quarta-feira, 23 de outubro de 2024

A doutrina esotérica de Leonardo Coimbra e da Universidade de Letras do Porto, segundo Álvaro Ribeiro. Uma dedicatória perdida, de 1953. O Orientalismo do Aristotelismo. A Oração como convívio com o sobrenatural.

Dalila Pereira da Costa, Sant'Anna Dionísio e Pedro Teixeira da Mota, na igreja de Rio Mau, vila de Aves, anos 80.

Nos anos oitenta, no Porto, convivi bastante com a Dalila e com o Sant'Anna Dionísio (23.2.1902-5.5.1991), um discípulo dilecto de Leonardo Coimbra (30.12.1883-2.1.1936), ele  já aposentado do ensino e do jornalismo, eu dando aulas de Agni Raj Yoga no Suribachi. Ia visitá-lo, em geral sozinho, mas uma ou outra vez levando alunas ou pessoas amigas, e eram sempre  momentos numinosos, por vezes com silêncios e interrogações mudas, outras vezes com boas comunicações na sua doce e suave voz. É pois grato que  testemunho os nossos encontros e diálogos, dos quais já partilhei no blogue alguns momentos.

 Há dias, arrumando uma prateleira, após uma conversa telefónica com o Alberto Castro Ferreira, amigo sábio de longa data, e que foi discípulo directo de Álvaro Ribeiro (1.3.1905-9.10.1981) no movimento da Filosofia Portuguesa, dei-me com um livro deste, intitulado Leonardo Coimbra (apontamentos de biografia e de bibliografia), um in-8º de 95 páginas, impresso em Lisboa, em 1945  e, ao abri-lo, deparei-me com uma meia folha de papel onde transcrevera, em casa de Sant'Anna dum livro (hoje perdido, pois a sua biblioteca dispersou-se) que lhe fora ofertado por Álvaro Ribeiro em 1953, provavelmente a Apologia e Filosofia, dado à luz exactamente nesse ano algo esotérico (tal como também assinalou Dalila Pereira da Costa, sibilinamente, na sua obra sobre as Margens do Douro) de 1953. Ei-la:

"Ao Sant'Anna Dionísio, na hora de reconstituir a doutrina esotérica da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, oferece cordialmente este modesto tentame o seu colega, leitor, admirador e amigo Álvaro Ribeiro. 1/VI/1953."

Uma dedicatória histórica, mencionando a época à volta do  ano de 1953 como o da "hora de se reconstituir a doutrina esotérica da Faculdade de Letras do Porto", e portanto do ensino de Leonardo Coimbra, de que sabemos algo através dos seus discípulos.  O que houve nessa época seja de publicações de livros ou revistas mais significativo, ou mesmo de celebrações? 

Em 1951 fora dado à luz o esperado e volumoso In-Memoriam de Leonardo Coimbra, organizado exactamente por Álvaro Ribeiro, Sant'Anna Dionísio,  e ainda A. Casais Monteiro e José Marinho, o qual trouxe ao de cima, através de testemunhos de quarenta almas o valor do mestre Leonardo Coimbra e do seu ensinamento. A primeira  contribuição  é  a de Teixeira Pascoaes, confessando: «Leonardo Coimbra era, e é, um espírito das alturas, que, pairando, sobre todas as coisas, contempla para além delas, o infinito. Esse além é uma fonte inesgotável...». Como abordei os vinte primeiros testemunhos no blogue, eis a ligação para o primeiro desses artigos: https://pedroteixeiradamota.blogspot.com/2024/01/leonardo-coimbra-testemunhos-dos-seus.html

Leonardo Coimbra (1883-1936) e Teixeira de Pascoaes (1877-1952)

Sabemos que as tertúlias filosóficas em Lisboa conhecidas começaram nos anos 40 com Fidelino de Figueiredo, e nos anos 50 com Álvaro Ribeiro, José Marinho e Sant'Anna Dionísio, vindos do Norte,  no café Brasileira, no Rossio, de Lisboa, e depois no café Colonial, aos Anjos, como me contou o embaixador e amigo perenialista Jorge Preto que nelas participou. Ora Álvaro faz a sua oferta-dedicatória em 1953, quando as tertúlias já funcionavam. E tanto podemos  então pensar que foram estes três meios (In Memoriam,  tertúlias e livros) de se estar a reconstituir a doutrina esotérica de Leonardo e da sua Universidade, como também considerar que o esotérico neste caso não será propriamente referência a um nível mais interno ou iniciático, mas num sentido apenas simbólico de pouco exteriorizada, tanto mais que a Faculdade fora encerrada em 1928, embora até 1931 funcionasse de modo a concluírem-se as licenciaturas já iniciadas.

 Todavia, como por mais de uma vez nos seus livros Álvaro Ribeiro considerasse a existência do lado esotérico do aristotelismo, mesmo sem certezas absolutas sobre o sentido do "esotérico" empregado, o melhor será transcrevermos (tanto mais que não se encontra na web) o que Álvaro Ribeiro, aluno e discípulo de Leonardo, escreve na pág. 17, subcapítulo Atitude Religiosa, numa leve aproximação ao esoterismo de Leonardo, e do qual muito mais se poderia dizer, como o fizeram em parte Sant'Anna Dionísio, ou outros, ou como eu posso testemunhar ao ter alguns exemplares de livros ou revistas desse cariz assinados por Leonardo ou endereçados a ele, para além de ter assinalado e comentado em alguns artigos no blogue as passagens mais espirituais presentes nos livros de Leonardo Coimbra, nomeadamente no seu trabalho sobre Antero de Quental e no valioso Luta pela Imortalidade : https://pedroteixeiradamota.blogspot.com/2020/12/leonardo-coimbra-e-luta-pela.html). Oiçamos então o que diz Álvaro no seu Leonardo Coimbra, 1945.

