Em 1977 o tão pioneiro poeta, jornalista, ecologista e ensaísta Afonso Cautela publicava nos seus cadernos policopiados da Frente Ecológica, jornal de vanguarda, descolonização cultural, macrobiótica zen, bioagricultura, tecnologias leves, luta anti-nuclear, parto sem dor, revolução artesanal, agro-comunas/sociedade paralela, energias infinitas e não poluentes, reconversão de consumos, alternativas à medicina, um número de 36 páginas intitulado A Cura pela Energia, 55 Indicações de base, que representava a sua compreensão dos processos de vida saudável e de cura, baseando-se nos ensinamentos da Filosofia e Medicina tradicional do Extremo Oriente, conforme George Ohsawa ensinara e divulgara no Ocidente e que tinham sido bem acolhidos em alguns países e que ele vivenciava há uns anos.
Quem fora George Ohsawa de quem celebramos hoje 18 de Outubro de 2023, os 133 anos de nascimento?
Nascera como Nyoiti Sakurazawa, em 1893, em Kyoto, de uma família de samurais empobrecida, já que o Ohsawa veio do francês, Oh ça va..., com que tinha de responder à pergunta, Como está? Aderira ao movimento Shokuiku, Educação alimentar, fundado
pelo genial médico Ishizuka Sagen, (1850-1909) e que atingira grande
sucesso (no pico, 100 consultas por dia) pelos seus tratamentos pelo
equilíbrio alimentar do Yin e Yang, consignados na obra Uma teoria química da nutrição na Saúde e Longevidade.
Nyoiti Sakurazawa aprende com um seu discípulo, Manabu Nishibata e, vindo para o Ocidente, transmitirá esta filosofia do equilíbrio do Yin-Yang, negativo e positivo, feminino e masculino, noite e dia, e sobretudo do conteúdo do potássio (yin) e sódio (yang)
no alimentos, iniciando no Ocidente o método macrobiótico (grande
vida) de alimentação, como disciplina harmonizadora do corpo e alma,
recomendando o uso de cereais, verduras, leguminosas e algas, e a cautela com as proteínas animais, o açúcar e o excesso de Yin,
ou seja de alimentos com mais teor de potássio. Os alimentos mais recomendados e utilizados salutarmente, além dos cereais, eram miso, daikon e
umesboshi, ainda hoje fazendo parte da dieta nipónica. Regressado ao
Japão em 1931, vai aprofundando os seus estudos e análises das pessoas, doenças, sociedades, como filósofo e educador pacifista e quando anos mais tarde prevê a derrota do
Japão, é preso, condenado à morte e foi por pouco que escapou e só após depois da rendição nipónica é que foi libertado,
consagrando-se de novo aos seus estudos, publicações e ensinamentos da
aplicação do Princípio Único do Yin e do Yang da filosofia Taoísta. A sua visão do mundo e dos seus fenómenos, bastante simplificadora e revolucionária face aos conhecimentos e poderes instituídos, embora em certos aspectos datada ou limitada, em muitos outros continua a ser muito rica de um discernimento directo e profundo da vida e da mente humana. Publicou, além de quatro revistas, mais de duzentas obras em japonês, inclusive de história, biografias e traduções (Alexis Carrel, e Northrop's, The meeting of East and West), e vinte delas em francês, já que esteve nos anos 20-30 em Paris, editadas pela reputada Vrin, em 1929 a primeira Le Principe Unique de la Philosophie et de la Science d'Extreme Orient, mas também dadas à luz noutras editoras francesas e belgas, país este onde teve muitos amigos e centros de tal modo que a fábrica de alimentos macrobióticos, que teve o nome da sua mulher Lima, ali nascerá em Gand, e ainda hoje é uma referência da qualidade biológica dos produtos, tendo-a eu visitado em 1982 e nela bem dialogado. A partir de 1957, George Oshawa viaja por todo mundo, ensinando, dialogando e está mesmo na floresta africana cerca de um ano com Albert Schweitzer (1875-1965), o filósofo e místico em acção abnegada pelos leprosos. Em 1961 saiu a sua obra mais popular, a mais prática e condensada, O Zen e a Macrobiótica, que foi traduzida para numerosas línguas. Mas nela, após as muitas páginas de explicação da filosofia do Extremo Oriente e de salutares receitas de bons cozinhados e de ideias práticas quanto ao uso e conservação dos alimentos, termina com um corajoso capítulo intitulado Certificado pro-forma do óbito do império mundial da dinastia americana do ouro, algo que estamos a observar hoje um começo, com o crescimento do BRICS e a diminuição do papel e valor do dólar infinito (impresso ilimitadamente, e logo injusta e corruptamente) no mundo. Será em 1966, de um ataque de coração, que se evolará da Terra.
