Sa'adi Shirazi... Sa'adi, de Shiraz, Irão.
Seguem-se algumas traduções que fiz com a ajuda de almas amigas iranianas, seja quando lá estive um mês, em 2013, seja pela net.
Uma das suas ekaya ou histórias, não vegetariana:Sa'adi num roseiral, numa miniatura mogol |
Homenagem em 2018, no seu dia de nascimento, e segundo o calendário lunar, móvel, a um dos génios (com Hafiz e Rumi, Sohrawardi e Attar) tutelares do Irão: Saadi, de Shiraz (1208-1291), autor de uma vasta obra de pequenas histórias e poesias, contidas especialmente no Gulistan, o Pomar, e no Boostan, o Roseiral, e um Diwan de ghazals, isto é uma antologia de poesia amorosa, após uma vida longa e bem aventurosa que o levou por vários países e continentes, destilando de tais viagens e encontros, amores, vivências e meditações uma grande e bem disposta sabedoria que partilha nos seus escritos.
Sa'adi inspirando-se e gerando o Roseiral. |
"Conta-se que, ao ser assada uma presa de caça para Nushirvan, o Justo, durante uma caçada, não se encontrou sal, pelo que um rapaz foi enviado à aldeia próxima, recomendando-lhe o Nushirvan: «Paga o sal, para que não se crie o costume contrário e a aldeia seja arruinada».
Ao perguntarem-lhe que mal poderia resultar de uma opressão tão pequena, Nushirvan replicou: «A fundação da opressão no mundo foi pequena mas todos os que vieram depois aumentaram-na de tal modo que se atingiu a magnitude presente…»
Se o governante come uma maçã do jardim de um cidadão,
Os seus funcionários arrancar-lhe-ão a árvore pelas raízes.
Por cinco ovos que o governante deixar serem roubados pela força,
O povo pertencente ao seu exército porá mil galinhas alheias no espeto.
Um tirano não permanece para sempre no mundo,
Mas a maldição ficará nele para sempre."
Moralidade, comentada por nós: Saibamos caminhar com justiça, harmonia e amor na vida, respeitando as propriedades e as ideias, os sentimentos e as religiões dos outros, mas denunciando ou lutando contra as injustiças e violências mais clamorosas ou graves...
E que os governantes, executivos, gestores e políticos se lembrem tanto que a memória histórica não ficará sempre manipulada como que há uma vida depois da morte...
Outra história (19) do Gulistan:
«Perguntei
a um homem ilustre a causa deste dito tradicional: “Considera como
um inimigo a paixão que está entre os teus dois rins .”
Ele replicou: “A razão é porque qualquer inimigo que tu propicies
torna-se teu amigo, enquanto que quanto mais te entregares a uma
paixão, mais ela se oporá a ti.”
O
ser humano atinge a natureza angélica comendo moderadamente.
Mas
se ele se torna voraz como o animal selvagem então cai como uma
pedra.
Aquele
cujos desejos tu cumprires, obedecerá ao teu comando,
Contrariamente
à paixão, que te comandará se for obedecida».
Que o Roseiral floresça no teu ser e coração |
Da Introdução do Roseiral, Gulistan.
«A
tradição é a de que sempre que um adorador pecaminoso e aflito
estende a mão do arrependimento com esperanças de ser aceite na
corte celestial, Deus o Altíssimo não dá conta dele; mas quando tal pessoa continua a implorar a misericórdia com súplicas e lágrimas,
Deus, o Santíssimo, diz: - Ó meus Anjos, verdadeiramente eu estou
envergonhado do meu servidor e ele não tem mais nenhum Senhor senão
eu.
Em concordância
com isto, eu perdoei-o completamente.
Vede
a generosidade e delicadeza de Deus.
O
servo cometeu um pecado e ele está envergonhado.»
Moralidade nossa:
Por
vezes Saadi é muito ousado e de modos subtis faz-nos suspeitar que a
generosidade ou o Amor divino são bem maiores que nós pensamos. E
para sociedades muito rígidas nas suas crenças e códigos morais,
afirmar que Deus pode perdoar os piores crimes ou sustentar os
seus inimigos, é sem dúvida de uma grande liberdade e liberalidade.
De Eugène Flandin, o mausoléu de Sa'adi, hoje bem diferente pois visitei-o em 2012 |
Continuando com Sa'adi:
«Aqueles
que oficiam permanentemente no templo da Sua glória confessam a
imperfeição da Sua adoração e dizem: - Não Te adoramos de acordo
com os requerimentos da Tua adoração.
E os que descrevem o
esplendor da Sua Beleza são arrebatados em espanto dizendo: - Não Te
conhecemos como deverias ser conhecido.
Se
alguém me perguntar pela Sua descrição,
O
que poderei dizer eu, tão desesperado pelas minhas limitações, do Um que não tem forma?
Os
amantes foram mortos pelo Amado,
Voz
alguma brotou do morto.
A
um dos devotos que mergulhara profundamente a sua cabeça no capuz
da meditação e estivera imerso no oceano das visões, quando estava a sair
desse estado, perguntou-lhe um dos seus companheiros, com vontade até de
o animar: “- Que presente belo trouxeste para nós do jardim em que
estiveste?”
Ele replicou: “Ao chegar ao roseiral eu tencionava
encher as abas da minha veste de rosas, como presentes para
os meus amigos, mas o perfume das flores intoxicou-me de tal modo que
deixei cair as abas”.
O
pássaro da manhã, aprende o amor da borboleta
Porque
ardeu, perdeu a sua vida, e não encontrou voz.
Esses
pretensiosos andam ignorantemente à procura Dele,
Porque
quem obteve conhecimento não volta…
Ó Tu que estás acima de todas as imaginações, conjecturas, opiniões
e ideias,
Acima
de tudo o que as pessoas disseram, ouviram ou leram,
A
assembleia terminou e a vida alcançou o seu termo
E
nós, como ao princípio, permanecemos sem poder para Te descrever.»
Por estes excertos podemos sentir um pouco e comungar com o grande Amor divino que ardia em Sa'adi e em muitos outros persas e místicos da sua época, mas que através dos séculos se comunica de peito a peito, de coração a coração, por tantas almas amorosas, por tantos Fiéis do Amor, pelo que tenhamos confiança nas vitórias da Verdade e do Bem, em nós e na cena mundial...
4 comentários:
Maravilhas imortais e sempre propícias...
Sim, Luama, a fraternidade dos cultores do Espírito e da Cultura, do Amor e do Divino e de tantas outras maravilhas é perene e está sempre a estimular-nos a aprofundar seus mistérios e a recriar luminosamente...
Estou numa fase em que me descubro em permanente surpresa pela imensidao de seres de Luz que desde sempre existiram.
Fui eu que vim atrasada .
Nunca há atrasos, pois o principal da nossa vida acontece na hora certa, para além de que a viagem mais do que horizontal é vertical, e depende sobretudo de nós, na nossa unicidade...
Enviar um comentário