«A vida religiosa de Leonardo Coimbra consistia principalmente em perscrutar os mistérios do Universo, numa série de interrogações à natureza e ao Espírito [interrogações mas também práticas psico-espirituais], e em admitir progressivamente a revelação de Deus.
Leo
nardo Coimbra afirmara-se sempre cristão; transferindo, porém, o seu conceito de cristianismo, do plano moral para o plano religioso, foi levado a admitir a divindade de Jesus, e a aceitar a teologia católica [parte dela]; o espírito de Leonardo Coimbra não pertencia à família dos impenitentes heterodoxos , como Teixeira de Pascoaes [que sempre foi bastante penitente, e na sua heterodoxia aceitava muitos aspectos da Bíblia...], nem à dos ocultistas lunares como Fernando Pessoa [embora templariamente também fosse mais solar...]: todo ele era alvoraçada procura do sol da ortodoxia [ou do verdadeiro Sol, que a ortodoxia por vezes espelha...] Não teve, pois, mero carácter episódico e sentimental esta discutida conversão religiosa [uns dias antes de morrer de acidente de automóvel, sendo o Padre Cruz o confessor]; tem o correspondente movimento intelectual registado nos escritos de diversas fases, o que garante a profunda sinceridade do pensador; filósofo católico com Maurice Blondel, Edouard Le Roy ou Jacques Chevalier, mas pensador de raiz português, se tivesse podido continuar a sua actividade espiritual, não seguiria o movimento neo-escolástico das Universidades de Lovaina e de Milão», nisto apontando para uma tendência não escolástica, não exotérica, mas afectiva, intuitiva, mística, espiritual de Leonardo Coimbra e logo do seu ensino universitário e que frutificará depois em alguns dos seus discípulos de 1ª e 2ª geração.

Álvaro Ribeiro explica depois  como a conversão religiosa de Leonardo não fora inesperada e, entrando em seguida no subcapítulo O Orador e professor, diz-nos que o seu discurso «era gradualmente transcendente (e logo esotérico, interiorizando para a imanência transcendentalizável, direi...] e nunca superficial ou pragmático», e caracteriza-o: «Leitor infatigável, abrangia todos os domínios da cultura humana, desde as matemáticas superiores aos romances de visão poética ou de intenção messiânica; à prova de todos os assuntos resistiam a sua inteligência penetrante, a sua assimilação completa, a sua exposição exacta e brilhante. Dotado de imaginação poderosa [nado e criado entre o rio Tâmega e a serra do Marão], familiarizado coma paisagem e o além, Leonardo Coimbra transfigurava os seus conhecimentos nas mais belas miniaturas de expressão verbal que encontramos frequência nos seus escritos.»...

Será na penúltima página que Álvaro Ribeiro aponta de novo para o permitia a ressurgência esotérica: "Intitulando o seu esboço de sistema filosófico "O Criacionismo", Leonardo Coimbra não procedia por mero arbítrio. Opunha-se ao materialismo e ao formalismo em que via agrupadas as teorias do conhecimento dominantes, porque nem a matéria nem a forma são princípio explicativos de uma actividade. Confiava na espiritualização crescente da sociedade humana e postulava um optimismo transcendente, como garantia da ação moral". 

Neste sentido estava com o que escreveu e desenvolveu a filósofa russa platónica Daria Platonova Dugina, nomeadamente no seu Optimismo Escatológico, que Leonardo Coimbra certamente apreciaria muito, e hoje só podemos desejar que nos planos espirituais possam conviver, dialogar e nos inspirar.

                                           

 Quanto ao livro Apologia e Filosofia publicado  em 1953 e donde terei copiado certamente a dedicatória, encontramos nele (como noutros) valiosos contributos do Álvaro Ribeiro para a elucidação do emprego do adjectivo "esotérico", nomeadamente no capítulo 18º e final, que mereceria até ser todo transcrito, que  começa assim: "A filosofa aristotélica é uma filosofia da razão intuitiva, embora tenha sido muito interpretada como filosofia da razão discursiva. Filosofia de compreensão mais do que filosofia de apreensão, o aristotelismo indica, através do Organon os exercícios espirituais que adormecem na alma humana a vontade de contradição dialéctica e militante e que nela despertam a adoração da verdade. Mas para entender o aristotelismo convém reflectir sobre o significado autêntico da compreensão. (...) Compreender é prender [ligar] mentalmente o meio com o fim, o efeito com a causa, o acidente com a substância [actividades que culminam em intuições], acto simbólico que se traduz no logismo, na tese ou na proposição. Compreender não é, pois, relacionar ou compor noções do mesmo plano de entendimento".

Eis-nos com uma boa partilha de Álvaro, mostrando que o esoterismo do aristotelismo reside na dinâmica ascensional da consciência, na importância da razão intuitiva,  buddhi da filosofia Vedanta, e no facto de propor "exercícios espirituais" que "adormecem" ou acalmam a mente irrequieta ou dialéctica"  e despertam nela a aspiração ou "adoração da verdade". Terá Álvaro Ribeiro lido os Yoga sutras de Patanjali, onde encontramos esta mesma visão e caminho, nos aforismos iniciais, yoga citta vritti nirodha, a união é obtida pela acalmia, adormecimento ou extinção das ondulações mentais?

Mais à frente vai mais longe na aproximação (numa unidade do platonismo e aristotelismo) ao esoterismo: "Nos livro reunidos sob o capítulo de Metafisica é que o platónico Aristóteles nos diz ter a filosofia origem no sentimento de admiração, e nesses mesmos livros aproxima a filosofia da filomitia, pelo que nos convence  de que o sábio não pode limiar-se ao estudo do que nasce e morre, ao estudo da Natureza, mas deve fazer por que a sua inteligência ascenda à intelecção do sobrenatural."

