Neste dia 7 de Fevereiro de 1478, portanto há 545 anos, Thomas More nascia em Londres. Estudante em Oxónia e Londres,
casado por duas vezes, pai de larga família onde se destacaria pelos estudos clássicos a filha mais velha Margaret, amigo de Erasmo e de John Colet, humanista profundo mas também irónico, advogado,
diplomata e Chanceler do reino, e por fim mártir da sua consciência perante o
prepotente e "criminoso" Henrique VIII, sendo decapitado junto à Torre de
Londres em 6 de Julho de 1535, por manter a obediência ao Papa acima do Rei.
Deixou uma vasta obra onde se destacam
refutações de escritos protestantes de Lutero, Tyndhal e outros,
traduções de clássicos da Antiguidade, e ainda a Vida de Pico della Mirandola, a Apologia, cerca de 200 valiosas cartas e os Epigramas, tal
como este ligado com o mar e os Descobrimentos: «Uma tempestade se
ergueu; o barco abanava; / Os marinheiros receiam perder as suas vidas. /
Os nossos pecados, os nossos pecados, desalentados gritam, / causaram
este fatal destino!” / Um monge, acontecia, era da tripulação, / e
atraídos rodeiam-no para se confessarem. / Ainda assim o desassossegado
barco abana, / e ainda receiam as suas vidas perderem-se. / Um
marinheiro, mais ladino que os outros / berra: Com os nossos pecados
ainda está ele oprimido; lancemos fora este monge que os carrega a eles
todos, e então já de todo bem cruzará a tempestade. / Dito e feito; como
um só / deitaram o biltre borda fora; / E agora a casca perante a
ventania / foge com casco luminoso e fácil navegação. / Aprende portanto
a conhecer o peso do pecado, / com o qual um barco dificilmente
navegará»...
Por fim, a Utopia,
a 1ª edição em 1516, em Lovaina, inspirada nas viagens dos Portugueses (e por isso o narrador é um marinheiro português, Rafael Hitlodeu) e que ele conhecera pelas
narrativas de Américo Vespúcio, lidas quando estava em 1515 nos Países Baixos e então a
gerou como "fábula" educativa, tal como a descreveu sobriamente o nosso
historiador quinhentista, e humanista, autor ainda da valiosa Ropica Pneuma, João de Barros: «Fábula moderna é a utopia de
Thomas Moro; mas nela quis doutrinar os Ingleses como se haviam de
governar» e que estimulou vários pensadores a gerarem outras propostas de vida
social e religiosa mais humana e harmoniosa, criando uma palavra arquetípica tão actual nos nossos dias em que sinistras utopias de sociedades se perfilam nos horizontes, enquanto as mais luminosas de More, Bacon, Campanela, Johannes Valentinus Andreae e outros (tal Aldous Huxley e a sua AIlha ou os indianos Sri Aurobindo e Sri Ananda Murti) se perdem de vista ou de memória actuante.Refira-se ainda uma das mais recentes e sábias, a Utopia III, de José V. de PIna Martins, dada à luz pela Fundação Calouste Gulbenkian, mecenas muito humanista nos tempos em que o prof. José V. de Pina Martins trabalhava para ela, seja em Paris seja em Lisboa. Em Portugal foram Damião de Goes, António Gouveia, João de Barros, bispo Jerónimo Osório e Frei Heitor Pinto os que mais elogiaram Thomas More, o qual apesar do seu Cristianismo chegou a ter a Utopia no Index Inquisitorial de 1624. O bispo Jerónimo Osório, em 1567, fora mesmo muito crítico da Inglaterra do rei Henrique VIII: «Ignorarás só tu quando a Inglaterra caiu nessa infâmia onde se debate agora? Como é que santos homens como John Fisher e Thomas More foram publicamente decapitados porque permaneceram fiéis à sua fé e religião? (...) Quanto a Thomas More, homem óptimo e de uma erudição singular, qual foi o seu crime? Corrompera as letras públicas? Desviara coisas do domínio público? Causara a injúria grave ou a morte dos seus concidadãos? De modo algum...»
No séc. XX os
seus grandes estudiosos estrangeiros serão muitos e referiremos apenas
W. E. Campbell, André Prévost e Germain Marc'hadour. Entre nós destacaram-se Fernando
de Mello Moser, que perseverantemente aprofundou e divulgou a vida e obra de More,
e José V. de Pina Martins, tendo até os dois juntos dado à luz o Thomas More au Portugal, em 1983.
E em 2006 José V. de Pina Martins e o padre Aires Augusto Nascimento dão à luz a Utopia numa excelente tradução pela primeira vez directamente do latim (pelo P. Aires A. Nascimento), publicada pela Fundação Calouste Gulbenkian e hoje já numa significativa terceira
impressão.
O prof. Pina Martins possuía belas gravuras dos humanistas e
pedira a dois artistas portugueses que pintassem Thomas More e cenas da
sua vida, e na sua grande sala da Biblioteca de Estudos Humanísticos,
duas belas pinturas, uma de Thomas More a oriente e outra de Pico della Mirandola a
ocidente presidiam como génios inspiradores e, no caso de Thomas More,
como santo, pois em 1935, nos 400 anos da sua morte, foi canonizado e por Pina Martins venerado.
No
V centenário do seu nascimento houve comemorações em toda a Europa, de
Portugal à Rússia, e entre nós destacaremos os trabalhos do P. Mário Martins, José V. de Pina Martins, P. Manuel
Antunes, Pedro Calmon, P. Aires do Nascimento e Fernando de Mello
Moser.
A revista de cultura e crítica Resistência,
no nº 186, de Dezembro de 1978, comemorou os 500 anos de Thomas More, e
um dos artigos valiosos é o de Fernando de Mello Moser, que resolvemos
ler, comentando pouco, e partilhar, em homenagem não só a Thomas
More e Fernando de Mello Moser, como também a sua filha e amiga Joana. E a Pina Martins e Mário Martins já que os conheci e que
certamente já dialogam entre si enquanto seres luminosos e despertos nos mundos
espirituais, sob as bênçãos Divinas.