sexta-feira, 7 de abril de 2023

Disse Jesus: "Vim lançar na Terra divisões, fogo, espada, guerra".

O mestre Jesus visto por Bô Yin Râ...

 «Disse Jesus: - Sem dúvida pensam as pessoas que eu vim para trazer a paz ao mundo e não sabem que vim lançar na Terra divisões, fogo, espada, guerra . Cinco, com efeito, serão numa casa, e três serão contra dois, e dois contra três, e o pai contra o filho e o filho contra o pai, e eles estarão de pé como solitários.»


Este dito ou logion 16 do evangelho de S. Tomé  é de uma actualidade imensa, e vem lembrar-nos como a demanda da verdade e da justiça pode ter que esfriar, diminuir ou mesmo cortar, entre pessoas, grupos, povos e governos, os laços de amizade e de paz, e há que estarmos preparados para tal, aceitando tais situações como estados transitórios, mais ou menos necessários.

O ensinamento surge também no evangelho de S. Mateus, ainda que de outro modo, em X, 34: «Não penseis que eu vim anunciar a paz na Terra; não vim para trazer a paz, mas a espada. Vim portanto para causar dissensões e para fazer o homem contra o pai, a filha contra a mãe, a mulher contra o marido. Quem amar o seu pai e a sua mãe mais do que a mim não é digno de me seguir.»

As diferenças entre eles são pequenas, a versão de Tomé não inclui porém a relação discipular, pela qual o mestre, ou o que ele vive e incarna, é mais forte que qualquer outro vínculo, provavelmente porque é apresentada noutros ditos do Evangelho de Tomé, mas que deveremos aqui realçar enquanto assinala o vencer-nos a nós próprios e nossos hábitos e defeitos, na adesão forte e invencível ao mestre e ao estado consciencial mais perfeito ou ungido pela graça divina que ele manifesta e simboliza.

Em Lucas XII, 50-53, encontramos a mesma ideia e imagens, acrescentada com uma importante e flamejante afirmação: «Eu vim trazer o fogo à Terra, e quero que ele arda», fogo de Amor e de Verdade, e não já só a Paz, pois antes há ainda em muitos a necessária ou fatal separação, divisão e luta, antes que consigam libertar-se dos entrelaçamentos limitadores, ou das opressões exteriores, e realizar a Unidade espiritual e divina que ele vivia...

E assim, ao longo dos séculos, e até aos nossos dias, a espada, seja da separação, discussão e polémica seja do esforço,  luta e guerra, não deixou de estar activa. Já quanto ao fogo, se ele sendo o da vontade de Amor pode ser manifestado como luta e guerra, é uma questão complexa e profunda, com muitos pacifistas ao longo dos séculos opondo-seexternamente, pelo que cada ser, caso a caso deverá, discernir a justificação, justiça e necessidade de actos que aparentemente e na realidade são duros ou violentos e têm consequências de sofrimentos mas que se podem compreender como correcções à luz do fim ou resultado futuro superior. Mas, claro, sabemos bem como todos os tipos de conflitos são facilmente prolongados por interesses e ódios que impedem que a espada  desembainhada, discriminante e flamejante, tenha o seu tempo de acção curto e libertador.

Na versão do Evangelho de Tomé, o ensinamento de seguir ou mesmo imitar o mestre, que será fortemente adoptado pelo Catolicismo, nomeadamente com eremitas, padres e monjas mas também pelo simples cristão, por vezes algo desequilibrado ou explorado, surge no sentido de se estar isolado,  livre dos laços e manipulações familiares e sociais e é bem compreensível no ensinamento de Jesus Cristo se pensarmos que ele, como mestre, veio para erguer os seres verticalmente, libertá-los das relações horizontais que os asfixiam ou alienam e devolvê-los à consciência e dinamismo de filhos e filhas de Deus, algo que acontecerá com muitos dos que o seguirão, num devir histórico no qual, como ele terá previsto, ainda assim muitos se oporão a muitos...

