A Alma-gémea, apesar da
sua celestial origem mítica, provinda em termos da literatura e da filosofia da Antiguidade, dada por Sócrates e Aristófanes, segundo Platão, com as limitações ou condicionalismos da época, no Banquete, é ainda hoje um desafio, uma demanda, uma obra perfeita em aberto: ao encontrar-nos com quem sentimos, pelo olhar intuitivo,
pelo diálogo, pelo tacto e pela meditação, que as profundidades, faces e desejos das nossa almas podem ter muitos momentos de grande comunhão e
afinidade e que há capacidade de sacrifício ou dádiva recíproca, e mais possibilidade de mais desabrochar das nossas capacidades e missões eventuais, então damos as mãos, interligamos as almas e avançamos pela vida a fora e a
dentro, a fim de actualizar e manifestar esse Amor potencial que quer tornar-se maior, imenso, fundo e iluminante, religando-se ao Divino, e assim frutificar e contribuir para
história da evolução da Humanidade seja dando filhos e filhas,
seja obras, contributos, descobertas, harmonizações e abnegações.
Que essa caminhada de
corações e mãos aprofundados e dadas tenha a certo momento merecido das Religiões
formas de perenização e santificação deve-nos fazer lembrar que
um compromisso assumido perante Deus e o mundo espiritual reforça a
verticalização e a cosmicização da demanda relacional e estimula-nos a
trabalhar para que, nos momentos de desencontro, adversidade, cansaço e dúvida, casados ou não pela religiões (já que a ligação
sacralizante pode ser feito sem elas), tenhamos a virtude de não
perdermos de vista a essência espiritual e psíquica própria, a recíproca e a que nos une (de
base e gerada por tantos fios e osmoses), e que nos projectará certamente ainda para outros estados futuros mais gnósticos, felizes ou luminosos.
Podemos pensar que a
tentativa de dois seres de se tornarem Almas-gémeas será o
desiderato mais elevado dum namoro ou de casamento ou relação, pois se dois
espíritos dotados de corpos anímicos e físicos com tanta
diversidade conseguirem harmonizar em si e entre eles as suas forças
anímicas convergentemente em muito, e se receberem apoios seja de
pais, mestres ou amigos, ou espíritos da natureza, Anjos ou da própria Divindade, então gerarão visões interiores iluminantes e estados de Unidade maravilhosos que consubstanciam a noção de
alma-gémea, sem dúvida um psicomorfismo (ideia-força-imagem-energia) muito valioso e que devemos
equacionar sempre, pois por ele o nosso corpo espiritual é reassumido a dois e à Unidade Divina, tanto Feminina e Masculina como Infinita e supra-dualidade, é religado...
Talvez possamos ver e
dizer ainda que algumas pessoas pensaram e viveram como se a sua Alma-gémea
fosse a do pai ou a mãe, tal o amor e identidade que sentiam com
eles. Outras, nos sábios e justos mestres ou mestras encontraram o
estímulo ao amor e ao estado de unificação e, portanto, tiveram
nesses mestres as suas almas- gémeas, ou por elas se foram preparando para alcançarem o Amor Divino. Mas a maior parte das pessoas
procura é na carne da sua carne, no amor do seu coração, encontrar
a contra-parte com quem possam construir um lar, dos lares,
expressão de origem latina e que correspondia aos deuses ou
espíritos dos antepassados e das casas, no tempo dos Romanos, preservadores dos laços de amor perenes.
Na imensa continuidade da
história humana, os laços de família são significativos e por
eles se transmitem desejos, capacidades, realizações e assim quando
dois seres se encontram pela primeira vez são muitas as gerações
de seres que se aproximam também, primeiro de longe, apenas por
curiosidade mas depois podem verdadeiramente bordejar os ombros e as
conversas, e quem sabe segredar as palavras ditadas em cartas ou em
diálogos amorosos ou inspirar nos sonhos e meditações...
Não somos nem estamos
sós....
O nosso espírito (ou o coração espiritual) constantemente tem o seu comprimento de onda, a sua modelação de
frequência, na qual podem comungar ou participar os que estão nessa
medida qualitativa da alma. Seja antepassados, guias, artistas,
mestres e anjos ou ainda uma camada ou nível do Campo unificado ondulante de vibrações e informações...
Vivemos todos entretecidos
num vasto campo unificado de consciência energia, com os sub-campos
familiares, profissionais, de estudos, de religiões, de aspirações,
de desejos, de utopias e portanto o namoro entre dois seres é bem
mais vasto e frutífero do que se pensa. E, de igual modo, o abraço..
Quando abraçamos fazemo-lo não só fisicamente, mas também psiquicamente, no que estamos a sentir e a pensar e, logo, no corpo espiritual, de tal forma que há
certos abraços que nos fazem abraçar a humanidade e o Cosmos de
modos bem fortes e significativos.
Pouca gente tem
consciência do que emana ou se expande, subtil ou invisivelmente,
quando se abraça ou beija...
Saibamos melhorar estes níveis e irradiar mais beneficamente para todo o Universo...
Saibamos melhorar estes níveis e irradiar mais beneficamente para todo o Universo...
Já quanto à ideia, tão
difícil de nos certificarmos, da existência da Alma-gémea desde o
momento original, cósmico, antes da queda nos corpos, explanada por
Platão e trabalhada depois por outros filósofos e mestres,
presente em várias tradições no mito ou memória do
andrógino, teremos de nos socorrer de textos que falem de tal e
ouvirmos relatos de seres que acharam que o seu amor era ou tinha
adquirido essa qualidade, sem nos esquecermos mesmo que o próprio
Cristianismo na sua simples apresentação matrimonial acaba por
selar tal união na eternidade quando adverte "que o que Deus
uniu não o separe o humano", união esta que tanto pode ser a que
acontece na cerimónia matrimonial, como também a que brota da afinidade atractiva forte e recíproca que não deve ser desperdiçada e, finalmente, para um cristão gnóstico platonizante, ou um iniciado em tal mistério, a união que realiza finalmente a ânsia imemorial de reunião das
almas-gémeas primordiais.
Embora tenhamos também de
Jesus a resposta, acerca da questão com quem viveria uma mulher que
tivera vários maridos, com outra pergunta: "se não sabiam que no
mundo espiritual não há maridos e mulheres"?
Talvez isto aponte que
para Jesus o casamento não teria a indissolubilidade que adquiriu
depois como sacramento pois seria mais a da afinidade de almas
livres, quem sabe guiadas pelo Espírito Santo imprevisível, como
gostava de o caracterizar o Agostinho da Silva. Um dinamismo que faz com que as pessoas não matem ou limitem o espírito pela letra do contrato, mas fazendo-as também estarem bem atentas à Voz da Consciência, tão enaltecida por Antero de Quental na suas imortais cartas aos amigos, para não se deixarem desviar do Caminho da Verdade e do Bem.
Assim a relação
matrimonial de duas pessoas que se amam mas que nada sabem ou crêem de Almas-gémeas tem contudo esse potencial sempre latente, se elas sentem e aceitam que o compromisso é para frutificar, para gerar aprofundamento luminoso e revelador e plenificante e libertador.
A Alma-gémea existe
então em cada um de nós tanto dentro como potencial, como fora de
nós em algumas pessoas, ou numa só pessoa, que ao encontrarmos e
conhecermos permitirá iniciar-se o processo adaptativo, transmutador e criativo, o Caminho para a plena unificação, a Grande Obra alquímica, a redescoberta e fruição do Fogo do Amor Primordial.
Sê Amor, ama, arde, comunga...
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