sábado, 21 de abril de 2018

Aniversário do nascimento de Sa'adi, 2018. Evocação e poemas, por Pedro Teixeira da Mota.

                                                Sa'adi Shirazi... Sa'adi, de Shiraz, Irão.
Sa'adi num roseiral, numa miniatura mogol
Homenagem em 2018, no seu dia de nascimento, e segundo o calendário lunar, móvel, a um dos génios (com Hafiz e Rumi, Sohrawardi e Attar) tutelares do Irão: Saadi, de Shiraz (1208-1291), autor de uma vasta obra de pequenas histórias e poesias, contidas especialmente no Gulistan, o Pomar, e no Boostan, o Roseiral, e um Diwan de ghazals, isto é uma antologia de poesia amorosa, após uma vida longa e bem aventurosa que o levou por vários países e continentes, destilando de tais viagens e encontros, amores, vivências e meditações uma grande e bem disposta sabedoria que partilha nos seus escritos.
Sa'adi inspirando-se e gerando o Roseiral.
 Seguem-se algumas traduções que fiz com a ajuda de almas amigas iranianas, seja quando lá estive um mês, em 2013, seja pela net.
                                                     
 Uma das suas ekaya ou histórias, não vegetariana:
 "Conta-se que, ao ser assada uma presa de caça para Nushirvan, o Justo, durante uma caçada, não se encontrou sal, pelo que um rapaz foi enviado à aldeia próxima, recomendando-lhe o Nushirvan: «Paga o sal, para que não se crie o costume contrário e a aldeia seja arruinada».
Ao perguntarem-lhe que mal poderia resultar de uma opressão tão pequena, Nushirvan replicou: «A fundação da opressão no mundo foi pequena mas todos os que vieram depois aumentaram-na de tal modo que se atingiu a magnitude presente…»

Se o governante come uma maçã do jardim de um cidadão,
Os seus funcionários arrancar-lhe-ão a árvore pelas raízes.
Por cinco ovos que o governante deixar serem roubados pela força,
O povo pertencente ao seu exército porá mil galinhas alheias no espeto.
Um tirano não permanece para sempre no mundo,
Mas a maldição ficará nele para sempre."

Moralidade, comentada por nós: Saibamos caminhar com justiça, harmonia e amor na vida, respeitando as propriedades e as ideias, os sentimentos e as religiões dos outros, mas denunciando ou lutando contra as injustiças e violências mais clamorosas ou graves...
E que os governantes, executivos, gestores e políticos se lembrem tanto que a memória histórica não ficará sempre manipulada como que há uma vida depois da morte... 
 Outra história (19) do Gulistan:
«Perguntei a um homem ilustre a causa deste dito tradicional: “Considera como um inimigo a paixão que está entre os teus dois rins .” Ele replicou: “A razão é porque qualquer inimigo que tu propicies torna-se teu amigo, enquanto que quanto mais te entregares a uma paixão, mais ela se oporá a ti.”

O ser humano atinge a natureza angélica comendo moderadamente.
Mas se ele se torna voraz como o animal selvagem então cai como uma pedra.
Aquele cujos desejos tu cumprires, obedecerá ao teu comando,
Contrariamente à paixão, que te comandará se for obedecida».
Que o Roseiral floresça no teu ser e coração
Da Introdução do Roseiral, Gulistan.
«A tradição é a de que sempre que um adorador pecaminoso e aflito estende a mão do arrependimento com esperanças de ser aceite na corte celestial, Deus o Altíssimo não dá conta dele; mas quando tal pessoa continua a implorar a misericórdia com súplicas e lágrimas, Deus, o Santíssimo, diz: - Ó meus Anjos, verdadeiramente eu estou envergonhado do meu servidor e ele não tem mais nenhum Senhor senão eu. Em concordância com isto, eu perdoei-o completamente.

Vede a generosidade e delicadeza de Deus.
O servo cometeu um pecado e ele está envergonhado.»

Moralidade nossa:
Por vezes Saadi é muito ousado e de modos subtis faz-nos suspeitar que a generosidade ou o Amor divino são bem maiores que nós pensamos. E para sociedades muito rígidas nas suas crenças e códigos morais, afirmar que Deus pode perdoar os piores crimes ou sustentar os seus inimigos, é sem dúvida de uma grande liberdade e liberalidade.
De Eugène Flandin, o mausoléu de Sa'adi, hoje bem diferente pois visitei-o em 2012
Continuando com Sa'adi:
«Aqueles que oficiam permanentemente no templo da Sua glória confessam a imperfeição da Sua adoração e dizem: - Não Te adoramos de acordo com os requerimentos da Tua adoração. 
E os que descrevem o esplendor da Sua Beleza são arrebatados em espanto dizendo: - Não Te conhecemos como deverias ser conhecido.

Se alguém me perguntar pela Sua descrição,
O que poderei dizer eu, tão desesperado pelas minhas limitações, do Um que não tem forma?
Os amantes foram mortos pelo Amado,
Voz alguma brotou do morto.

A um dos devotos que mergulhara profundamente a sua cabeça no capuz da meditação e estivera imerso no oceano das visões, quando estava a sair desse estado, perguntou-lhe um dos seus companheiros, com vontade até de o animar: “- Que presente belo trouxeste para nós do jardim em que estiveste?” 
Ele replicou: “Ao chegar ao roseiral eu tencionava encher as abas da minha veste de rosas, como presentes para os meus amigos, mas o perfume das flores intoxicou-me de tal modo que deixei cair as abas”.

O pássaro da manhã, aprende o amor da borboleta
Porque ardeu, perdeu a sua vida, e não encontrou voz.
Esses pretensiosos andam ignorantemente à procura Dele,
Porque quem obteve conhecimento não volta…

Ó Tu que estás acima de todas as imaginações, conjecturas, opiniões e ideias,
Acima de tudo o que as pessoas disseram, ouviram ou leram,
A assembleia terminou e a vida alcançou o seu termo
E nós, como ao princípio, permanecemos sem poder para Te descrever.» 

Por estes excertos podemos sentir um pouco e comungar com o grande Amor divino que ardia em Sa'adi e em muitos outros persas e místicos da sua época, mas que através dos séculos se comunica de peito a peito, de coração a coração, por tantas almas amorosas, por tantos Fiéis do Amor, pelo que tenhamos confiança nas vitórias da Verdade e do Bem, em nós e na cena mundial...
Que Abū-Muḥammad Muṣliḥ al-Dīn bin Abdallāh Shīrāzī,  ou mais simplesmente Sa'adi, nos inspire e intensifique a poesia e a cultura, a fraternidade, a paz e o Amor, e o conhecimento e a ligação a Deus na Terra...

4 comentários:

Luama Socio disse...

Maravilhas imortais e sempre propícias...

Pedro Teixeira da Mota. disse...

Sim, Luama, a fraternidade dos cultores do Espírito e da Cultura, do Amor e do Divino e de tantas outras maravilhas é perene e está sempre a estimular-nos a aprofundar seus mistérios e a recriar luminosamente...

Unknown disse...

Estou numa fase em que me descubro em permanente surpresa pela imensidao de seres de Luz que desde sempre existiram.
Fui eu que vim atrasada .

Pedro Teixeira da Mota. disse...

Nunca há atrasos, pois o principal da nossa vida acontece na hora certa, para além de que a viagem mais do que horizontal é vertical, e depende sobretudo de nós, na nossa unicidade...