domingo, 29 de agosto de 2021

Da escrita íntima e perene das nuvens e do Amor.... Ao pôr do divino Sol, de 29-VIII-2021....

Por vezes uma só nuvem incendeia de tal o modo o céu e a consciência, que manifesta mais o Amor que muitas palavras, promessas e discursos...
Quantos de nós aspiramos a estar e a voar nas labaredas do Amor e, como as gaivotas, nos lançamos ao ar, ao mar, ao amar?
Felizes dos seres que sabem estar e ser, plenamente e de corações abertos e gratos, conscientes da sua auto-consciência e do que emanam no campo unificado universal...
Entrar mais dentro do coração espiritual, do fogo do Amor e do Ser, é a obra prima da Vida, num estar atento e criativo perseverante...
A demanda da Verdade e da Justiça, do Amor e da Divindade espelha-se e desafia-nos nas nuvens...
As letras e escritas íntimas que no Coração e suas telas e nuvens vamos escrevendo ou desenhando poucos discernem, intuem, sentem...
Esta nuvem, tão fugaz mas quão ardente, atravessou os céus e aqui se perenizou para os que, apesar de tanta violência, mentira e opressão, ainda acreditam e querem o Amor e a Fraternidade, o Espírito e a Divindade e agora a acolhem nas suas almas e neurónios, no graal ou jam-e jam do coração, e se fortalecem e expandem na unidade desta comunhão...

sexta-feira, 27 de agosto de 2021

"Despertador Quotidiano", da Soror Thomazia (Tomásia) Caetana de Santa Maria, lido e comentado em vídeo.

                                       

 No ano da graça de 1758 saía à luz benigna de Lisboa, ainda fendida, ensanguentada e turvada pelo terramoto do 1º de Novembro de 1755, um opúsculo poético de quatro folhas, da oficina de Pedro Ferreira, impressor Real, intitulado Despertador Quotidiano.
Constava de um poema proémio e de um soneto, este glosado quatorze vezes em oito versos, tendo ainda no fim um soneto de António Correia Viana, "em aplauso da discretíssima autora, a reverendissima Madre Soror Thomazia Caetana de Santa Maria", natural de Lisboa mas religiosa no Real Convento de Santa Cruz de Vila Viçosa.
O folheto fora custeada pelo seu pai, o médico cirurgião Manuel de Mira Valadão, e levava o aviso no frontispício, quem sabe afastando importunos pensamentos ou censuras contra a jovem sóror que das profundidades do Alentejo deplorava a decadência e vaidades de Portugal considerando um castigo da Providência divina e elemental o terramoto que abatera a capital do reino.

O Despertador Quotidiano, como seu nome indica, visa despertar as pessoas para o Amor divino e para uma vida mais luminosa, ou seja, humilde, pura e contemplativa, e funciona quase como um exorcismo ou uma litania de poesias mantricas estruturadas a partir de um proémio e de um soneto que é glosado quatorze vezes em oito versos, em todas se referindo o lastimoso sucesso ocorrido pela braveza dos elementos, a qual é atribuída a um castigo divino.

A obrazinha é hoje rara, com mais de 250 anos e resolvemos lê-la e comentá-la brevemente.

                        

Depois de tal gravação consultamos a Biblioteca Lusitana, onde Barbosa de Machado informa que ela nascera a 7 de Março de 1719, sendo sua mãe Josefa Maria. E que «recebeu o hábito eremítico de Santo Agostinho no Convento de Santa Cruz de Vila Viçosa a 29 de Setembro de 1731, e professou solenemente a 15 de Outubro do ano seguinte. Por ser dotada de génio feliz para a Poesia, publicou...», seguindo-se os títulos de algumas das obras dela....

                                
                 Imagem de uma religiosa da sua época,  conventual no Alentejo. 

Entrara na religião muito cedo, com treze anos, e aos vinte e quatro anos começara a dar em letra de imprensa, e certamente antes em manuscritos, e facilmente imaginamos a soror Tomásia a conseguir harmonizar a sua vocação poética com a consagração religiosa e o tempo disponível na sua cela.
Como era ela, na face e na alma, como foi o seu noviciado, que forças instintivas nela lutaram, que devoções germinaram, já é bem mais difícil deduzirmos ou intuirmos mas, pelo conteúdo das suas obras, constatamos que discernia bem a mutabilidade do mundo e  atrevia-se tanto a rebelar-se contra as mortes de pessoas valiosas, como também a considerar as desgraças naturais como ordenadas pela Providência divina, algo que na época o Marquês de Pombal e o seu círculo iluminista ou mais esclarecido não gostavam ou admitiam. Todavia, conseguiu  publicar cerca de vinte e três obras pequenas, dedicadas a pessoas importantes da corte e da província, talvez por o seu pai ser cirurgião e para receber mais protecções e leitores. 

Em 1993, a investigadora Isabel Morujão dedicou-lhe uma valiosa comunicação, Entre o convento e a corte: algumas reflexões em torno da obra poética de Soror Tomásia Caetana de Santa Maria, baseada na leitura das suas vinte e três publicações (constatando ainda como sinal de aceitação pública a existência de mais de uma versão manuscrita de algumas das suas obras), onde analisa  aspectos do diálogo entre a corte e o claustro, nomeadamente através do paratexto da publicação (os elementos constantes no frontispício, dedicatórias, poemas, licenças, censuras, etc.)  e a sua diferença em relação a outros de religiosas da época, comprovando ou reforçando o que dissemos: em todas as obras (menos uma) é o pai médico que apresenta a obra à Mesa Censória e que a custeia. Observa ainda como as dedicatórias escritas por ela e  dedicadas a pessoas importantes estabelecem essa teia de apoios, elogios, protecções, algo menos visível nos poetas que ela glosa ou que a poetizam, por serem de pouco reconhecimento posterior.
Isabel Morujão considera ainda como a melhor obra de Tomásia Caetana este Despertador Quotidiano, que precisamente possuímos, e que lemos e comentamos no vídeo sem saber da autora mais do que nas oito páginas da obra está escrito. Das três obras que li posteriormente talvez a que mais apreciei seja contudo as Saudosas expressoens de hum reverente, e obsequioso affecto na sensivel morte do desembargador Luiz Borges de Carvalho, de 1753, hoje digitalizada na web, e onde, depois de pedir na dedicatória a protecção de um Mercúrio, para não ser um Ícaro a cair dos céus, caracteriza muito bem rítmica e psicologicamente o magistrado justo.
Ora se ouvirmos o Despertador Quotidiano e entrarmos nele com uma hermenêutica não só religiosa mas também espiritual talvez se possam acrescentar alguns dados sobre a autora (certamente bem diáfana para nós no séc. XXI), quase que "acusada" de fazer entrar o amor profano no sagrado, ou usar a linguagem do sagrado em domínio profano, numa "contaminação discursiva".
Quer-nos parecer porém  que Tomásia Caetana tinha uma visão mais unificada desses dois aspectos, ou seja, no amor ao amado ou amada humano, expresso por exemplo num poema-dedicatória a um casamento, pode estar a amar-se o amado divino, ou mesmo o Amor em si. Esta unidade omniabrangente do Amor é importante de se compreender e realizar, em vez de se considerar falta de respeito, abuso e intromissão do profano no sagrado pela apropriação da sua linguagem...

