Raul
Traveira (n. 1924), natural da Figueira da Foz, major do exército, amante e pioneiro da navegação em barcos pequenos, kayaks, a remo, notável pitagórico e rosacruciano, poeta matemático, e ainda amigo convivente
de Joaquim Montezuma Carvalho e de Agostinho da Silva, é um notável português que conheci através de Agostinho da Silva nos anos finais da década de 80, nuns encontros
informais que se
realizavam junto à Torre de Belém, aos fins de semana, e nos quais eles participavam.
Era então uma pessoa de coração, muito bondosa, um ser puro, tal como a sua mulher. Estive com eles também dialogando em Coimbra, na casa onde moravam, lembrando-se o seu filho Eduardo de eu ter trazido o meu tacho de inox e o arroz integral.
Com efeito este seu filho, Eduardo, dirige hoje a Goltziana, uma empresa e marca de renome nos kayak de mar, por eles fundada, no final da década de 70, bem sinalizada na internet e que depois de ter falado comigo me proporcionou hoje receber um telefonema dos pais, com mais de 90 anos e pujantes de alma, sabedoria e amor.
Não está suficiente "imortalizado" na grande biblioteca digital mundial, umas pequenas referências enquanto
dinamizador do Associação Naval da Figueira da Foz, pioneiro dos kayak, e amante da história antiga da Figueira, mais alguns poemas, mas disse-me ao telefone que pensa editar em breve alguma da sua criatividade.
Embora possa ter outros documentos ou apontamentos dos nossos encontros, o facto de ter encontrado
este pequeno impresso e manuscrito leva-me a
partilhá-lo, pois o
conteúdo desta pequena pagela poético-pitagórica e aritmológica é por si só suficiente para merecer divulgação.
Vejamo-la:
«Raul
Traveira
POEMAS
Tese
(Primeira)
Poeticamente
Falando,
É;
matemática
E
geometricamente
Falando,
Musicalmente
Falando,
Verdadeiramente
Falando,
Porque
falando
Poeticamente
Não
se mente
Falando.
******
Sei
um triângulo!
Juro,
Raro,
Tão
puro
Mas
mais seguro
Que
a neve do Kilimanjaro!
******
Graças
te dou
Sol-Amigo
Cristo
Rei,
Porque
sou
Sempre
serei
Garimpeiro
de pepitas
As
palavras infinitas.
******
*******
«O
Teorema de Pitágoras fascinou as antigas civilizações. Acontece
que não há triângulo rectângulo sem ângulo recto.
Ora,
foi por fascinante pressentimento que meu neto João me sugeriu que
calculasse a gematria do apelido Traveira da nossa família, o qual
como se vê coincide rigorosamente com a medida, em graus, do
referido triângulo:
T
R A V E I R A
19
17 1 21 5 4 17 1=90
Com
os votos mais sinceros de que o ESPÍRITO DA FASCINANTE E SANTA
PÁSCOA sempre o acompanhem,
do muito grato amigo,
Raul Esteves Traveira.»
Comentários meus:
Ser que ama a palavra profundamente e a pesquisa e trabalha, Raul Traveira lembra-nos no primeiro poema que a devemos proferir poética, matemática, geométrica, musical e verdadeiramente. Bem simples, mas inegavelmente uma grande arte que exige uma auto-consciência grande e perseverança na sua auscultação e emissão...
No segundo poema, quase mantra ou sutra, e com a sua a pertença à tradição pitagórica pois, tal como eles, jura pelo triângulo, Raul Traveira muito provavelmente partilha uma intuição e visão que terá recebido na meditação: a contemplação do triângulo, branco, puro, qual a neve da alta montanha africana do Kilimanjaro. Talvez uma visão no plano espiritual das formas arquétipas ou primordiais, e que lhe deu uma certeza pessoal de algo, que só ele saberá indubitavelmente, mas que ao ser partilhada, nos poderá estimular a estarmos mais abertos à visão espiritual das formas geométricas fundacionais do cosmos.
