segunda-feira, 10 de outubro de 2016

Tarot XI, a Força. Imagens arquétipas, símbolos, iniciações. Com uma música no final...

                                               
O arcano XI, a Força, é dos mais directos e simples: uma mulher, e, neste Tarot antigo, num esforço bem denodado ou heróico, doma um animal forte, em geral um leão, abrindo-lhe, ou então fechando-lhe, a boca. Resta apurar o que esteve por detrás de preparação e treino, meditação e maturação, antes de ter  chegado a tal capacidade ou hora certa...
Algumas das particularidades na veste (neste caso quase a fazerem de asas, noutros serão mantos mais solenes), bem como na posição do animal em relação ao corpo e no que ela tem por cima da cabeça (tal como as formas dos cabelos-energias, chapéu, véu, símbolos), podem-nos dar indicações ou guiar sobre as energias e ensinamentos que se tentam veicular através deste arcano ou que podem brotar deste arquétipo. Ou seja, o que esta simbolização do psicomorfismo da força, tanto exterior como interior, contemplado mais profundamente, pode fazer desabrochar em nós para avançarmos com a força apropriada e vencedora no Caminho e seus desafios.

As representações mais antigas Renascentistas italianas ligam claramente a Força a duas fontes: a primeira é na tradição Grega ao herói Herakles ou Hércules,  lutando com o leão de Nemeia, e que, vencendo-o, poderá revestir-se da pele, energia ou aura fortalecedora, num dos seus doze Trabalhos, em geral vistos em correspondência com a passagem pelas doze constelações astronómicas e constituindo assim um programa de esforços ou provações iniciáticas realizável ao longo do ano, que despertam as qualidades luminosas que uma psicologia milenar, certamente muito empírica e subjectiva, foi atribuindo a cada constelação e signo,  numa linha de individuação espiritual, ou seja, de desenvolvimento controlado pelo eu espiritual das múltiplas energias anímicas mas unificadas sob a vontade superior.
          No Tarot renascentista dos Visconti Sforza, a Força abre mesmo a goela energética para o alto...
A segunda fonte é a tradição universal, e sobretudo clássica e cristã, da Força ou Fortaleza, tão valorizada na literatura e na filosofia moral pagã, em especial no valor e culto dos Heróis, e  depois no Cristianismo ao ser considerada uma das quatro virtudes (de virtus, em latim, força) cardeais (ou principais), com a Prudência, a Justiça e a Temperança, fazendo naturalmente parte dos programas culturais humanistas e espirituais que originaram as cartas-arcanos dos Trionfi e do Tarot nas cortes italianas do começo do Renascimento,  sendo essas virtudes as qualidades principais que a alma humana deve desenvolver, criando beleza e coerência em si e à sua volta, para poder avançar na realização das melhores potencialidades e gerar  estados conscienciais de lucidez, transparência e unidade de modo a sentir e a partilhar mais graça, amor e felicidade.                    
A Força ou Fortaleza, representada na catedral de Chartres, séc. XIII.
Compreenda-se que a força assumida e desenvolvida, em paciência e em esforço e luta, é não tanto ou só exterior contra seres negativos, clubes, partidos, corporações e países adversários (onde tanta energia é gasta destrutiva e mortíferamente), mas sobretudo dentro de nós nas energias que atraímos, captamos e criamos, e na vontade que despertamos e desenvolvemos diariamente, harmonizando e vencendo tendências e instintos, frustrações e preguiças, fraquezas e medos, preconceitos e distracções, consumismos, pesadelos e que não fossem vencidas constituiriam infidelidades ao melhor de nós próprios e da Alma do Mundo e da Humanidade... 
Nesta invulgar representação do Tarot antigo de Estensi, a Força ou Fortaleza é uma Mulher de verde que calmamente consegue quebrar ou derrubar uma coluna de um edifício, seja este de uma Religião, Instituição,  Estado, Corporação ou  grupo de pressão e alerta-nos para a necessidade de sabermos com a força do Amor e do Discernimento cooperar na libertação nossa e da Humanidade de falsos ídolos, de falsas colunas de templos, ideologias e corporações opressivas, tal como modernamente na era digital se têm multiplicado, apelando-se assim a um maior activismo nosso a fim de que nós, o país, os povos, o planeta e a Humanidade não continuem a ser tão desfigurados e manipulados, alienados, explorados e destruídos.... 
O Tarot de Marselha, o que mais circulou na Europa dos séculos XVII ao XX, transmite-nos o psicomorfismo da Mulher ligada ao alto, ao seu Espírito mas também ao corpo místico da Humanidade, ao Campo unificado de Consciência Energia e por isso tem na sua cabeça esta força-energia infinita representada pela lemniscata, na qual o princípio e o fim, o esquerdo e o direito, visível e invisível, vermelho e azul, ou seja os opostos, estão ritmicamente unidos e algo que nós de quando em quando em intuições ou  sincronias captamos ou realizamos.
