Estes hinos e aforismos foram gravados no Gerês transmontano num telemóvel, durante duas meditações a meio de duas noite outonais bem frias, em 2021.
Não conheço maior felicidade do que sentir o coração
vivo e procurar entrar dentro dele com certo resultado.
Que felicidade esta de sentir que, ainda que longe, outras pessoas meditam também no Amor divino e tentam entrar no graal do coração.
Que felicidade tão grande é esta de tentar ouvir a voz ou vibração da Divindade em mim. Atman hum om...
Não conheço peregrinação mais difícil do que esta ao coração pois por mais que caminhe ou medite nela e para ele, nunca chego mesmo ao centro, à estrela, ao espírito e apenas o avisto ao longe ou o sinto por momentos.
Esta meditação, esta peregrinação, eterna, é trilhada pelas almas que aspiram verdadeiramente à Divindade, à Verdade da Primordialidade.
Embora muitos meditem ao nascer do Sol, pouco são os
que vêm a Luz interna e sentem o Amor espiritual e divino.
Esta meditação é longa e exigente. Só aquele que é persistente consegue começar a ver despontar a claridade.
Esta peregrinação no íntimo e na vida à luz divina e ao amor divino, ao espírito e à Divindade, é uma alquimia em que o combustível é a aspiração, o fole ou sopro é a respiração subtil e psíquica, que sobe e desce e pela qual a chama do amor à Divindade e do amor da Divindade se intensificam e unem.
Esta meditação, esta peregrinação, ao coração é longa, exige persistente sinceridade pois sendo a pluridimensionalidade do coração quase infinita são muitos os seres, imagens, memórias que vamos encontrar nas ante-câmaras do Templo e ora folhas e ramos secos, ora espectros e preocupações, se erguerão até que por fim, acalmada e silenciada a agitação, o espelho puro e primordial desanuviado permite que as cores luminosas e as bagas vermelhas do amor brotem da árvore sempre verde, azevinho perene.
Aum, Om. Tudo o que diligenciamos fazer ao longo da vida
encontra-se, com os seus meios, vias e instrumentos, potencialmente ou energeticamente, no nosso interior. É através da respiração consciente que nos vamos interiorizando, e é pela ascendente que nos elevamos aos cimos da
montanha, aí onde a visão é mais plena e a unidade do que somos, amamos e contemplamos pode realizar-se.
O amor a Deus pede asas, de aspiração e oração persistente, asas que nos elevem até à estrela do
nosso espírito e ao espírito primordial e Divino. Dentro de nós, mas
também no cosmos subtil e espiritual.
Om. Por vezes nesta peregrinação ao coração ele
surge-nos como um barca, uma barquinha que nos leva ou que nós
levamos nas mãos ao peito. Nele e nesta barca há muitas imagens de quem amamos ou até que não amamos e temos
de desprender-nos delas, e sermos só amor. Para isso, para irmos avançando em maior claridade e transparência, há quem utilize um mantra ou
uma oração fixa, ou a imagem da Divindade preferida para si, e nessa prática obtém resultados luminosos.
Outros recebem os símbolos da própria peregrinação, no aqui e agora e tentam aprofundá-los e senti-los, rumo a maior plenitude do coração espiritual, sincero, redondo, luminoso.
Esta peregrinação ao coração e ao espírito, esta meditação persistente, faz-se com todo o corpo e por isso temos de o bem verticalizar na ligação entre a terra e o céu, de modo a que a respiração suba e desça, tal como a aspiração.
Então por vezes o nosso corpo torna-se a terra,
torna-se penedos graníticos, estáveis, abertos ao ser divino, ao sol divino e às correntes, ventos e aromas que interligam subtilmente tudo o que é afim, como os persas Hafiz e Saadi tanto poetizaram nos que se amam.
Assim o coração vai-se desanuviando para o nosso
olhar interior e a busca do fogo do Sol divino primordial
arde mais e mais luminosamente em nós. E então podemos dardejar tal fogo sobre alguém e ajudar, ou mesmo estreitar em abraço e no amor unificar.
O Caminho faz-se andando, peregrinando, aspirando, sentindo, sendo, realizando a realidade do Divino nos seres e coisas, com coragem, vencendo medos e obstáculos, manipulações e opressões, pois o Caminho é para o Amor verdadeiro e libertador.
Esta peregrinação ao coração nunca
termina pois o coração é infinito e a vida é infinita e vamos
avançando, ainda que estes momentos de concentração e
meditação, tal como a contemplação do nascer do Sol, ou a entrada mais profunda no
coração, tenham um princípio e fim. Todavia, de tais momentos vai resultando uma maior unificação e
fortificação do nosso ser, um rejuvenescimento, uma determinação,
uma claridade maior, a maturação do corpo espiritual com que avançaremos na perenidade da vida...
Possa a comunhão com o espírito divino aumentar em
nós, possa a comunhão com o corpo místico da Humanidade, ou com a alma grupo que nos
interliga, fortificar-nos a nós, à amada ou ao amado, às almas afins, aos que já partiram e mesmo à Humanidade...
Possam os cristais e as flores da nossa alma flamejarem e brilharem mais divinamente.
Demos graças, demos graças, demos graças, Om.
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