Festejando-se hoje o aniversário de Helena Ivanovna Roerich, pois nasceu a 12 de Fevereiro de 1879, resolvemos homenageá-la com uma pequena biografia, algumas fotografias e da sua vasta correspondência uma carta pouco conhecida escrita em 1943, em que refere o difícil discernimento da demarcação entre as forças da Luz e as das Trevas, da Verdade e da Mentira, criticando alguns grupos da época, e mais especificamente um, o que para muita gente será uma completa novidade, tal como foi para mim (de certo modo), há pouco tempo.
Helena, filha dum arquitecto cuja linhagem remonta a Pedro o Grande, bisneta do marechal de campo Mikail Kutuzov (1745-1813) que derrotou Napoleão, sobrinha neta de M. P. Mussorgsky, foi uma alma bem luminosa, muito dotada intelectual e artisticamente, nomeadamente como pianista Desde muito cedo, sentiu e teve uma ligação com Mestres Espirituais que a guiaram invisivelmente ao longo da vida. Era muito bela, possuidora de uma nobreza e de um requinte elevados. Foi abordada por pessoas muito ricas, mas estava interessada no mundo da beleza, da filosofia e da criatividade, e por isso casou com Nicholas Roerich, na altura um artista ainda pouco conhecido, mas que mais tarde se tornou mundialmente famoso como pintor, viajante e mestre espiritual. Eram seres espiritualmente próximos, as aspirações convergiam para a compreensão e aprofundamento da filosofia, especialmente da filosofia oriental, o conhecimento esotérico, o desenvolvimento evolutivo da humanidade.
Dum casamento muito feliz nasceram dois filhos, George (ou Yuri, nascido em 1902, notável linguista e orientalista) e Svetoslav (1904, pintor - e a ele devemos vários retratos dos pais -, e que casará com Devika Rani, actriz do cinema indiano e bisneta do grande poeta e mestre Rabindranath Tagore. Ambos louvarão muito a escola aberta em que viviam, com orientação sábia da mãe em relação às impulsões e necessidades próprias do desabrochar de cada um deles.
Em 1916 tiveram de partir para a Finlândia, que era então parte da Rússia, por causa de Nicholai ter contraído uma pneumonia, e depois, com a revolução bolchevique de 1917, não puderam regressar a São Petersburgo, e viajaram para a Europa, tendo sido convidados, para partirem em 1920 para os EUA, onde se organizou uma exposição de pinturas de Nicholai Roerich que percorreu muitas cidades com grande sucesso. Mais tarde, em Nova Iorque foi criado, pela primeira vez no mundo, um museu de um artista num arranha-céus, o Masterbuildings, no qual os Roerichs desenvolveram uma grande atividade artística e espiritual: foi criada uma escola artística e pintados muitos quadros, foram atraídos artistas e músicos, foram criadas várias organizações, tão brilhante era a irradiação de ambos. Mas a mola principal de todas as actividades e esforços era Helena. Mesmo na sua obra Nicholai Roerich pensava que sob os seus quadros deviam ser colocados dois nomes, porque Helena sentia subtilmente a combinação de cores e muitos temas eram motivados pelos seus sonhos e visões.
Com grande aspiração pelo Oriente e a Índia, em Maio de 1923 abandonam Nova Iorque e instalam-se na Índia, em Darjeeling, e depois de vários meses de visitas a cidades e locais, que geram muitas pinturas, entre 6 de Março de 1925 e Maio de 1928 lançam-se os quatro numa expedição fabulosa e com bastantes e extremas dificuldades pela Ásia Central, em que chegaram pioneiramente a Lhasa, e em que Helena Roerich, que nunca tinha montado um cavalo, percorreu milhares de quilómetros como a única mulher no grupo de expedição.
Foram recolhidos numerosos achados étnicos, arqueológicos e religiosos, foram pintados muitos quadros (cerca de 500) e os membros da expedição deixaram-nos valiosos diários, para além de que foi durante ela que Helena escreveu o 1º livro do Agni Yoga, a Comunidade, passando por provas tremendas pelo clima frio (e morreram vários dos participantes, humanos e animais) e pela recepção das energias ígneas espirituais cósmicas no seu corpo subtil.
Vemo-los nas fotografias diante da porta da casa, no sopé do monte, virada para os Himalaias, e a poucos metros donde se encontram os restos mortais de Nicholai Roerich (9-X-1874 a 13-X-1947), o denominado Mahasamadhi (onde meditei há décadas com muita inspiração], o grande êxtase ou unificação, a morte que entre nós Antero de Quental, Joaquim de Araújo e Fernando Pessoa bem glossaram na frase: "Morrer é ser iniciado", embora tenhamos de reconhecer que o casal Roerich já em vida estava bastante mais iniciado no conhecimento e realização espiritual, nomeadamente da interacção entre as energias subtis humanas e cósmicas, na base da ética fundamentada nas leis do Cosmos e no desenvolvimento da mestria e criatividade do pensamento e da alma, como energias ígneas, em unidade com o corpo místico da Humanidade, os mestres, santos ou grandes seres e que os inspiraram ou guiaram constantemente, no seu caso o mestre Morya.