Talvez até pudesse dizer no 1º verso: "Sou um triângulo", pois com sua mulher construiu-o, tendo no vértice, e assim dinamizando a circulação da três Graças, seja a Divindade seja cada filho que gerou.
O
3º poema é quase uma auto-biografia concentrada de si próprio: adorador do Sol, do Logos Solar, de que o Cristo Rei será uma
expressão humana. E ser consciente da sua imortalidade de amante da Palavra, do Sermo, Verbo ou vibração do som Amen ou Aum ou Iao, que
depois se infinitiza nas pepitas das palavras com as quais podemos
comunicar, aprender e comungar e muitas ressonâncias encontrar e
admirar.
Como nós fazemos neste momento, graças a ele, e logo dando graças, sentindo gratidão por esta
comunhão com a Palavra, o Som e a Divindade que
as emana
musicalmente, geometricamente, poeticamente, verdadeiramente.
Que tal arte, sensibilidade, capacidade e aspiração se torne mais viva em nós!
O texto manuscrito que me dedicou nessa "fascinante e santa Páscoa de 1988", assinala bem a sua pertença à tradição iniciática pitagórica,
ainda que apenas falando do interesse das várias civilizações por
tal descoberta geométrica de Pitágoras. E marca a importância do ângulo recto,
de sermos rectos, de conseguirmos ligar a terra e o céu direitamente,
confirmando aritmologicamente e pela gematria da correspondência das
letras e números, ser um ângulo recto.
A
final dedicatória mostra-o de novo um cristão gnóstico rosacruz, e
assinalando como a passagem da morte para a vida, da mortalidade
corporal para a imortalidade anímico-espiritual, será sempre algo
fascinante, pelo seu mistério, dificuldade,
santidade e beleza.
Poderíamos aqui mesmo aduzir o dito grego, desenvolvido por Antero de Quental, Joaquim de
Araújo e Fernando Pessoa, "Morrer é ser iniciado", pois embora Jesus
já fosse iniciado, certamente que a sua morte foi uma outra
iniciação e sobretudo para os que o amam, o seguem ou nele se
inspiram, um modelo e imagem de iniciação foi dada: ressuscitar logo, ou em
poucos dias, para a vivência consciente no mundo
espiritual.
Espero visitar Raul Traveira e a família na Figueira da Foz e dialogar sobre as nossas caminhadas e realizações nestes já trinta anos sem nos vermos e desde já o saúdo de coração e com muito amor e votos de saúde e inspirações.
Post-scriptum: Anote-se que anteontem, 9 de Janeiro de 2021, partiu da terra o nosso querido amigo Raul Traveira, com a sua missão certamente muito bem cumprida. Acrescentarei, através do contributo escrito pelo Eduardo Aroso, na página do Eduardo no Facebook, que Raul Traveira «fundou
com Manuela de Azevedo, Julião Bernardes (pseudónimo poético do major
João Repolho) e Eduardo Aroso, entre outros, o GRESFOZ – Grupo de
Estudos Figueira da Foz. Durante cerca de duas décadas o Gresfoz
realizou recitais de poesia e música, tendo promovido edições de poesia
(colecção Ponte). O Gresfoz representou, entre outros acontecimentos e
sem quaisquer ajudas oficiais, a Figueira da Foz e Portugal,
nomeadamente no Centenário do poeta Afonso Duarte (Cáceres, 1984) e
Rosalía de Castro (Santiago de Compostela,1984), tendo participado na I
Bienal Internacional de Poesia, 25 nações,
(Madrid, 1987).»
|Que continue a ser nos mundos subtis um espírito irradiante de luz e de amor e que nos possa inspirar e fortalecer na nossa caminhada ainda na Terra, bem necessitada nos nossos dias de virus, manipulações e opressões, e tão pouco da palavra órfica, pitagórica e rosacruciana, isto é, verdadeira, proporcionada e realizada, que Raul Traveira tanto cultivou e cultuou...