                               

Também se pode destacar nesse seu Despertador Quotidiano, a trindade final do Proémio: "Gosta de Cristo a pureza/ Vê de Jesus a fineza,/ Escuta de Deus a voz", na qual, realizando-se uma hermenêutica mística, contemplamos e realizamos, numa entrada aprofundante no templo da nossa alma, o Cristo que é o Logos ou Inteligência Universal divina, a fineza ou gentileza do Jesus ser humano e, mais íntima ou importante, a audição da voz de Deus, no saber fazer o silêncio e no receber orientação, no nosso interior.
Curiosa ou propositadamente, soror Tomásia Caetana, vai replicar o ouvir na glosa final da sua obra, pedindo ao doce Pai que abrande seus rigores e que abra os ouvidos aos nossos pedidos, e nisso seguia o seu mestre Jesus de quem aprendera o "Pedi e ser-vos-á dado".
Poderiam alguns mais ortodoxos ou até inquisitoriais levantar as sobrancelhas a tal ousadia de uma "pirralha", que só teria em seu abono ter-se sacrificado pela religião desde a tenra idade dos doze anos e ser poeta sensível: o querer aconselhar o Pai a ser mais doce...
O poema todavia passou, quem sabe se graças à dimensão elevada, misteriosa e amorosa do Pai, de Jesus, tão diferente do ciumento e vingativo Javeh do Antigo Testamento (que por isso mesmo foi tão ridicularizado por Guerra Junqueiro e Fernando Pessoa), e chegou aos nossos dias, onde ainda tem encontrado almas ressoantes, como a Isabel Morujão e eu, que tentam ouvir sua palavra e voz ou sermo de soror poeta portuguesa do século XVIII, que em 1766 era declarada como a escrivã do seu convento, por seu pai, no frontispício das (por ela) compostas Queixas da Saudade na falta do Sereníssimo Senhor D. Manoel Infante de Portugal, aonde escreve «ponderando-se a circunstancia de nascer, e morrer Sua Alteza no mesmo dia; porq[ue] nasceo a 3 de Agosto de 1697; e faleceo a 3 do mesmo mez do corrente anno de 1766»,  na sua linha de sacralização do ser humano, caracteriza o príncipe D. Manoel «por excesso de amor constante» e compara-o a um «Celeste Serafim na virtude e na candura»... 
Amor constante, oração persistente, gratidão permanente, consciência espiritual mais desperta e admissão da existência dos espíritos celestiais e da nossa aprendizagem com eles...
Com esta leitura e notícia do Despertador Quotidiano, que em si significa intentarmos quotidianamente despertar da mutabilidade e dispersão para a pureza, fineza e vibração divina, desejamos que todos os geradores de tal publicação, e em especial a soror Tomásia Caetana de Santa Maria, se intercomuniquem e alegrem nesta comunhão do corpo místico da Tradição Espiritual Portuguesa que, transcendendo imanentemente fronteiras e limitações do espaço e tempo, na sua muldimensionalidade tão subtil e desafiante, sobretudo para quem medita, quer contribuir para a Paz, a Justiça, a Verdade, a Liberdade e a Divindade nos seres e no mundo...
Segue-se o vídeo do Despertador Quotidiano, como já dissemos, pela 1ª vez lido e gravado em simultâneo sem nada dela ainda sabermos...

                             

quarta-feira, 25 de agosto de 2021

Harold Bloom, "Omens of Millennium.The Gnosis of Angels, Dreams and Ressurrection", a critical review, specially on Angels.

                                                        

A critical review of the book of Harold Bloom, Omens of Millenium.The Gnosis of Angels, Dreams and Ressurrection. London, Fourth Estate, 1996.

The impression that remain with us at the end of reading the book, with so many approaches and references to Angels, is that the author,  an university professor, an american jew and a great admirer of the Mormon efabulation (that he sees as a return of the old gnosis), althought having made a very good research on the history of the Angeology in religion and literature and trying to convey to us that what he is sharing is the correct view from sufis, kabbalists and gnostics (and, why not, yogis?), and that the commum source of all these angeologies is the persian Zoroastrism, in fact  the exploration, even if well written and based in good references, sometimes is a bit manipulated, and not so true or neither enlightening in pratice.

Indeed, he has collected facts about the evolution of the understanding of Angels, coming from Iran and Babilony and from Zoroastrism and Kervanism  into Judaism, Christianity, Gnosticism and Kabbalism, mostly related to the Bible and around it, and makes a good contrast with the New Age superficial theory of Angels, sharing with wit or humour some interesting aspects of American religionism ("the New Age prose, which is of a vacuity not to be believed") for which he is surely well equipped, as he has written a book on The American Religion in 1992.

The emphasis in the Millennium, and the new prophets,  natural in USA, as he wishes and writes: "a nation whose quasi official high priest is the Reverend Billy Graham, author of Aproaching Hoofbeats: The four Horsemen, is rather clearly more likely than most other countries to have strong intimations of Millenium. Our Southern Baptists and Mormons, our Adventists, Pentecostals, and other indigenous faiths all have particular end-time prospects in view, and I have seen these as parts of this book's subject...».

 But with the passing of the border line of 2001 without  anything special happening in the world, and with the evolution of Mankind in ways not so much according to his millenium's wishes and profecies (like the one at the end of the book that Mormons will greatly expand), gives today to the book and title a bit a flavour of failure, or of the so used apocalyptical trend, that is made mostly of fears and expectations, human and messianic, but not truly spiritual and divine, even if at the end of the New Testament was aded the spurious Apocalipse, made by a imaginative christian zelot and atributed to S. John the evangelist, that had a long history of being taken seriously by generations and generations of zealots, scaremongers, believers, theologians and professional esotericists, and surely also by good mystics and theologians.

Anyway, Bloom is very keen in drawing the evolution of  the theological thoughts about Angels and Satan, arriving to the Apocalipse and then being superseded by S. Paul's suspicion or even hate of angels, fallen and unfalen (Ephesians 6:11-12) and after by S. Augustine narrative of an envious and prideful Satan already being or existing from the beginning of Creation.

