Jesus, tentando salvar o mundo terrestre, por Albrech Dürer. |
Este dito metafórico de Jesus contido na recolha das suas palavras atribuída a S. Tomé, realçando o discernimento do que é essencial e o desprendimento em relação ao que é desnecessário, tem paralelos nos Evangelhos, em especial em S. Mateus, cap. 12, onde uma série de metáforas do acesso ao reino de Deus são apresentadas, mas de modos bastantes mais moralistas e projectados para o futuro e um julgamento eventual, perdendo-se assim a dinâmica actual (aqui e agora) iluminadora da opção pelo essencial ou o espiritual, o peixe grande, e o desprendimento pelo acessório, que Tomé nos transmite bem claramente.
S. Mateus, transmitindo tal ensinamento em metáforas muito directas e simples, como (13, 44-46): «o reino dos céus é semelhante a um tesouro escondido num campo que um homem achou e escondeu; e, pelo amor dele, vai, vende tudo quanto tem e compra esse campo. Ou ainda o reino dos céus é semelhante ao negociante que procura pérolas valiosas; e, encontrando uma de grande valor, foi, vendeu tudo quanto tinha e comprou-a», tende contudo a concluir na moralização e adiamento dualístico para um julgamento final, com o céu e inferno como resultados, tal como vemos na parte final, versículos 47-50: « o reino dos Céus é semelhante a uma rede lançada ao mar e que apanha todo tipo de peixes. E, estando cheia, puxam-na para a praia e, sentando-se, apanham nos cestos os bons e lançam fora os maus. Assim será na consumação dos séculos: virão os anjos e separarão os maus dos justos. E lançá-los-ão na fornalha de fogo; ali, haverá pranto e ranger de dentes.»
Pese esta visão de julgamentos exteriores tão duais finais, é visível e claro o ensinamento, e muito actual para nós, hoje tão enredados nas teias manipuladoras dos meios de
comunicação, das redes sociais e da sovrevivência que nos limitam em
tal proporção que muito tempo da vida ou passagem pela Terra torna-se
obscurecedor ou mesmo destruidor para a nossa alma, incapaz de se conhecer e de alcançar o grande peixe ou a pérola, e logo de estar e de agir em amor e sabedoria...
Há então que escolher e colher com mais frequência um certo recolhimento, seja na natureza seja no quarto ou templo, a sós ou em família, para a comunhão espiritual ou divina, ou, pelo menos, a acalmia mental e a oração, a recolecção com o sagrado, seja a invocação e diálogo com o Anjo, o Mestre, a Divindade, em especial na aspiração à religação e harmonia divina e na sensação, escuta e visão interior.
Ou seja, procurarmos estar mais conscientes da dimensão
espiritual da vida e a partir do estado mais sintonizado com o Todo, com o Logos, com a Anima Mundi, sabermos ser e interagir harmoniosamente na pluridimensionalidade do mundo, da sociedade, do meio ambiente.
O grande peixe é pois, de certos modos, tanto o reino dos Céus, o reino do Pai, como a consciência espiritual, o Atman-Brahman indiano, o Tao, e cada pessoa escolherá a linha e designação preferida pela afinidade de tradição ou de tipo de realização…
O
mestre Jesus falou frequentemente diante do grande lago de Tiberíades e
muitos dos seus auditores eram pescadores acolhendo e assimilando com naturalidade
e sensibilidade estas imagens metafóricas vivas. E com os discípulos e discípulas que atraiu, e que não conseguiu pela sua morte precoce preparar melhor, como ele se lamenta, deu-se início a uma das maiores pescarias
de almas de toda a História, claro com poucas delas realizando a pesca do peixe grande, a maioria ficando na conversão de fiéis e no cumprimento de regras, ritos e crenças, mas nem sempre bem, pois os
pescadores e os pescados foram perdendo a pureza, a abnegação, o amor caridade e a aspiração que os deveria
caracterizar, e a arrogância, a violência, a inquisição, a imoralidade manifestaram-se demais...
Assim também cada um de nós, diariamente, recebendo na rede dos
nossos sentidos tantos dados e informações, sugestões e manipulações, tem de saber
discernir muito bem o que e quanto deve acolher ou irradiar, não deixando que abafem ou distorçam a nossa auto-consciência
nem a vivência e orientação justa, natural e espiritual, tal como certas novas ordens mundiais tentam e pelos meios de comunicação difundem...
É pois fundamental ver-se o menos possível dos noticiários manipuladores e ao chegar à noite, ao rever o dia e meditar, e ao sonhar, o ser no Caminho espiritual, o discípulo ou discípula de Jesus, ou dum outro mestre, ou apenas da Bem e da Verdade, deve tentar deitar fora o que ficou de impressões que não interessam, e orar ou rezar pelos espíritos já partidos e pela vida mais harmoniosa no mundo e em si, abrindo-se então (na medida do controle alcançado ou pacificado das suas vagas de substância psíquica), ao essencial, à comunhão do espírito e com o mundo divino, que está nele e acima dele, ainda que tão condicionado e velado pelos estados corporais e da personalidade psíquica, com as suas dores e preocupações, receios e desejos, em ondas e vibrações subtis...
O ensinamento transmitido é pois o do desprendimento, de não andarmos à procura ou a cumprir exageradamente os pequenos objectivos do ego e da vida social, mas de escolhermos e entrarmos mais na corrente da unidade espiritual da vida, pela qual nos alinhamos mais com a essência nossa, dos outros e do Cosmos e agimos mais livre e desprendidamente e, portanto, com mais sensibilidade às específicas e verdadeiras necessidades e prioridades da Vida, o Dharma, a unidade mais luminosa ou em glória da Terra e do Céu, como o mestre Jesus e outros têm procurado impulsionar...
Jesus mostrando o caminho do esforço humano para chegar ao Divino, ao mestre Morya. Pintura simbólica do russo Nicholas Roerich... |
2 comentários:
Sim, nestas redes de mentiras em que andamos e nos perdemos valioso é que hajam seres que procurem dar alimento espiritual, assim como você faz. Mas os tempos estão a mudar e as pessoas querem retomar a sua soberania mesmo...
Graças pela sua compreensão e apreciação, e esperemos que as pequenas contribuições de cada um nós possam ajudar a melhoria do estado social, psíquico e espiritual de muitos...
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