segunda-feira, 20 de novembro de 2023

Tolstoi, 113 anos da sua morte. Pensamentos libertadores, extraídos de "A Anexação da Bósnia e da Herzegovina pela Austria", traduzido por Jaime de Magalhães Lima. 1909.

 Pensamentos bem simples, directos e verdadeiros, mas que parecerão muito utópicos ou revolucionários, de Tolstoi, e partilhados para comemorarmos o dia do seu aniversário de libertação da Terra, 20 de Novembro. Extraídos da tradução e apresentação por Jaime de Magalhães de Lima [1859-1936], anteriano e tolstoiano, pois peregrinara à  Iasnaia Poliana e encontrara-se com ele (e publicando sobre isso), do livro a Anexação da Bósnia e da Herzegovina pela Áustria, dado à luz em 1 de Janeiro 1909, na popular A Editora, ao Largo Conde Barão, 50.

«Estamos tão acostumados a pensar que alguns homens devem governar a vida dos outros que as leis emanadas de alguns deles, mandando aos outros crer ou proceder de certo modo, não nos parecem estranhas. Se os seres humanos podem publicar tais decretos e serem obedecidos é porque não reconhecem nas pessoas aquilo que é a verdadeira essência de todo o ser humano – a Divindade da sua alma, sempre livre e incapaz de se submeter a qualquer coisa que não seja a sua própria lei, isto é, à consciência e à lei de Deus...» p. 9-10.

[Eis uma afirmação altamente revolucionária mas baseada na realidade e verdade íntima do ser humano. Por isso tanto afã nos mentores e defensores da Nova ordem Mundial, do transhumanismo infrahumanista de negarem o espírito e a imortalidade da alma-espírito, e tentarem impor as mais diversas derrogações da leis naturais da Ordem do Universo e o seu Logos divino, isto é a Inteligência amorosa ou compassiva.]

«O patriotismo, para todo o membro de um grande Estado e para mim, um russo, não somente envolve a ausência de simpatia com milhares e milhões de homens, polacos, fínios, judeus, e várias tribos caucásicas, mas também resulta em que eu seja o objecto do ódio dos homens, aos quais não fiz mal algum e com os quais nenhum contacto tenho. Para as pequenas raças ou nações escravizadas é ainda pior: pelo lado espiritual é a causa justificativa do ódio a um povo que lhes é estranho, e pelo lado material produz toda uma série de opressões, perdas e sofrimentos; e este sentimento obsoleto, grosseiro, e moral e materialmente pernicioso é advogado e insinuado por todos os meios, da parte daqueles a quem aproveita, e é ingenuamente aceite como virtude e bênção por aqueles aos quais é manifestamente nocivo...». p. 22.

«Os povos devem ter consciência da sua dignidade humana, igual para todos, incompatível com o domínio de alguns sobre a vida dos outros, ou com a sujeição desses outros a qualquer. Esta consciência é unicamente possível para os homens que conhecem o seu destino na vida e seguem nos comportamentos a direcção que deriva daquele conhecimento. E só conhecem o seu destino na vida e seguem nos actos ou comportamentos a direcção que daí deriva, aqueles que tem religião [ou religação], ou que estão a nascer de novo permanentemente para o amor e o bem..
  p. 24
 

«Hoje ainda vivo; amanhã, provavelmente, já não existirei, mas terei partido, para sempre, para o lugar donde vim. Enquanto vivo, se estiver em relações de amor com os homens, será isso para mim a alegria, a paz e o bem...» p. 25

 «Para um ser humano que acordou para a compreensão religiosa ou espiritual da vida, o que se chama a autoridade do governo consiste meramente na atribuição, que a si mesmo fazem certos homens, de uma importância imaginária, que carece de qualquer justificação racional, mantendo a sua vontade por meio de violência. Para o homem acordado, esta gente desvairada e, em regra, venal, que coage os outros, é como salteadores de estrada que prendem os viajantes e os violentam. A iniquidade desta violência, as suas dimensões e organização, não pode alterar-lhe o carácter essencial. Para o homem que despertou, aquilo que se chama o governo não existe, e não há por conseguinte justificação alguma da violência cometida em nome do Estado, e não pode ter parte nisso. A violência dos governos será abolida, não por meios externos mas unicamente pela consciência dos homens que acordaram para a verdade».
  p 26.