After reading the book of Harold Bloom (1930-2019), if our objective was a better, clear or more active view of the Angels, we will be provided with much  information about their evolution in the history of religions but we may feel  a bit disapointed as he enters, for example, too much in the efabulations of the great Archangels and how men can become angels (specially in chapter IV), much based on late Testament productions of Enoch and other imaginatives authors-prophets and sources, notably the modern one "Joseph Smith doubtless by now is a ressurrected angel, another god-man, working for the welfare of the world's 10 milions or so Mormons."

In fact in the Introduction he recognizes that «the angels scarcely play independent roles until the very late Book of Daniel, written about 165 B. C.E., the time of the Maccabean rising against the Syro-Hellenes. In earliest biblical narrative, the Yahwist or J strand of the tenth century B.C.E., most of the angels are surrogates for Yahweh himself, and probably were added to the text by the Redactor at the time of the return from Babylon or soon afterwards. There is a wry Talmudic adage that "The angels' names came from Babylon" and I suspect that more than their names came from east of the Jordan. / The angelology of Daniel, and of the Books of Enoch after it, is essentially Zoroastrian rather than Israelite. Norman Cohn, an authority upon millenarium thinking, traces its origin to the Iranian prophet Zoroaster, who cannot be precisely dated, but who may go back to 1500 B. C.E., half a millenium before the Yahvist.»

                                                          

For the pratical aspect of knowing the Angels the author has no experience and even doesn't consider so much possible that, giving little or no value to the modern testimonies of awareness and vision of Angels. So, apart from John Milton and Emmanuel Swedenborg, he only accepts or sees Joseph Smith, the founder of the sect of Mormons, «the greatest, and most authentic of American prophets, seers and revelators», recognizing out of these only some sporadical literary expressions, like the ones in Raine Marie Rilke, in fact probably arising more by sensibility and poetic creativity than by true angelic experience.

His understanding of the valuable work of Henry Corbin, that he praises highly,  sometimes is not good, as when Bloom characterizes the subtle or imaginal world, between the literal and the intelectual, «for a religious believer, whether normative or heterodox, this middle world is experienced as the presence of the divine in our world», what is not the case and gives value to a very superficial and not experienced vision of God, happening in mostly of the believers. But his apreciation of Aldous Huxley's anthology Perennial Philosophy is important and is in line with the apology made by him of the need of reading good books instead absorbing superficial new age and digital fantasies.

Already in the second chapter, about Dreams as omens of spiritualiy or of Millenium or of the capacity of prophecy, Bloom presents very well the angeology of the main kabbalists of Saphed, like Luria and Cordovero, and their view of the voice of the angel that answers  in the dreams the queries made in vigil. For Harold Bloom, "the Answering Angel (maggid) remains the most shocking innovation in the entire history of angelology, as he and others like Rabi Zwi Wer Blowsky sees him like a man-made angel. Hayim Vital is also called or quoted, in one of the typical exagerations of kabbalists and messianics: “for every word that is uttered creates an angel”.

These aspects about the power of the words and sounds are indeed important but should be correct and not mystified. We could say better that some words and sounds uttered with more awareness, power, significance and consequences can attract some angelic blessings, or some not so good entitities or energies, or affect our different bodies and levels...

And we should say that the possibility of the spiritual or angelic anwers to our prayers or queries before entering into sleep  is something generalized in many traditions and not created by the kabbalists. We can say that either the spiritual self, or the guardian Angel, or the ancestors, guides or Masters, or the Unified field of energy conscience and information, the Logos or the Buddhi of the Yogis, that entangles all minds and souls, can indeed inspire anyone who merits or needs it, specially if prayer is done before sleeping.

The kabbalists are prone indeed to mystify, to exagerate, and they could be well called mystagoges, althought Harold Bloom prefers to give that title to Giordano Bruno, a so valuable humanist, or to the french philosopher Lacan...

On that chapter Dreams, on the subchapter On the Nature of Dreams, he mentions some interesting teories, like the ones of Lehman and Koukkou, that in dreaming we are revising childhood's conceptions with the latter ones, and one of Francis Crick that we are then unlearning the irrelevant material of the day, and so counseling us to forget them and not remember, as Freud wanted. I prefer to see that kind of dreams as a processing and development of the relevant material of the lasts days or even a preparation for the next day.

Harold Bloom confesses, what is not so so good about his sensibility, that “I am not more a mystic or a normative believer than Freud ever was” and he agrees that Freud doesn't give an adequate account of the nature of dreams, and  considers him the great blocking agent to find omens of the milenium on dreams, as Freud was all his life avoiding profecy, ocultism, telepathy, saying exactly in 1934 to his disciples: “Psychoanalysts are fundamentally unreconstruted mechanisst and materialists, even thought they refuse to strip the mind and soul of their as yet understood qualities. They study occult material only because they hope that this would enable them to eliminate once and for all the creations of the human wish from the realm of material reality”. And then Bloom points «that it is just on some other researchers opposed to Freud that we can see some light on dreams, like Wendy Doniger, Dreams  Illusions and Other realities, a specialist on Indian tradition, or Ludwig Wittgenstein critics of Freud's theories...», but Carl G. Jung, «masqueraded as a gnostic», was not at all apreciated by Bloom...

Harold Bloom tends to value two lines on dreams: that we are dreamed by others. Or even by the Angel, and goes to say: "What the Shekinah, or Fatima or the Angel of Christ gives in the dream ultimately is the image of the astral body, a man or woman all light". But this broad comparativistic identification of Angel of Crist, Fatima wife of Ali, 1º Shia Imam, and the Kabbalist Shekinah as being the some, seems also a bit just an intelectual afirmation by someone who has not such experience, and so it is weak, because only by inner experience can we know what level of reality or of imagination is being shown to our dream consciousnesse or even to spiriritual eye. But to claim that some spiritual entities or ideas  they can give only the image of astral body (although is not the lower conception of the theosophists but the one of the Greek-Romans classics - ochema- and Gnostics), is  reductionist because much more can happen and we should also attain that unification and vision of our spiritual entity by our own efforts, pratices and love.

The debasement, or downgrading, or materialization of the spiritual realities and experiences is typical of the USA's consumist and imperialist civilization and mindset, where Harold Bloom lives  and  we can see that by the incredible optimistic idea that «for at least two centuries now most Americans have sought the God within rather than the God of European Christianity».  Within the soul, with the Baptists, Mormons, Protestants, free churchs?

