quarta-feira, 24 de maio de 2023

Vladimir Soloviev. Vida e iluminações, a santa Sophia. Com gravação de leitura sobre Soloviev da "Alma da Rússia", por Helen Iswolsky.

Vladimir Sergueïevitch Soloviev, 16.I.1853 a 31.VII.1900.
Teillard Chardin, Helena Iswolsky e a poetisa Marina Tsvetaeva, final dos anos 30.

 Helena Iswolsky, uma tradutora, jornalista e escritora russa (1896-1975), nascida na Alemanha onde o pai, antigo ministro do Czar, era diplomata, e de  mãe alemã, emigrou para Paris com ela, no começo da 1ª grande Guerra, e aí se deu com Jacques Maritain, Teillard Chardin e outros intelectuais e padres católicos e ortodoxos,  que circulavam à volta do movimento do personalismo da Action Catholique e da revista Esprit, significativamente aonde a nossa Dalila Pereira da Costa publicou o seu primeiro ensaio em 1970, Expérience de l'extase, já abordado neste blogue. E conheceu e colaborou mesmo com Nicolas Berdiaev (1874-1948),  na época o principal filósofo russo emigrado em França, expulso da Mátria em 1922, com outros intelectuais considerados inimigos ideológicos do comunismo pelas autoridades soviéticas. A sua obra foi vasta, tanto mais que as vicissitudes da Fortuna caíram sobre a família e foi obrigaram a ganhar a vida através da escrita, o que não foi difícil porque era uma boa poliglota, cristã e de coração.

                                                            

O seu livro Soul of Russia, Alma da Rússia, publicado em Londres, em 1944, já que ela no dealbar da 2º grande Guerra, em 1941, emigrara da França para os  USA, está dedicado a sua mãe e dividido em dezasseis valiosos capítulos, oferecendo-nos uma boa visão da evolução histórica da religião e da espiritualidade russa, sintética nas suas 159 páginas, acrescentadas de uma razoável bibliografia para cada capítulo. Entre eles destacamos o XIII, A Procura de Deus, onde se acerca de Dostoievsky e de Tolstoi, e o XIV, o Profeta da Universalidade, onde nos partilha a sua compreensão da vida e obra de Vladimir Soloviev, que fora grande amigo de Dostoievsky e de certo modo o mestre de Nicolas Berdiaev, Pavel Florensky e Sergei Bulgakov, estes dois últimos profundos filósofos, isto é, amantes da Sabedoria, como foi bem captado pelo pintor Mikahil Nesterov:

                                 Ficheiro:Nesterov Florensky Bulgakov.jpg

 O capítulo dedicado ao genial filósofo e teólogo Vladimir Soloviev (1853 a 1900), em dez páginas, partilha resumidamente o essencial do percurso da sua vida e alma, tendo eu lido as três primeiras páginas, comentando-as, tal como pode ouvir na gravação vídeo, destacando-se nelas a sua visão e compreensão da Sabedoria Divina, a Hagia Sophia, a alma divina do Mundo e que ele tanto aprofundara em vida, com grande originalidade, tal como fez em relação à Trindade, sendo reconhecido mesmo por cristãos católicos (tal Osvaldo Lira, no seu prólogo à Rusia y la Iglesia Universal, 1946), já que Solovief, após uma evolução abrangente e investigadora de vários caminhos,  reafirmou o pensamento religioso ortodoxo e tradicional da Rússia, aberto ou fundado pelos primeiros padres do Oriente mas por ele exponenciado magnificamente, profeticamente mesmo,  na sua visão da missão universal da grande alma russa.

V. Soloviev, S. Trubetskoy, N. Grot e L. Lopatin, em 1893
Foi  muito fracturante o seu famoso discurso em 1881 contra a pena de morte, e embora amigo de Tolstoi e discutindo bastante com ele não apoiava o princípio  da não-violência na sua radicalidade, ou seja, a não resistência ao mal. Foi  ainda um crítico fundamentado  do Positivismo de Augusto Comte, conforme a tese defendida brilhantemente em 1874 na Universidade de S. Petersburg, e do Darwinismo, mas também do nacionalismo exagerado dos Eslavófilos, a que chamava um nacionalismo zoológico. Quanto a afinidades de fontes de inspiração,  apreciava muito os poetas simbólicos Alexander Bloc, místico, e Andrei Biely.
No veemente discurso contra a pena de morte, em 1881, face ao assassinato do czar Alexandre II, e pedindo ao filho Alexandre III clemência, afirmou ainda  a sua visão espiritual: «A natureza tende para a unidade absoluta; a natureza humana e o mundo externo têm a mesma alma, e esta alma procura dar à luz o divino».

Helena Iswolsky resume bem alguns aspectos da teodiceia e aspiração espiritual de Soloviev: «A encarnação da Palavra [Sermo, Logos ou Verbo] aconteceu na Pessoa de Jesus Cristo, mas há uma encarnação de Deus em cada ser humano, criado à sua imagem. Cada pessoa é um homem-Deus, um membro do Corpo Místico. Deus está também incarnado na sociedade Cristã, reflectindo a justiça Divina.
Soloviev descreveu Deus como um absoluto e perfeito todo. O mundo é a expressão do pensamento e amor Divino. Há uma plenitude, uma totalidade do ser: a pluralidade dos seres criados mergulha numa suprema unidade. A unidade do mundo é a sua alma. Soloviev chama-a também Sabedoria Divina (Sophia na Grécia) que é descrita no Livro dos Provérbios

Mais misteriosa e profética é a sua visão de que as várias igrejas se unirão na luta contra o Antecristo e que a Rússia tinha ou tem "a sua palavra por dizer" (ideia também de Dostoievesky) na impulsão ou mesmo liderança na missão de universalidade religiosa e espiritual, justa e fraterna, da Humanidade, muito presente metamorficamente nos séculos XX e XXI, sobretudo na terceira década em que estamos...

Visão da Mãe do Mundo e Hagia Sophia protectora nossa, por Nicholas Roerich
Anote-se em português  dada à luz pela Guimarães Editora, como de costume sem data, A Verdade do Amor, traduzida do francês e prefaciada sobriamente em dezassete páginas  por Álvaro Ribeiro, um dos mestres da escola da Filosofia Portuguesa, que se enraíza bastante em Leonardo Coimbra, autor dum valioso ensaio onde Soloviev e Berdiaef estão bem presentes, a Rússia de Hoje e o Homem de Sempre, 1935. Noutra linha da nossa tradição espiritual temos a tradução prefaciada que José V. de Pina Martins, ainda com o nome de Duarte Montalegre, fez de Nicolas Berdiaeff, O Marxismo e a Religião, Coimbra, 1948. Esperamos acercar-nos ainda de parte da extensa obra de Vladimir Soloviev...
Oiçamos então agora a descrição, com pathos, ou emoção,  feita por Helen Iswolsky da vida e visões iluminativas de Vladimir Soloviev, lida e comentada por mim:

                        

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