Um recente texto (traduzido do orginal inglês por mim) sobre o conceito de hegemonia e quanto ele deve à análise histórica e filosófica do batalhador e co-fundador do partido Comunista italiano Antonio Gramsci (22.I.1891-27-IV.1937) foi dado à luz por Alexander Dugin (7.I.1962), e cremos ser importante conhecê-lo dado o seu carácter tão actual face às subtis máscaras com que o capitalismo anglo-americano e ocidental se disfarça e ao seu excepcionalismo iníquo (seja de impressão infinita de dólares, seja de impunidade judicial para os múltiplos crimes de guerra), oprimindo povos e governos e desgraçando a Humanidade e a Mãe Terra. Um texto breve e iluminante, para podemos discernir melhor a luta hercúlea da Humanidade com tal Hidra.
O que é Hegemonia?
«Se queremos começar a falar de contra-hegemonia, precisamos primeiro de definir o termo "hegemonia".
A hegemonia não é apenas um Estado, não é apenas um poder. Gramsci entende a "hegemonia" como um fenómeno muito próximo do que Lenine entendia por "imperialismo", ou o que hoje se chama "globalização", o "grande reset" ou a "nova ordem mundial". Ou seja, a hegemonia é um fenómeno histórico, ideológico, militar, geopolítico e estratégico complexo.
O próprio conceito de "hegemonia" não foi inventado por Gramsci, foi inventado há muito tempo: foi utilizado pelo antigo historiador grego Tucídides. O termo grego "hegemon" é uma força política que é dominante num contexto regional ou mais vasto. Os estóicos tomaram o conceito de "hegemonicon" para significar o princípio dominante.
A hegemonia de Gramsci é um uso muito especial do termo "hegemonia" que não decorre directamente da análise histórica do uso do termo. De acordo com Gramsci, a hegemonia é uma força que combina história, ideia, civilização, cultura, o militar, o sócio-económico e o potencial industrial. Os gregos nunca incluíram a ideologia no conceito de "hegemonia": a batalha de Esparta e Atenas era para eles uma luta entre duas hegemonias. Mesmo Roma e Cartago, os romanos e os cartagineses - apesar de Chesterton ter tentado, com razão, associar Roma e Cartago à ideologia, de acordo com o dualismo geopolítico - entenderam a sua inimizade como uma luta pelo controlo político.
Mas a ideia de Gramsci é diferente.
A hegemonia não é apenas um Estado, não é apenas um poder. Gramsci entende a "hegemonia" como um fenómeno muito próximo do que Lenine entendia por "imperialismo", ou o que hoje se chama "globalização", o "grande reset" ou a "nova ordem mundial". Ou seja, a hegemonia é um fenómeno histórico, ideológico, militar, geopolítico e estratégico complexo.
O próprio conceito de "hegemonia" não foi inventado por Gramsci, foi inventado há muito tempo: foi utilizado pelo antigo historiador grego Tucídides. O termo grego "hegemon" é uma força política que é dominante num contexto regional ou mais vasto. Os estóicos tomaram o conceito de "hegemonicon" para significar o princípio dominante.
A hegemonia de Gramsci é um uso muito especial do termo "hegemonia" que não decorre directamente da análise histórica do uso do termo. De acordo com Gramsci, a hegemonia é uma força que combina história, ideia, civilização, cultura, o militar, o sócio-económico e o potencial industrial. Os gregos nunca incluíram a ideologia no conceito de "hegemonia": a batalha de Esparta e Atenas era para eles uma luta entre duas hegemonias. Mesmo Roma e Cartago, os romanos e os cartagineses - apesar de Chesterton ter tentado, com razão, associar Roma e Cartago à ideologia, de acordo com o dualismo geopolítico - entenderam a sua inimizade como uma luta pelo controlo político.
Mas a ideia de Gramsci é diferente.
António Gramsci (22.I.1897-27-IV-1937), um mártir da causa libertadora dos proletários e camponeses, e dos cidadãos face à opressão, na Itália de Mussolini. |
O conceito de hegemonia de Gramsci é uma tentativa de isolar um sujeito específico que unifica formas históricas de vida. E estas formas de vida históricas suprimem e subjugam tudo: sistemas económicos, padrões culturais, tecnologia, indústria militar. A hegemonia global é um específico ambiente de vida, é um sujeito que extorque, tritura, assimila, transforma tudo o que encontra pela frente.
Para Gramsci, a hegemonia é o capitalismo, com o seu inerente ambiente cultural, informativo, económico, mediático, militar, político e educacional. A hegemonia é uma forma de ser do capitalismo como um sujeito específico da história. A hegemonia baseia-se numa simbiose subtil dos seus elementos constitutivos. A descolagem de um bombardeiro da NATO, a chegada de uma missão diplomática para observar o "átomo do Irão", uma actuação de Lady Gaga, a oferta de um grande empréstimo do FMI a um país africano em desenvolvimento, a censura do discurso de um filósofo italiano ou russo - tudo isto são elementos de hegemonia. Acha que estamos a falar de questões completamente diferentes? Num caso é uma questão militar, noutro caso é uma questão económica, num terceiro caso é uma questão política, num quarto caso é uma questão cultural. Mas para Gramsci estão todas directamente relacionadas.
Só há uma hegemonia. Os antigos acreditavam que só existe um império. A classe dominante pode mudar, seja ela assíria, grega ou romana, mas um império permanece. Portanto, há apenas uma hegemonia.
Este entendimento fundamental de Gramsci é, nalguns aspectos das relações internacionais, mais profundo do que a metodologia de Carl Schmitt. Eles funcionam bem juntos: quando Gramsci se desvia para o marxismo vulgar, Carl Schmitt pode ajudar com o seu realismo; quando Carl Schmitt fala de forma demasiado cautelosa ou estreita, Gramsci liberta inesperadamente as suas generalizações selvagens. Por isso, devem ser lidos em conjunto - a "direita" e a "esquerda", um par ideal. Esta é a verdadeira ciência política, e uma análise deste tipo nas relações internacionais é óptima e mais completa.»
