quarta-feira, 6 de novembro de 2013

Da Imortalidade na vida e obra de Fernando Pessoa: um contributo de Pedro Teixeira da Mota..

     Da Imortalidade em Fernando Pessoa. Contributos ou centelhas para iluminar um pouco mais a aura e alma do seu nome, palavra e Ser, em si e em nós, e para que possamos ter mais destemor justificado em relação à morte...
Podemos dizer que a intensa busca da imortalidade psico-espiritual por parte de Fernando Pessoa desenvolveu-se, e segundo ele, por duas vias principais, assinaladas em duas cartas à sua namorada Ofélia Queiroz, a qual poderia constituir a terceira via imortalizante, na descendência carnal, que ele contudo não quis ou não pode assumir. E são elas, na ordem das duas justificações do fim do namoro: o destino e a demanda ligados aos Mestres, e a dedicação à obra literária, à volta da qual a sua vida girava ou se entretecia.
Dotado de um oceano anímico muito vasto e poderoso, Fernando Pessoa teve de desdobrar-se em vários pseudónimos, heterónimos e grupos, através dos quais exprimiu e aprofundou diversos estados de emoções e consciência, pulsões e concepções de vida que o multiplicaram e dispersaram mas não o impediram de se manter lúcido até ao fim, na demanda da compreensão da Verdade, ciente da sua razoável verticalidade espiritual, certo de que morrer seria apenas o dobrar de uma esquina do Caminho que ele soubera percorrer com genialidade e dignidade, inteligência e sentido de missão, apesar de todas as vicissitudes e limitações que apressaram o desagregar do seu invólucro corporal e o seu enfraquecer afectivo.

«- Ó curva do horizonte, quem te passa,
Passa da vida, não de ser ou estar.
Seta, que o peito inerme me trespassa
Não doas, que morrer é continuar».

A sua profunda cosmovisão, alicerçada (ainda que por vezes algo tremida pelos abismos de que o seu Fausto nos relata) em abrangentes estudos ocultistas e gnósticos e provinda de alguém capaz de ser de certo modo tudo das mais diversas maneiras e de buscar sempre os sentidos dos símbolos e ensinamentos da Tradição, bem como, em certa medida, a ligação aos mestres e a Deus, revela vários aspectos doutrinários mais ou menos esotéricos, tais como a Unidade e a Trindade Divina, a Hierarquia dos seres, o conhecimento dos planos ou níveis do Universo, a triplicidade corpo, alma e espírito, com a preexistência dos dois, e a via iniciática, sobre a qual muito reflectiu, escrevendo, por exemplo: «o verdadeiro sentido da iniciação é que este mundo visível no qual vivemos é um símbolo e uma sombra, que esta vida que conhecemos através dos sentidos é uma morte e um sonho, ou, por outras palavras, que o que vemos é uma ilusão. Iniciação é o dissipar - um dissipar gradual, parcial – dessa ilusão».
Face a esta dupla demanda, alicerçada em tantas especulações mais ou menos verídicas ou correctas, talvez a mais certeira tenha sido a da conquista da celebridade imortal pela sua obra literária,  antevista e expressa ousadamente na profecia do super-Camões que estava a chegar, quando tinha apenas 24 anos, em 1912, na revista Águia, da Renascença Portuguesa, de Teixeira de Pascoaes, Jaime Cortesão e Leonardo Coimbra, este vindo a publicar em 1918 a importante obra A Luta pela Imortalidade, onde narra certas experiências psíquicas que realizou e que muito provavelmente Fernando Pessoa terá lido, já que o admirara bastante, confessando-lhe mesmo em carta: «eu conhecia já de sua obra-base, as grandes qualidades e os (a meu ver) alguns defeitos do seu espírito, o mais alto, porventura, porque plenamente lúcido e intelectual, que a nossa Raça hoje reveladamente possui» (in Agenda do Centenário de Fernando Pessoa. Lisboa, 1988)
Não era um delírio narcisista  nem uma mistificação para incomodar os burgueses, mas uma revelação da sua precoce e intensa genialidade e pressentimento dela. Neste sentido, e são muitos os textos sobre o génio, referindo-se a Milton, diz-nos belamente que ele «escreveu os seus sonetos como se cada um deles fosse o candidato à sua imortalidade. Pôs o todo da sua alma em cada parte do que exprimia num momento. Assim deve ser o génio – uma sentinela dos deuses grandiosos que em nenhum momento pode dormir».