Quanto ao estudo e conhecimento sobrenatural, Álvaro Ribeiro parece estar a par dos perigos de certas práticas (mágicas, yoguicas), advertindo "que o convívio com o sobrenatural exige predicados delicadíssimos, os quais se resumem no que a doutrina cristã estabeleceu serem as virtudes teologais", a Fé, Esperança e Caridade, esclarecendo, com certa originalidade, que os exercícios espirituais visam obter essas virtudes, e que o magistério da Igreja se deveria exercer no sentido de defender tais virtudes. 

Os dois últimos parágrafos são bem valiosos quanto ao seu modo de ver o esoterismo e a ligação com o sobrenatural, com o divino, e neles afirma a sua confiança na persona, dotada de cabeça e de coração: O espírito finito que é o homem está em relação com o espírito infinito que é Deus, e por misteriosa que seja essa relação de transcendência não podemos deixar de a [meditar e a] conceber na ordem do pensamento e do sentimento (...) 

O último parágrafo é riquíssimo de sugestões interiores, e faz-nos pensar como seriam as orações do Álvaro Ribeiro, e lamento, tendo ainda visitado a sua afável mulher em sua casa em Campo de Ourique, não lhe ter perguntado por tal:

 "A oração, que nos incita a ascender da Letra para o Verbo, e do Verbo para o Espírito, é, por isso, um processo de culto  que rejuvenesce a cultura. A oração mental é o mais puro convívio com o sobrenatural. Elevando assim a palavra, o pensador cumpre o primeiro preceito da arte de filosofar."

Possamos pelas nossas orações-meditações comungar com o Espírito e com estes nossos amigos que já estão mais religados a Ele... 

quarta-feira, 16 de outubro de 2024

Soror Mariana do Rosário, clarissa de Évora: no aniversário da sua libertação da Terra a 16 de Outubro de 1649, em Évora.

 Os Desposórios do Espírito celebrados entre o Divino Amante, e sua Amada Esposa, a venerável Madre Soror Mariana do Rosário, Religiosa de Véu Branco no Convento do Salvador da cidade de Évora, composto por Frei António de Almada, Religioso dos Eremitas de Santo Agostinho na Província de Portugal, jubilado na Sagrada Teologia, foi dado à luz em Lisboa em 1693 e reimpresso em 1766, e transmite-nos bastantes aspectos da meritória vida da soror Mariana do Rosário, que em  Évora brilhou fulgurantemente como resiliente alma face às dores e como mística ardente na união ao espírito e ao Divino e mestra de noviças nas vias espirituais. O Padre Mestre Francisco de S. Maria, no seu incontornável Anno Histórico, Diário Português, noticia abreviada de pessoas grandes, e cousas notáveis de Portugal, de 1744, consagra-lhe uma breve mas bem suave notícia, onde diz: «Mariana do Rosário, natural de Évora, Religiosa leiga do Mosteiro do Salvador da mesma cidade. Cresceu tanto em virtudes, e participou tantas luzes da Terra, que foi assombro daquele sempre religiosíssimo Convento. Depois de padecer com grande humildade, paciência e resignação gravíssimas enfermidades, securas, participou nesta vida muitos favores soberanos. Predisse muitas coisas, que todas se verificaram. Obrou Deus por ela evidentes milagres, e não foi o menor escrever a sua vida, por mandado do seu director espiritual, sem saber ler nem escrever. Faleceu suavissimamente neste dia [16], ano de 1649».
Começara aos dez anos (nascera a 4 de Abril de 1615) a ter oração mental sem ser ensinada, mas será bem mais tarde que passará da oração à contemplação. Foi aos 18 anos que professou, mais exactamente no dia 10 de julho de 1633 e que alegria imensa sentiu por se consagrar plenamente a Deus e ao mestre Jesus. Embora curta a sua vida, e sofrida de muitas penitências e enfermidades, desenvolveu as virtudes e dons e foi  favorecida por um permanente estado abrasado de amor e por constantes graças divinas, tais como visitas do seu "Esposo" e transportes a planos ou estados subtis e intensificados de consciência. 

Monja da ordem do Santo Espírito. Que Ele nos ilumine e aumente o nosso discernimento.

 Foram na realidade apenas trinta e quatro anos de vida florescida na Terra mas dezasseis deles iluminando as suas condiscípulas sorores clarissas do convento do Salvador em Évora, com as suas virtudes e dons, alguns inatos, como ela nos conta:«de dez anos comecei a ter oração mental, sem alguém me ensinar mais que as inspirações divinas, e tomar Deus esta alma à sua conta (...)  e considerava com gosto que não cansava cansar-me nem afligir-me por amor de Deus "». Hoje estranharemos esta aspiração a Deus tão intensa e precoce, pois estamos tão cheios de informações, conhecimentos, posses, prazeres e capacidades, que conseguirmos arder de amor por Deus é algo muito raro, apenas uma ou outra alma mística o alcança, pois cada vez menos se encontram os apoios de ambientes familiares, escolares e sociais propícios, já que a sociedade post-moderna ocidental tende a manipular, desidentificar, despiritualizar e massificar as pessoas. 