Ora em Portugal desde os meados dos anos 60 havia alguns núcleos, alimentados por publicações vindas de França e do Brasil e assim em 1969 saía a primeiro número de uma revista do Centro Ignoramus de Macrobiótica Zen, sediada na R. da Emenda, 110, 2º, Lisboa, e que era orientado por Fernando Mesquita e José Galambas. Nela funcionava também o restaurante, a Colmeia, que a breve trecho passou a ser dirigido por Abel Trancoso e depois apoiado pelo calmo e sábio João Ribeiro. Provavelmente foi pela Colmeia que Afonso Cautela teve conhecimento da Macrobiótica, tal como eu e muitas outras pessoas, ainda que no Norte houvesse também um núcleo que teve como dinamizadores Augusto Coutinho e outros donde surgiriam os centros e restaurantes Pirâmide e mais tarde o Suribachi, este ainda hoje vivo, no Porto. A partir de 1975, um discípulo de Ohsawa, Michio Kushi, sediado nos USA, passará a vir a Portugal para seminários e consultas, divulgando o seu aprofundamento da Macrobiótica através da edições da Cooperativa Unimave e da Trigrama, onde ainda trabalhei, fundada por Gomes Ribeiro, um do co-fundadores do Suribachi, com Maria Arminda e Amândio.
Contracapa de uma publicação da Trigrama sobre a Macrobiótica |
Dessa obra de Afonso Cautela A Cura pela Energia. 55 Indicações de Base, vamos então transcrever algumas partes em homenagem aos 133 anos de George Ohsawa e a Afonso Cautela:
As 55 indicações de base são antecedidas de duas páginas nas quais Afonso Cautela expõe a sua compreensão da cura pelo equilíbrio da polaridade yin e yang da força energia cósmica aplicado a cada ser ou doente que «é um ponto da espiral, o micro do macrocosmos», «um elo da grande corrente corrente universal, ininterrupta e infinita». A ideia base é que «todas as doenças são curáveis: e a maior ou menor rapidez na cura depende do método ou regime alimentar seguido», e assim após as 55 indicações de base podemos ver os três regimes sugeridos (as famosas dietas nº5 (50% de cereais, 30% legumes frescos, 10% leguminosas, 10% algas e saladas), nº6 (75% cereais) e nº7 de Ohsawa), conforme a proporção de cereais, legumes, leguminosas e algas.
55 Indicações
«1 - Cada pessoa deve ter uma terapêutica especial. "Não há doenças, há doentes". (Hipócrates). Mas o que aqui se indica são generalidades, que podem servir a todo e qualquer caso, todo e qualquer doente, como medida imediata de prevenção, defesa, controle e terapêutica.
2 - Do ponto de vista racional (terapêutica causal), o que importa é deixar o organismo reagir por si, porque o o organismo" – Hipócrates – "é que se cura a si mesmo". Se assim foi e assim será, a única atitude inteligente quando a doença ataca, não é atacar ainda mais o organismo com medicamentos, deixa-lo exausto com alimentos complicados e pesados, mas libertá-lo de todos esses encargos suplementares para o deixar com forças de reagir por si.
6 – Para começar,o
melhor de tudo é um pequeno jejum. Ao contrário do que afirmam os
preconceitos de costumes retrógrados, o doente não deve ser
super-alimentado. É exactamente o contrário. Se der descanso
digestivo ao seu corpo, este ficará disponível para colocar todas
as energias e reservas no "combate à doença".
Durante o jejum convém não despender esforços intelectuais nem físicos. Todas as energias do corpo, normalmente utilizadas no trabalho da digestão, se concentram para fazer frente à doença. Além disso, o jejum é um princípio de desintoxicação.
Mas a grandes descoberta de Ohsawa é que o doente poderá fazer o jejum continuando em actividade, se a sua vida lhe não permitir que seja de outra maneira. Ideal seria que descansasse, física e intelectualmente. Mas senão conseguir esse ideal, nem por isso o jejum deixará de operar no processo de retroagir a doença.»
52 - Conservar a Energia: Princípio único de toda a cura.
«Na cura pelo Princípio Único [da Ordem do Universo e que é o do equilibrar o Yin e o Yang, negativo e positivo] têm a máxima importância os mínimos pormenores. Seja qual for o caso, recomenda-se aos doentes:
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