Só há uma hegemonia. Os antigos acreditavam que só existe um império. A classe dominante pode mudar, seja ela assíria, grega ou romana, mas um império permanece. Portanto, há apenas uma hegemonia.
Este entendimento fundamental de Gramsci é, nalguns aspectos das relações internacionais, mais profundo do que a metodologia de Carl Schmitt. Eles funcionam bem juntos: quando Gramsci se desvia para o marxismo vulgar, Carl Schmitt pode ajudar com o seu realismo; quando Carl Schmitt fala de forma demasiado cautelosa ou estreita, Gramsci liberta inesperadamente as suas generalizações selvagens. Por isso, devem ser lidos em conjunto - a "direita" e a "esquerda", um par ideal. Esta é a verdadeira ciência política, e uma análise deste tipo nas relações internacionais é óptima e mais completa.»
Alexandre Dugin e a sua filha Daria Dugina, recentemente assassinada por agentes do regime de Kiev. Uma perda irreparável para o património cultural e espiritual da Humanidade. |
What is Hegemony?
In order to start talking about counter-hegemony, we first need to define the term “hegemony”.
Hegemony is not just a state, not just a power. Gramsci understands “hegemony” as a phenomenon very close to what Lenin understood by “imperialism”, or what is today called “globalization”, the “great reset” or “new world order”. That is, hegemony is a complex historical, ideological, military, geopolitical, and strategic phenomenon.
The very concept of “hegemon” was not invented by Gramsci, it was invented long ago: it was used by the ancient Greek historian Thucydides. The Greek term “hegemon” is a political force that is dominant in a regional or wider context. The Stoics took the concept of “hegemonicon” to mean the ruling principle.
Gramsci’s hegemony is a very special use of the term “hegemony” that does not follow directly from the historical analysis of the term’s use. According to Gramsci, hegemony is a force that combines history, idea, civilization, culture, military, socio-economic and industrial potential. The Greeks never included ideology in the concept of “hegemony”: the battle of Sparta and Athens was for them a struggle between two hegemonies. Even Rome and Carthage, the Romans and the Carthaginians themselves – despite the fact that Chesterton rightly tried to link Rome and Carthage with ideology in keeping with geopolitical dualism – perceived their enmity as a struggle for political control.
But Gramsci’s idea is different.
Unlike with the Greeks and Romans, the subject of Gramsci's hegemony is not the state. And this changes everything: from Gramsci’s viewpoint, hegemony is a certain force that can be embodied in a state, a bloc of states, or in a political orientation, but this force is more than a state. Historical, fundamental, ontological tendencies are embodied in hegemony. That is, hegemony is constituted by time and determined by its direction. And therefore, it is the network that is the subject of hegemony.
Gramsci’s concept of hegemony is an attempt to isolate a specific subject unifying historical forms of life. And these historical life forms suppress and subjugate everything: economic systems, cultural patterns, technology, military industry. Global hegemony is a specific living environment, it is a subject that extorts, grinds, assimilates, transforms everything it comes across.
In addition, hegemony is also a special economic order. For Gramsci, hegemony is capitalism, with its inherent cultural, informational, economic, media, military, political, and educational environment. Hegemony is a form of the being of capitalism as a specific subject of history.
Hegemony is based on a subtle symbiosis of its constituent elements. The takeoff of a NATO bomber, the arrival of a diplomatic mission to observe the “Iranian atom”, a Lady Gaga performance, the offer of a large loan from the IMF to a developing African country, censorship of an Italian or Russian philosopher’s speech – these are all elements of hegemony. Do you think that we are talking about completely different issues? In one case it is a military issue, in another case an economic one, in a third a political one, in a fourth a cultural one. And for Gramsci they are all directly related.
There is only one hegemony. The ancients believed that there is only one empire. The ruling class can change, be it Assyrian, Greek, or Roman, but one empire remains. Therefore, there is only one hegemony.
This fundamental understanding of Gramsci’s is in some aspects of international relations deeper than the methodology of Carl Schmitt. They go well together: when Gramsci strays into vulgar Marxism, Carl Schmitt can help with his realism; when Carl Schmitt speaks too cautiously or too narrowly, Gramsci unexpectedly unleashes his savage generalizations. Therefore, they must be read together – the “right” and the “left”, an ideal couple. This is real political science, and such an analysis in international relations is optimal and most complete.»
Hegemony is based on a subtle symbiosis of its constituent elements. The takeoff of a NATO bomber, the arrival of a diplomatic mission to observe the “Iranian atom”, a Lady Gaga performance, the offer of a large loan from the IMF to a developing African country, censorship of an Italian or Russian philosopher’s speech – these are all elements of hegemony. Do you think that we are talking about completely different issues? In one case it is a military issue, in another case an economic one, in a third a political one, in a fourth a cultural one. And for Gramsci they are all directly related.
There is only one hegemony. The ancients believed that there is only one empire. The ruling class can change, be it Assyrian, Greek, or Roman, but one empire remains. Therefore, there is only one hegemony.
This fundamental understanding of Gramsci’s is in some aspects of international relations deeper than the methodology of Carl Schmitt. They go well together: when Gramsci strays into vulgar Marxism, Carl Schmitt can help with his realism; when Carl Schmitt speaks too cautiously or too narrowly, Gramsci unexpectedly unleashes his savage generalizations. Therefore, they must be read together – the “right” and the “left”, an ideal couple. This is real political science, and such an analysis in international relations is optimal and most complete.»
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