Soror virtuosa e mestra de noviças, atribuía o mérito ao Senhor pois «para isto me ensinou este Senhor duas coisas ou ciências, que me servem, e servirão de grande proveito: uma delas foi ler no Livro das Criaturas, onde aprendi a mais alta ciência, que se pode imaginar; a segunda foi fazer conta que aquela era a última hora da minha vida», e assim afirmava, primeiro, o seu discernimento dos sinais e correspondências entre o interior e o exterior, o psíquico e o físico e, segundo, o seu desprendimento do corpo, do ego, da vida terrena, diariamente morrendo em asceses e esforços, em jejuns, vigílias e orações, pelos quais vencia e transmutava a personalidade e o apego ao corpo e renascia para o espírito, para a compaixão e abnegação.
A sua devoção ao mestre Jesus, o seu amor e entrega, foram constantes e, testemunhando o progresso no caminho do amor devocional, caracteriza o subir da meditação algo esforçada, que durou dez anos, para o descanso e gozo da contemplação: "daí por diante se me mudou outro modo de oração, que era como dois amantes que não podem estar um sem o outro. Aos pés deste Divino Mestre e amante aprendi a mais alta ciência que já mais se pode imaginar», explicitando mesmo o que nesta graça unitiva via e o estado ardente com que era agraciada: «Todo este tempo estive vendo coisas, que a língua humana não pode declarar. Eu bem me sentia, mas não podia sair daquilo; e se alguma pessoa fora falar-me, não pudera responder. Vi nesta ocasião a meu Senhor, como uma pessoa que está muito saudosa de outra, abrindo-me os braços e apertando-me com muito amor. Todo este tempo interiormente lhe pedia não quisesse que alguém me sentisse. Saí daquela fogueira divina, como quem sai dum forno ardente: isto tudo foi desde o jantar até que foram nova horas da noite, a qual não pude dormir, porque não se acabou o fogo Divino. Quem o pudera imprimir em todo o género humano.”......

                              

Este estado ígneo do seu chakra cardíaco e de todo o seu ser, pelo amor que sentia e dirigia ao mestre e a Deus, foi bem assinalado ainda quando afirmou então magistralmente: «sempre meu coração está uma brasa viva.... Dois anos há que trago uma brasa viva no coração...»
Dentro desta mesma
linha de grandes místicas portuguesas, uma  outra das nossas sorores do séc. XVII exclamava, "Ay amor, Ay amor", quando sentia mais intensificada a sua devoção divina, na Índia denominada bhakti yoga.


Em 1648, depois de um grande estado de amor unitivo, e já sabendo que em breve iria desencarnar, transmitiu ao seu confessor «que Deus nosso Senhor por sua infinita bondade era servido prometer a todas aquelas religiosas a salvação das suas almas, e que assim mandava as publicasse a todas juntas em comunidade»......
Soror Mariana
do Rosário, com a sua clarividência dos mistérios da vida e ascensão das almas no além, corajosamente e generosamente afirmada em tempos de Contra-Reforma, entrava assim na legenda pura e flamejante das destemidas místicas portuguesas capazes de arrastar no seu fogo muitas almas, dos purgatórios, para as cercanias luminosas e amorosas divinas.
                                                          
Finalizemos com um episódio
bem significativo da sua vida e vidência, a respeito das  festivas e tão apreciadas procissões e da subtil e íntima omnipresença divina. Conta-nos a Soror Mariana do Rosário (e que pena não haver a sua vera efígie e termos de tentar a comunhão cognitiva pelo coração), que estando em união com o Mestre Jesus, ao ver passar no adro da igreja do Convento de São Salvador uma procissão em dia de Corpo de Deus, reparou que o Senhor também participava, e exclamou então espantada:«"É possível que tenha eu a meu Senhor comigo, e que o veja ir ali tão perfeitamente!" as quais palavras foram nascidas da singeleza do seu ânimo e não de dúvida alguma que tivesse em os Mistérios daquele Santíssimo sacramento [acrescenta o seu biógrafo]. Mas o Senhor que em tudo queria satisfazer a sua serva respondeu: - "Mariana, nisso fecha os olhos e crê que muito mais pode fazer a minha omnipotência"».


Glosemos este caso com as descrições indianas dos amores e dança das Gopis com Sri Krishna, na Bhagavata Purana, e lembremos ainda um outro episódio de ubiquidade na vida das nossas sorores,  citado pelo historiador Lino de Assunção, acerca duma freira do convento de Semide que, durante um incêndio, foi vista em vários sítios simultaneamente, ajudando e guiando as sorores mais timoratas.
Sejamos então seres mais ar
dentes no amor à Divindade, ou ao Mestre, que sentirmos no nosso coração, e logo mais corajosos e persistentes na vivência do caminho da Verdade...

[Com cartoons] Até quando o Ocidente apoiará o psicopata anti-russo disposto a matar todos os ucranianos para o seu sinistro ego brilhar? Uma notícia da Tass.com ecoa a desconfiança crescente em relação à idoneidade e exequibilidade dos seus projectos e no fundo dele próprio...

 

Mais de um milhão de ucranianos e 300 mil russos desincarnados precoce e violentamente. Lux, Pax!

«WASHINGTON, 16 de outubro. /TASS/. O chamado plano de vitória do presidente ucraniano Vladimir Zelensky é considerado inviável tanto pelos EUA quanto pela Europa, à medida que a fadiga em relação ao conflito ucraniano continua a crescer, informou o The Washington Post.

                                  

 De acordo com Ishaan Tharoor [um indiano nova-iorquino] colunista do jornal, "o plano de vitória de Zelensky provavelmente estará longe da 'vitória' absoluta que muitos esperavam, à medida que o cinismo e a fadiga se instalam entre os aliados ocidentais da Ucrânia.", [tanto mais que outra frente de batalha mais importante se abriu, a defesa, no Israel genocida, do sionismo da oligarquia mundial detentora da banca, do dólar e do euro, agora ameaçada gravemente pelo BRICS e a crescente desdolarização da economia mundial]

Entretanto, "há um consenso fracturante entre os governos ocidentais acerca de quanto da 'lista de desejos' de Zelensky deve ser concedido." Mas Kiev, na melhor das hipóteses, espera que o Ocidente lhe possa dar o maior impulso possível numa futura mesa de negociações," observa Tharoor. O autor acrescentou que em dezembro de 2022, quando Zelensky foi "celebrado como um herói em uma sessão conjunta do Congresso," apenas alguns republicanos "desdenharam" da recepção que lhe foi dada e das vastas somas de dinheiro dos contribuintes dos USA que estavam a ser empregues na defesa da Ucrânia, enquanto esse cepticismo se tornou um ponto de vista comum à medida que as realidades de 2024 se foram concretizando. Além disso, esta opinião é enfatizada tanto pelo candidato republicano Donald Trump como pelo seu companheiro ou vice presidente, o senador James David Vance [nisto discordando do partido  Democrático, liderado por Biden, Kamala, Pellosi, Obamas e Clintons.]

