Wenceslau de Moraes nasceu a 30 de Maio de 1854, em Lisboa. Alistou-se de livre vontade na Marinha aos 17 anos e concluiu os seus estudos na Escola Naval em 1875. Durante alguns anos faz algumas viagens mas é em 1887 que chega a Macau, onde estará estacionado até 1898, tendo de Atchan, uma mulher chinesa, dois filhos. Em 1893, apaixona-se pelo Japão ao visitá-lo pela 1ª vez, mas será só após uma missão oficial em 1897, na qual acompanhou o governador de Macau Eduardo Galhardo e foram recebidos pelo Imperador, que a decisão de abandonar a Marinha e o professorado que exercia em Macau se concretiza, sendo nomeado, a instâncias do governador Eduardo Galhardo, cônsul em Kobe, em 1899 e como tal recebido pelo imperador.
Aí encontra uma gueixa, Ó-Yoné Fukumoto, que amará, como querida companheira, e depois da morte dela, demitir-se-á do consulado em 10 de Junho de 1913, para ir para a terra da sua querida companheira Ó-Yoné, a cidadezinha de Tokushima, onde viverá menos harmoniosamente no relacionamento que acontecerá com a sua sobrinha Ko-Haru, que também morrerá antes dele, descrevendo com intensidade a dupla partida precoce de tais almas.
Viverá assim sozinho de 1916 a 1929 em Toskushima, «nesta terra de deuses e de buddhas, em Tokushima, onde eu vim estabelecer o meu albergue, onde vim em procura da paz, da tranquilidade, para o corpo e para o espírito... com a esperança inconfessada, mas profundamente sentida, de entrar aqui em íntimas relações com eles, com os meus mortos». Neste sentido escreverá ainda no seu livro Bon-Odori em Tokushima (Festival dos Mortos na cidade de Tokushima), Porto, 1916: «Não haverá nos espaços da nossa atmosfera encontros e embates entre as hertzianas e muitas outras ondulações de forças ainda hoje apenas imaginadas ou absolutamente ignoradas?... E não constituirão os espíritos dos mortos uma dessas estupendas forças de mistério? Ao povo japonês, pelo menos, não repugnaria a hipótese, ele que admite a descida periódica à terra durante o Bon, a festa dos mortos, dos seus queridos desaparecidos». E vai cogitando e meditando as subtis realidades do ser humano e da natureza, escrevendo livros e artigos para revistas, correspondendo-se com alguns amigos e editores (de que resultaram livros) e enviando centenas de pitorescos postais nipónicos para a sua irmã Chica, muitos dos quais Armando Martins Janeira e sua mulher Ingrid partilharam por diversos modos e ocasiões.
Wenceslau de Moraes, sendo um ser intuitivo e de imensa sensibilidade à natureza, à beleza, aos afectos, costumes e objectos, conseguiu sintonizar e entrelaçar-se muito bem com a grande alma do Oriente nipónico e com as especificidades subtis do seu povo, pelo que, como fruto dos seus 31 anos no Japão (1898 a 1929), escreverá belíssimos livros de impressões suaves, reflexões filosóficas ou mesmo arrojadas especulações e subtis intuições, sobre o Japão, as suas terras, gentes e animais, costumes e provérbios, história, mentalidades e religiões.
As capas dos dez livros fotografados representam os principais livros que publicou, destacando-se pela sua graciosidade e qualidade gráfica o Culto do Chá, impresso em papel de arroz, e que tem tido sucessivas reimpressões.
Destaquemos brevemente alguns dos seus ensinamentos mais significativos ou valiosos: «Duas religiões, principalmente, infiltram-se, pelas suas crenças, na alma japonesa: o shintoísmo, nativo, e o buddhismo, importado da China, por via da Coreia, — ambas com os seus templos. Os deuses adoram-se nos templos shintoísticos, O’-Myra; os budhas nos templos buddhisticos, O’-Tera. Estas religiões completam-se, pelas influências que exercem no íntimo da alma nipónica».
Destaquemos brevemente alguns dos seus ensinamentos mais significativos ou valiosos: «Duas religiões, principalmente, infiltram-se, pelas suas crenças, na alma japonesa: o shintoísmo, nativo, e o buddhismo, importado da China, por via da Coreia, — ambas com os seus templos. Os deuses adoram-se nos templos shintoísticos, O’-Myra; os budhas nos templos buddhisticos, O’-Tera. Estas religiões completam-se, pelas influências que exercem no íntimo da alma nipónica».
Pouco conhecido no Ocidente, o Shintoísmo, o caminho de Deus, descreve no seu registo sagrado, o Kojiki, o surgimento de formas individualizadas a partir da diferenciação polar centrífuga e centrípeta do infinito. Tendo como objectivo uma consciência ou julgamento supremo, preconiza a purificação do corpo, ambiente, coração e alma, usando o banho frio, o sal (tal nas lutas de sumo), a dieta, a postura direita, a aquietação mental, e a unificação anímica dos opostos, a fim de que o ser humano se torne makoto, seja ele próprio. O Imperador do Japão, como símbolo da humanidade perfeita, possuiu os três tesouros sagrados: a espada (Kusagani), a jóia (Yata no Kagami) e o espelho (Yasakami no Magatama), este tão famoso seja gnóstica seja magicamente em tantas tradições. Já os santuários (O'Tera, Jinja) destinados a cultivar os Kamis, os espíritos, invocam sobretudo o fluxo unitivo entre as dualidades complementares, seja céu e terra, visível e invisível, espiritual e material, na maior simplicidade arquitectónica, de vestes, ritualística e de orações (noritos).
Wenceslau de Moraes dirá ainda sobre a religiosidade nipónica: «Feliz gente, muito feliz!... Feliz gente, que passa a vida em comunhão com os espíritos superiores que regem os destinos do Nippon; sem flagelar-se, sem penitenciar-se, porque as suas crenças não comportam mortificações e penitências».
A profunda espiritualidade de Wenceslau de Moraes, bem como a sua posição na Tradição Espiritual Portuguesa, nomeadamente no seu diálogo com o Oriente e na sua religiosidade tão própria, apesar do valioso contributo equilibrado do seu primeiro biógrafo e estudioso Armando Martins Janeira, embaixador no Japão, da fotobiografia de Daniel Pires, ou do estudo algo mistificador de Helmut Feldmann, continua ainda por ser plenamente compreendida, destacada e divulgada na sua originalidade e valor. Quem quiser realizar mais tal, estou disposto a orientar ou cooperar...
A profunda espiritualidade de Wenceslau de Moraes, bem como a sua posição na Tradição Espiritual Portuguesa, nomeadamente no seu diálogo com o Oriente e na sua religiosidade tão própria, apesar do valioso contributo equilibrado do seu primeiro biógrafo e estudioso Armando Martins Janeira, embaixador no Japão, da fotobiografia de Daniel Pires, ou do estudo algo mistificador de Helmut Feldmann, continua ainda por ser plenamente compreendida, destacada e divulgada na sua originalidade e valor. Quem quiser realizar mais tal, estou disposto a orientar ou cooperar...
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