terça-feira, 27 de abril de 2021

Albuns inéditos. José de Beires Junior, 1872. Desenhos, e um anteriano, lançados na barca perenizante dos Fiéis do Amor, com a voz da Teresa Salgueiro.

                                              

                               

                               

Este Álbum desenhado há mais de 170 anos sobreviveu às vicissitudes do tempo e chegou aos nossos dias com oito desenhos cheios de ingenuidade, força e frescura, que caracterizariam o seu autor José de Beires Júnior, que se poderá admitir ter seguido a carreira militar. Pela intercomunicação das coisas e dos seres veio parar-me às mãos e suscitou-me a ideia de o dar a conhecer e simultaneamente fazer chegar até à sua alma alguma luz e amor. Uma música do grupo Madredeus, com a voz sublime da extraordinária Teresa Salgueiro, Ao Longe o Mar, que encontra no fim do artigo, poderá ouvir desde já, até no sentido de recuperarmos mais a perenidade consciencial de tudo o que vale ou que amamos...

Possa muito da arte deste Álbum, já patente nas letras que assim o intitulam, miniaturizadas e esmeradas beneditanamente, e depois nos ingénuos desenhos, estimular-nos a sermos mais criadores e cultores, com amor despertante, da beleza e da harmonia e, portanto, da justiça e da fraternidade humana tão necessárias face a tanta iniquidade e sofrimento  que o imperialismo norte-americano e o neo-liberalismo ocidental  desencadeado no mundo. E assim a desenvolver mais a vontade ou a aspiração do amor, pois  é ela que nos arranca à mediana e tão perecível horizontalidade, tão manipulada ou mesmo opressiva...

De que nos falam os desenhos tão naifs senão do caminho do ser humano, e assim no 1º par de desenhos deparamo-nos com a face de um oficial garboso de capacete emplumado diante de uma criança tímida segurando uma maçã nas suas mãos, qual prece de gratidão,ou símbolo da busca do conhecimento e do amor, que se abre ou desafia a todos. O 2º leva-nos numa fragata com um "P", talvez de Portugal, na vela, rumo à travessia do Oceano, a que todos somos lançados nesta Terra, só aparentemente terra e física pois bem mais vasta e subtil ela é. Na 3ª folha José de Beires Júnior apresenta duas imagens de animus, da alma masculina, a que o seu peito aspirava e no qual se dilatava. Segue-se na 4ª folha  a sua materialização conquistadora no cavaleiro, no corredor ou jokey, aquele que sabe dominar os seus instintos e chegar às suas metas, qual arcano VII no Tarot. Ei-los:




O desenho a seguir ao do cavaleiro, na quinta folha, foi cortado, escapou-se da história e só podemos intuir que nele talvez a Amada, provavelmente ainda ideal, fizesse a sua aparição, mas uma mão incógnita a arrancou da nossa narrativa e da História...

Assim se passa tantas vezes na vida, quando dois seres se podiam constituir em duas páginas seguidas de um livro mas por diversas causas se rasga tal contiguidade de almas afins. Talvez por isso o desenho que se segue é um monumento com um vaso de cinzas, ou como lhe chama José Beires Júnior, um túmulo, ao estilo grego. Quem se memoriza e resgata da Eternidade? Foi alguém que conseguiu realizar que o morrer é ser iniciado, ou seja, que é apenas iniciar-se um novo caminho nos mundos subtis e espirituais?

Para o seu último desenho (e porque não desenhou mais?) José Beires Júnior escreve com a sua letrinha de jovem: "Um eclesiástico considerando as reformas de 1870", ou seja, lendo o jornal Diário Popular.  

Curiosamente na época em que Antero de Quental, com a denominada Geração de 1870, lançava as bases de uma certa revolução moderna das consciências portuguesas, primeiro com as suas Odes Modernas (1865, com a dedicatória a Germano Vieira Meires, e a nota final bem revolucionária, já não presentes na 2ª edição de 1875), depois entrando em polémica com o conservadorismo literário de Castilho e seu círculo, enviando-lhe a sua brilhante carta Questão do Bom Senso e do Bom Gosto e, finalmente, com as Conferências do Casino, realizadas a partir de Maio de 1871, na qual a sua sobre as Causas da Decadência dos Povos Peninsulares nos últimos três séculos, ao originar ataques fortes dos meios  eclesiásticos, obrigou Antero a escrever a Resposta aos Jornais Católicos, que saiu à luz na madrugada de 22 de Junho de 1871  no nº 5295 do Jornal do Comércio, magistralmente justificada assim no 1º parágrafo:  «Respeito todas as opiniões: nenhuma todavia tanto como a opinião dos vencidos cuja fé é superior aos factos que os esmagam, e muitas vezes à ciência que os condena. As opiniões, se vivem muito pelas ideias, vivem tanto ou mais ainda pelo amor e pelo carácter dos que as representam. Considero assim o partido católico. Combato-o, respeitando-lhe a lealdade da crença. Esperava dele a reciprocidade deste sentimento. Não posso pois senão estranhar e sobretudo lastimar o procedimento dos jornais católicos, que para impugnar as conclusões da minha conferência sobre as causas da decadência da Península, recorreram deslealmente a insinuações pérfidas sobre as minhas intenções e a minha convicção, adulteraram as minhas palavras, e me atribuíram opiniões  a que nem de longe aludi. isto tem um nome muito feio, e que eu não quero dar a pessoas que, apesar de tudo me obstino em respeitar.»

Por fim, deixando para atrás a súbita descoberta (já aqui com as fotografias no blogue) de uma possível referência a Antero de Quental e às Conferências do Casino, entramos no último desenho, já não de Beires Júnior mas de um desenhador Marques no qual vemos um homem bem vestido, pujante de vitalidade e empunhando nas mãos dois vasos plenos de flores garridas, qual homenagem ao seu predecessor José Beires Júnior, seja antes a uma amada. Ou será que queria apenas estimular a consciência de termos as flores da nossa alma, bem coloridas e desabrochadas e de oferecermos mais flores a quem nos rodeia ou quem mais merece ou precisa?

Demos graças a José Beires Júnior, a Marques, a Antero de Quental, a Teresa Salgueiro e aos  Madredeus (nesta sua música que nunca mais findará...)  e que a Luz e o Amor brilhem nas suas almas de Fiéis do Amor e da Tradição Espiritual Portuguesa...

                       

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