O conselheiro do chefe do escritório do presidente ucraniano, Sergey Leshchenko, afirmou anteriormente que Zelensky apresentaria um "plano de vitória" na Verkhovna Rada em 16 de outubro. De acordo com declarações de representantes ucranianos, o plano inclui o aumento do fornecimento de armas para o exército ucraniano, ataques com armas de longo alcance no território russo, um processo acelerado para a adesão da Ucrânia à OTAN e o envolvimento de países ocidentais na reconstrução da Ucrânia. Alguns meios de comunicação dos USA e da Europa citaram fontes indicando que a reação dos aliados de Kiev a essas propostas foi bastante discreta. [Pudera, completamente irreais, provindas de um autor, outrora um comediante e agora um autor de filmes de mortandade e terror, tal como está a fazer com Ucrânia e os seus cidadãos obrigados a morrer por ele e a sua clique extremista.]
                                         
 
O irresponsável e vaidoso Boris Johnson é, com Victoria Nuland, um dos principais responsáveis pela mortandade eslava, ao ter pressionado Zelensky para não aceitar o acordo negociado com a Rússia, na Turquia, no início da operação militar...

                                                             

Moscovo criticou repetidamente a chamada fórmula de paz, que está sendo proposta por Kiev, como irrealista e apontou para a necessidade de levar em conta as realidades no terreno. [Mais do que evidente, pois a Rússia nunca mais deixará Donbass a zona resgatada da opressividade extremista do regime de Zelensky (neste momento a exercer o poder autocraticamente, pois está já fora do prazo da sua presidência), por muito que mintam e manipulem os avençados Milhazes, Rogeiro, Cruz, Pontes e Pinheiro...] 
 
O presidente russo Vladimir Putin enumerou as condições para a resolução do conflito, incluindo a retirada das Forças Armadas Ucranianas de Donbass e Novorossiya e a recusa de Kiev em aderir à NATO. Moscovo considera também que todas as sanções ocidentais contra a Rússia devem ser levantadas, e que a Ucrânia se deve comprometer com um estatuto de não alinhamento e livre de armas nucleares.»
 
 
 
 Entretanto porta-voz do Kremlin Dmitry Peskov comentou estas últimas notícias: "Desde há muitas semanas tem havido conversas  acerca dum mítico plano de paz … Muito provavelmente, é o mesmo plano Americano de lutar "até o último ucraniano", que Zelensky disfarçou e chama de 'plano de paz', disse o porta-voz, acrescentando "Não há outro plano" .
O porta-voz
enfatizou que ainda existem possibilidades de uma resolução pacífica, sob condições específicas: "Um plano verdadeiramente pacífico pode existir para a Ucrânia," afirmou Peskov, que "implicaria que o regime de Kiev reconhecesse a futilidade de suas políticas atuais, aceitasse a necessidade de uma abordagem mais realista e entendesse as causas subjacentes que levaram ao conflito em curso".

Removam Zelensky, removam Netanyahu, e os seus sequazes, e as duas guerras terminarão...

terça-feira, 15 de outubro de 2024

Os estados conscienciais post-mortem. Para onde se vai quando se morre? Como nos prepararmos? Breve indagação. Em actualização...

Para onde vão os seres que desencarnam, ou seja, que morrem fisicamente, é uma questão enigmática há milénios, gerando muitos pensamentos e sentimentos, teorias e esperanças, ritos e práticas mas sem  se terem estabelecido até agora certezas claras, seja para os que acreditam piamente, seja para os que têm estudado ou investigado, embora haja excepções, com alguns investigadores do psiquismo a obterem experiências e a gerarem teorizações que, pelo menos a eles e a alguns que as conhecem, os satisfazem mais ou menos plenamente.

Nos últimos anos as experiências de quase morte (near death) têm sido bastante estudadas e embora algo se possa deduzir e generalizar tal serve apenas para confirmar a existência da vida humana, fora do corpo físico, no mundo subtil do além e algumas das possíveis veredas e ocorrências no acesso a certos níveis e seres dele.

As hipóteses principais para a pessoa que acaba de morrer, que desencarna, que abandona definitivamente o seu corpo físico, parecem ser:

1 - Ficar adormecida ou inconsciente, 

2 - Ficar semi-acordada e sentindo-vendo algumas memórias, ou mesmo obtendo algumas percepções ambientais, num estado próximo do sonho terrestre,

3 - Ser levada ou ir para um local de descanso e recuperação, por auxiliares ou guias, e que pode ser mesmo um tipo de hospital, 

4 - Estar bem desperta e poder discernir os guias, e avançar para as  zonas para onde é atraída pelas suas afinidades, seja quais forem, e ditas "boas" e "más", as boas as que corresponderão a planos de mais luz, amor e liberdade de ambiente, movimento e diálogo.

5 - Ser recebida ou encontrar as pessoas amigas ou familiares e reunir-se a elas, conviver, aprender a funcionar no além

6 - Ser encaminhada por elas para a sua zona ou mesmo para a instalação seja numa casa própria, seja 

7 -Elevar-se aos planos já não astrais e psíquicos, mas para os espirituais e divinos, o que acontecerá aos raros seres que ao longo da vida desenvolveram  uma forte, criativa e abnegada realização da sua identidade espiritual e religação divina. E é possível que se possa ir para fora do ambiente aurico e anímico da Terra, passando para mundos distantes...

