Frontispício, fac-similado por Mendes dos Remédio. |
D. Francisco de Portugal foi um dos cavaleiros do Amor que floresceram em Portugal no século XVI, o último em que eles puderam livre, criativa e criticamente manifestar-se, já que a introdução do Tribunal da Inquisição começaria em breve a censurar, prender e castigar quem fosse considerado menos conforme às doutrinas e dogmas da Igreja. Não sendo D. Francisco um cristão gnóstico, menos seguidor escrupuloso dos preceitos e ideias, não teve que recear problemas e tal como ele, ao longo dos séculos seguintes, continuou a haver cavaleiros ou fiéis do Amor, guerreiros, corajosos, esforçados, nobres, dedicados à honra e ao amor, capaz de terçarem armas pela pátria e escreverem ao amor da dama ou à liberdade da Sabedoria.
Nascera filho natural de D. Afonso de Portugal, e de uma descendente de Nuno Álvares Pereira (quando D. Afonso ainda não era religioso, onde chegou a bispo de Évora) e era neto do 1º marquês de Valença. Em 1505 foi legitimado pelo rei D. Manuel, que em 1515 fundou para ele o condado do Vimioso, e desde cedo se destacou pelas suas qualidades, tendo sido um dos cavaleiros que acompanhou D. Manuel a Castela quando este foi jurado príncipe, ou ainda a sua filha D. Isabel à Alemanha quando foi casar-se com o imperador Carlos V. No campo das armas brilhou em Arzila em 1509 e em Azamor em 1515, dirigindo tropas e chegando a dirigir Azamor. Foi depois Vedor da Fazenda e por fim educador ou Camareiro-mor dos filhos de D. João III, D. Manuel e D. João.
«O Bem se deve crer de todos e de ninguém o mal sem prova.
O grande espírito é igual, e rigoroso.
O freio do bom é Amor, e o do mau é temor.
Os bons sabem bondades, e os maus sabem malícias
Os pusilânimes prezam-se do que tem, e os magnânimos das obras que fazem.
Ouvir maus é criar maldades.
Os fracos morrem após a vida.
O saber sem inteireza é uma roda de vento.
Os magnânimos tem a honra dos seus por sua.
Quem segue a alma sacrifica o esforço
A ignorância escandaliza o entendimento.
A desestima dos bons dá ousadia aos maus.
Para aconselhar, e ser aconselhado convém o entendimento nu da vontade.
Corrupto governo é usar primeiro do formoso que do necessário.
Se culpa a vida alheia seja com o teu exemplo, e não com o teu entendimento.
Quem muito estima coisas pequenas nunca faz nenhuma grande.
O fiel servidor não deve servir a quem dele senão fia.
Ninguém se fia de quem dele se não fia.
Onde as verdades falecem os enganos prevalecem.
As más suspeitas destroem as verdades.
Apetito é grande vício.
O coração confiado e a razão desconfiada são para feitos grandes.
Os homens que não sentem são tanto pior que as bestas, quanto neles degenerou a natureza.
Ao bom somente o obriga o que a virtude obriga.
Não há buraco no mundo para escapar do mundo se não Deus.
Onde a razão se não ouve, doido é quem se não cala.
Quem não emudece vendo quem fala com as orelhas dos homens, e não com os corações dos homens.
O primeiro conceito do bom é cuidar de todos bem, e o do mau de todos mal.
As obras sem esperança são como corpo sem alma.
A ambição não ouve a razão alheia.
O coração livre despreza tudo o que errando se ganha.
Ao ignorante sempre aborrece o sabedor.
Com grandes determinações, não lembram inconvenientes.
A quem não crê verdades dizem mentiras. [Tão actual, pla manipulação geral]
O poderoso deve ser sujeito à razão dos seus, e livre à sem razão dos estranhos.
O verdadeiro, a si mais que a todos deseja satisfazer.
As fracas conversações enfraquecem o forte.
Quem quiser emendar o mundo seja em si. [Muda-te, que o mundo mudará]
Sem o uso da fortaleza, tudo é perigoso.
A ignorância obra monstros. [Saibamos detê-la]
Aonde a ignorância manda a malícia se assenhoreia.
A boa fortuna não somente faz as obras mas autoriza as palavras.»
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