Anyway, beyond these exagerated nationalistic and kabbalist valorizations exhibited in the book and in these two first interesting chapters I - Angels, and II - Dreams, both in 90 pages,  Harold Bloom enters still in a III - Not Dying, where in the 1º subchapter is very critical of Raymond A. Moody, Kenneth Ring and of the industry (research, books and workshops) of Near-death experience,  and in the 2º subchapter - Shamanism, following sometimes Mircea Eliade's wrong understandings on Shamanism, as we can say that more than dreams, spiritual visions were essential; or still the mystifying affirmation that the shamans went to all Heavens and Hells, when in reality  they only entered or had some acess to the energetic and astral levels which are acessible generaly to mediuns, sorcerers, magicians. And then Harold Bloom sees and affirms Jesus as the universal shaman, considering the legend of descent to the hells and the 40 days as ressurrected on Earth as true shamanic accomplisments, much more than the near-death experiences and astral travels of the New Age.

In the chapters  IV - Gnosis, with five subchapters, on Hermetics, I, and Christian gnostics, II,  he defends mostly the hebrew roots of Hermeticism and Gnosis (what is not true) and of Gnosticism, but gives a fair approach to Valentinus gnosis and to the Gospel of Truth and Gospel of Thomas, from the Nag Hammadi texts. In Sufism, III, he quotes mostly Henry Corbin and Sohrawardi about Hurqalya and the imaginal world but mixes that with Ibn Arabi visions, sometimes loosing the right path to understand, at least rationally, what has to be lived and seen by the inner eyeIn the subchapter Metraton   he gives details of the weird speculations about this imaginative entity, like being  Jahve, the angel of Exodus, Jahoel, Enoch, Shekinah, Shadai, etc.   

And in the subchapter Isaac Luria, he expresses one more time his own division between the normative orthodow Jew and the adept of kaballa, and enters into the subject of the doctrines of the transmigration of souls, and concludes with the confession that the Shi'ite sufism, despite its imaginative boldness, neverthless conveys a more unified image of ressurrection than the wilder Kabbalh could accomplish.  And he finishes with V chapter -  Millenium, with two subchapters, American Centuries, and Gnosis of the World to come, where valuable but sometimes not correct statements or, better, conclusions are provided. In this last chapter, may be a bit manipulative or even cunningly, Bloom reaffirms the dependence of the Western world from Zoroaster dual conceptions and writes about the ethos of USA: «our agressive millenarism has verry little to do with Christian humility, and can be interpreted as a throwback more to the ancient Iranian sense of being the Chosen People than to the biblical sense of election. It was, after all, Zoroaster, and not the Hebrew prophets, who invented Western ideas of Hell and of the Devil, and so it is Zoroaster who is the ultimate ascestor of the full range of recent American millenarians, from the now-benign national icon, Billy Graham, all the way to such nativist groups as the Aryan Nation and the Pose Comitatus, unknowing heirs of the ancient Persians». 

In this direction of repudiating dualistic concepcions, there is a discarding of the Millenarism at the end of the book, pointing that there can be no Gnosis of the world to come, but only the Gnosis of the perennial innmost self, as Aldous Huxley so well had given so many examples in the true spiritual teachings of many traditions, in its classical anthology Perennial Philosophy, that personally I had to read with my first guru in India, in Riskikesh, Swami Kaivalyananda, an Advaitic Vedantic..

In a last apendix, a Gnostic Sermon, he shows the division of choice between the follower of the God of the covenant of the three religions of the Book, and the gnostic being, seeing these ones exemplified better in Valentinus and his followers, and giving to the gnostic an incorrect interpretation:«If you know yourself as having an affinity with the alien, or stranger God, cut of from this worlds, then you are a gnostic», as there is no alien's God affinity but only spiritual and divine reunification. He may say that this is a definition of gnostic negation of the material worlds and bodies, but the gnostic is mostly called with that name because he knows, or he has a gnosis about himself as a spiritual being,,,,

Manuel Duarte de Almeida e o seu contributo no " Antero de Quental In Memoriam", bem valorizado por José Bruno Carreiro.

                                           

Manuel Duarte de Almeida (1844-1914), foi um transmontano natural de Vila Real, estudante de Farmácia na Universidade de Coimbra, tal como o seu irmão Custódio, de Medicina, na época áurea de Antero de Quental e da sua geração, quando se abriram as portas à modernidade europeia em Portugal. Participou mesmo em Abril de 1864 na famosa saída dos estudantes liderados por Antero para o Porto, a Rolinada, em protesto contra o chefe do Governo José
Rolim de Moura, 1º duque de Loulé.
Após a formatura, embora tivesse exercido farmácia em Vila Real,
preferiu entrar na Administração dos Correios (tendo-se casado em 1880, com descendência) e depois (1902) na Direcção Geral de Instrução Pública, e dedicar-se à poesia, alguns dos seus poemas tendo tido grande sucesso e consagração, nomeadamente pelo seu conhecimento científico e amor a Portugal, e o  último deles, Vai Victoribus!  escrito contra o imperialismo inglês por ocasião do Ultimato de 1890, mereceu um forte elogio do seu amigo Antero de Quental, em carta do Porto, de 24-III-1890: «Recebi o teu admirável poema, que, esperando eu sempre muito de ti, excedeu ainda a minha expectativa. A tua linguagem simples, forte, intensa, é verdadeiramente clássica. 

Escrevo à pressa. Teu do Coração, Anthero de Quental» 

Ora o infatigável publicista José Bruno Carreiro, a propósito do último período de vida de Antero, transcreve na sua ainda hoje incontornável obra Antero de Quental, Subsídios para a sua Biografia, 1948, no 2º volume, páginas 227 e seguintes, parte do contributo de Manuel Duarte de Almeida no In Memoriam de Antero de Quental, considerando-o «tão importante que cada um dos seus pormenores deve ser fixado e retido, como contribuição de alto valor para o conhecimento do seu estado de espírito nessa época. Procurando encontrar o que poderia ter-lhe "armado o braço com que, deliberada e friamente, pôs termo à sua preciosa existência", o velho amigo de Antero começou por reconstituir o último período da sua vida"... E começa a transcrever algumas partes, com comentários interessantes, embora os primeiros parágrafos do contributo tenham sido omitidos, nos quais Manuel Duarte de Almeida defende o direito ao suicídio e traça uma breve síntese do carácter de Antero. Ora como escreveu com bastante conhecimento, já que era dois anos apenas mais novo do que Antero e foram amigos desde pelo menos  1863 até 1891, oiçamo-lo: 