Que toda esta evolução depende do que se fez, desenvolveu, assimilou, sentiu e realizou em vida não haverá dúvida, embora saibamos como há milhares propostas de trabalho espiritual, de práticas religiosas e espirituais ou então simplesmente de regras para bem viver na Terra e no Além, tanto mais que os efeitos nunca são matemáticos e universais e antes tudo depende bastante do sujeito ou observador, numa rede entretecida de influências recíprocas infinitas.

Admitamos então que alguma vida moral e de serviço foi desenvolvida, bem como uma prática religiosa ou espiritual e que pessoa quando morre já sabe que há uma vida depois da morte, que tem um corpo psico-espiritual com o qual funciona, e que neste ora sente e vê como um todo, a partir de todo ele, ora utiliza certos órgãos subtis mais ou menos despertos, ora funciona com uma réplica do seu antigo corpo físico, com a idade em que se sente...

A pessoa sente com o seu coração espiritual e vê com o seu olho espiritual os seres de luz que lhe são afins, pode ouvi-los mesmo, e seguir os seus conselhos....

Uma questão reside na localização da alma: fica a pairar no espaço, arrasta-se em paisagens próximas das terrestres, ou há casas, moradas para as almas, mansões no além? Vai para um quarto de uma casa de alguém, ou para a casa própria, ou constrói mesmo ela essa casa, numa substância subtil? 

Vive aí sozinha? Com que noção de tempo e de horários? Com que necessidades e obrigações? Com que actividades colectivas seja de educação, seja de serviço, ou ainda de culto, se vai envolver?

Para prepararmos um destino melhor há então que vivermos em amor, sabedoria, justiça e sermos criativos, harmoniosos e  intensificdores da religação espiritual e divina através das consciencializações, práticas e acções que conseguirmos.

Que podemos nós lembrar como adequado de práticas?

1- Orar com regularidade para os familiares e amigos que já partiram.

                                   

 2. Praticar com regularidade a abertura ao Cosmos, aos Mundos Distantes, ao Infinito, e igualmente o desprendimento deste corpo físico, afirmando-nos como seres espirituais e cidadãos cósmicos.

3 - Meditar com regularidade e aspiração na ligação ou comunhão com a Fonte Divina, qualquer que seja a forma com que a  imaginamos ou conceptualizamos. 

4 - Desenvolver a saudação, comunicação e comunhão com o seu anjo da guarda, com os seus auxiliares e mestre e com antepassados e amigos com quem sente mais afinidade e ligação

5 - Estar atento aos sonhos, perceber as suas cenas e imagens simbólicos, discernir os  desejos e carências, afinidades e aspirações que se manifestam, e harmonizar-se e melhorar-se em função deles..


domingo, 13 de outubro de 2024

Da perenidade da Utopia: Antonin Rondelet, "A Minha Viagem aos país das Quimeras". Porto, 1876.

A filósofa Daria Platonova Dugina, mártir na  utopia da Verdade.

Em tempos de grande desinformação e manipulação, de alteração dos sentidos das palavras e dos conceitos,  de  nova ordem mundial e suas agendas semi-opressivas, mais do que nunca é necessário manter-nos lúcidos, informados, cultos, espirituais, solidários  interactivos, escatologicamente optimistas - tal como ensina Daria Dugina Platonova -,  para resistirmos aos opressivos projectos, à marginalização dos mais lúcidos e independentes e ao esvaziamento e perseguição dos conteúdos religiosos e espirituais pois ,sob as capas do aparentemente correcto, científico e eficaz, oculta-se um indiferentismo ético e moral que corta as pessoas das suas ligações verticais, seja às raízes do passado e suas tradições seja aos frutos do futuro  nesta vida, ou no além onde já estão muitos familiares e amigos, e no qual entraremos mais tarde ou mais cedo, mais ou menos plenamente.
Sendo muitas e insidiosas  as formas manipuladores que se exercem na educação, na publicidade, na política e nos meios de informação deveremos, para as discernir e suplantar,   procurar tanto ensinamentos de resistência ou de idealização valiosos do passado, como informações de criatividade e lutas alternativas fidedignas actuais.

Um dos nossos mais valiosos moreanos (bem acompanhado por Pina Martins e Mário Martins), Fernando de Mello Moser. A Fundação Calouste Gulbenkian publicou-lhe os valiosos Dilecta Britannia. Estudos de Cultura Inglesa.
Frontispício da 1º edição de 1516 da Utopia: a ilha e a sua capital Amaurot. A principal personagem é um português dos Descobrimentos, Rafael Hitlodeu. João de Barros na Terceira Década da Ásia: "Fábula moderna é a Utopia de Thomas More: mas nela quis ele doutrinar os ingleses como se haviam de governar".

 
  Um segmento da criatividade humana literária, ideológica, espiritual salvífica ou aperfeiçoante são e foram as utopias, algumas tornando-se célebres  e de leitura constante, tais como a República de Platão, a Utopia de Thomas More (1478-1535), já tão crítica da plutocracia ou oligarquia, e obra irmã do Elogio da Loucura do seu grande amigo Erasmo, que lha dedicou até;  o hermético Rabelais (1490-1553) e a sua abadia de Thelema, onde a única regra era " faz o que queres"; a Cidade do Sol do monge calabrês Tommaso Campanela (1568-1639), discípulo de Joaquim de Fiore e de Guillaume Postel; a Nova Atlântida do monge inglês Francis Bacon (1561-1626); e a Reipublicae Christianopolitanae Descriptio de Johannes Valentinus Andreae (1586-1654), o inventor dos Rosacruzes, de grande sabedoria e harmonia.
                                             
