Cartaz da exposição de curadoria do Alberto Guerreiro, com uma das notáveis fotografias de Jorge Prata. Seguem-se dois dos trabalhos da Maria De Fátima Silva. |
As fotografias dos túmulos, por Jorge Prata, numa imagem da autoria do Alberto Guerreiro.
O delicado e original trabalho de João Leirão e Cristina Henriques Fotografia de todos os artistas participantes, rodeando o Alberto Guerreiro, director do excelente museu. Fotografia
da frente do painel, e tal como a seguinte captada pelo João Leirão, onde estava o meu
contributo, que transcrevo acompanhado de sete
fotografias obtidas na igreja do mosteiro antes de nos dirigirmos para a
exposição. INÊS E PEDRO: AMOR ATÉ AO FIM DO MUNDO... Quando Inês e Pedro, a Galiza e Portugal, em 1340, se encontraram e apaixonaram: olhos, cabelos e gestos, forma, voz e espírito, não poderiam antever como o fogo do amor aceso nas suas almas, e irradiante por quinze anos, da Lisboa cortesã à Coimbra das ninfas do Mondego e das fontes, da Serra d'El- Rei e Moledo ao rio Douro e Oceano em Canidelo, atingiria a perenidade de nos congregar, quase setecentos anos depois, nesta exposição, em Alcobaça, terra e junção de rios sagrada e onde os seus corpos e almas estão sublimemente imortalizados. Inês de Castro, ao ser morta violentamente, no sombrio 7 de Janeiro de 1355, no paço de Coimbra, em plena formosura, maternidade e doçura, derramou a sua energia por toda a eternidade, e a paixão que os transfigurava circula ainda hoje no sangue e alma dos que os amam e intuem os seus êxtases e dores e aspiram ao desabrochar do coração e do amor, da liberdade e da unidade. Depois das oposições e desterro saudoso, morrendo D. Constança, viveu alguns anos Inês com ele, ledos e de comunhão com a natureza, coroada de rosas e boninas por D. Pedro oferecidas e, dessa intimidade nua e pura inscrita no coração, em três partos foi abençoada. Mas, depois, quanta apreensão pelas ameaças, quanta revolta e luta face aos assassinos, quanto sacrifício na entrega à morte e abandono dos meninos, olhos postos no céu cristalino? O pleno amor de Ynês, subitamente ceifado, permanecerá vibrante em Pedro e entrará no além e no imaginário, fecundando a grande alma portuguesa e europeia na demanda da justiça, da beleza e do amor, inspirando muitos a exaltar Inês como musa e mártir ungida.
Depois da guarda do corpo de Inês pelas sorores clarissas nas margens alagadiças do Mondego, em Abril de 1362 dá-se a sua impressionante trasladação para a firme Mater cisterciensis de Alcobaça, ao qual se juntará o de Pedro em 1367, e os túmulos vão tornar-se um íman impulsionador de criações artísticas e literárias, lendas e mitos, no culto dum Graal de amor extremo. O perigo da audácia traiçoeira dos adversários da relação ou casamento, perigosa para o Reino segundo eles, fora negligenciado por Pedro e, ao ausentar-se para o exercício da montaria, deu azo à fatalidade da qual ninguém poderá sentir o impacto desintegrante na sua alma e cérebro, bem como nos três filhos de tenra e impressionável idade. Em "grande desvairo", como narra o cronista Fernão Lopes, D. Pedro, sangrando, com as suas hostes e as dos irmãos de Inês vindas da Galiza, faz seis meses de razias no Entre Douro e Minho, onde os conselheiros culpados tinham suas terras. Acercando-se do Porto, porque o Rei e o seu exército já estavam em Guimarães, e pela mediação do Prior do Crato e de D. Beatriz, santa mãe e avó, assinam-se três acordos de amnistia e concórdia, em Agosto de 1355, jurando D. Pedro o perdão dos matadores e recebendo poderes judiciais. Passados dois anos, com a morte do pai, D. Pedro, rei e senhor da Administração e da Justiça, assume a responsabilidade de as bem executar, e logo revoga o juramento pronunciado verbalmente, enquanto alma mutável mas não de coração e faz morrer cruelmente dois dos culpados. Confiava na justiça e misericórdia Divina, e nas orações e missas, velas, aspersões e incensos que os frades cistercienses lhes consagrarão durante séculos, e só os clarividentes intuirão os efeitos subtis de tais elementos, sons e intenções nas suas almas ascendendo no corpo místico da Igreja.
O cognome de Justiceiro ou Cruel será apropriado conforme as circunstâncias, pois tal virtude cardeal tão demandada por Pedro e exercida duramente, também o foi sublimemente, ao fundar a obra-prima da estatuária jazente portuguesa, fazendo justiça ao amor divino incarnado e tão precocemente separado, imortalizando-o na união artística da Mors-Amor, sublimadora dos participantes das limitações corporais e históricas. A perenidade exemplar do amor de Pedro e Inês, vencendo interesses políticos e matrimónios de conveniência, ódios, fragilidade e morte, brota tanto da intensidade do Eros vivido e da unidade alcançada, derramados por seus descendentes e todos, como da arte dos anónimos artífices dos túmulos, orientados por D. Pedro e os monges brancos alcobacenses. As suas vidas e sentimentos, cinzelados em rosáceas e pétalas animadas de cenas historiadas e íntimas, em roda da vida e via sacra paralelas à dor e amor do ungido Jesus e do mártir e mítico apóstolo das Índias S. Bartolomeu, fecundarão de modos caleidoscópicos os sucessivos peregrinos, poetas e fiéis do Amor que as admirarão. A numinosidade serena das faces de Inês e Pedro, brotando das suas estátuas jazentes, entre seis pares de anjos de guarda, é uma iniciação ao fogo do Amor divino no coração, e à luz da Sabedoria no olho e corpo espiritual, ou de glória, de cada um. A missão de revificar o fogo do amor unificador e imortalizador de Inês e de Pedro, e em quem ama, pois provimos do Logos solar e devemos emaná-lo em reciprocidade e criatividade, inspirará ao longo dos séculos os que entrarão nesta grã-corrente e tenção do "quem puder fazer bem, faça" (Garcia de Resende), do "désir", divisa do infante D. Pedro (seu neto e de Teresa Lourenço, da Galiza), e do amar "até ao fim do mundo", fortificando a chama do Amor, na condição humana frequentemente "mísera e mesquinha", tal como nos Lusíadas canta Camões para Inês, na esteira de Sannazaro no De Partu Virginis para Maria, tal como discerniu Faria e Sousa. Ao lermos, ouvirmos e admirarmos tais criadores e criações unimo-nos num culto à liberdade e beleza, energia psíquica e amor, na religação ao espírito, à Divindade, ao Cosmos, no campo unificado pluridimensional de energia consciência informação. Que o nosso coração e ser brilhem flamejantes, em sintonia com Jesus e Bartolomeu, Inês e Pedro, os anjos e arcanjos e a tradição Espiritual de Portugal. Viva Deus, santo Amor! |