os envolveram, com destaque para as aves, e imaginando ainda a graça da companhia dos Anjos no mundo psico-espiritual a que eles têm acesso, qual ilha do Amor intuída por Camões nos Lusíadas».
                               
 
                                      
  «É no túmulo de D. Pedro que as delícias do amor conjugal e o trágico assassinato de Inês são representados, assumindo D. Pedro o papel tanto de amoroso, como de queixoso e justiceiro, embora em ambos os túmulos jacentes estejam representados com as feições serenas, belas e apoiados pelos Anjos.
Muito disto ecoa nas pinturas da Fátima, por vezes trazendo Inês e Pedro para os nossos dias, tanto mais que a capacidade de ultrapassar os limites da linearidade do tempo é bem visível na sua obra, como que tendo acesso ao campo unificado de energia consciência e informação ou, pelo menos, tentando intuir e penetrar os mistérios que a História sempre deixa nele.
O monumento magistral gótico tumular é interpelante, fracturante, no seu apelo e afirmação do Amor sacralizado e eterno acima das conveniências sociais, e a sua recriação artística ou pedagógica pode ser bem poderosa para despertar mais o amor em nós, a nossa vontade de sermos mais verdadeiros, sinceros e intensos nos breves momentos que a Roda da Fortuna acompanha a da Vida...
Assim a pintura de Maria Fátima da Silva está carregada dessa intensidade do amor, do pathos, da paixão nos dois sentidos que aconteceram, o feliz e o trágico, e, simultaneamente, da ressonância ou acompanhamento dos mundos espirituais e angélicos nos passos de amor e de dor e desencarnação, e logo reunião e ressurreição em corpo psico-espiritual.»
                              
                        
                             
                        
                               
 «O realizar-se esta exposição e recriação do mítico amor de Inês e de Pedro, em Alcobaça, junto ao local onde se depositaram os seus corpos e onde algo deles é mantido, ou mesmo intensificado ocasionalmente, ao longo dos séculos, permite-nos auspiciar a esta exposição um carácter quase mágico, de ressurreição, de boa nova ou evangelho, anúncio do amor eterno ou perene que vence todos os obstáculos e limitações e nos chama a sermos verdadeiros e sinceros na entrega total ao amado ou à amada, de corpo, alma e espírito, e procurando verdadeiramente atingir a unidade e nela recebermos a bênção divina, a desvendação da nossa ligação espiritual, e que Inês e Pedro conseguiram certamente tocar e entrar e, através desta bela e intensa arte impregnada do amor, janela entre os mundos, partilhar».
 
 
 
 «Poderemos então dizer que esta exposição Amare é uma recriação perenizadora do Amor, na melhor tradição dos Fiéis do Amor de Portugal, na qual Inês e Pedro, D. Dinis e Isabel, o Infante D. Pedro das Sete partidas, Damião de Goes, Camões, Jorge Ferreira do Vasconcelos, Fernão Mendes Pinto, Bocage, Antero, Wenceslau de Moraes, Florbela Espanca, Leonardo Coimbra, entre outros, se inseriram, testemunhando tal qualidade na busca e vivência do amor e da justiça, da unidade e da Divindade. 
Possa esta exposição Amare ser uma bênção para as forças do Amor em Portugal, e de Portugal para o Multi-universo, e possa a comunhão dos e das Fiéis do Amor, o corpo místico da Humanidade e dos amantes, concretizar-se, tornar-se mais perceptível no nosso coração e consciência íntima e aí como chama de Amor divino desabrochar e ser mais sentida e contemplada, cultivada e partilhada...», como aliás na própria inauguração foi acontecendo em algumas pessoas...
O Nuno, marido da Fátima, e o monge budista Dhammiko, com quem eu seguia para uma peregrinação no Gerês.
                                         
«Possa esta exposição, inaugurada no Verão ardente de 2018, ser verdadeiramente uma comunhão no Graal de Portugal, tal como Maria de Fátima da Silva nas suas palavras introdutórias apela, e que no coração de cada um de nós, e no coração de Portugal e do seu Arcanjo, a chama do Amor seja intensificada e desvendada e que todos os que a virem em peregrinação de estudo histórico ou artístico, pedagógico ou contemplativo do Amor, tão manifestado por Inês e Pedro, sejam por Ele inspirados e fortalecidos.»
Quais cachos de uvas do vinho do Amor humano-divino imortal, glícinias violetas na sebe da casa das musas de Alcobaça que acolheu o Amare de Inês e Pedro.

sábado, 7 de julho de 2018

"AMARE": O Amor Divino em Pedro e Inês. Exposição de Maria de Fátima Silva, em Alcobaça.