Poderemos ainda invocar o
padre Jean Meslier (1664-1729), um pioneiro defensor da necessidade duma revolução, e cujo Testamento, crítico do Cristianismo corrente ou pregado, foi por Voltaire aproveitado com grande sucesso;  Étienne-Gabriel Morelly (1717-1778), com La Basiliade ou le naufrage des îles fottantes, onde o comunismo e o nudismo se pioneirizam,  e o Code de la Nature; Saint-Simon (1760-1825), o conde comunista, autor Du Nouveau Christianisme, e originador da religião São-Simoniana, já propondo sete horas de trabalho no Verão e seis no Inverno; Charles Fourier (1772-1837), dotado de fabulosa imaginação criativa, com a  Théorie de l'Unité Universelle,  com os seus falanstérios cooperativos e regidos pelas leis da atração, e que valorizava muito as actividades educativas e culturais, fora dos quadros da exploração económica do capitalismo, e que tantos seguidores teve. Outros autores e obras haveria que, tendo o seu momento e época, com o decorrer do tempo foram sendo varridas do conhecimento público e já quase ninguém as relembra, lamentavelmente para eles e nós. De utopias vividas e sofridas, relatadas posteriormente, mencionemos apenas a demanda da Terra sem Mal, dos Tupi e Guarani, no Brasil.
                                     
Modernamente, as obras de George Orwel e Aldous Huxley destacam-se. Entre nós, Antero de Quental desejou uma Ordem dos Mateiros, e Fernando Pessoa, além de uma ressurgência templária, sonhou, pluridimensionalmente, um V Império, que não fosse o sinistro anglo-americano e sionista que tem despedaçado o planeta. Mas ouve outros pensadores utópicos, tal o idealista anarquista António Gonçalves Corrêa (1886-1967), inspirado ideológica e comunitariamente em Tolstoi, no Alentejo profundo.
                                                   
Fora da Europa, destaquemos na Índia, Gandhi, Vinoba e Lanza del Vasto, o fundador da Comunidade da Arca, em França, e que marcou presença em Portugal; Sri Aurobindo e a Mãe, com Auroville, a cidade do futuro inaugurada em 1968, com as suas comunidades e cooperativas, e onde  estive há umas décadas. Entre nós, dada à luz em 2005 (em dois formatos), a Utopia III de José V. de Pina Martins (1920-2010), é muito actual nas propostas concretas de melhoria civilizacional, para o que estava bem preparado pela sua longa convivência com os humanistas sábios (através da sua excelente biblioteca, e não só), académicos e investigadores, enquanto Presidente e vice-Presidente da Academia das Ciências,  director dos serviços de Educação da Fundação Calouste Gulbenkian e antes leitor de Português em França e Itália.
Ora um utopista pouco conhecido  mas pensador valioso, tanto na economia como nas ciências sociais, formado em Filosofia (duas teses sobre conceitos aristotélicos) e Literatura  e que se distinguiu como pensador social, pedagogo, historiador, economista e professor de Filosofia em Rennes, Poitier, Marseille e  durante treze anos, catedrático na Universidade de Clermont, foi Antonin François Rondelet, nascido em Lyon a 28 de Fevereiro de 1823. Viajou bastante para observar as cooperativas (no fundo embriões de pequenas utopias) em França e Inglaterra, muito participou em debates, revistas  e com livros, manifestando sempre funda ética e humanidade,  são cristianismo e pia espiritualidade reformista.
 As sua obras principais são: Du spiritualisme en economie politique, 1860, Du découragement: réflexions sur le temps présent, 1868, Le danger de plaire, 1869, Les limites du suffrage universel, 1871, Réflexions de littérature et de philosophie, de morale et de religion, 1881, La Femme bien malheureuse, 1890.
 Ao desencarnar em 24 de Janeiro de 1893, com 70 anos de idade de valiosos trabalhos e abnegações, a sua sensibilidade empática humana foi enaltecida, por exemplo, por outro reformista social A. Delaire (conforme o cita Cristel Chaineaud),  por ele não ter desenvolvido uma visão economicista estreita e desumana, pois "quer tratasse da moral da riqueza ou da filosofia das ciência sociais, sempre o observador e cristão teve a preocupação de afirmar na economia política o papel do espiritualismo e da consciência, a noção de responsabilidade e dever." Destacou-se ainda no modo como acompanhou nos últimos tempos o notável engenheiro de minas, político e escritor reformista Fréderic Le Play, autor da Reforme Sociale e director da revista com o mesmo título.

Um elo valioso do pensamento utópico europeu, importante de ser retomado face à distopia infrahumanista da direcção da União Europeia...

Entre as suas obras encontramos então uma utopia valiosa e temo-la nas mãos: A Minha Viagem ao país das Chimeras, numa tradução do oficial do exército José Nicolau Raposo Botelho (Porto,1850-1914), publicada no Porto, em 1876, num in-8º de 285 páginas, um ano apenas após ter sido dada à luz em França, o que revela do tradutor certamente internacionalismo e grande amor pela obra ou as utopias, curiosamente sendo o avô maternal da ama, de mim e do meu irmão Francisco, Maria Alzira Raposo Botelho Coelho da Silva, a Cabé, no fundo quem mais ajudou a mãe a tratar do 7º e do 8º filhos:  Luz e Amor Divinos nela e seu avô!

A José Francisco Duque devemos em parte este artigo. Muita luz e amor nele.

