Gravei em vídeo uma carta de Antero de Quental ao seu amigo Jaime de Magalhães Lima, datada de 13 de Outubro de 1886, por ser muito valiosa de ensinamentos. Tem a particularidade de ser a primeira carta conhecida de Antero para Magalhães Lima, assim se compreendendo melhor o início dela: «Meu caro Magalhães Lima. Consinta-me este tratamento familiar, e deixemos as Excelências para aqueles com quem não temos outra comunhão senão a de pertencermos à mesma sociedade em geral».
Com efeito na correspondência de Antero, beneditinamente compilada pela Ana Almeida Martins, encontramos nove cartas (sendo a primeira, de 13-X-1886 e a última, bem dramática, também enviada de Vila do Conde, de 9-II-1891) dirigidas a Jaime de Magalhães Lima (em baixo, numa fotografia anos mais tarde. No vídeo pode-se ver uma invulgar fotografia dele, oferecida com dedicatória ao jornalista Avelino de Almeida, cuja biblioteca ao ser leiloada foi por mim catalogada.)
Entre a primeira e a última carta sucedem-se sete sempre de elevado teor de ética, filosofia, espiritualidade, literatura, etc. Esperamos ler e comentar mais uma ou outra pois são verdadeiros cristais da Tradição Espiritual Portuguesa, senão atente-se a um extracto da segunda: «o que nos salva é a obediência cada vez maior às sugestões daquele demónio [daimon] interior (...) é a fé na espiritualidade latente mas fundamental do universo, é o amor e a prática do bem, para tudo dizer numa palavra. É por isso que a melhor filosofia será sempre a que melhor auxiliar a compreensão e a prática da virtude». E da 3ª carta: «a justiça perfeita para com os outros chama-se caridade; a justiça perfeita para com nós próprios chama-se humildade».
Antes de partilhar a gravação da 1ª carta, de 13-X-1886, a Jaime de Magalhães Lima comentada por mim, transcrevamos então a última e bem dramática e que ainda hoje nos desafia a sermos melhores e mais despertos e activos pelo Bem da Humanidade:
«Meu querido amigo.
Vou exigir de si um sacrifício - não sei se será grande ou pequeno - mas sei que o fará. Preciso absolutamente de si no Porto durante seis meses. A Liga [Patriótica do Norte] vai naufragar por falta de um homem - o secretário-geral, tão único como o Presidente, senão mais. O Porto não o tem! Há quatro dias que penso nisso e já desesperava, quando me lembro do Jaime! O Jaime é o homem; é o único. Há-de vir. O que se vai passar em Portugal é seríssimo. Faça cada um o sacrifício no altar da Pátria. Eu sacrifico a minha saúde, que naufragará de todo no meio disto, e muito provavelmente o meu nome, que antes de seis meses estará manchado. Não importa. Quero sacrificar a vida, e morrerei contente se tiver vivido 6 meses ao menos da verdadeira vida de homem que é a da acção por uma grande causa. O Jaime fará também à Pátria e ao Bem o seu sacrifício. Venha.
Um abraço infinito do seu
Anthero»
Que bela carta, tão palpitante de vida e de idealismo: a Pátria e o Bem pedindo o sacrifício e quem sabe Antero de Quental antevendo até já a sua morte. Escrita algo profeticamente, pois a Liga Patriótica do Norte desfez-se sem grandes resultados e Antero lá carregou mais uma desilusão. Mas que esperanças no Jaime, culminando no tão actual quão perene "abraço infinito", o qual agora, quando eventualmente o sentirmos e dissermos ou escrevermos, nos fará estarmos mais conscientes da Tradição Espiritual Portuguesa, e de Antero de Quental e Jaime de Magalhães Lima.
Como foi a resposta participativa de Jaime de Magalhães Lima ainda tentaremos sondar melhor, mas no In-Memoriam de Antero, publicado em 1896, no seu contributo sob o título, Um Justo, confessa com beleza e profundidade no começo do artigo que «já longe da hora em que um desastre cruel roubou da vida o melhor dos meus mestres, desprendida das alucinações da saudade e dos desvairamentos da dor, a grandeza de Antero de Quental cresce e atinge aos meus olhos proporções que noutra atmosfera lhe desconhecia».
Embora desconheçamos a razão da não participação de Jaime de Magalhães Lima como secretário na Liga Patriótica do Norte, sabemos contudo que foram escolhidos dois secretários, Francisco Reis Santos e João de Ramos, menos conhecidos que os já consagrados pensadores, nomeados relatores, Sampaio Bruno e Basílio Teles, ambos com fundas preocupações políticas e sociais. Contudo Jaime de Magalhães Lima seria um dos membros da Comissão executiva inicial, ao lado de outros amigos de Antero, como Luís de Magalhães e o conde de Resende.
Como foi a resposta participativa de Jaime de Magalhães Lima ainda tentaremos sondar melhor, mas no In-Memoriam de Antero, publicado em 1896, no seu contributo sob o título, Um Justo, confessa com beleza e profundidade no começo do artigo que «já longe da hora em que um desastre cruel roubou da vida o melhor dos meus mestres, desprendida das alucinações da saudade e dos desvairamentos da dor, a grandeza de Antero de Quental cresce e atinge aos meus olhos proporções que noutra atmosfera lhe desconhecia».
Embora desconheçamos a razão da não participação de Jaime de Magalhães Lima como secretário na Liga Patriótica do Norte, sabemos contudo que foram escolhidos dois secretários, Francisco Reis Santos e João de Ramos, menos conhecidos que os já consagrados pensadores, nomeados relatores, Sampaio Bruno e Basílio Teles, ambos com fundas preocupações políticas e sociais. Contudo Jaime de Magalhães Lima seria um dos membros da Comissão executiva inicial, ao lado de outros amigos de Antero, como Luís de Magalhães e o conde de Resende.
Oiçamos então a gravação, que terminou por falta de espaço na memória da máquina, talvez um minuto antes do que deveria acontecer para dar por findo o comentário...
https://youtu.be/UnhPP_n0Yxk
Sem comentários:
Enviar um comentário