Quando um grande amor é cortado precocemente na terra é oportuna a intervenção angélica para apaziguar as almas feridas e separadas e muitos ritos religiosos inserem-se nessa tentativa de serenarem-nas e orientarem-nas para estados conscienciais menos emotivos e mais lúcidos e universais, caracteristicamente vividos pelos Anjos e grandes Seres...
Os escultores de Alcobaça dos túmulos de Inês e de Pedro conseguiram cumprir essa tarefa exemplarmente e poderemos crer que com a sua materialização no calcário moldável do amor imutável, Inês (1355) e Pedro (1367) avançaram nos mundo espirituais mais harmonizados, menos revoltados e calmos e clarividentes com os Anjos, celebrados e esculpidos como os que os acompanharam mais de perto para além do mundo físico e da morte trágica e traiçoeira, guiando-os para a reunião e rumo à Fonte de Luz e Amor divinos.
É como numa barca, de Ísis ou da Senhora da Boa morte, que Inês navega da terra e se interna nesse além oceano misterioso e ao princípio tenebroso mas que a breve trecho dá lugar à Luz e à Paz que a companhia dos Anjos mais intensifica.
As duas vias principais nas quais nos internamos quando mal ou bem procedemos foram alegorizadas neste painel facial como o caminho para o inferno e o caminho para o paraíso, aquele considerado como o local sem luz e sem ligação com Deus, este último como o da beatitude e da comunhão amorosa e luminosa entre os seres humanos e na sensação, presença ou contemplação de algo de Deus.
Para os portugueses e ocidentais dos séculos XIV e XV certamente que as principais referências de vidas exemplares eram a vida de Jesus e as dos santos e santas, e assim se representavam nos frontais (laterais) do túmulo ou bombordo da embarcação mágica do final da vida tais exempla.
O cerne da viajem era contudo individual e interior e com que suavidade, amor e poder os Anjos afeiçoam a cabeça de Inês e lhe transmitem a vibração justa, orientando-a para a Luz Divina, de modo a que a sua alma espiritual consiga passar através dos remoinhos astrais e elevar-se nos planos subtis e espirituais, em perdão e em amor-paixão-adoração-união.
No chakra da cabeça, o mais subtil e difícil de ser trabalhado, vemos traçado uma cruz templária, ou uma cruz e flor octogonal, de forma perfeita, assinalando até que ela foi um mártir, uma crucificada pelas razões do Estado e pelas forças e seres do anti-Amor...
O ponto central do ser, da cabeça e do espírito irradia e comunga com o Cosmos pelos oito raios que fluem em oito míticas direcções do espaço, gerando bem-aventuranças por tais capacidades e qualidades sentidas e desenvolvidas. Os mestres escultores coroaram o chakra superior da alma de Inês com todo este potencial e programa psico-mórfico e certamente tanto na época como ainda hoje tal simbolismo opera, emana...
A paixão de Jesus e de Madalena, além de Maria e João, está invocada na zona facial do túmulo provavelmente não só como invocação católica mas sobretudo abrindo uma espaço de tradição crística: Inês foi também um ser sacrificado e ungido, este ungimento feito primeiro pelo Amor que os uniu e depois pelo rei D. Pedro no beija-mão real e coroamento e na encomenda final aos mestres canteiros de Alcobaça desta obra prima. E por todos os que têm vibrado ao longo dos séculos em empatia de amor com ela...
Diz o Amor à Amada: Desta altura em que nos encontramos vejo que o rio chegou ao Oceano, e os nossos seres ao Ser...
Eis a vera efígie de Inês...
"Dobrei a minha face com as mãos juntas nela e invoquei o Amor e a Divindade, ousando erguer a visão em adoração..."
A visão espiritual e a elevação da vibrações, a entrada no coração e a expansão da consciência são muito necessárias para a preservação do estado de amor e de unidade...
A disposição dos dois túmulos separados nos dois braços do transepto da igreja é discutível, tanto mais que inicialmente foram erigidos juntos, D. Pedro dando a direita a Inês, sua alma-gémea e sua reintegração na Unidade Divina.
Embora com tal disposição separada se fortifique a polaridade, encarnando-a na própria igreja, podemos pensar que o Rei e o Amor se tinham querido mais juntos, embora certamente o verdadeiro Amor vença todas as distâncias, do espaço e do tempo...
A vasta nave que liga a terra e o céu e onde oramos diz-nos que a natureza aborrece o vazio e que no aparentemente nada existe todo um mundo de vibrações e energias, formas, cores e sons que celebram e comunicam o mistério do Amor e de Deus, e dos espíritos que comungam com eles, como Pedro e Inês....
Gate, gate, paragate, parasamgate, bodhi swa, reza o mantra budista impulsionando no seu avanço para a Luz quem passou para além da ilusória vida e vive já mais no Amor, na Sabedoria e na Paz.
A fotografia mostra-nos como temos de concentrar-nos e de focarmos bem para sentirmos mais e comungarmos o Amor Divino e perene que nos percorre e anima...
Amor...
Sem comentários:
Enviar um comentário