Ora se a genialidade literária imortal tem sido bem reconhecida e estudada já a demanda mais esotérica da imortalidade, que o levara, por exemplo, na curiosa e juvenil idade a interessar-se pelo espiritismo, ou a recorrer à escrita automática, processos que veio compreendida ou aceite, talvez porque tenha sido registada em fragmentos e textos longamente inéditos, e por ser difícil de se vivenciar e ainda pela oposição materialista ou de outro género de muitos dos investigadores ou publicistas pessoanos…
Ora tal demanda, e depois convicção, assentava segundo ele próprio primeiramente num instinto, tal como nos afirma: «a fome deve ser satisfeita pela comida e a fome da alma da imortalidade pela própria imortalidade. Ambas são instintos verdadeiros», e depois em leituras, compreensões e intuições que Fernando Pessoa realizou com constância e das quais hoje podemos ler os vestígios em breves textos ou ensaios, nomeadamente nos que escreveu sobre os Mistérios da Antiguidade e os seus ensinamentos reveladores da imortalidade da alma: «Era em Eleusis, não em Atenas, que se sabia a boa-nova. A doutrina da ressurreição era pois tida por imprópria para se dizer aos profanos, que serão sempre a maioria: era considerada como tema e motivo de iniciação; como doutrina verdadeira, porém para raros somente». 
Também em textos sobre as influências na Europa do espiritismo e do ocultismo, encontramos Fernando Pessoa a valorizar a imortalidade da alma como uma doutrina metafísica «enquanto insusceptível de prova e contendo, de qualquer modo, a ideia do infinito», bem acima das provas da sobrevivência da alma tão procuradas pelos espíritas.
Noutros ensaios, intitulados Reincarnação, onde depois de afirmar que a rosa crucificada é também um símbolo da reincarnação, tenta determinar como poderemos calcular quem fomos na reincarnação anterior, e noutros textos intitulados em epígrafe Crisálida ou Fénix,  considera o génio como a iniciação obtida noutra vida. 
E cogitando, ou afirmando, sobre a complexa questão da metempsicose, escreverá num texto sobre o Sebastianismo, numa linha ou hermenêutica algo mágica, e que ele de algum modo praticou pela escrita e propaganda: «A metempsicose. A alma é imortal e, se desaparece, torna a aparecer onde é evocada através da sua forma». Já num poema de 1932 traça de novo o encadeamento da vida e a queda neste mundo, tal como ele vê: «Em outro mundo, onde a vontade é lei, / Livremente escolhi aquela vida/ Com que primeiro neste mundo entrei./ Livre, a ela fiquei preso e eu a paguei/ Com o preço das vidas subsequentes/ De que ela é a causa, o deus; e esses entes,/ Por ser quem fui, serão o que serei.»
Em verdade, Fernando Pessoa sentiu desde muito novo, tal como os gnósticos e os místicos de todos os tempos, que a origem da sua alma-espírito não era deste mundo, que em si é incompleto («porque a vida é só metade»), mera sombra e sonho do espiritual e, talvez por isso, a sua já imensa criatividade interrogante e dialogante juvenil.
Numa época de crescimento do materialismo reducionista, do agnosticismo e do ateísmo, que deu origem a tanto desassossego e descrença, como também a tanta reacção ou compensação espírita, ocultista e iniciática, por vezes bastante mistificadoras, vemos que Fernando Pessoa sentiu-se e afirmou-se convicto da imortalidade desde muito novo e terá tido um percurso rico de ideações e consciencializações neste sentido, que algo perpassa num ou noutro texto para quem os sabe sentir e ver.
O próprio termo de metempsicose, frequente em poemas de Fernando Pessoa, é já aos 14 anos, no jornalzinho Palrador do Dr. Pancrácio, o título de um poema, significando a metamorfose da psique que se opera nele em «mística ternura» desde que avistou uma formosa jovem e que um «celeste olhar de suprema candura» desterrou da sua «mente o que é vil, nefando», de modo que «é a sua alma pura que em minha alma habita!!», revelando já os sonhos e ideais que em vida não conseguirá tanto realizar. E aos 16 anos, ou seja, em 1904, sob o nome de Alexander Search, diz poeticamente: «pequena flor, não choro por ti/Nada, verdadeiramente, morre/ Estás agora em Deus, e estás em mim /Estás nos céus certamente».
Na sua fase juvenil crítica e idealista valorizou a ideia de uma certa condicionalidade da imortalidade, e com a qual manterá uma afinidade dada a sua posição algo aristocrática, como transparece no que nos diz comentando uma obra ainda hoje na sua biblioteca: «– Imortalidade condicional. Drumond e a sua teoria do “spiritual environement”. Imortalidade condicional. Só quem tem estado em relação com o ideal é que não morrerá para ele. Antes não se pode dizer que “não morrerá”, mas sim que “continuará morto” para o ideal. Há apenas uma injustiça relativa – em não dar a alguns a vida eterna. Quem nunca viveu num meio, não pode morrer para ele. Aquele livro estupendo: Natural Law in the Spiritual World».