Claro que a Mulher simbolizada é tanto cada mulher em si  como o Feminino que está ou é dentro de cada ser, pois a polaridade existe em todos e  tudo, e poderemos então dizer que se trata de uma força ou energia forte e suave, convincente, amestradora, órfica (de encantadora pelas palavras e a música), no fundo, de Amor.
A Mulher, assumida neste arcano, para além de contestar a atribuição predominante da Força ao Homem, o que é muito importante perante tantos séculos de condicionamento feminino enfraquecedor, é ainda um símbolo da alma em geral, tal como o animal e seus instintos e medos simbolizará o corpo, e a lemniscata na cabeça aponta à união do alto e do baixo e o acesso do nosso ser às energias vitais, solares e cósmicas, e ao campo da informação global, bem como aos outros espíritos, heróis e Anjos, a denominada Comunhão dos Santos ou ainda Corpo Místico da Humanidade. A abertura ao espírito pode ser vista como ao Espírito Divino, tão cultuado entre nós nas fraternas festas populares do Divino Espírito Santo.                                         
Mas se recuarmos ao antigo Egipto, pai e mãe de muitas das concepções que depois se transformaram nas adaptações das religiões posteriores, em especial do Judaísmo, Cristianismo e Islão, e bastante mais próximo de uma relação sagrada com os animais (e as forças e seres subtis deles), descobriremos que a deusa Shekmet foi ou é uma deusa, um ser-energia divina representada como mulher leoa, que dá a mão ao faraó e o abençoa com a sua energia espiritual...
Já em Tarots modernos, feitos com sensibilidade e conhecimento, tal como este algo inspirado nos ensinamentos e desenhos-mandalas do psicólogo suíço Carl G. Jung, o leão surge acalmado ou abençoado pela mão direita activa, já que a mão esquerda e lado receptivo da alma se encontra ligado com o Sol divino e leonino do coração espiritual, indicando-se em pano de fundo e horizonte a passagem por níveis conscienciais, por práticas ou processos iniciáticos de auto-conhecimento e de firmeza neles, nos mundos interiores subtis e espirituais. 
Que a fortaleza ou a força tem muito a ver com a energia vital e psíquica que circula na nossa coluna vertebral, em parte assimilada pela respiração psico-física, e que depois se derrama pelos vários chakras e órgãos há  indicações simbólicas explícitas, tais como as que apresentam a mulher cavalgando ou assente sobre o tigre ou leão e com o caduceu erguido na mão, aludindo à manifestação da energia nervosa e amorosa anímica, denominada de Kundalini, na Índia. E uma das indicações sugerida é a do controle tanto da potência irascível como  da energia sexual, pelo menos nas suas frequências vibratórias instintivas e animais, ao ser elevada, ou sublimada, ou comungada, a níveis superiores...
Finalizemos com um Tarot bastante moderno e mais ressoante na juventude, a qual poderá assim entrar em contacto com os grandes psicomorfismos e arquétipos da Humanidade (e outros da Força poderiam ter sido utilizados, tal como S. Jorge resgastando a Dama e S. Miguel e o Dragão), através de imagens que lhes digam mais e poderem assim ter acesso a representações estimulantes da auto-realização fora da massificação consumista ora de espectáculos e fogos fátuos, ora cinzenta e opressiva que o Sistema, os oligarcas da tecnologia e saúde química e artificial (os chips) e os meios de informação dominantes querem impor, tentando submeter-nos às tragédias e crimes que o neo-liberalismo e o imperialismo global norte-americano e dos seus aliados vão gerando, sobretudo no Médio Oriente e na América Latina, mas também agora no centro da Europa.
A mulher ou jovem é claramente apresentada como um ser em harmonia com a Natureza, ecologista, de agricultura e alimentação biológica diríamos, e que acolhe a Mãe Terra e os seus seres no seu corpo e alma, no caso o leão que nela própria está, ou que assimilou ou que é, e que no valioso Evangelho de Tomé se menciona no  logion 7. «Disse Jesus: Feliz é o leão que o ser humano comerá, e o leão será humano. E maldito o ser humano que o leão comerá, e o leão será (tornar-se-á) humano».
Qual shakta, ou mulher indiana mais desperta animico-espiritualmente, com o bindu ou ponto primordial marcado à altura do olho espiritual, tão irradiante no olhar, sobretudo amoroso, e que leva sobre a cabeça um leve véu  que a protege e donde se derramam as comunicações lúcidas, amorosas, sábias e fortes que da Alma do Mundo, ou como se pode dizer hoje, do Campo Unificado de Energia Consciência lhe chegam, ou consegue sintonizar, no seu despertar poderoso, no seu fluir e abençoar harmonioso, eis uma bela imagem..
Saibamos exercer a força harmoniosa e luminosamente em nós e na melhoria das condições de vida e de alma dos seres da Humanidade e do Planeta, saibamos tanto estar lúcidos como fortificar-nos no sistema imunitário e nas ligações superiores,  e com uma vida ética, ambientalista, amorosa, criativa, fraterna...
 E eis uma música e uma voz com Força, uma shakta...
                     

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