«É preciso pôr, completamente, de parte a ideia de padecimentos físicos incomportáveis, que pelo desespero, levassem o Antero à trágica resolução, que tão inesperadamente pôs termo aos seus dias.
Tal hipótese é a meu ver, absolutamente insustentável - e só quem não conhecesse a rija tempera daquele carácter, um tanto desigual, é certo, mas heróico, mas dotado, em sumo grau, de todas as energias morais; só quem não soubesse do, relativamente, plácido e resignado viver do Antero nos últimos tempos é que a poderia admitir.
O Antero só era fundamental vulnerável aos sofrimentos do espírito, ao mal do pensamento, e creio bem que nunca o tormento físico, por mais cruel e dilacerante que fosse, lograria quebrantar-lhe a robustez de animo a ponto de o forçar a eximir-se-lhe por um acto de fraqueza. Não que eu capitule assim a solução do suicídio, em toda e qualquer hipótese que ele se produza. casos pode haver e há, com feito, em que o suicídio, longe de revelar pusilanimidade, de significar ausência de energia para arcar corajosamente com as dificuldades da existência ou para suportar o peso de amarguras e adversidades iníquas e inexplicáveis que nos couberam em partilha, é, pelo contrário, um acto de coragem serena e reflectida, uma prova autêntica de verdadeira grandeza moral. É escusado recordar exemplos históricos e por demais eloquentes, que sobejamente o comprovam e que a ninguém medianamente ilustrado é lícito desconhecer.»
Saltando estes quatro parágrafos e mais quatro, Bruno Carreiro começa a transcrever assim: "A derradeira fase da existência do Antero derivou pacífica e repousada. As grandes lutas morais e sobretudo intelectuais, que no seu espírito por vezes tão violentamente se debateram, haviam cedido o lugar a uma serenidade calma e filosófica, feita de decepções e amarguras, como é a sorte de nós todos, mas nem, por isso, menos sólida e resistente; a uma quase perfeita conformidade, em suma, com as condições humanas da existência, com as suas dores e as suas misérias, intransferíveis e inevitáveis, conformidade que era nele aureolada pelo divino reflexo da bondade moral que de si espargia e fortalecida pelo ascendente prestigioso que ele bem conhecia exercer no círculo restrito dos amigos que o admiravam e compreendiam... Os padecimentos físicos haviam acalmado. As insónias, aquelas pavorosas e memoráveis insónias, que tão horridamente o haviam torturado durante a época mais agitada da sua vida intelectual e que eram devidas, sem dúvida, ao trabalho incessante, trabalho profundo e exaustivo, do seu poderoso cérebro, no período de gestação e sistematização das suas ideias filosóficas, acabaram afinal por desaparecer completamente, permitindo-lhe um sono tranquilo e fisiologicamente reparador. [Nota: Luís de Magalhães, escrevendo para a Província em 25-IX-1891, confirma-o: «Há bons seis anos que o seu estado geral melhorara. A terrível excitação dos nervos acalmara; alimentava-se bem, ainda que uma só vez ao dia; e as tormentosas insónias, que tanto o haviam martirizado, só de longe em longe e excepcionalmente se repetiam»]. O apetite, e com ele o vigor físico – um certo vigor físico, é claro – voltou, como era natural. Dava passeios de légua, a pé, sem experimentar a menor fadiga, como por mais de uma vez me asseverou... Alimentava-se pouco e uma só vez por dia. Devo, todavia, acrescentar que esse pouco bastava à sua regular nutrição, como ele próprio o reconhecia, sendo certo que, desde muito, se habituara completamente a esse regime sóbrio e que possuía a inestimável felicidade de se dar bem com ele, sem que vez alguma sentisse a necessidade de o alterar». (pág. 228).

                            
Depois de afirmar mais de uma vez que Antero estava bem e satisfeito com o seu regime dietético, bem como com a construção filosófica a que chegara, Duarte de Almeida interroga-se quanto a ele necessitar de partir para os Açores e narra algumas das conversas que tiveram nas quais Antero confessou que «as suas queridas pupilas estavam senhoras feitas. Acabavam de sair do colégio; precisavam de entrar no mundo, de abandonar aquela monótona e arredada tebaida de Vila Conde». Depois havia a conveniência de uma casa grande: «O Antero não podia prescindir de casa espaçosa e ampla, com um vasto salão, pelo menos, onde pudesse isolar-se, em plena liberdade, passear de extremo a extremo, quando o seu espírito nervosamente exigia concentração criadora, a ausência de todo o ruído, o afastamento de toda a comunicação com o mundo exterior».
E por fim precisava de um ambientes sereno e livre da agitação lisboeta para «reduzir a sistema o conjunto de as suas ideias filosóficas, de as coordenar e fundir em corpo de doutrina, dando-lhe a forma arquitectural e técnica, a definitiva redacção, em suma (...) Para um tal empreendimento, Lisboa não lhe podia convir» pois «a intriga é enorme, trovejante, ensurdecedora (...) e nenhuma ideia convergente, nem sombra de pensamento patriótico - sincera e desinteressadamente patriótico - salvas raríssimas excepções, entre tantos alvitres opostos, tantos desalentados queixumes, tantas invectivas pessoais e miseráveis intrigas e inconscientes afirmações do mais impudente e desvairado egoísmo!»
São muito interessantes os sucessivos parágrafos em que Manuel Duarte de Almeida, amigo íntimo de Antero, reconstitui os diálogos tidos com Antero, com uma linguagem por vezes tão invulgarmente astral que ficamos siderados. Atente-se aos efeitos da "absurdeza e puerilidade das ideias emitidas pela vacuidade vertiginosa de uns cérebros", pois «em tais condições é impossível pensar. Toda a serenidade, de que o espírito necessita, esfarrapa, dissolve-se na bruma espessa, gelatinosa, desse meio asfixiante, dessa bisbilhotice mórbida, tão incorrigível, quanto insaciável, ficando-nos, de tudo, uma grande sensação de fadiga, de aborrecimento, de insuperável e apavorada repulsão.»
Quanto ao suicídio, considerando ser «difícil coisa, em verdade, averiguar e surpreender num espírito tão complexo e profundo ( e ao mesmo tempo tão cândido e cristalino!) as causas psicológicas, que poderiam determinar tão irreparável resolução põe a hipótese então de subitamente, num dos seus rompantes e assentes no seu sistema nervoso frágil, na sua "hereditariedade mórbida", considerando a imperfeição do seu trabalho ou escrito, que já o levara a rasgar o Programa de Trabalhos para as Gerações Novas, decidir partir da Terra, já que se desiludira da perfeição da sua filosofia. Não cremos contudo que seja esta explicação, pois não houvera descobertas que suscitassem tal derrocada de uma construção ainda hoje válida filosoficamente, embora certamente com outros conceitos, tais os da física quântica, a sustentarem-na, mas são valiosas as caracterizações que faz da demanda filosófico-espiritual de Antero, do seu sistema, muito ainda no séc. XIX, e certamente a sua espiritualidade ter-se-ia erguido mais fortemente senão se tivesse embrenhado tanto na filosofia alemã...
                                        
