O Amor nos seres, e em especial entre dois seres, quando tende ou demanda maior plenitude, tem de ser consciencializado como algo bem difícil, raro e frágil, pois são muitas as forças internas e externas, nomeadamente estados de ânimo e seres, que perturbarão ou mesmo se oporão por diferentes causas e razões a tal conseguimento, a tal felicidade, a tal unificação.
Por isso convém compreende-lo bem, e intensificá-lo e aprofundá-lo o mais possível quanto ele brota, ou subsiste, nomeadamente quando se pensa, trabalha e vive para a felicidade e plenitude, seja universal, seja a dois ou em família, prevendo-se e evitando-se o que poderá diminuir, fazer olvidar ou mesmo apagar tal fogo...
Na realidade humana a felicidade do amor, sendo das mais luminosas e intensas, é facilmente abalada pelas preocupações profissionais e de saúde, e já que estamos todos ligados pelos conflitos ambientais ou mundiais e pelas discussões nas redes sociais, podendo ser mesmo invejada e atacada (consciente ou inconscientemente) pelo que devemos discreta mas fortemente trabalhar na unidade amorosa, interna e externa, para nos aperfeiçoarmos enquanto almas na demanda de alcançarmos as metas mais elevadas, íntimas e logo secretas do desabrochamento na Humanidade do Amor, que sendo a força atrativa que mantém o universo em dinamismo vital deve ser mantida bem activa e criativa em cada ser e entre os seres que se conhecem ou que mais se amam, que estão no Caminho ou demanda do Graal divino.
Se a mais conhecida frutificação entre o homem e a mulher é a geração de seres, a que outros níveis que o da procriação física, o amor se quer afirmar, gerar e irradiar? Certamente em compreensões, transformações, influências, resultados e frutificações...
Como se podem orientar as forças do amor entre dois seres nas linhas mais adequadas às elevadas frutificações possíveis, como estarmos atentos a sinais, intuições e resultados por vezes tão subtis e paralelos e não nos distrairmos ou enfraquecermos por dispersões sociais e desconfianças, desânimos?
Fundamental é de quando em quando a auscultação interior, o silêncio, a meditação e em seguida a manutenção consciente de raios e laços entre os amigos, amantes, ou para com os objectivos e metas do Caminho, pois só por esta auto-consciencialização constante é que realmente vamos sentindo o estado do amor presente em nós, as suas forças energéticas e logo as direções possíveis dele se transmitir intensificadamente para o ambiente, o outro ser, para nós, para o mundo espiritual e divino e logo ser sentido mais fortemente, independentemente dos efeitos exteriores possíveis.
De certo modo em nós o amor é a força divina criativa de querer o bem, seja o sumo e divino, seja o de outrem, o nosso, de todos, e é a força harmonizadora por excelência, e portanto a vix curativa, a panaceia de muitos, muitos desequilíbrios, vícios e doenças psico-somáticas. Se cada doente fosse mais amado e amasse mais, haveria poucos...
Ao se abraçarem verdadeiramente em amor tanto despertam como recebem influxos de energia luminosa e amorosa, que podem encher os seus centros de força nervosos, subtis e psíquicos, permitindo-os elevarem-se a estados de consciência mais fortes, serenos e lúcidos, ou seja, para níveis mais confiantes, gratos, felizes de ser, estar, acreditar, lutar e melhorar as consciências e as vidas...
E quando dois seres comunicam pela palavra frente a frente há trocas importantes de energia informção consciência. Mas se elas se tocam e abraçam ou estreitam então podem acontecer alquimias bem maiores, pois é mais fácil sentir e desejar amor para o outro ser com o coração e os peitos de certo modo se fundindo nessa vontade de amor mútua, já que se gera uma intensificação de percepções, além da energia de dádiva e irradiação, entre os dois seres nessa comunhão de espírito e alma, sentimento, pensamento e corpo e que acontece não só nas pessoas mas também delas com o Cosmos, em florações e geometrias de beleza subtil maravilhosa de se contemplar pelo olho interior...
Mas será possível algo mais se passar, no sentido de se religarem ou identificarem melhor com os seus espíritos? Ou de diminuir os egos, os muros separadores, as desconfianças e dependências? Para se verem e sentirem mais na pluridimensionalidade e enquanto geradores de frutos perenes ou pela eternidade a dentro, já?