 [Um certo idealismo utópico foi fortemente afirmado por Tolstoi, e hoje no século XXI, com os Estados cada vez mais organizados e opressivos nos seus actos, damos conta como os meios externos revolucionários são muitas vezes necessários pois a democracia instalada está rota e é nociva. Mas quantos acordam para algumas verdades externas e para a realização da sua verdade e missão íntima? Muito poucos, tanto mais que há milhões de limitados ou falsos pregadores ou instrutores, pelo que o discernimento do caminho da Verdade é bem difícil. Meditemos bem e seja a nossa acção ditada pela nossa justa e sã ideia ou convicção, e manifestada com inteligência e amor para o Bem...]

«A relação com a fé fazia com que a maioria dos seres humanos, não reconhecendo em si qualquer autoridade espiritual independente que os guiasse, submetia-se cegamente à direcção de uma minoria escolhida, tanto na compreensão da vida como na direcção das suas acções, enquanto a minoria, atribuindo-se qualidades supernaturais, considerava-se com o direito de dirigir simultaneamente a vida espiritual e a corporal da maioria.» p. 35.

 [Auto-conhecer-nos, e tornar-nos independentes, não perdendo as nossas forças em submissões erradas e nocivas.]

  «A consciência de que a lei velha  está antiquada, gasta e que levou-nos à maior miséria e anormalidade de vida, e de que a nova lei de liberdade e amor revelada há dois mil anos exige aplicação e realização, tomou-se agora tão íntima dos seres humanos, não só no nosso mundo cristão mas em todo mundo, que um despertar em relação à escravidão e à perversão, nas quais se vê mantido há tantos séculos, pode, julgo eu, surgir de repente. Porque na verdade, este acontecimento iminente, imensamente importante como é, depende não de quaisquer acções externas, que podem encontrar obstáculos invencíveis, mas inteiramente da consciência dos homens - que é sempre livre e nunca pode ser estorvada. De nenhumas façanhas ou acções difíceis em conflito com os inimigos mais fortes carece agora o povo do mundo inteiro para a sua emancipação, mas só de uma coisa, a coisa mais natural e normal ao homem - nem mesmo um acto, mas meramente uma abstenção - não fazer coisas contrárias à nossa convicção. E nem a convicção nem a abstenção de acções contrárias à convicção de cada um podem ser impedidas.»
p. 46 

[Eis pensamentos ou linhas de força para despertarmos e nos libertarmos mais: Não agir em desacordo com as nossas ideias, ideais, princípios, convicções...]

  «O ser humano pode libertar-se imediatamente de toda a posição difícil, se apenas se lembrar de que Deus vive dentro dele. Deixai apenas que os homens concebam clara e firmemente o que eles são: deixai-os conceber o que foi ensinado por todos os sábios do mundo e o que foi ensinado por Cristo: que em cada homem, - como em todos, - habita o espírito livre eterno, todo-poderoso de um filho de Deus; que o homem não pode governar nem estar sujeito, e que a manifestação desse espírito é Amor. Deixai que os seres humanos concebam isto (e já estão preparados para o reconhecer) e deixai  que eles procedam
em harmonia - ou antes, deixai que eles somente não procedam ou ajam contrariando a sua consciência, e rapidamente, da maneira mais simples e pacífica, todas as dificuldades se dissiparão...» p 49.

«O mal não pode ser suprimido pela força física do governo. O progresso moral da humanidade não é provocado só pelo reconhecimento individual da verdade mas também através do estabelecimento da opinião pública…» 

[No interior e exterior dos seres deveria a Verdade brilhar e fluir mas sabemos como a opinião pública é ou está completamente manipulada, enganada, oprimida, pelo que nos resta trabalharmos pela auto.realização interior e a irradiação possível no exterior, no ambiente, nos grupos e pessoas mais afins...]

E terminará assim o livro: «Os seres humanos só podem [ou devem] submeter-se aquela lei suprema do amor que dá o maior bem estar a cada indivíduo e a toda a humanidade. Só o reconhecimento, da parte dos homens e mulheres, do princípio espiritual que neles está, e o reconhecimento consequente da sua verdadeira dignidade humana [conforme Pico della Mirandola acentuara já no dealbar do Humanismo], pode libertar e libertará da servidão de uns e outros. Esta consciência vive já no género humano, e está pronta a manifestar-se em todo o momento.»

No bosque de faias da Iasnaia Poliana...

 Que estas corajosas, lúcidas e tão verdadeiras quão poderosas palavras e ensinamentos do Logos, inteligência-amor, e de Tolstoi nos fecundem e nos inspirem, tanto para  nos transformarmos como para impulsionarmos os outros a se descobrirem, iluminarem, realizarem e logo as pessoas, os ecosistemas planetários e a Humanidade melhorarem...

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