quinta-feira, 8 de fevereiro de 2018

Das Bibliotecas e Livros e seus efeitos anímicos. Da biblioterapia como medicina simples.

As bibliotecas das pessoas, dos escritores (e até dos livreiros e instituições) permitem deduzir, do seu conteúdo e temáticas, as orientações, afinidades, gostos, influências, amizades e inspirações dos  possuidores. Todavia, a menos que haja anotações e referências, não saberemos bem o que foi lido e apreciado, repelido ou assimilado, embora certamente se possam encontrar na obra de um escritor referências, citações e sinais de afinidades ou influências que certos livros ou autores exerceram.
                                        
É rara a casa que não tenha as suas estantes de livros e revistas, poucas as pessoas que não recorrem a eles para aprender, comungar ou evadirem-se, descontraírem-se, deliciarem-se ou então adormecerem com a mente mais aconchegada. E se houve escritores que tiveram poucos livros, ou que leram com dificuldade em bibliotecas públicas ou de outros, muitos há que se viram rodeados de boas companhias, podendo navegar em diferentes cursos psico-energéticos e atingir certas intuições, compreensões e visões novas, originais mas a partir de estímulos e antecessores, que acabaram por se incorporar nas suas almas e escritos e, eventualmente, em quem os ler...
                                               
Assim, cada casa, cada pessoa deveria ter uma razoável biblioteca para a evolução pessoal sua e da Humanidade, ainda que, nos tempos modernos, os computadores e a internet sejam por vários modos, nomeadamente por possuírem já descarregados ou reproduzidos milhões de livros e folhetos, excelentes bibliotecas globais, ainda que virtuais e logo com certas limitações, seja de contacto físico, manual, seja de fixação anímica e talvez até mnemónica do que se lê...
Em verdade, os livros e revistas, com todas as suas subtis particularidades, desde os autores aos assuntos, das datações às dedicatórias, das encadernações e ilustrações às anotações ou marginália, do tacto ao cheiro do papel, são preciosos companheiros para quem quer aprofundar os mistérios e maravilhas do universo e da humanidade e, particularmente, para os estudantes, pensadores, escritores, historiadores, investigadores, artistas, criadores, comunicadores.
Todos nós sabemos quanto podemos receber psico-somaticamente ao manusear e ler com atenção, gratidão e amor qualquer obra que a sabedoria dos séculos nos lega, ou nos permite aceder, e com ela viajar no tempo e nos mundos psico-espirituais, nos quais tantas riquezas há para suprir as necessidades da Humanidade, ainda tão mergulhada na ignorância, na violência, no egoísmo, no sofrimento, ou manipulada para tal por forças, grupos e seres anti-culturais, anti-libertadoras, opressivas, redutoras...
Podemos dizer então que cada livraria ou biblioteca, ou livro é uma mezinha, um medicamento para harmonizar e curar, um fermento de transformações, uma semente de novas manifestações luminosas e benéficas, uma defesa face à invasão manipulante e massificante que nos rodeia ou nos penetra pelos meios de informação e a publicidade.
O livro no seu suporte de papel, pergaminho ou papiro, pela sua durabilidade e pela sua proximidade e intimidade, será sempre então um dos melhores instrumentos de harmonização e elevação humana e, como tal, o presente ideal que as pessoas oferecem e acolhem, lêem e anotam, criticam ou amam, e com eles se harmonizam.
Quando entramos na casa de alguém frequentemente a nossa primeira impulsão é ver as obras contidas nas estantes, o que essa pessoa leu ou mostra e, ainda que nem queiramos, a partir até de uma mera vista de olhos (se for de conhecedor...) poderemos intuir algumas das características das pessoas que os juntaram, leram, possuíram, amaram...
 Constituirmos a nossa própria biblioteca, e saber ordená-la, e ter mesmo em destaque ou de mais fácil acesso as obras que mais nos tocam,  com as quais  trabalhamos ou os autores com quem  sentimos melhores afinidades e sintonizamos, é então importante, construindo-se assim ilhas valiosas, insuspeitadamente interligadas em redes invisíveis no mundo subtil da Grande Biblioteca Mundial, às quais podemos até convidar a desembarcarem pessoas amigas a fim de desfrutarem da sabedoria e dos prazeres que tais fontes vivas nos transmitem.
 Todos sabemos como algumas bibliotecas se transformaram em quase ilhas utópicas, até no sentido que pela sua singularidade, beleza e raridade não podem ser facilmente acedidas, reforçando-se assim a sua aura, a que hoje as imagens livres virtuais na Web ainda mais realçam, ainda que desvendando-as incompletamente, sem a verdadeira energia do local e dos livros palpitantes ao vivo... 