O exemplar que consultamos conserva a dedicatória de José Francisco Duque à portuense Sociedade Alexandre Herculano, e contem três carimbos de instituições. A obra é muito bem pensada e o país utópico visitado apresenta vários aspectos de controle  manipulador ou mesmo opressivo, antecipando medidas tomadas modernamente. É obra recomendável para quem tiver mais tempo e se interessar pelo pensamento utópico, nomeadamente no que ele tem de crítico e de exemplar para os nossos dias, quando o Fórum Económico Mundial e a União Europeia tentam implementar uma nova Ordem, felizmente agora muito mais difícil graças à resiliente e sagrada Rússia e ao BRICS, a utopia maravilhosa actual...
Oiçamos alguns
extractos proféticos, pois algumas das medidas criticadas estão a ser de certo modo implementadas actualmente, do tão arguto psicologicamente Antonin Rondelet, de quem nos falta a imagem:
"- Tu com
preendes perfeitamente - disse-me o conde - quanto é importante para os cidadãos d'Egalicité destruir os princípios da moral, e sobretudo tirar-lhe todo o carácter e apoio religioso. Uma pessoa que adora Deus em espírito e em verdade, que se submete sem murmúrio à sua divina vontade, e que lhe agradece com efusão, tanto as provações, como os benefícios, é perigoso para uma república igualitária. A devoção e a fortuna são duas coisas que não lhe convêm. Pensa bem, meu caro amigo, na vantagem, na superioridade que provém ao ser humano do domínio de si mesmo, do desapego das coisas mundanas, da disposição sublime de antepor o interesse dos outros a si próprio. Diz-me, se houvesse liberdade de virtude e de devoção, que seriam os outros seres em vista do virtuoso? Como é que os outros cidadão haviam de resistir ao confronto? Assim a história da Quimérica, que tenho estudado - acrescentou modestamente  conde com um sorrisinho de satisfação - a história da Quimera ensina-nos que o primeiro esforço e a primeira vitória dos verdadeiros republicanos igualitários foram destruir e extirpar por todos os modos possíveis as práticas e as crenças religiosas, a fim de se livrarem da concorrência insuportável da virtude. Como queres tu, Francisco, que se considerem a par na consideração pública este homem de bem, completa e desinteressadamente dedicado ao serviço daqueles a que chama seus irmãos, e aquele ambicioso, que diligencia até explorar os seus semelhantes? Para obter alguma regularidade em um Estado, é absolutamente preciso suprimir esta cultura superior, visto que a sua própria natureza a faz entrar na ordem dos facto excepcionais. Vale bem mais baixar as almas até ao nível mais seguro, e sobretudo mais cómodo, do egoísmo e da indolência, e portanto afastar a religião, que provoca  e auxilia os heroísmos." p. 50.
"Todo o sistema repousa so
bre este princípio: isolar o individuo da família e forcá-lo a viver só, e sobretudo ter cautela em que o passado não legue nenhuma vantagem ao presente, nem nenhuma esperança ao futuro. Então cada indivíduo fica reduzido a uma unidade pura e simples. O ideal seria fazer com que cada cidadão não tivesse outro valor nem outra distinção, senão o número que lhe fosse atribuído." p. 57.
Traduzimos
em seguida alguns pensamentos valiosos das suas Reflexões de literatura, filosofia, moral e religião, Paris, 1881:
"Cada século teve seus autores favoritos que ele estimou e acolheu, em proporção não do mérito que tiveram, mas pelo prazer que lhe proporcionaram.
O sentimento do ridículo não é mais do que uma das formas exteriores do bom senso.
Não sabemos verdadeiramente nada, enquanto não somos capazes de reproduzir e explicar de viva voz o que cremos saber.
Não somos realmente poderosos em nenhuma ordem de ideias, a não ser que estejamos realmente apaixonados por ela.
[Ama o que fazes]
Seria necessário haver de ambas as partes numa conversa, mais vontade de  ouvir e entender o parceiro do que de responder e triunfar sobre ele.
Não ter fé no poder da palavra é não ter fé no poder da verdade.
[Fala a verdade, não te cales quando sentes que a palavra é luz . Se estás na verdade, se o que pensas é verdadeiro, então confia e partilha.]
A leitura apresenta a vantagem de se prestar com igual complacência ao relaxamento de uma mente muito tensa, assim como à reflexão concentrada de uma inteligência muito dispersa.
[Do valor amplo da Biblioterapia. Encontra neste blogue vários artigos consagrados a ela: https://pedroteixeiradamota.blogspot.com/2020/04/dia-mundial-do-livro-de-2020-historias.html ]
A maioria dos grandes génios, tanto na literatura como noutros campos, praticaram essa arte suprema não apenas de criar beleza de primeira ordem, mas também de governar as almas com autoridade suficiente para dar, de certa forma, ímpeto ao entusiasmo e tom a elas.
[Vai-te auto-dominando a par das tuas criatividades]
Os espíritos medíocres podem vangloriar-se dos espectáculos externos, porque não lhes é dado conceber algo mais elevado, mas não deixa de ser verdade que as almas superiores e os espíritos de elite oferecem a quem sabe vê-los um espectáculo ao qual nada pode se comparar.
[Quão raros são os que conseguem admirar a interioridade dos grandes seres.]
A vulgarização, mesmo levada ao extremo, é uma satisfação para o orgulho dos que sabem, um alívio para os que esqueceram, uma necessidade para os que ignoram.
Na literatura, o trabalho fácil não é, no fundo, senão o trabalho sem valor.
[Esforcemo-nos, studium em latim e bem assinalado por Erasmo, é estudo, esforço, e até consagração à república das Letras.]
Em mais de uma ocasião, o que se chama tão maldosamente de falta de inspiração, não é outra coisa senão uma profunda ignorância da questão, ignorância causada pela preguiça de se informar ou pela incapacidade de tratar a questão.
[Trabalhemos, que a inspiração virá.]
A arte de escrever consiste precisamente em introduzir nas composições uma espécie de felicidade contínua.
[Bom apelo a um estado de maior conexão com a dimensão espiritual beatífica, criativizada.]
A leitura representa para um grande número de pessoas, incapazes de qualquer meditação original, o único recolhimento de suas vidas.»
[Logo, leia mais boas obras, para que a sua alma e o mundo melhorem...]

Acredita no poder da Divindade e do seu corpo místico, do Bem, do Amor, da Verdade e, lendo, escrevendo, falando e agindo, luta pelas Utopias libertadoras!