segunda-feira, 7 de novembro de 2022

Livros (7º) sobre Sonhos. Marie Coupal, Le Guide du Rêve et de ses symboles. 2004. Apreciação de Pedro Teixeira da Mota.

                                      

Marie Coupal, na sua obra Le Guide du Rêve et de ses symboles. De A a Z, tous les sens de vos rêves, publicada em Ottawa, em 2004, num in-8º pequeno de 567 páginas, embora com alguns optimismos new Age quanto aos mundos e realidades subtis, ou exageros valorativos do Judaísmo e do Cristianismo, no extenso dicionário interpretativo de 500 páginas revela a leitura de Jung, Adler, Freud, além de boa sensibilidade mas, como todos os dicionários, dá várias vezes interpretações muito pessoais, ou imaginativas, ou limitadas a imagens ou símbolos que noutras pessoas teriam ressonâncias, leituras e  causas ou fontes bem diferentes.  Já a Introdução, de 40 páginas, é mais valiosa, embora com afirmações superficiais ou preconceituosas, e com alíneas sobre: Linguagem simbólica e projecção pessoal; símbolos inatos e adquiridos; princípio feminino e masculino; símbolos gerais, cores, aspectos musicais [elevar-nos-iam menos que as cores], arquétipos, dos povos antigos, do alto e do baixo, de palavras inductoras, sonhos recurrentes. Conteúdo manifesto e latente («o sonho desenha as nossas ideias, desejos, concepções, emoções, recalcamentos, obsessões, motivações, complexos e libertações»). Fenómenos   de censura e de repressão. A deslocação, a condensação e a inversão. Personagens simbólicas: a sombra, o animus e a anima. Os tipos de sonhos. Sonhos em cores, e a preto e branco. Porquê trabalhar os sonhos. Para bem analisar o seus sonhos (Possuir algumas noções de psicologia, e Falar dos sonhos e pesadelos). Meditação.

Embora estas quarenta páginas introdutórias,  resumidas acima pelos títulos das alíneas, sejam em geral valiosas, vamos transcrever algumas partes que sendo mais instrutivas são contudo por muita gente ignoradas, embora haja distinções que não se podem tomar à letra como regra geral ou verdade absoluta, tal como a autora tende a afirmar. Vejamos então o mais original:   1º  Os tipos de sonhos. Diferenças entre o sonho mental e o astral:  «O sonho mental é um produto de tudo o que toca as preocupações terrestres: amor, sexualidade, família, profissão. Ele estende-se à matéria e ao tempo. Os que só sonham em branco e negro devem-se questionar, pois estão a conjurar esta zona. Já o sonho astral é um produto de tudo o que nos religa ao cosmos numa comunicação mística, durante a qual o divino desce gradualmente no humano e vem progressivamente apagar o ego. Tal sonho toca o sobrenatural e o que nunca terminará. As suas vibrações estendem-se no espaço». 

Há algum exagero no "Divino descer gradualmente", ou na utilização da palavra já em si tão polivalente de "mística", mas interessa tentar discernir melhor o que ela entende pelo sonho astral, e assim, após explicar que o sonho mental,  nascendo de deduções racionais e preocupações,  utiliza símbolos a partir de experiências do passado, para prever (ou prevenir) e que nos fazem reagir com o ego,  e para afirmar-nos e defender-nos, escreve que já «o sonho astral relaciona-se com as preocupações de crescimento divino em nós. Todos temos a mesma e única profissão, a de nos tornarmos completos e divinos» e para esse reencontro com a Luz e o Divino vamos sendo preparados por lutas e iniciações, em que vamos vencendo o astral baixo e penetrando na Luz, até que o Si (ou Eu pleno) substitui progressivamente o ego, a humildade faz o orgulho render-se e o desprendimento terrestre impõe-se», certamente bons objectivos e ideais na vida e que de alguns modos vamos tentando e algo conseguindo realizar...

 Na alínea do "Porquê trabalhar os sonhos", diz-nos sobre as vibrações que desencadeariam os sonhos: «Nós recebemos constantemente vibrações que são também mensagens. Elas são-nos dirigidas e se queremos não viver  como hipnotizados, devemos aplicar-nos a reflectir, a analisar estas ondas que se transformam em imagens ou em intuições pelo milagre do funcionamento genial do nosso cérebro. É um modo de cessarmos de viver passivamente e inconsideradamente. Nós lembramo-nos dos sonhos se nos interessamos por eles, quando compreendemos que o sonho é uma mensagem que nos diz respeito pessoalmente, então surge um interesse que nos ajuda a memorizá-los». E, sem dúvida, conseguirmos discernirmos se essas vibrações (e logo sonhos, encontros e eventos) são do nosso inconsciente, ou se são do Cosmos, ou se são provenientes de outros seres ou entidades, é tão importante quão difícil, aliás que ela pouco também consegue discernir.

