Na Casa Sommer, da Fundação D. Luís I, em Cascais, realizou-se no dia 18 de Junho a apresentação do livro
Timor anos 30, de Maria da Conceição Valdez, e realizado em co-autoria comigo. A autora apresentou também a 3ª edição de um outro sua obra Com Timor no Coração - Livro de Genealogia da Família Valdez Ferreira, a qual foi apresentada pelo historiador João Aníbal Henriques, conforme a fotografia.
Edição original foi então Timor anos 30, baseado nas fotografias que o seu avô Artur dos Santos Ferreira captou durante os quatorze anos em que esteve como 2º sargento e chefe de posto em seis circunscrições administrativas timorenses, tendo-as eu contextualizado em algumas páginas, sendo natural que numa 2ª edição da obra sejam ampliadas.
Coube ao major, historiador e sub-director do Arquivo Militar Joaquim José da Cunha Roberto (na imagem acima) traçar a biografia do notável militar, que veio a servir ainda na Metrópole e em Goa, e que era um dinâmico e convivial português, muito dotado artisticamente para trabalhos manuais, ginástica, direcção da juventude, para além de competente autoridade administrativa, sendo assim louvado mais de uma vez pelo seu zelo competente e capacidade de dedicação.
A minha intervenção, na fotografia perante a selecta assistência, acerca de alguns aspectos da espiritualidade timorense, decorreu sem qualquer tipo de plano e foi gravada na sua parte inicial, tendo merecido calorosos aplausos, como todas as intervenções anteriores e posteriores, já que a Dra. Maria Angela Viegas Carrascalão, antiga ministra da Justiça, e neta de um dos heróis do livro, Manuel Carrascalão (tal como o Liuray ou regente de Alas D. Carlos Borromeu), fechou a sessão com breves palavras de agradecimento ao avô Artur dos Santos Ferreira e à neta Maria da Conceição Valdez por terem conseguido ressuscitar memórias tão valiosas, que certamente lhes trarão bons frutos, reafirmando o forte sentido mágico de Timor.
Edificadas com formas especiais, muito ornamentadas com símbolos auspiciosos femininos e masculinos, e telhados e traves especiais, consideradas hoje património protegido, foram ao longo dos séculos a alma mater de famílias e povoados, quais templos de aldeias nos quais ou diante dos quais se realizam as principais cerimonias e festividades da vida .
Talvez possamos introduzir brevemente em seguida a visão cosmológica espiritual da generalidade dos timorenses, ainda que hoje a população seja quase 96% católica (numa religiosidade bem sentida e que foi essencial para a resistência à Indonésia islâmica), e ainda que as designações variem conforme as línguas: no nível mais elevado está a Divindade ou Ser Supremo denominado Naromak, cuja raiz poderá ser "esplendor", ou Akai, Dato Geme, Uru Uatu, Usi Nena. Um segundo nível com os espíritos celestiais ou terrestres, que podem ser apenas espíritos da natureza, e o 3º nível por fim os ancestrais e os mortos. Ora a grande maioria das preces e orações, parecem dirigir-se a estes espíritos ancestrais, que se admitem estar ou em planos subtis do Universo ou habitarem mesmo as Uma lulik que são então casas de espíritos. Faltam-me o contacto in loco, com as casas sagradas e os timorenses para sabermos se, por exemplo, eles vão meditar ou orar, para serem inspirados por tais antepassados ou guardiões da aldeia ou grupo familiar.
Vivendo numa ilha, e logo rodeados pelo imenso oceano, e com vegetação e fauna grande e próxima, podemos pensar que os timorenses adoptaram comportamentos de adaptação sensata com alguns animais, os quais foram então investidos de qualidades como seres ancestrais ou tabus, e estão no caso o tubarão, o crocodilo, a cobra, o lagartixo e através de tal parentesco procurarem criar uma relação amistosa e suplantadora dos perigos que tais animais causariam, dando-lhes essa capacidade de terem arquétipos, guardiões ou ancestrais que apaziguariam os animais e que dialogam com o ser humano, remetendo-nos para a longínqua ou para uns mítica época em que os animais falavam, ou melhor dito, em que os homens conseguiam comunicar com os animais, entender a famosa linguagem das aves.
Terminemos com o tais, esse pano ou faixa de algodão entretecido, nas suas belas cores naturais, pelas mulheres timorenses em teares de madeira, tendo neles desenhados símbolos antropomórficos e naturalistas auspiciosos, e que desde há muito é talvez o principal símbolo (a para da Uma lulik) da habilidade manual, do amor, da estética, da convivialidade e da sacralidade da cultura timorense, tão presente em tantos momentos de celebração, e que vai na capa do livro Timor anos 30, invocando-o sobre os nossos ombros e sobre Timor, qual manto, xaile e veste de harmonias e psico-morfismos benfazejos.
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