É pois um revolucionário, um despertador espiritual a falar e a agir. A História da Humanidade não será mais a mesma, tal como se passara com a vinda de Buda no Oriente, ou depois acontecerá com Maomé nos países árabes, ou o Guru Nanak com os sikhs. A sua impulsão foi poderosa e ainda o é, e embora exteriormente os grandes feitos arrefecessem, no Cristianismo aqui e acolá há sacudidelas, clarões na noite, tais actos de certos fiéis ou cavaleiros do Amor, ou as manifestações humildes e sacrificiais de tanta gente simples em vidas duras e abnegações grandes.

Em verdade, a mensagem dos mestres e de Jesus fermenta eternamente porque dentro de nós se pronuncia a todo o momento enquanto tónica ou essência tanto do nosso ser íntimo como das verdades do mundo espiritual para a humanidade terrena, podendo desabrochar por vezes mesmo em consciência ateias ou agnósticas mas abertas à justiça, à demanda da verdade, ao fogo do Amor.

Poderemos interrogar o "quem está de pé, verticalizado", no dizer e traduzir de acordo com a versão copta do Evangelho:  está-se a falar dos bons e dos maus ou, se quisermos, dos que aspiram à Divindade e tentam realizar generosamente a Sua vontade, ordem e solidariedade, e os que se opõem à manifestação dela e querem uma outra ordem nova, como recentemente se começou a tentar implementar perigosamente, opressivamente pela oligarquia mundial?

Se ao longo dos séculos a luta contra os seres mais imbuídos da luz, verdade e liberdade aconteceu, e se poderá ver tal quase como uma luta entre o bem e o mal, também não devemos cair em dualismos exteriores e culpabilizações excessivas, cabendo-nos primeiramente lutar contra as tendências negativas nossas, ou dos outros próximos, que ferem e que nos rebaixam, sub-animalizam e intensificam o egoísmo e logo o sofrimento dos outros.

Um aviso actual desta mensagem de Jesus na sua perenidade é: as sociedades modernas estão tão mediatizadas e manipuladas e tão sujeitas a uma forma gigantesca e absorvente de desinformação e opressão, que a carga dispersante e obscurecedora que as pessoas recebem impede a maioria delas de conseguirem recolher-se dentro de si próprias ou seja, poucas conseguem esvaziar-se, desprender-se e sentirem-se a si próprias veramente Espíritos individualizados psicomaticamente e nos seus níveis mais elevados ligados à Divindade, pelo que é necessária a espada voluntariosa da discriminação em acção desalienadora e libertadora, harmonizadora e unificadora. 
 
Ícone do mosteiro da Ascensão de Cristo, no Kosovo, Sérvia.

Quanto à expressão usada na época por Jesus do reino dos céus ou de Deus na terra se a equacionamos a uma paz geral planetária, vemos como isso demorará a estabelecer-se na humanidade, pois muitos líderes, políticos, e os que os suportam manipulados ou manipuladores, ainda estão na violência do egoísmo da consciência e responsabilidade negativa nos seus intuitos hegemónicos de manipularem, oprimirem e controlarem a Humanidade e não querem a multipolaridade fraterna, ecológica, espiritual até---

Mas tal estado corrupção e escravização não deve impedir a nossa postura e modo de vida verticalizante, alinhado ou orientado por fins éticos e espirituais e em que de quando em quando nos erguemos mais intensamente unindo Céu e a Terra, o supra-consciente e o consciente, a personalidade e o Espírito santo, comungando com o Fogo divino do Amor que Jesus lançou na Terra, partilhando-o, frutificando-o...

Saibamos pois não desanimar perante os conflitos actuais, ou as críticas e oposições mais violentas que nos sejam lançadas por quem não está de acordo com os nossos posicionamentos ideológicos, ou por quem está cheio de teias de aranha de narrativas oficializadas, e antes com a espada das compreensões, ideias e palavras justas trabalhemos em amor e despreendidamente para dissipar a ignorância, a mentira e o ódio, e fazer, com os mestres e Jesus Cristo (que nestes dias da Páscoa de 2023 comemoramos), que a verdade e a justiça, o amor e a paz se estabeleçam mais na Terra e na Humanidade.

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