Solemnia Verba
Disse ao meu coração: Olha por quantos
Caminhos vãos andámos! Considera
Agora, desta altura, fria e austera,
Os ermos que regaram nossos prantos...
Pó e cinzas, onde houve flor e encantos!
E a noite, onde foi luz de Primavera!
Olha a teus pés o mundo e desespera,
Semeador de sombras e quebrantos!
Porém o coração, feito valente
Na escola da tortura repetida,
E no uso do penar tornado crente,
Respondeu: Desta altura vejo o Amor!
Viver não foi em vão, se isto é vida,
Nem foi demais o desengano e a dor.
Caminhos vãos andámos! Considera
Agora, desta altura, fria e austera,
Os ermos que regaram nossos prantos...
Pó e cinzas, onde houve flor e encantos!
E a noite, onde foi luz de Primavera!
Olha a teus pés o mundo e desespera,
Semeador de sombras e quebrantos!
Porém o coração, feito valente
Na escola da tortura repetida,
E no uso do penar tornado crente,
Respondeu: Desta altura vejo o Amor!
Viver não foi em vão, se isto é vida,
Nem foi demais o desengano e a dor.
Eis-nos com um dos sonetos (ainda que por vezes mal transcrito, tal como n' O Citador...) que melhor desvenda o fundo da alma estóica, espiritual e de amor de Antero de Quental.
Como o escritor e realizador e cinema Pierre Schoendoerffer (1928-2012) disse belamente (e cheguei a saber de cor a frase), há alguns momentos na vida em que, chegados a um alto, paramos e, contemplando o caminho percorrido, recolhemos as razões e forças de continuar.
Extrapolando no Tempo, não me parecerá completamente infundado admitirmos que esta realização anímica de Antero de Quental, transmitida nas Palavras Solenes, e vivenciada efectiva e intimamente num desses momentos singulares de auto-reflexão, ao ser escrita no seu dia de anos em 1884, como registou na carta em que enviou o poema ao seu grande amigo e discípulo Joaquim de Araújo, poderá ter estado presente no momento do seu hara-kiri, da sua desincorporação voluntária, iluminando algum canto alto do ambiente post-mortem, e que portanto deveremos ter sempre presente este memorial-testamento de Antero (tal como no soneto Mors-Amor), de valorizar o amor e continuar a amar acima ou para além de todas as desilusões, traições e sofrimentos que tivermos de penar no percurso por vezes bem agreste da vida, tal como foi bem fixado no dito latino e paracelsiano: ad astra per aspera...
Oiçamos então o poema lido comentado uns ano antes deste prefácio solsticial, pois escrito a 21 de Dezembro de 2024, numa outra ocasião comemorativa propícia à auto-gnose iluminadora do ser e dos caminhos para nova estação luminosa..
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