O Amor de Inês e de Pedro, no século XIV, foi tão intenso, mas também tão trágico, que se tornou lendário, imortalizou-se, evoluiu para um mito sempre presente e fundador de maior consciência do valor do amor espontâneo, livre, pleno e que, apesar dos perigos mortais que frequentemente o ameaçam, se torna perene, imortal
Um mito verídico e dinâmico, não baseado apenas em especulações e imaginações mas fundado na realidade, testemunhado na vida e ampliado ao longo dos séculos por todos aqueles, nacionais e estrangeiros, e foram muitos, que se deixaram comover, inspirar e tocar por tal sintonia, entrega e vivência de amor e paixão, acima das convencionalidades e pseudo-razões que se opõem à união livre dos seres que se atraem e ressoam, dedicam e amam.
Esta história amorosa, tornada legendária e perene pela literatura popular e erudita e a arte, continua a fecundar-nos e não podemos deixar de congratular-nos pelo seu arquetipismo operativo, já que, apesar do longo tempo decorrido de oito séculos, estes dois seres ainda estão tão vivos no imaginário e na alma dos portugueses que podem surgir a qualquer momento recriações da sua vida, amor e paixão.
 
 A Maria Fátima da Silva, muito dada à investigação e ao culto da memória histórica, mítica e espiritual dos locais, tendo recentemente realizado algumas exposições consagradas à Atlântida e ao Portugal megalítico, teve a varinha de condão de sentir na floresta imaginal portuguesa a necessidade de mais uma vez vir ao de cima este veio do amor que ultrapassa as razões sociais, os ditames convencionais e assume a sua chama de conflagração libertadora e unificadora, tão valiosa face à massificação consumista e superficializante que acinzenta ou oprime as pessoas nas sociedades modernas, pouco espaço ou valor dando ao amor, à poesia e à liberdade.
A vida, amor e a morte destes dois apaixonados, para além do seu registo em crónicas e em poemas, adquiriu cedo nos túmulos uma materialidade artística tão radiosa e impressionante, nomeadamente ao serem erguidos no ambiente de um estilo gótico tão austero como o da igreja da abadia de Alcobaça, que facilitou eles serem agradavelmente admirados, contemplados e assimilados pela sensibilidade anímica de qualquer época e pessoa.
A Maria Fátima da Silva aproximou-se deste mito fundamental de Portugal com o triplo trabalho do artista, pois não só pôs as mãos, os pincéis e a paleta das cores em acção mas foi tanto lendo e meditando muitas das valiosas obras, crónicas e dramas, poemas e ensaios, dedicadas ao amor de Inês e de Pedro, como também visitando locais associados à vida e e peregrinação inesiana, na busca de se impregnar mais dos eflúvios ou inspirações que ainda hoje se transmitem a quem souber sintonizar e sentir.
Bocage, um vate bem sensitivo, órfico mesmo,  deu maravilhosamente eco de tal: 
«Da triste, bela Inês inda os clamores// Andas, Eco choroso, repetindo;//Inda aos piedosos Céus andas pedindo// Justiça contra os ímpios matadores.//
«Ouvem-se ainda na Fonte dos Amores//De quando em quando, as náiades carpindo;// E o Mondego, no caso reflectindo,// Rompe irado a barreira, alaga as flores.//
«Inda altos hinos o Universo entoa// A Pedro, que da morte formosura/ Convosco, Amores, ao sepulcro voa.//
«Milagre de beleza e da ternura!// Abre, desce, olhe, geme, abraça e c'roa//A malfadada Inês na sepultura».
Ora é na monumental e poderosa Real Abadia de S. Maria de Alcobaça, no transepto da sua Igreja, que encontramos o testemunho mais imortalizante: os túmulos magistralmente esculpidos em pedra calcárea, e que mais do que servirem para darem guarida aos ossos e serem uma memória, são antes maravilhosas chamas historicizadas celebrando e invocando um amor que, embora fisicamente truncado na Terra, animico-espiritualmente viverá «até ao fim do mundo», tal como o justiceiro rei D. Pedro I (1320-1367) pediu ao escultor para gravar na cabeceira do seu túmulo jacente, e certamente numa encomenda tanto transmitida como esculpida com muita carga psíquica, pathos, já após a feitura do túmulo da sua amada e mulher Inês de Castro (1325/7-I-1355).
