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sexta-feira, 29 de março de 2024

Sete imagens propícias à contemplação espiritual da Cruz, latina e de Jesus. Sexta-feira santa de 2024.

Este registo num quadrado de 4x4 cm, contendo ao centro um círculo com o Menino Jesus dos Atribulados abraçado à Cruz (ou melhor, com os braços cruzados sobre ela) e com o cordeiro ao ombro e atado por uma corrente, sentado no chão com ar concentrado e sereno, e com duas chamas no interior do coração, nasceu da imagem existente no séc. XVIII, no convento das Religiosas Trinas, no Mocambo, hoje rua das Trinas, na Madragoa de Lisboa, muito venerada e divulgada, e que exortava e inspirava as pessoas a tentarem acolher e cruzar as suas atribulações com serenidade e aspiração de purificação, confiando nas bênçãos da natureza e divinas. Há várias versões, com diversas dimensões e legendas. Esta foi desenhada por Santos e impressa no Porto. Em Lisboa havia-as veneradas na igreja do Loreto e na de S. Roque, além da principal do convento das religiosas Trinas.     Especial devoção tinham a ela os pais com crianças doentes.
Esta cruz latina, de verso e reverso igual, e em xadrez, de delicada feitura devocional, tende a inspirar-nos a subir a montanha da vida, ou a Golgota, ou os montes das nossas paixões e dores, com lucidez e amor, harmonizando ou ultrapassando as discórdias, dualidades e opostos, ligando a Terra e o Céu, nós e a Fonte Divina, em sabedoria e esperança.
Este santinho rendilhado, de manufactura francesa parisiense Rouasse Lebel, de cerca de 1870, com uma alma levando às costas a Cruz, por um caminho árduo e que a levará ao cimo do monte, onde uma representação da alma santificada ou imortalizada se discerne com esforço entrando o portal paradisíaco. A legenda é: "A rota é escarpada mas ela conduz ao céu", e  no reverso contém algumas frases de adesão ao caminho exemplificado por Jesus, ad astra per aspera, e estimula-nos a sermos fortes nas provações.
Tal como os raios das nuvens descem dos céus sobre a Terra e de certo modo a fecundam igneamente, assim da Cruz e do coração ardente de amor do Mestre desprendem-se raios e flores que intensificam o fogo do nosso coração na cruz da vida, e geram flores, fragrâncias e dons de prudência e fortaleza, caridade e sabedoria.  
No Hospital de S. Lázaro, no Evangelho de S. João, o amigo de Jesus "ressuscitado",  e que fora fundado em Lisboa ainda na primeira dinastia, serviam-se e curavam-se os leprosos, e o registo que se vendia, como vemos, fornecia uma versão da cruz de Jesus ou latina bastante irradiante do centro dela, que poderia ser Jesus, o coração, o espírito, e tida como dissipadora do mal. As pontas em trilóbulo assemelham-se a uma chama trinitária. Nas épocas de peste  utilizavam-se mais estes registos ou estampas, sendo frequentes soltos ou inseridos em livros religiosos e de orações dos séculos XVII a XIX. Talvez tenha havido alguns afixados mesmo em portas.

Os Calvários nas aldeias e vilas eram pontos de cruzamento de energias sacralizadoras e dissipadoras do mal e dos sofrimentos. A eles se acolhiam os mais devotos e os mais ameaçados, outros apenas faziam o sinal da cruz ao passarem diante deles, seja por costume, seja para invocarem e recolherem as bênçãos divinas e as traçarem  e derramarem sobre si mesmas. Tinham algo de menhires, de pontos de ligação entre a Terra e o Céu, como Jesus realizara sacrificialmente na Cruz, símbolo sagrado desde a mais remota antiguidade pela sua representação do encontro e concórdia dos quaternários dos elementos, das direcções do espaço, das estações do ano. Estes registos tinham grande aceitação e nas festas religiosas e romarias eram adquiridos a fim de levarem às casas as bênçãos do calvário e da igreja ou santuário próximos.  O Calvário do Senhor, em Gouveia, é ainda anualmente celebrado com grande festa em Agosto. Neste registo do final do séc. XIX um anjo recolhe num Graal o que se derramava da chaga do Lado, a quinta e quintaessenciada chaga, exaltada por muitas místicas e místicos, no lado direito do peito.
 

O amor imenso de Maria Madalena pelo mestre, em vida e morte, e na imortalidade, tornou-se um paradigma para o comportamento religioso e assim ao longo dos século milhões de almas sofreram como ela a morte precoce e dolorosa de Jesus às mãos das autoridades judaicas e romanas em Jerusalém. A aspiração amorosa de comunhão com tal sofrimento, e que o Mestre se manifestasse nas almas, gerou muitas visões, estados extáticos e conversões, e mesmo nos nossos dias muitos religiosos, freiras e fiéis continuam orando pelo coração ao mestre da Paixão e Ressurreição, seja na época pascal seja noutros momentos de maior provação ou aspiração. Mas nos nossos dias a banalização do sofrimento e do mal, sobretudo na Palestina, tem secado bastante este tipo de  devoção aos pés do mestre Jesus.