O primeiro sentido que se sente é que "quando se morre é se iniciado", ou seja, a morte é uma iniciação, um começo de um nova vida, e sem dúvida que o é.
Já errado será deduzir que com a morte somos iniciados, no sentido de recebermos uma iniciação ou ficarmos iniciados, pois quando morremos só temos a certeza que a vida no corpo físico acabou (já que por vezes os que morreram nem tal têm ou se consciencializam), mas quanto à vida no além que se abre, pouca gente tem uma visão acertada ou clara dela, mesmo com espiritismos e esoterismos lidos ou praticados em vida...
Ora quando saímos do corpo físico, a consciência que levamos, que resulta do que desenvolvemos em vida e do que passa para tal plano, é fundamental, de tal modo que há seres que morrendo fisicamente continuam mortos consciencial e animicamente, enquanto outros, já mais despertos, sabem movimentar-se no além, conscientemente...
Quantos saberão movimentar-se no melhor sentido é ainda uma outra questão, pois muitos certamente ficarão nas margens mais próximas do mundo terreno, apenas nos planos astrais e não saberão elevar-se para os mundos espirituais.
Mundos espirituais, por Bô Yin Râ.
Sabemos como no Egipto e no Tibete se desenvolveram crenças em litanias de encaminhamentos das almas no além muito detalhadas, denominados bardo thodol (do tibetano, libertação no astral pela audição) e é bem possível que para alguns dos crentes tais percursos fossem depois prosseguidos até desembocarem nos níveis mais elevados que poderiam merecer, embora o facto de se ouvir já morto ou mesmo de saber de cor e acreditar na subida pelos meandros dos mundo subtis, com seus encontros com deuses pacíficos ou violentos, não corresponde forçosamente à capacidade de avançar conscientemente já em corpo espiritual.
Mais simples eram os iniciados órficos, pitagóricos e de alguns dos Mistérios da Antiguidade, quando apenas sabiam e afirmavam, por experiência ou doutrina, que eram espíritos imortais no caminho dos deuses ou de Deus.
Ora o segundo aspecto menos trabalhado e compreendido é o que está ligado com outra linha de força perene, a denominada Arte de bem morrer, que em quase todas as religiões teve os seus autores e livros, tal na Europa Erasmo de Roterdão, que tentavam preparar as pessoas para estarem prontas a deixarem a terra luminosamente quando fosse cortado o fio da vida terrena.
Ora além desta preparação geral há uma outra que é fundamental e que é saber morrer em vida. Saber morrer nos momentos de dor e sofrimento, ir fundo neles, observando as dores, a diminuição de vitalidade, de amor, de aspiração e mesmo assim continuar a crer e a querer o espírito, o divino, a verdade. Aceitando a dor ou mesmo a morte se ela tiver que vir já. Utilizando nenhum ou o menos possível de remédios, mas apenas a água, os banhos, os chás, a oração, alguma erva medicinal, o jejum, o sono, os sonhos, a meditação.
O ser que se vê fora do corpo fica mais ciente da sua imortalidade e está menos sujeito a muitos aspectos negativizantes derivados da ignorância, do apego e do medo que controlam bastante as potencialidades das almas, que se identificam e limitam ao corpo físico e à sua mortalidade...
Saber morrer em vida, saber ir fundo nas doenças e provações, pode iniciar-nos no espírito, pode ser uma iniciação na consciência e caminho espiritual.
Eis o meu contributo, para o Morrer é ser iniciado, escrito neste dia 17-X-2020, quando de madrugada atravessei uma provação de saúde dolorosa mas que consegui enfrentar com calma, aceitação da morte e aspiração à verdade, aos mestres, aos anjos e a Deus...
E em comunhão com a Tradição espiritual anterior e futura, dei mais um testemunho sobre
Morrer é ser iniciado.
Jazes deitado na cama
mas tu não és esse corpo.
De pé, e de fora, observas
E reconheces que estás
tanto ali como fora dali
e então subitamente
desprendes de ti,
qual génio luminoso de Aladino
teu corpo subtil espiritual,
como num desabrochar de asa,
voluta elegante, geométrica e espirálica,
como um ghazal de amor imortal,
oferecido ao espiritual e divino Graal.
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