Estes dois túmulos góticos, nos quais um mestre provavelmente de Coimbra, e quase que num estilo de miniaturas iluminadas de Livro de Horas, ou hoje de banda desenhada, esculpiu magistralmente (embora mutilados em algumas partes pelos invasores franceses) nas edículas cenas da vida e morte de Inês e de Pedro, e de passos da vida de Jesus e da tradição cristã, estando as esculturas em tamanho natural acompanhadas de Anjos, serão a fonte mais consultada ou inspiradora da forte pintura, histórica e cromaticamente, psicológica e espiritualmente, de Maria Fátima, a qual certamente ao longo dos dois anos do trabalho criativo de trazer o potencial à tela e nos seus sonhos e devaneios, pensamentos e meditações, comungou com o mundo histórico e trágico, amoroso e divino de Pedro e Inês e, quem sabe, com as suas almas espirituais, agora livres de todos ou muitos dos constrangimentos.
Poderemos talvez dizer que a bela e doce Inês é erguida, tanto pela cultura portuguesa como sobretudo pela pintura de Fátima, a um ser crístico, um ser ungido de amor, um ser sacrificado e martirizado, mas para que amor desabroche imparavelmente, perenemente.
É um Cristo (um ser ungido) feminino português, amparado pelos Anjos, abraçado pelo marido e cuidando das suas crianças que contemplamos.
 Nas edículas do túmulo de Inês, preenchidas com cenas das descrições do Novo Testamento, tendo a facial a crucificação de Jesus, podemos admitir essa implícita comparação de que a morte de Inês é como a morte de Jesus: um ser de amor a quem é recusado pelos pais ou sogros, o sacerdócio judaico e o estado romano, tal como Inês é rejeitada pela convencionalidade religiosa e pelo pai do seu amado, o rei D. Afonso IV e vários do seu conselho, a que se seguirão ao longos dos séculos os que não serão Fiéis de Amor, ao dela e de Pedro, ou em si mesmos e nas suas vidas...
É no túmulo de D. Pedro que as delícias do amor conjugal e o trágico assassinato de Inês são representados, assumindo D. Pedro o papel tanto de amoroso, como de queixoso e justiceiro, embora em ambos os túmulos jacentes estejam representados com as feições serenas, belas e apoiados pelos Anjos. 
  Muito disto ecoa nas pinturas da Fátima, por vezes trazendo Inês e Pedro para os nossos dias, tanto mais que a capacidade de ultrapassar os limites da linearidade do tempo é bem visível na sua obra, como que tendo acesso ao campo unificado de energia consciência e informação ou, pelo menos, tentando intuir e penetrar os mistérios que a História sempre deixa nele.
 O monumento magistral gótico tumular é interpelante, fracturante, no seu apelo e afirmação do Amor sacralizado e eterno acima das conveniências sociais, e a sua recriação artística ou pedagógica pode ser bem poderosa para despertar mais o amor em nós, a nossa vontade de sermos mais verdadeiros, sinceros e intensos nos breves momentos que a Roda da Fortuna acompanha a da Vida...
Assim a pintura de Maria Fátima da Silva está carregada dessa intensidade do amor, do pathos, da paixão nos dois sentidos que aconteceram, o feliz e o trágico, e, simultaneamente, da ressonância ou acompanhamento dos mundos espirituais e angélicos nos passos de amor e de dor e desencarnação, e logo reunião e ressurreição em corpo psico-espiritual.
 Esta consciencialização e visão do amor que se acontece tanto nesta vida como no além, é fundamental e está bem desenhado e colorido por Maria Fátima da Silva em cenas de beatitude amorosa que tanto podem ser terrenas como já nos mundos subtis, para além do sofrimento e da morte, da efemeridade e transitoriedade.
