quarta-feira, 15 de outubro de 2025

A Utopia de Thomas More, por José V. de Pina Martins. Vídeo da tradução comentada do prefácio ao livro. João de Barros e o valor das fábulas e utopias.

 José Vitorino de Pina Martins, em 1983, homenageou Thomas More, publicando em francês Thomas More au Portugal, onde reúne dois estudos, um mais breve do seu amigo Fernando de Mello Moser, intitulado La Très ancienne renomée de More au Portugal,  e outro seu, L'Utopie de Thomas More au Portugal (XVI et début du XVIIª siècle), prefaciando-os com um texto também valioso, que resolvemos lê-lo e traduzi-lo em simultâneo, como pode ouvir em duas partes no Youtube. Muitos outros textos dedicou ele a Thomas More, que se tornou mesmo o seu humanista preferido, logo após Pico della Mirandola, Erasmo, Sá de Miranda e Damião de Goes, mas acabou por ser este em francês o que escolhi para traduzir e acrescentei-lhe alguns breves comentários que me brotaram espontaneamente. 

À introdução de nove páginas, assim lida e traduzida, segue-se  no livro transcrição do texto de Fernando de Mello Moser de nove páginas, onde apresenta os elogios de sete humanistas portugueses a Thomas More, e depois em trinta e seis páginas o ensaio de José V. de Pina Martins. As últimas quatorze páginas contêm textos de Damião de Goes e  Jerónimo Osório, sobre Thomas More, em latim, e traduzidos  em francês. 

Por fim, conclui-se com a defesa do valor das fábulas e utopias  que o historiador e  admirador de Erasmo, João de Barros (1496-1570) teceu no seu culto prefácio à Década Terceira, da Ásia, e que pela sua grande qualidade resolvemos em sintonia com o nosso querido amigo e sábio José de Pina Martins transcrever para este blogue e para a net. até pela afirmação da cavalaria de Amor e da Philosophia Perenis:  «Fábulas são as de  Homero em nome, e argumento; mas nelas vai ele enxertando o discurso da vida activa e contemplativa, e por isso o proémio das Pandectas do Direito Civil lhe chama o Imperador Justiniano pai de toda virtude. E Macróbio diz dele, que é fonte, e origem de todas divinas invenções, porque deu a entender a verdade aos sapientes debaixo de uma nuvem de ficção poética. Fábula é a Ciropédia de Xenefonte; mas nela quis ele debuxar, que tal havia de ser um Rei em o governo do seu Reino, e por isto era este livro o familiar por que [ou onde] estudava Cipião, e Cícero andando na guerra. Fábula moderna é a Utopia  de Thomaz Moro; mas nela quis ele doutrinar os Ingleses como se haviam de governar. Fábula é o Asno de ouro de Apuleio; mas no discurso dele mostra quão brutos animais são os homens que andam ocupados e envoltos em vícios, e fora deles ficam racionais em vida. Fábulas é a multidão das que escreveu o Filósofo Esopo; mas nelas estão pintados todos os afectos humanos, e como nos havemos de haver neles. Fábula é a Tábua do Filósofo Cebes ; mas nesta pintura está todo o processo da vida justa, e perfeita. Todas estas, e outras escrituras, ainda que sejam profanas, e de argumento fingido, quando vão verdadeiras em todas as partes, e afectos, que lhe convém, são muito aceitadas e recebidas de todos os doutos Barões; porque vendo eles com quanto fastio das gentes se recebiam a moral doutrina em argumento descoberto,e grave, ao modo de Platão, e Aristóteles, entenderam que os Escritores, que seguiram este género de escritura tiveram por fim dar na doçura da fábula o leite da doutrina; e por isso quando liam as tais escrituras, lançavam a casca do argumento fora, e gostavam do fruto da interior erudição. Mas escrituras, que não têm esta utilidade de lição, além de se nelas  perder o tempo, que é a mais preciosa coisa da vida, barbarizam o engenho, e enchem o entendimento de cisco com a enxurrada dos feitos e ditos que trazem. E o que é mais para temer, escandalizam a alma, concebendo ódio, e má opinião das partes infamadas por eles. (...)» 

   Fiquemos a relembrar os doutos Barões, designação que nos reenvia para os Cavaleiros de Amor da tradição espiritual perene, europeia e portuguesa, e que devemos continuar e ser, e um dos passos de Pina Martins sobre a Utopia:«Nada impede evidentemente um socialista ou um comunista de ver na organização ideal da Utopia o anúncio maravilhoso dos amanhas que cantam. Os cristãos, mesmo aqueles que se batem mais arduamente pela justiça social, pensam que ela só existe no Reino de Deus, e Thomas More - não enquanto autor da Utopia mas em quanto cristão autêntico - partilhava a fé deles, a ponto de morrer por ela, e o seu martírio testemunha-o. Os que não creem no papel soteriológico da Fé, dessa Fé, mas pensam que a Justiça pode reinar no mundo, esses consideram a Utopia uma previsão dos tempos novos e incluem-na entre os textos percursores duma sociedade perfeita. Também Thomas More, santificado pela primeira Roma, também o é pela terceira pois o seu nome foi glorificado pelos construtores do socialismo soviético.» Nesta linha de pensamento se inclui nos nossos dias o filósofo e geoestratega russo Alexandre Dugin, tal como a sua filha e também ela mártir Daria Dugina.

Possam todos os grandes seres nomeados, doutos barões e sapientes, influenciar e inspirar mais os portugueses e europeus nestes tempos de crise forte do humanismo no Ocidente algo infrahumanizado.

                        

3 comentários:

Anónimo disse...

Parabéns

Paulo Falcão Tavares disse...

Parabéns

Anónimo disse...

Obrigada pela lembrança