domingo, 23 de abril de 2023

Ensinamentos espirituais de Rishi Atri e do seu Atma Bodha Satsanga. 1ª lição do seu curso.


Já foi há uns bons anos, quando tinha 20 anos,   que conheci o instrutor ou mestre francês Rishi Atri e que estive com ele e sua mulher Anusuya em duas maravilhosas estadias de alguns dias no seu centro Atma Bodha Satsanga, na quintinha intitulado La Fleur d'Or, em Neuvy-en-Champagne, França. Ensinava ele o caminho ou realização espiritual através de duas linhas de tradição: a indiana, e mais particularmente a do Kriya Yoga, na linha indo-crística de Swami Yukteswar, Bhupendra Nath Sanyal e Paramahamsa Yogananda, na qual iniciava as pessoas, e a do mestre e pintor alemão Bô Yin Râ, pois era discípulo de um discípulo dele. Bô Yin Râ de quem traduzi recentemente em tiragem privada o livro A Oração, e antes O Livro do Deus Vivo.  Ora Rishi Atri e Anusuya, além de receberem as pessoas individualmente ou em retiros no seu sereno ashram, publicavam trimestralmente ainda Atma Bodha, la Revue du Kriya Yoga,  com bons textos e reflexões e ensinavam por correspondência dois cursos.

Não me lembro ao certo como cheguei a saber da sua existência mas creio que foi ao comprar a obra sua Aperçus sur le Kriya Yoga (voie d'évolution rapide), na Procure, uma das livrarias francesas com mais livros de espiritualidade no cais de S. Michael em Paris, escrevendo-lhe então e ficando a saber da existência de dois cursos por correspondência em 12 lições mensais cada a que aderi, lendo, aprendendo, dialogando, praticando. 

E tendo conservado até hoje tais preciosas "relíquias" (já que eram policopiadas) quase desconhecidas, resolvi resumir, contextualizar e partilhar para o homenagear e para frutificar um pouco o seu ensino e alma nas dez ou vinte pessoas que lerão esta publicação, ou as eventuais seguintes, no blogue.

Entrando directamente na 1ª lição do curso,  de introdução à espiritualidade indiana e à iniciação no Kriya Yoga,  Rishi Atri, depois de citar na epígrafe inicial  Swami Vivekananda numa das suas valiosas passagens, e logo duas páginas depois o seu mestre Sri Ramakrishna Paramahamsa, esclarece que os ensinamentos transmitidos não são dogmáticos mas apenas princípios e indicações a serem confirmados pela experiência de cada um e que visam conduzir-nos à experiência da Realidade última, ou reino de Deus, que está em nós.

É por uma vida justa, amorosa, criativa, e pela persistência ou longa paciência no caminho do auto-conhecimento e da concentração  que se vai criando o estado de calma que permite tornar-nos conscientes do que não muda e entrarmos em contacto com o permanente, com o que está para além da dualidade, o Divino.

Realça a importância de uma prática ou treino de acalmia mental nas três vias de yoga principais,  pois se não há a paz, devido à agitação das vagas de pensamento e preocupações, não se consegue criar um contacto direto permanente com o mestre ou a divindade cultuada devocionalmente (Bhakti Yoga), ou com a unidade do Todo (Jnana Yoga), ou com o plano supramental que permite o vencer-se o pequeno eu através da acção desinteressada (Karma Yoga).

A explicação que é dada das três etapas finais do Raja Yoga, do Patanjali, é:

Dharana: é uma forma de concentração intermitente na qual os pensamentos parasitas fazem ainda erupção ou entrada. 

Dhyana: é uma concentração contínua sem que irrompam pensamentos parasitas.

Samadhi: é a concentração a mais perfeita, onde a noção de actor e de acção desaparece na Unidade. 

Referindo os suportes internos de meditação mais conhecidos, os cinco elementos e o som e a luz, dirá algo importante e que tendemos a esquecer: ver-se a luz ou ouvir-se o som não é o objectivo da concentração, mas sim atingir-se a calma interior, e logo a ligação ao Espírito em si. 

  Aum:   A, U, M...e a nasalação interior em abelhinha...
 Após explicar os tradicionais conselhos quanto ao horário, local e posição mais propícios à concentração, partilha alguns ensinamentos sobre o mais famoso suporte da concentração, o japa ou repetição do mantra AUM, anotando que «mantra é uma palavra ou conjunto de palavras que tem uma significação esotérica e produz efeitos sobre os planos espirituais, e que a letra A simboliza o aspecto criador da Consciência Cósmica, o U o Preservador e o M o destruidor.  AUM que significa igualmente Ishwara, o ser espiritual (seja transcendentes seja imanente) que está sempre para além dos conflitos da ignorância, do sofrimento, etc.... Pela concentração que brota da repetição ou japa, o fiel [do Amor] impregna-se deste estado superior do seu ser, que é o de Ishwara

Dirá ainda judiciosamente que «o Aum deve ser repetido um certo número de vezes, segundo o tempo disponível» sugerindo algo que muita gente se esquece que «um mínimo de um quarto de hora é contudo necessário para se obter um certo grau de calma, e este tempo pode ser sem perigo prolongado à vontade.» E ainda que «este japa ou repetição deve ser executado com convicção, respirando-se calmamente, se queremos tirar efeitos benéficos», recomendando ainda que se recite antes de se começar tal prática alguma oração ou  em especial o cântico tradicional a Brahman, à Divindade.

Concluirá a 1ª lição com directivas gerais conhecidas, tais como sentirmos que os ambientes nos influenciam, e que até reagem contra nós por pessoas que estão contrárias aos nossos desígnios, e que não devemos insistir ou forçar novos aderentes ou crentes, realçando ainda que a fé não é uma crença mole, mas a potência criadora do espírito, que nos ajuda a evoluir, a renascer, a realizar o Ser espiritual e divino.

E dará ainda a explicação dos símbolos da Atma Bodha Satsanga ou associação por ele fundada e que estão na capa, em que vemos ao alto o Aum num círculo (o Purusha, a Consciência cósmica para além da dualidade ou criação) dentro dum triângulo (das três gunas ou características da matéria, satva, rajas e tamas) dentro de uma cruz (a multiplicidade e em que pelo eixo ou trave central nos elevamos ao Eu espiritual).

E em baixo a bela imagem (e da qual D. João de Castro falou), esculpida numa gruta de Elefanta, junto a Bombaim, da Trimurti ou trindade indiana Brahma, Vishnu e Shiva e que simboliza os três aspectos manifestados de Iswara, a consciência cósmica envolvida por Maya, ou seja a ilusão cósmica [material e subtil]. Brahma, à esquerda o criador, Vishnu ao centro o preservador e à direita Shiva, o destruidor [ou transmutador].

Saibamos orar, meditar e realizar a oração da imagem inicial, extraída do Yajur Veda, I,111, 28:  

Oṁ asato mā sadgamaya
tamasomā jyotir gamaya
mrityormā amritam gamaya
Oṁ śhānti śhānti śhāntiḥ

Oṁ  Do irreal conduz-nos ao Real,
Da obscuridade à Luz
Da morte à imortalidade.
Oṁ paz, paz, paz.

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