Na 3º e última parte do seu escrito O que está vivo na tradição do Humanismo, intitulada "O Humanismo como retorno às Fontes e ao pensamento Irenista", o prof. Pina Martins explica que as fontes dos humanistas foram as cristãs e a patrística (dos primeiros padres da Igreja, tal como Clemente de Alexandria e Orígenes) para a gnose teológica; o pensamento grego para a demanda filosófica; e os textos gregos e latinos para os filólogos e escritores, estes impulsionando métodos mais críticos ou científicos de investigação e fixação dos textos, iniciados por Lorenzo Valla, Erasmo e os grandes impressores, como Aldus, Froben e Estienne.
Desta abrangência de fontes resultou também uma certa aceitação da diversidade, por vezes conflituosa, da hermenêutica dos textos, abrindo caminho para um irenismo filosófico e religioso, ou seja, para aceitação tolerante de perspectivações diferentes. Algo hoje fundamental, em tempo de narrativas oficiais e extremar de posições ideológicas, e que teve então sua raiz.
Desidério Erasmo, defensor da verdade, no seu scriptorium, por Quentin Metsys |
Desta abrangência de fontes resultou também uma certa aceitação da diversidade, por vezes conflituosa, da hermenêutica dos textos, abrindo caminho para um irenismo filosófico e religioso, ou seja, para aceitação tolerante de perspectivações diferentes. Algo hoje fundamental, em tempo de narrativas oficiais e extremar de posições ideológicas, e que teve então sua raiz.
Pina Martins escreve mesmo, talvez para manter viva tal tradição Humanista e despertar-nos de uma subjugação medíocre: «O respeito pelo outro não é mais do que um aspecto do respeito pelo ser humano. Nos nossos dias dá-se prioridade à melhoria da sorte do indivíduo nas suas relações com o trabalho e os meios de produção: este problema está intimamente ligado ao dos direitos do homem na comunidade, pois o Estado existe para a felicidade dos cidadãos, não são eles que têm de se sacrificar para assegurar um enriquecimento hipotético do Estado.»
E, não sabemos se a sério se com ironia, pois escrevia em 1987, já que nos nossos dias passa-se o contrário, da prisão de Julian Assange à manipulação e opressão crescente das vozes discordantes do capitalismo oligárquico e imperialista que tenta reger o planeta, Pina Martins acrescentava logo em seguida: «Estas ideias, admitidas hoje em toda a parte, encontram-se já em alguns dos textos fundamentais do Humanismo...», citando a Utopia de Thomas More, com as suas seis horas de trabalho e Juan Luis Vives com as propostas de medidas para evitar a pobreza...
Marsilio Ficino, Picco della Mirandola e Angelo Poliziano, em 1485, em Florença, num fresco de Cosimo Rosseli.
E, não sabemos se a sério se com ironia, pois escrevia em 1987, já que nos nossos dias passa-se o contrário, da prisão de Julian Assange à manipulação e opressão crescente das vozes discordantes do capitalismo oligárquico e imperialista que tenta reger o planeta, Pina Martins acrescentava logo em seguida: «Estas ideias, admitidas hoje em toda a parte, encontram-se já em alguns dos textos fundamentais do Humanismo...», citando a Utopia de Thomas More, com as suas seis horas de trabalho e Juan Luis Vives com as propostas de medidas para evitar a pobreza...
Marsilio Ficino, Picco della Mirandola e Angelo Poliziano, em 1485, em Florença, num fresco de Cosimo Rosseli.
Transcrevendo a famosa frase de Pico della Mirandola, e que Pina Martins relembrava de quando em quando "philosophia veritatem quaerit, theologia invenit, religio possidet", "o amor da sabedoria (filosofia ou ciência) procura a verdade, a teologia encontra-a mas só a religião a detém ou possui»", considera tal como aproximação à unidade ou ecumenismo das religiões, já que Pico della Mirandola, tal como Marsislio Ficino, reconheciam uma religião ou filosofia perene, a prisca teologia, que sempre se transmitira, estudando-a nas diferentes religiões e tradições, algo que é hoje uma mentalidade ou visão bem mais corrente, embora com retrocessos nas seitas e mentes fundamentalistas. Certamente que podemos sentir e postular ainda a religião, que possui a verdade, no seu nível mais elevado e íntimo como a religação espiritual e divina.
Depois de ter equacionado levemente a união da imagem e do texto ao longo dos séculos, sem ainda observar a actual predominância crescente dela, nomeadamente digital, Pina Martins questiona-se quanto à capacidade de ele ou outros fazerem sínteses completas, pois nem sobre o Renascimento nem sobre o saber contemporâneo os melhores seres as poderão fazer, cabendo-nos apenas participar com as nossas contribuições, estudos e investigações, nomeadamente sobre os temas e textos maiores do Humanismo, dos quais enumera no fim treze, da Theologia Platonica de Marsilio Ficino ao Quod nihil scitur de Francisco Sanches, de modo a que possamos revificá-los e frutificá-los nos nossos dias, tal como Pina Martins tão bem realizou, culminando mesmo com a sua Utopia III.
Segue-se então a leitura e simultaneamente tradução do texto francês, com alguns comentários meus, em prol da Tradição Humanista em Portugal e, nestes dias do centenário do seu nascimento, como homenagem de coração e de espírito ao ilustre investigador, bibliófilo, bibliotecário, professor e amigo José V. de Pina Martins.
Um dos mais belos e enigmáticos livros com imagens do Renascimento, O Sonho de Polifilo, de Francesco Colonna. |
Segue-se então a leitura e simultaneamente tradução do texto francês, com alguns comentários meus, em prol da Tradição Humanista em Portugal e, nestes dias do centenário do seu nascimento, como homenagem de coração e de espírito ao ilustre investigador, bibliófilo, bibliotecário, professor e amigo José V. de Pina Martins.
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