 Da alínea final, "Meditação: um retorno às fontes", à qual se segue ainda uma pequena oração invocadora do Amor universal, transcrevemos como instrutiva uma parte: «É muito importante saber retirarmo-nos pelo menos uma vintena de minutos, conforme o degrau de tensão,  para reentrarmos no nosso Eu universal. Nós compomos o ovo humano que está  a eclodir progressivamente para a Divindade. Somos todos chamados a esta dimensão divina.
O sonho responde aos nossos pe
nsamentos e avaliações quotidianos. O sonho responde ao que questionamos. Essa parte do sonho que é chamada acertadamente o sonho paradoxal permite uma reprogramação do potencial genético humano em cada noite. Saídos do nosso corpo físico, os nossos corpos subtis em crescimento recebem ajuda de conselheiros protectores. No estado de vigília nós compreendemo-los pela intuição. Este fenómeno que permite o diálogo  com a Luz, é o sonho astral, enquanto que o sonho mental é um diálogo com nós próprios e o que nos rodeia.»  

Esta afirmação de que saímos do corpo físico, quando sonhamos ou pelo menos, algumas vezes, é importante de destacar, pois pode significar  apenas que o mundo astral e subtil dos sentimentos e emoções entra mais em jogo ou acção em nós e no sonhos. Mas com a frase anterior, e que sublinhamos, Marie Coupal, posiciona-se numa valorização dos corpos subtis e espirituais dos humanos que podem ser responsáveis por encontros e sonhos, tanto mais que logo no segundo parágrafo da obra escreve que durante as milhares de horas que dormimos durante uma vida, trabalhamos para nós próprios e «viajamos astralmente noutras esferas, noutros lugares e comunicamos a diferentes níveis, e juntamo-nos àqueles que o espírito [melhor dizer, o eu] consciente não nos permite reencontrar por causa do peso das nossas vibrações carnais.»
Já  consagrara dezoito linhas ao sonho paradoxal, quase no início da Introdução, nas "Fases do Sonho", onde é apresentado como a 5ª e última fase de cada ciclo e onde (esquematicamente e creio que em muitas pessoas não sendo assim, sobretudo nas durações), a 1ª seria o período  Alfa e que duraria cerca de 20 minutos, com sonhos; a 2ª fase Theta, estaríamos mais conscientes dos sonhos; na 3ª Delta seria mais profunda, cerca de 20 m, e dificilmente há lembrança dos sonhos; 4ª , a mais profunda e inconsciente, e finalmente a 5ª a do sono paradoxal, denominada R.E.M,  Movimentos Rápidos Oculares,  próxima do estado de vigília, com o coração a bater mais e a haver maior irrigação sanguínea cerebral, durando de 14 a 19 minutos.
Passando as pessoas cerca de 13 a 18% do seu sono, a sonhar, Marie Coupal considera tal tempo muito necessário ao ser humano pois, e nomeadamente no paradoxal, seria verdadeiramente «o local de aprendizagem de novos instrumentos para a psique». Mesmo as crianças nos fetos já recebem as vibrações do invisível que em parte vão gerar os sonhos, e quem está  sofrer ou a lutar, mais sonha. Discutível é a sua ideia que os cinco minutos antes de se adormecer são determinantes na tónica dos sonhos, de tal modo que estes podem ser influenciados, dando para isso certos exercícios de visualizações que dissipariam problemas, sonhos recorrentes ou pesadelos.  
"A sua visão da meditação como um retorno às fontes e origens" , ou "que cada dia é um novo julgamento", nos sonhos, ou que "somos livres de reconhecer a nossa missão de crescer, ou de sermos preguiçosos e continuarmos na indiferença, dando prioridade ao material", quando há o karma e as contas, são certamente afirmações desafiantes. Tal como algumas das contextualizações e interpretações dos símbolos dos sonhos, ou das realidades que neles se espelham, da qual escolheremos o 1º parágrafo de uma das mais extensas entradas, a da Água: « A Água foi a nossa primeira morada, o nosso primeiro toque. Crescemos na água e fomos aspergidos na água como testemunho da fé. Lavamo-nos na água; as Ondinas que ela contém limpam quotidianamente o nosso corpo físico e etérico, e graças à agua que nos bebemos, continuamos a viver». 
Saibamos pois lavar-nos com as cores astrais da água, já que as ondinas dificilmente se conjuram a partir de uma torneira de agua canalizada, ou beber das fontes e cascatas em que elas ainda possam, quais as Tágides de Camões e de Bocage, inspirar-nos...
Uma ondina a dar um anel a um pescador napolitano, por William Turner.

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