Mas oiçamos então a hipótese posta por Manuel Duarte de Almeida: «O sistema filosófico do Antero, a aliança íntima do espiritualismo e do materialismo, indissol
uvelmente fundidos num misticismo superior e transcendente, seria, na realidade, um sistema perfeito, impecável, absoluto, invulnerável e inacessível à acção e à influência progressiva das ciências físico-naturais, que na sua ininterrupta evolução têm feito ruir por terra as maiores produções do espírito humano, para as substituir por novas fórmulas e novas concepções, que, a seu turno, cederão o lugar a outras que melhor corresponderão e satisfaçam a um mais adiantado grau de civilização?
- O meu sistema é sólido, indefectível, dizia-me o Antero um dia, no quintalzinho das Águas Férreas [no Porto, na casa de Oliveira Martins], ao terminar uma saudosa e ameníssima palestra, em que, largamente, me expusera a súmula das suas ideias. E, tomado de crescente entusiasmo, prosseguiu: Como vês, assenta maciçamente no solo, sem precisar de escoras. Eleva-se por si, naturalmente; não carece do auxílio emprestado de estranhas teorias nem de vagas hipóteses ou postulados iniciais. O progresso das ciências físicas, seja qual for, há de fazer-se dentro do meu quadro e não virá senão confirmar, cada vez mais, a solidez indestructível da minha construção.
Tal era, com efeito, a sua convicção íntima no momento em que me falou. Mas o espírito do Antero era eminentemente progressivo e móbil, de uma plasticidade inigualável ou só igualada pela sua insaciável sede de saber. A dúvida, o monstro incoercível e informe, o lendário abutre do Prometeu, mordia-o, espicaçava-o, de contínuo, como sucede a todos os espíritos daquela envergadura e compleição. E se ele viesse a descobrir uma falha, uma fenda, por onde o seu grandioso sólido edifício? (...) Verificada essa impossibilidade, ou como tal julgado, de conseguir esse desideratum supremo, cessou toda a razão de existir. Avivarei este tópico essencial, que cumpre não esquecer: os combates de ideias foram sempre os que mais violenta e dilacerantemente se travaram na personalidade moral de Antero. Era do pensamento sobretudo que ele sofria, muito mais que do corpo ou ainda do coração.»
Discordamos da hipótese da desilusão filosófica, como já dissemos, pois as últimas conversas já nos Açores não a confirmam, e provavelmente Manuel Duarte de Almeida desconhecia os problemas de Antero com a irmã a propósito da guarda e educação das crianças, quanto a mim o factor decisivo do suicídio, tanto mais que se tinham tornado, tal como são mencionadas neste contributo, "mulheres feitas".
Como o preito da amizade profunda é expresso várias vezes neste contributo e com uma qualidade tão grande, concluiremos esta breve homenagem à amizade de Manuel Duarte de Almeida e Antero de Quental acrescentando, de outras partes do seu contributo para o imortal In-Memoriam de Antero de Quental, as que Duarte exprimiu no seus dois últimos parágrafos:
«Sim. Nestas breves e descoradas linhas, não procurei tracejar um Antero sobrenatural e fantástico, para ter o pretexto e o prazer de lhe acolchetar depois os factos e os comentários críticos, e bordar sobre essa criação da minha fantasia um tecido cintilante de imaginosas pedrarias, de tropos faiscantes, ou recamado de eruditas e autoritárias considerações.
Narrei singelamente factos: formulei conjecturas e induções; e se, de umas e de outras, não ressaltar, irrefragável, a evidência das conclusões alvejadas, destacar-se-á, pelo menos, espero eu, um pálido reflexo dessa imortal e radiosíssima figura - soberbo diamante preto, de incomparável e profundo fulgor, que nas letras portuguesas riscou tão inapagável e inconfundível traço - desse paladino idealista e intemerato sonhador, que, alfim, se partiu em demanda da sua fria noiva sepulcral, deixando nos corações dos que a amaram uma tão vívida saudade, uma tão indelével e espontânea e simpática veneração».
Foz do Douro, 24 de Janeiro, 1894. M. Duarte d'Almeida.

segunda-feira, 23 de agosto de 2021

Um poema espiritual, de Luz no Caminho, escrito ao som de "The fosse" - Wim Mertens, em 23.VIII.2021

Lisboa, 23.VIII.2021. Princípio da tarde, um poema espiritual. 


Cante a tua alma,

corajosamente,

contra ou acima de todas as oposições,

desferindo as setas que são orações,

a abrem as portas dos acontecimentos.


Mantém firme os teus objectivos maiores

a ligação ao espírito e a Deus,

o discernimento do que de subtil te rodeia

e a capacidade de apoiares o que vale.


Segue solitário, pois esse sempre foi a via

de quem quis subir à montanha divina,

embora possas encontrar almas afins

e cruzarem peitos e aspirações

na presença do Amor divino.


Liberta-te dos horizontalismos excessivos,

de tudo o que pouco podes modificar,

e consagra-te mais à realização interior

e partilha alegremente tal sobriedade

para que os antigos mestres encontrem em ti

ecos seus harmonizadores e inspiradores.

 

Nestes tempos de pestes e derrotas internacionais,

como não abrires mais os olhos e o coração

e saberes dialogar, apoiar e comungar

com os que à Verdade aspiram e se dão?


Um entre mil, dois num milhão,

que luta a da Humanidade mais luminosa

para se encontrar e saber comungar

a Verdade, a Justiça, o Amor e a Divindade.


Junto as mãos, cerro os olhos

À porta do peito bato e persisto

Até o resplendor do Amor

e do Ser Divino brilhar,

e nos encantar, alegrar e fortificar.


Tanta ignorância e egoísmo nas pessoas,

tanta opressão e sofrimento no mundo.

Quem consegue divertir-se ou dormir

quando tão grande é o clamor da dor?


Rasgo o meu peito corajosamente

que ele sangre de dor e aspiração,

e que saibamos derrotar a mentira

a opressão, e a insidiosa manipulação.


Circunsescrve agora a alma e avança.

Leva o fogo do amor lúcido acesso

e assume bem o teu corpo espiritual,

sintonizando aquelas luzes e estrelas

 dissipadoras da obscuridade e superficialidade

e que trazem o Graal do coração vivo,

prontas a reconhecerem-se na unidade Divina.

Fotografias no Gerês, Verão de 2021. Lux Dei!