 Talvez possamos dizer que historicamente a sagração lendária e perenizante foi começada a ser talhada nesses fabulosos dias 23, 24 e 25 de Abril de 1361 quando o corpo de Inês foi levado em procissão ou cortejo, à luz de archotes, de Santa Clara a Velha em Coimbra para a igreja de Alcobaça, a Abadia real, onde coroada e sobre um trono recebeu na sua mão os beijos dos nobres, religiosos e da corte, ao som de ladainhas, cantos e música, à luz dos archotes e velas, com os aromas dos incensórios, sem dúvida uma extraordinária antevisão da ressurreição, realizada feericamente na Terra, em carne, tal era a intensidade do Amor que os unia e percorrera os corpos, o pescoço ou colo, a pele, os lábios e todos os membros deles e que, no fundo, também quer acontecer em nós, apelando a tornar-mos mais seres de amor, em chama corajosa divina de criatividade e de dádiva.
A pintura de Maria Fátima Silva, ainda que com muitos laivos de amor cortês ou de religiosidade gótica e angélica, está carregada de tal intensidade amorosa, que se torna carnal, musculada, de mãos, pés, seios, cabelos, sorrisos e ora em fusão amorosa ora em pieta de compaixão, e surge para a nossa contemplação apoiada nas geometrias e rosáceas góticas da época que ela soube sentir e recolher, recriando os ambientes do mundo histórico e da natureza que os envolveram, com destaque para as aves, e imaginando ainda a graça da companhia dos Anjos no mundo psico-espiritual a que eles têm acesso, qual ilha do Amor intuída por Camões nos Lusíadas.
  O realizar-se esta exposição e recriação do mítico amor de Inês e de Pedro, em Alcobaça, junto ao local onde se depositaram os seus corpos e onde algo deles é mantido, ou mesmo intensificado ocasionalmente, ao longo dos séculos, permite-nos auspiciar a esta exposição um carácter quase mágico, de ressurreição, de boa nova ou evangelho, anúncio do amor eterno ou perene que vence todos os obstáculos e limitações e nos chama a sermos verdadeiros e sinceros na entrega total ao amado ou à amada, de corpo, alma e espírito, e procurando verdadeiramente atingir a unidade e nela recebermos a bênção divina, a desvendação da nossa ligação espiritual, e que Inês e Pedro conseguiram certamente tocar e entrar e, através desta bela e intensa arte impregnada do amor, janela entre os mundos, partilhar. 
 Na longa feitura e preparação desta exposição, nutrida por leituras e peregrinações , meditações e diálogos, dos quais um ou outro eu ainda participei, é evidente que a Fátima se apoiou no amor que sente e vive com o marido, a família, as amizades, o trabalho, as terras, a natureza, as pedras sagradas e a cultura de Portugal e, claro, com Inês e Pedro...
Poderemos então dizer que esta exposição Amare é uma recriação perenizadora do Amor, na melhor tradição dos Fiéis do Amor de Portugal, na qual Inês e Pedro, D. Dinis e Isabel, o Infante D. Pedro das Sete partidas, Damião de Goes, Camões, Jorge Ferreira do Vasconcelos, Fernão Mendes Pinto, Bocage, Antero, Wenceslau de Moraes, Florbela Espanca, Leonardo Coimbra, entre outros, se inseriram, testemunhando tal qualidade na busca e vivência do amor e da justiça, da unidade e da Divindade. 
 Possa esta exposição Amare ser uma bênção para as forças do Amor em Portugal, e de Portugal para o Multi-universo, e possa a comunhão dos e das Fiéis do Amor, o corpo místico da Humanidade e dos amantes, concretizar-se, tornar-se mais perceptível no nosso coração e consciência íntima e aí como chama de Amor divino desabrochar e ser mais sentida e contemplada, cultivada e partilhada...
Possa esta exposição no Verão ardente de 2018 ser verdadeiramente um comunhão no Graal de Portugal, tal como Maria de Fátima da Silva nas suas palavras introdutórias apela, e que no coração de cada um de nós, e no coração de Portugal e do seu Arcanjo, a chama do Amor seja intensificada e desvendada e que todos os que aqui vierem em peregrinação de estudo histórico ou artístico, pedagógico ou contemplativo do Amor tão manifestado por Pedro e Inês, sejam por Ele inspirados e fortalecidos.

Pedro Teixeira da Mota.