 A Biblioteca de Mafra, a da Universidade de Coimbra, a da Academia de Ciências de Lisboa, a Vaticana, a de Paris, a do Escorial, e outras famosas, serão algumas das mais notáveis. Mas não devemos menosprezar as  apenas nascidas da bibliofilia de almas mais entusiastas, outras nascidas de legados post-mortem, destacando-se nestas as que tendo pertencido a escritores ou investigadores, e não foram dispersas em leilões ou passadas a diferentes instituições e pessoas, conservam a sua autonomia, diríamos mesmo a sua individualidade, especialmente quando se mantêm no local onde sempre estiveram, rodeadas da memória subtil dos momentos em que as mãos do escritor ou dos seus amigos manusearam os livros, dialogando-o e de mais vida e alegria os inundando. Neste sentido deveria haver mais casas-bibliotecas museus, como polos culturais dinamizadores, constituídas a partir de boas bibliotecas não dispersadas pelas leiloeiras e alfarrabistas, embora certamente estas cumpram um papel bem importante nesse partilhar...
Livros para leilão, em Lisboa...
Não há ainda máquinas digitais que consigam medir a intensidade vibratória que cada livro de uma biblioteca ganhou pela passagem pelas mãos, pela leitura, pelas anotações, pelas trocas psico-energéticas desencadeadas a partir do tabuleiro de xadrez da impressão invertido na cabeça das pessoas e sentido e compreendido na alma em compreensões, intensificações e iluminações...
Alguns de nós, todavia, já terão certamente contemplado por momentos uma estante a certa distância antes de se aproximarem e acolherem o  livro que lhes pareceu mais vibrar ou os chamar. 
Talvez o melhor, quando temos seis ou sete prateleiras à nossa frente, seja escolher uma e depois até ir passando os olhos pelas lombada dos livros, vendo-os a vibrarem, e tentarmos discernir qual é o mais palpitante e tremeluzente que se quer dar às nossas mãos e almas, para depois identificarmos quem o escreveu ou mesmo o anotou. E que talvez deseje diálogos, continuadores e, logo, mais luz e amor no planeta e no cosmos psico-espiritual.
Outra hipótese de trabalho será, depois dessa passagem ou entrada dos olhos-mente nos livros, ficarmos numa percepção desfocada de todos e abrir mais o coração e tentar sentir qual é o que mais nos envia os seus raios, qual é o que mais nos impacta invisivelmente e nos quer fazê-lo arrancar do seu poisio à sombra, quem sabe se já longo, e trazê-lo à luz solar e ao calor amoroso que o ambiente e os nossos olhos, almas e mãos nele introduzem, deles acolhendo tantas potencialidades "suaves, deliciosas, exultantes", três palavras que eu retiro agora da obra antiga que me atraiu de uma estante, as Anotações críticas ao Novo Testamento síriaco, por Egidio Gutbirii, de 1706, impressas em Hamburgo. Mas, vendo melhor o livro, e temos um belo exemplo da riqueza dos livros, da sua capacidade de serem espelhos do passado para o futuro, dou-me conta que a obra tem outro frontispício, começando portanto tanto no fim como no princípio do volume, se o manusearmos da esquerda para a direita, surgindo o começo do Novo Testamento ora em síriaco ora em latim, quem sabe sugerindo-nos que devemos ler e reler aquelas obras que impulsionam mais a nossa religação com a Fonte, com a Sabedoria e Ser Divino, e que constituem portanto o princípio e o fim de tudo...
Os livros são então boas novas, evangelhos, trazendo sabedoria que se acrescenta à nossa, luz sobre luz e, em certos casos, os mais frequentes, os livros sendo já escritos sobre outros livros, introduzem-nos numa cadeia de elos de sabedoria quase infinita, adentrando-nos no vasto campo bibliográfico mundial e no corpo místico dos escritores e pensadores da Humanidade, ou dos seres e temas que eles partilharam...
E, assim, sobre a informação e ambiente  que alguém num presente-passado trabalhou, recriou, descobriu e passou ao futuro, nós agora, os leitores que de novo o retomamos,  reactualizamo-lo de um modo ou outro mais luminoso neste presente e para um futuro que desejamos melhor graças aos nossos contributos...
E tal circulação de saber, energia e graça realiza-se seja pelo que sentimos, anotamos, mencionamos, seja pelo que aprofundaremos e escreveremos já posteriormente e independentemente, cada livro do passado sendo como uma semente lançada de uma planta matura, e estática se ficar em terra estante parada, mas que cresce ao ser lida e se multiplica ao renascer noutra escrita, espaços e tempos, de novo dando ou proporcionando cores e perfumes, ideias e imagens, impulsões e clarificações.
Realcemos de novo as palavras e estados de alma recolhidos há pouco nas três palavras: a suavidade, a elevação e a delícia.
Possam os livros intensificar tais efeitos em nós, fortificando-nos no corpo e na alma das emoções e pensamentos e gerar frutos de vida eterna, ou seja, que iluminando mais as pessoas, as façam reintegrar-se mais harmoniosamente neste planeta, sistema solar e humanidade em história e evolução, de modo a que levemos o que se leu e amou  no corpo espiritual ou de glória, esse com o qual avançamos mais ou menos conscientes, aqui e aquém, rumo a melhores comunhões seja com os outros escritores seja com Divindade, na Unidade amorosa, suave, deliciosa, elevante.
E nestes tempos graves de "cofinagem" nada melhor que os livros, com que mais aprendemos ou nos ligamos beneficamente, para na sua discreta e dialogante biblioterapia, nos apoiarem, harmonizarem, inspirarem, pela disponibilidade, paz, silêncio, suavidade, simplicidade, sabedoria ou mesmo Amor que catalizam em nós e no ambiente...
Ornamento da estrela pentagonal, por Bô Yin Râ

