S. Catarina de Ricci (1523-1590) é uma santa italiana do século XVI pouco conhecida em Portugal, apesar da sua extraordinária vida, reconhecida como de alto valor espiritual pelos seus próximos desde tenra idade, de tal modo que aos 12 anos já estagiava num convento vizinho e aos 16 professava na Ordem Dominicana no convento de Vincenzio, no Prado, onde iria decorrer a sua vida, de noviça a mestra e prioresa, mas irradiando até longe ao tornar-se conselheira e correspondente de reis e fiéis, papas e religiosos, entre os quais S. Filipe de Nery e Santa Maria Madalena de Pazzi.
Beatificada em 23/12/1732, a aprovação da sua canonização ocorreu a 6/10/1744, sendo finalmente canonizada em 29/6/1746, pelo papa Bento XIV, dando origem a festividades celebradas em Portugal sobretudo no convento de S. Domingos em Lisboa, com um oitavário, do que resultou a publicação de duas relações, denominadas Compêndio e Epítome, de autores que a partir das fontes consultadas descreveram a vida da santa de modo semelhante embora com realces diferentes, e ambos aludindo nos títulos das páginas iniciais às festividades sacras no Rossio em Lisboa. Vamos apenas abordar o início da vida espiritual da jovem Alessandrina ou Alexandra (pois só receberia o nome de Catarina ao professar aos 16 anos), e em especial em relação ao Anjo da Guarda e ao Amor Divino...
Em 2º, a capacidade ascética ou de controle das atrações mundanas, desvalorizando-as, não se deixando prender nas ilusões e prazeres sensoriais e sociais.
Em 3º a capacidade de ver, sentir, dialogar com o Anjo ou, se quisermos, merecer tal graça pela sua vida pura, pelo seu amor ao divino, pela sua sensibilidade. Não é por acaso que a tradição popular fala das crianças até aos sete anos verem os anjos, associando até a moleirinha no cimo da cabeça não estar ainda fechada, o que pode estar ligado a uma consciência de um centro de forças no cimo da cabeça nelas ainda muito aberto e que depois com a educação e a vida exteriorizante se vai encerrando e perdendo a sua dimensão de porta de comunhão subtil com os mundos espirituais.
Em 4º, o seu Anjo Custódio ensinar-lhe a rezar a Ave Maria, algo que pode parecer pouco necessário, sendo uma oração tão simples mas não só ela era uma criança, como certamente a ensinava abrindo-lhe a sua visão e sensibilidade interior ao que se pode realizar com tais petições, e como tal poderia ressoar nela.
5ª Contemplando e meditando na vida e paixão de Jesus, a jovenzinha Alessandrina (e terá sido chamada de Sandrina?) despertou tanto o seu centro espiritual cardíaco que ficou desde aí com uma chama acessa permanente, compreensível dada a sua vida harmoniosa e sempre em adoração e acção generosa e compassiva pelo bem dos outros e da sacralidade religiosa, religante, transfigurante...
Na segunda versão da vida de S. Catarina de Ricci, impressa em Lisboa, em 1747 mas tal como a outra não datada e sem nome do editor, quando se celebrava sua canonização, Epitome da Portentosa vida, e milagres de Santa Catharina de Riccis, Florentina, (...); novamente canonizada pelo N. SS. P. Benedito XIV (...) cuja festividade celebram com Oitavário os Religiosos Dominicanos no Real Convento desta Corte, que começa a treze de Agosto de 1747, lemos: «Na nobilíssima cidade de Florença, vistoso jardim da Itália, a vinte e cinco de Abril de mil quinhentos e vinte e dois viu Catarina a primeira luz do mundo, tendo seus ditosos progenitores Pedro Francisco de Ricciis, e Catharina de Ponsano, de nobreza e piedade conhecida. Puseram-lhe na Sagrada fonte do Bautismo o nome de Alexandra. Nas primeiras respirações da sua inocente vida deu logo indícios de uma admirável virtude, sendo todo o seu divertimento naquela primeira idade o silêncio, e oração. Logrou visível a comunicação do seu Anjo da Guarda, que lhe serviu de Mestre na devoção do Rosário; e inflamada com tão suave magistério na contemplação da Vida de Cristo, foi tal o incêndio, que lhe ateou no coração o Amor Divino, que se viu seu amante peito um vivo Mongibello.»
O autor desta última relação, e que diz ter-se baseado nos documentos da Sagrada congregação de Ritos, para a sua canonização (enquanto no primeiro só menciona traduzido do latim por M. F. L., e seria interessante sabermos quem foram), e na parte final, ou Corolário, citando casos miraculoso a partir da vida da santa pelo P. Fr. Filippe Guidos, era alma mais sensível artística, panteísta, e assim na parte que transcrevemos abre-a com o ambiente onde nascera ou terá as primeiras respirações Alessandrina, Florença, chamando-lhe o jardim vistoso de Itália. E discenirá nos efeitos do magistério e da santa conversação com o Anjo da Guarda, uma bela e poderosa correspondência de sinais entre o macrocosmos e o microcosmo: tais conversas e estados unitivos tornaram o seu peito um Mongibelio, ou seja um vulcão, e no caso o Etna, pois como tal se denomina Mongibelio. Um vulcão do fogo do Amor....
Eis-nos com belas ideias e imagens para fortalecermos a nossa relação com o Amor Divino ou Logos, a Divindade, com o Espírito, com Jesus Cristo, com o Anjo da Guarda, e com a nossa alma espiritual, e os próximos, e ainda, mais subtilmente, com o corpo místico da Humanidade e da Igreja onde Santa Catarina de Ricci continua uma luminária, um ser de amor que nos pode inspirar...
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| Voltaremos à sua vida, e às suas cartas, já que deixou extensa correspondência. |