                        

quarta-feira, 18 de agosto de 2021

Miguel Torga profetiza o admirável mundo novo actual, pela demissão das consciências, exactamente há 46 anos, em Albufeira.

                                               

Miguel Torga, na sua tão valiosa obra DIÁRIO, no vol. XII, publicado em 1975, escreveu uma entrada para o dia 18 de Agosto de 1975 (há 46 anos precisamente) com algo de profético na sua crítica e advertência quanto à manipulação das consciências, bastante demitidas, confundidas ou assustadas, por poderes e interesses mais ou menos perversos que controlam as máquinas dos Estados. Oiçamo-lo com um coração vivo e grato pela sua vida e demanda...

«Albufeira, 18 de Agosto de 1975 – Observo esta fauna drogada, hirsuta e piolhosa, que é hoje o pão nosso obrigatório em todos os meios cosmopolitas. Rapazes e raparigas, deitados à entrada do túnel que dá acesso à praia, ali estão de um lado e do outro, aos magotes, a  fazer e a vender bugigangas, a ensaiar a veia numa flauta, a coçar a guedelha, e a pedir esmola. A arremedar os chineses das gravatas e os cegos das romarias. Estranha juventude, que começa por impugnar a noção de singularidade individual – todos com as mesmas barbas, as mesmas cabeleiras, as mesmas gangas e os mesmos blusões, não se distinguem uns dos outros -, e acaba por estender a mão contestatária à caridade burguesa. Infinitamente mais capaz de se estender entre si do que a do meu tempo – no descampado dos valores é fácil a unanimidade -, feliz na sua preguiça e no seu desregramento, solar, de tropismos, sem dramas de nenhuma natureza, sentimental e sexualmente liberta, apenas motivada pelas mais estritas necessidades, longe de mim o propósito de a julgar. Mas inquieta-me pensar que o seu modo de vida, repartido entre a indiferença e o prazer, possa ser a prefiguração tosca de uma futura sociedade, certamente mais higiénica, embora igualmente abúlica e hedonista. Uma sociedade já não abandonada a si própria, como estes bandos de marginais, mas confiada à tutela providencial de um Estado oligárquico e esclarecido. É que os admiráveis mundos novos de amanhã, mais do que na perversão dos poderes, vão-se preparando na demissão das consciências.»

Há certamente alguma generalização excessiva da visão redutora da juventude contestatária de então, e por isso mesmo Torga se desculpa de parecer estar a criticá-la nessa descrição algo caricatural, mas de facto ele sente os perigos que se avizinham se não houver consciências que assumam a resistência às opressões dum sistema que se apresenta como uma nova ordem mundial, um admirável mundo novo, que assenta numa obediência abúlica das pessoas,  controladas e manipuladas para a sua sobrevivência minimamente hedonista e maximamente digitalizada, artificializada e medianizada, e garantida providencialmente por Estados oligárquicos, isto é, dependentes de grandes corporações, interesses, instituições e blocos, que não têm qualquer sensibilidade e visão de fraternidade e auto-sustentação mundial, antes se encontram em conflituosas opressões de vários povos menos alinhados com tal ordem financeira e ideológica e que internamente nada valorizam os direitos humanos e a dignidade e autonomia esclarecida da pessoa.

Sabemos como Miguel Torga nos últimos anos da sua vida (desencarna em 1995) foi bastante crítico dos desvios que se estavam a operar pelos governos e partidos em relação aos ideais democráticos, fraternos e libertadores que se abriram com o derrube da ditadura do Estado Novo. 

 O que diria ele nos nossos dias? Cremos que não se afastaria dessa linha, e certamente realçaria a necessidade de fortes valores afectivos, cognitivos e éticos e a competência responsável e independente marcarem as actuações sociais e públicas, numa ampla base de diálogo livre pela Verdade e o Bem Comum. Saibamos cumprir a nossa quota parte de discernimento e civismo, como ele tanto exemplificou...

segunda-feira, 16 de agosto de 2021

"A ORAÇÃO", de Bô Yin Râ. 2º cap. "Procurai e Achareis". Tradução de Pedro Teixeira da Mota.

                                 A ORAÇÃO, por Bô Yin Râ

                                          Tradução de Pedro Teixeira da Mota. Agosto 2021.

II. Capítulo:                            “PROCURAI E ENCONTRAREIS!”

«O procurar, tal como deve ser, quando se quer aprender a orar, é verdadeiramente tudo menos um cismar no entendimento!

Já a promessa que o que procura – com toda a certeza - "encontrará", mostra fortemente numa simplicidade lapidar que se trata de algo diferente duma “Procura interior” como se entende correntemente, pois a maior parte das vezes isto não é mais do que remexer e querer sentir dentro do entendimento humano, se houver sorte, mas sem nenhuma certeza de encontrar, como é firmemente prometido.

“Procurar”, tal como se procura normalmente dentro de si algo, é sempre expressão duma inquietação interior, - e qualquer que seja o objecto da procura: - tal busca é desenvolvida para se alcançar a quietude.

Alguns talvez possam pensar que a outra “procura”, de qual se diz que certamente “encontrará” deve ter igualmente como causa  uma inquietude que deseja tornar-se quietude?

Ora a “procura” necessária à  “oração” certa assenta nessa grande quietude: - aquela quietude interior que se enraíza  em si mesma e que não é mais influenciada pelo exterior.

Este modo de procura exige sempre o ser humano inteiro, e não somente o seu entendimento como um cão de busca inquieto sempre a esgaravatar.

É uma imersão serena no mais íntimo da alma – sem qualquer agitação, - sem nenhuma ambição - e sem impaciência inquieta.

Seria uma terrível tolice pretender-se que através de uma ardente e tempestuosa vontade forçada fosse atingido mais cedo o que se procura.

Assim uma pessoa só se engana a si própria, até que por fim, cansada e desapontada, renuncia a qualquer procura, quase antes do começo.

Pelo contrário quem procura deve  saber que só  tem a si próprio como obstáculo no caminho, se não procurar como alguém que tem a certeza de encontrar, - como o faria  quem soubesse que um objecto está num certo local e que tem de ser necessariamente encontrado, quando tudo o que tapava for retirado.

As pessoas não devem basear tal certeza apenas na promessa de que quem procura “encontra”!

Aqui a procura em si inclui logo necessariamente o encontrar-se, pois não se pode procurar sem que se siga igualmente o encontrar-se.

Neste tipo de «procura» o procurador é ele próprio o objecto de sua procura.

Contudo, quanto menos ele ansiar por si mesmo, tanto mais cedo se encontrará a si próprio!

Não deve fazer imagem ou representação do que espera encontrar!

Deve deixar-se afundar na sua própria profundeza sem fundo – sem medo e sem resistência!