Helena escreveu, tal como o marido, vários livros, nomeadamente os quatorze do Agni Yoga, o primeiro tendo sido publicado em 1927, Comunidade, num conjunto denominado o Ensinamento da Ética Viva, e correspondeu-se com muita gente, aconselhando como mestra e a partir da sua experiência, conhecimento e sobretudo realização flamejante subtil (dos raios do fogo cósmico), do que resultaram as suas Cartas, primeiro editadas em Riga em 1940 em dois volumes (legíveis, tal com as suas outras obras, no site do Nicholas Roerich Museum): e por fim já todas em cinco volumes, no final dos anos 90, apenas publicados em russo.
Em 1948, após a morte de Nicholai Roerich, partiu com o seu filho Yuri, ou George, primeiro para Delhi e depois para a zona mais fresca dos contrafortes dos Himalaias, orientais, em Kalimpong, onde realizará a grande transição em 5 de Outubro de 1955, sem ter conseguido que o governo soviético autorizasse o seu retorno, cabendo aos seus filhos George e em seguida Svetoslav (com quem me correspondi duas vezes) levarem o espólio da família, com centenas de quadros e muitos materiais preciosos, das suas viagens para a Rússia, George ou Yuri, primeiro, e impulsionando uma importante escola russa de orientalistas. Há ainda bastante material para editar proveniente do génio de Helena e da inspiração do seu mestre Uchitil Morya.
Há actualmente na Rússia muitíssima gente e muitos grupos, nomeadamente no muito recomendável VK.com (e devo agradecer a Helena Levintova algumas informações aqui acrescentadas), que gostam e estudam os ensinamentos, inspirados no seu mestre Morya, com quem aliás Nicholai Roerich a pintou mais de uma vez. Anote-se que alguns discípulos do casal geraram escritos espirituais de boa qualidade, tais como os de Boris Nicolaevich Abramov (1897-1972), com as suas Facetas do Agni Yoga, em que afirma ou elogia poderosamente Helena Roerich como a Mãe do Agni Yoga, pelo seu trabalho com o Fogo Cósmico, havendo ainda actualmente quem mantenha a ligação bem viva.
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A Mãe do Mundo, o Princípio Feminino da Divindade, com o casal Roerich em baixo. |
Leiamos então uma carta muito forte, e inesperada para muita gente...
«"A força das trevas é a antítese da Luz, e não há pontos de contacto entre elas.
São precisamente as forças das trevas que usam todos os meios para se infiltrarem num empreendimento nobre e o destruírem.”
Muitas pessoas ingénuas acreditam que as forças das trevas actuam apenas através do mal, da devassidão e dos crimes. Como estão enganadas! Apenas os seres grosseiros e as forças de graus inferiores agem dessa forma. Muito mais perigosos são aqueles que se apresentam sob o disfarce da Luz. Já conheceis um exemplo disso. Na América, existe uma Sociedade muito extensa, e a sua líder recebe os ensinamentos de um professor que não revela o seu nome, chamando-se Irmão Tibetano. Nós sabemos quem se esconde por detrás deste pseudónimo. O seu poder é grande. E o objetivo deste mestre, personificando o chamado mestre da Fraternidade Branca, é atrair para as suas fileiras o maior número possível de pessoas decentes e úteis, que poderiam ajudar eficazmente o Grande Plano dos Senhores, o Plano para a salvação do planeta. E os infelizes, enganados, sem o verdadeiro discernimento das luzes do coração, voam para o fogo negro que os consome como mariposas.
A ignorância, a falta de auto-conhecimento, leva-os ao abraço das trevas e priva-os por muito tempo, senão para sempre, da influência benéfica e da atração dos Raios da Grande Fortaleza de Luz. O Armagedão é formidável, pois as forças das trevas estão a lutar pela sua própria existência; o desespero torna-as tão unidas e persistentes em alcançar o seu objetivo. O Príncipe deste Mundo tem muitos cúmplices talentosos, conscientes e inconscientes, e é ingénuo pensar que eles não podem agir subtilmente. Eles são muito sofisticados e inventivos e actuam de acordo com a consciência das suas vítimas. Mas são todos desprovidos de calor no coração.
Tenho livros deste professor tibetano, e são extremamente secos. Um deles chama-se Tratado de Magia Branca. Diz-se que as melhores páginas são emprestadas dos Ensinamentos da Irmandade Branca. É interessante notar que o chefe desta Sociedade, por causa do seu próprio prestígio e para atrair apoiantes dos nossos livros, recomenda-os aos seus membros e estabeleceu aulas para estudar os livros de “Agni Yoga”. Assim, na Terra, a escuridão se entrelaça com a Luz. A teia das trevas é tecida por mãos hábeis.
Também vale a pena notar com interesse que os condutores de uma Sociedade tão extensa são simultaneamente parte da polícia secreta ao serviço de um determinado estado.»
Elena Ivanovna Roerich. Cartas, em 9 volumes. Vol. 2, p. 55. Centro Internacional Roerich.
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De Helena se escreveu neste aniversário: "Extraordinariamente bela, refinada, encarnava as melhores caraterísticas de uma mulher russa: dignidade, bondade, misericórdia, altruísmo, e foi o coração da família bem como a mentora principal e a confortadora."
"Необыкновенно красивая, утонченная, воплотившая в себе лучшие черты русской женщины: достоинство, доброту, милосердие, самоотверженность, она была ее сердцем, главным наставником и устоем."
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