Certamente, quanto maior for o amor transmitido, a dádiva plena de um ao outro, a vontade intensa de entrega e de fusão recíproca, à aspiração à unidade primordial, mais se irradiam energias subtis que desabrocham ligações ou comunicações entre corpo, alma e espírito, gerando um campo invisível de unidade, que vai amenizando e diminuindo estados de crispação e medo, fraqueza e sofrimento, e intensificando o fogo poderoso do amor nos vários níveis do nosso ser, em especial na nossa mente ou psique que perde assim algo da sua constante carência e conflitualidade.
Podemos dizer que a estrutura mental e consciencial submetida aos influxos de amor ou a estados de unidade, seja da natureza seja de uniões ou até grupos, cede muitas das suas arestas e agitações e tende a tornar-se um campo sereno e unificado, base importante para que depois a meditação aconteça graças à capacidade de maior aprofundamento da paz, devoção e adoração e sobretudo da unidade, a qual sendo sentida a dois ou mais fortemente, seja como desejo ou aspiração, seja como comunhão já presente, gera uma consequente samskara valiosa, ou seja, impressão duradoura e frutificadora.
Pode-se dizer que uma das mais elevadas frutificação da aspiração espiritual e do amor foi aquela que na Índia foi denominada Ishta devata, muito realçada por Ramakrishna e Guru Ranade, e que por exemplo o pintor e mestre alemão Bô Yin Râ, já no séc. XX, realçou também, denominando-a o nascimento do Deus vivo em nós.
Com efeito, quando não é a criança que vai nascer nesse casal ou par, dois frutos mais elevados se podem apresentar potencialmente: o primeiro é a criança amorosa, ou o Amor, que outrora na arte os puti, ou anjos pequeninos, podem significar na sua irradiação, e que nasce entre os dois, e que entre os dois desfere as suas flechas, seja pelo olhar seja apenas pela intencionalidade de alma e os raios do coração.
O segundo fruto é a concepção e aspiração, e posteriormente, o nascimento do Deus vivo em nós, ou seja, a visão, sentimento e adoração do aspecto ou face com que a Divindade se pode manifestar a nós, ou em nós, num processo alquímico lento, em geral exigindo a vida inteira, pelo que teremos de ter paciência e perseverar, dando muitas graças por o amor, o espírito, a visão, a adoração brotarem mais poderosamente.
Muito importante, portanto, e por vezes ignorado, serão no caminho dos buscadores e portadores do Graal, ou nos que desenvolvem uma relação amorosa ou de matrimónio, os efeitos que os estados de diminuição dos egos, ondulações mentais e separatividades vão causar no campo de forças ou na plataforma superior do Amor, aquela pela qual entramos no mundo espiritual e na qual podemos sentir mais a unidade, só que já não apenas com o outro ser mas também com a muito mais difícil, subtil, elevada e ilimitada unidade do mundo espiritual, e seus grandes seres e a Divindade.
Neste caminho criativo espiritual o casal alquímico descobre ora súbita ora gradualmente que o seu labor amoroso e unitivo vai fertilizando ou lucidificando a terra interior, tornando-a húmida e fértil, ou um ventre da deusa mãe onde a semente do amor e da aspiração, prema e mumuksha, na tradição indiana, germina e cresce mais facilmente, e a auto-consciência da presença íntima do espírito e do amor vai desabrochando.
Não é contudo, como já dissemos, imediata a revelação, o darsham divino. Temos de ir trabalhando e aspirando muito, persistentemente, até que mereçamos mesmo conceber no nosso interior as chamas amorosas onde a Fénix divina pode ressurgir nas proporções apropriadas.
A cavalaria do santo Graal é uma tradição de recepção e comunhão com o divino, em que cada meditação é um formar ou ingressar na procissão em que o Graal pode ser avistado, sentido, enchido, proporcionando-nos a comunhão com a Luz divina, o Amor ou até a própria presença indirecta ou humanizada de Deus, a qual pode surgir ou vir pelo mestre, o anjo ou a própria Divindade, imanente...
Possamos nós saber erguer o cálice do nosso coração cheio de amor em aspiração de comunhão com a Divindade e possa Ela no seu Amor infinito presentear-nos com as suas graças e influxos, seja no par ou em grupo, na nação ou na Euroásia ou mesmo no mundo multipolar que finalmente nasce, nas meditações e no dia a dia e suas ressonâncias e sincronias, intuições e graças...
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