Deve mergulhar a pique em si mesmo, e não deve sair da quietude, mesmo se os seus pés perderem o apoio habitual!

Com confiança deve deixar-se conduzir até ao seu fundo mais fundo, plenamente confiante que não está num caminho de aniquilação, mas que só se pode encontrar a si próprio !

Nenhum trabalho prévio de imaginação deverá turvar a sua visão!

Não deve esperar ver interna ou externamente “imagens”, como que nunca tivesse visto: - visões doutros seres e de mundos ocultos!

Não deve esperar manifestações do mundo dos Espíritos!

Mergulhando nas suas profundezas, verá ao princípio à sua volta tudo às escuras, mas quanto mais descer profundamente, mais as trevas retrocederão face a uma nova luz maravilhosa até que, na sua profundeza mais funda, se descobrirá a si próprio atravessado de luz - até  no fundo do seu próprio abismo, se tornar a si próprio claridade cristalina.

A sua imersão constituirá assim um constante descobrimento desde o primeiro instante, até que por fim tenha encontrado em si o que não pode ser dito mas apenas o que se deixa sentir, porque mesmo a palavra mais resplandecente permanece obscura diante de tal claridade interior duma luminosidade indescritível…

Quem quer procurar desta maneira, a fim de encontrar, deve desde o princípio deixar o seu corpo chegar a uma  paz completa, de modo a não estar mais consciente de que um corpo animal "carrega" a sua consciência.

Depois quem procura deve  fechar lentamente os olhos e juntar as mãos, até sentir-se, percorrido por uma corrente muito viva de energia numa quietude profunda.

Como melhor atingir este estado de animada e intensa quietude, cada um descobrirá por si mesmo...

Um só aí chega em posição deitada, outro sentado ou de joelhos, e ainda outro só aí chegará, mantendo-se de pé.

Mas uma vez que se tenha chegado a este estado de quietude cheio de vida, não deve preocupar-se mais com a posição exterior do corpo.

Agora deve-se aspirar a sentir-se unicamente no interior de si.

Depois de algum tempo, uma pessoa sente-se cada vez mais no interior de si mesmo, até  gradualmente uma sensação encontrar entrada na consciência, tal como uma pessoa se sente  completamente cheia si próprio no seu interior.

É como se fossemos um fluído – o corpo porém um recipiente – e como se o fluído se sentisse cada vez mais distintamente a si próprio como o conteúdo do recipiente.

Os pensamentos devem então aquietar-se e não devem ser autorizados a qualquer tipo de interpretação tagarela do que é sentido.

Se os pensamentos ainda andam à volta, não se lhes deve dar mais atenção, até gradualmente se acalmarem por si próprios.

Mas se esta sensação de si próprio no seu interior se tornou um todo bem fechado, então os pensamentos não se repetem mais, porque a nova consciência de si próprio absorve toda a atenção.

Ao princípio será bom uma pessoa contentar-se por sentir-se no interior de si própria, pois isto é um resultado já certamente muito significativo.

Uma pessoa deve voltar à sua tarefa quotidiana com alegria, logo que que esta sensação começa a enfraquecer.

Nunca se deve manter forçadamente esta sensação quando, por exemplo, se está  cansado.

Se pouco a pouco, - sejam necessárias semanas ou meses - quem procura chegar, em qualquer momento e sem esforço particular, na quietude dum isolamento voluntário, a sentir-se e a vivenciar-se a si próprio, na maneira já descrita como o interior do seu corpo terrestre – configurado como este, tal como um fluído abraça os contornos do vaso no qual é derramado, então a pessoa está dignamente preparada para começar a “procurar” no sentido do verdadeiro “orar”...

Agora a pessoa na demanda, por um querer sentido claramente, deve entregar-se completamente nas mãos da sua vida mais íntima  e deixar-se mergulhar até ao sem fundo desta vida pressentida, - mantendo-se sempre claramente consciente e sem jamais se entregar, mesmo que um piscar de olhos, ao sonhar meio-desperto! -

Se emergem formas e imagens no interior de si, não se lhes deve dispensar qualquer atenção e sobretudo uma pessoa deve-se guardar de querer de algum modo interpretá-las!

Ainda  pior tolice seria combatê-las, pois de tal modo só se as tornam mais fortes e seguras.

Se uma pessoa não consegue desfazer-se delas ignorando-as, é necessário na circunstância e no momento considerado, interromper a imersão interior e entregar-se a uma actividade intensa no mundo exterior até que, num outro dia, se sinta de novo capaz de completar o que começara, sem interrupção.

Só quando a sensação de mergulho na sua própria profundeza interior se tornar completamente isenta de imagens é que uma pessoa deve entregar-se sem reservas.

A indizível escuridão, que tende ao princípio assustar a alma deve ser suportada com calma e sobretudo sem medo algum, mesmo quando seja necessário suportá-la várias vezes antes de o primeiro brilho luminoso se deixar sentir no seu mais íntimo.

Mas desde que a obscuridade se começa a aclarar, desenvolve-se também mais e mais um novo estado interior de consciência, dum tipo de que nunca antes se estivera consciente.

Então este novo estado de consciência torna-se mais e mais claro até que por fim mostra  a unidade indissolúvel da vontade do que procura com a vontade do Ser Primordial eterno...

Quem chegou a este nível sabe pela sua própria experiência, o que significa «encontrar», e  a primeira condição da verdadeira “oração” foi vivenciada por ele.

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Quando ele agora pronunciar as admiráveis palavras tão simples e tão claras de sentido, que o elevado Mestre da Nazaré transmitiu aos seus discípulos para “orarem”, sente, no novo estado de consciência atingido, que cada uma das suas palavras é só uma confirmação da sua própria vontade. -

 Toda a oração dominical torna-se para quem procura nada mais do que o reconhecimento perfeito da sua própria identificação indissolúvel com a vontade do Ser Eterno…

O que é vivenciado interiormente encontra nesta oração a expressão verbal na linguagem humana, e actua através dela em retorno sobre alma,  tornando-se por si mesma num «pedir» que traz consigo mesmo a sua satisfação.

Assim quem procura é desde então libertado da tola ilusão, de que a oração seria um meio de «modificar a mente» da Divindade...

 Ele sabe agora, que orar consiste simplesmente em: querer, em comunhão com a vontade do Ser Original, o que é querido de toda a eternidade a fim de que, posta em acção através da correcto modo de «pedir» possa agora manifestar-se, realizar-se e afirmar-se. - -

A sua procura tornou-se verdadeiramente “encontrar”.

Ele não pode, em toda a eternidade, nunca mais perder o que encontrou assim em si mesmo! ---»