2 comentários:

foureaux disse...

Uma lição a aprender, este seu texto. Fico a pensar naqueles que não colecionam livros, mas que leem. Seria o mesmo, pois mão? Ando numa "maré" de desilusão que me faz pensar na carga de estereótipo que uma "biblioteca" pode carregar. Veja bem: sou entusiasta dos livros e da leitura, mas não posso me furtar à oportunidade de uma "cutucada", mesmo em meus próprios valores e opiniões! Obrigado por seu texto! Abraço

Pedro Teixeira da Mota. disse...

Graças pela apreciação e cutucada, no texto, nos livros-bibliotecas e em nós mesmos. Pois, os livros pesam, seja no transporte, no espaço da casa, no preço, na gravidade que encerram em si e que transmitem aos outros e portanto acho muito sã uma certa apreensão entre o passar do ler para o juntar>coleccionar e logo biblioteca gerar.
Parece-me todavia que cada ser tem uma vocação especial com os livros, seja mais activa de os procurar ou escrever seja mais passiva em os ler, e que eles geram relações, criatividades e amores imensos, pelo que deveremos fluir com eles de acordo com o nosso coração e a mais pragmática razão e, idealmente, sempre em uníssono com a Sabedoria que por eles se expressa...
Boas inspirações e abraço luminoso!