Da leitura deste livro talvez provenha o seguinte fragmento dos seus numerosos escritos sobre o "Cristismo" ou o Cristianismo: «A imortalidade é condicional: leva a ela a prática do Bem, tira-a a prática do mal e o único castigo de Deus é morrermos inteiramente», exemplificado um pouco mais à frente no mesmo texto com a afirmação: «Cristo é a vida eterna, a imortalidade tornada carne para nos vir mostrar pelo exemplo das suas acções qual o caminho que devíamos seguir para obter a vida imortal».
Da sua biblioteca, ainda hoje continuando  mal catalogada tematicamente, na casa museu Fernando Pessoa, constavam obras bem afirmativas da imortalidade espiritual, tais como as de Xavier de Maistre, Sir Walter Barret, Gustave Geley, Gabriel Dellane, Bothwell Gosse e Manly P. Hall, outras da sua condicionalidade, tal a de Henry Drumond e a de J. F. B. Tinling, The promise of life and the doctrine of everlasting punishment, bem anotada a lápis, na qual se referem algumas afirmações dos primeiros padres da Igreja que a propunham, tal Justino o Mártir, Teófilo, Irineu e Arnóbio) e, finalmente, algumas obras sobre a problemática da metempsicose, tais como a de H. D. Taylor, Reincarnation refuted (muito crítica das pretensas revelações clarividentes do desequilibrado teósofo Leadbeater sobre mirabolantes vidas passadas, autor que Fernando Pessoa traduziu e criticou) ou a Ring of Return, an anthology of references to reincarnation and spiritual evolution: from prose and poetry of all ages. Compiled by Eva Martin, publicada já em 1927...
Mesmo na época da teorização neo-pagã, durante a qual faz múltiplas tentativas de contacto com espíritos através da escrita automática,  afirma que a alma é imortal e identifica-se com um discípulo dos discípulos de Jâmblico, Juliano, o Apóstata, que «era, propriamente, um mitraísta, o que hoje se chamaria um teosofista ou um ocultista». Depois, ao longo dos anos, com os seus amplos estudos ocultistas, maçónicos e iniciáticos aprofundará essa certeza que vai culminar no seu testamento autobiográfico de 30 de Março de 1935, onde se afirma como «cristão gnóstico». Ou seja, cristão, crente em Deus, em Cristo e na imortalidade espiritual, e gnóstico, por realização e auto-conhecimento e afirmando-se, por via tradicional, iniciado na Ordem Templária de Portugal, nos três graus menores.
Para uns, esta afirmação, realizada uns meses depois de ter dito em carta a Adolfo Casais Monteiro que não pertencia a ordem nenhuma, seria uma mistificação, mas há fragmentos do espólio que nos mostram claramente que Fernando Pessoa se iniciara nesses três graus. Um texto, cuja importância apontei em 1ª mão mas que tem sido menosprezado, contém mesmo a lápis as datas de 1931, 32 e 33 para a obtenção de tais estados e níveis, e aí afirma que para se obter o grau de Adepto Menor da Ordem de Cristo de Portugal era preciso «vencer o amor à vida como vida e o temor da morte como morte».
Como o conseguira Fernando Pessoa? «Vencendo o mundo, a carne, o diabo», como ele nos diz nas provas ou testes do grau de Aprendiz da Ordem Templária ou de Cristo, pela iniciação, pela transformação interior, pela tomada de consciência espiritual, que permitem a realização expressa no fim do seu famoso poema de 1932, A Iniciação: «Não estás morto entre os ciprestes. Neófito, não há morte». Ou num discurso iniciático dos últimos anos da sua vida: «Cego, nu e pobre entraste na vida. Cego, nu e pobre entrareis na morte. Não há, porém, vida nem morte: não há, Neófito, senão vida. O que vos sucedeu ao nascer, vos sucederá ao morrer: entrareis na vida. Isto é a verdade; o entendimento dela é convosco; assim como o regrar-vos por ela como deveis». No mesmo sentido da imortalidade corre um outro fragmento de um seu discurso iniciático: «Tudo aqui em baixo é símbolo e sombra. Julgas que vivemos e estamos mortos; julgas que morremos e vamos a viver.»
De realçar ainda textos onde lembra que, para se chegar à reconstrução do Templo que «é a plenitude da nossa vida espiritual», há que desarreigar «a Ignorância, o Erro, a Ambição, não apenas de nós próprios, mas (já que de certo modo o nosso Eu superior é um com toda a humanidade) da humanidade», pois são estes três defeitos ou vícios (trindade que glosará com frequência, com outras equivalências) que matam o Mestre, ou seja, que impedem ou dificultam o eclodir da consciência espiritual e imortal…
Ao utilizar expressões específicas e bem profundas como a de “talhar o corpo espiritual”, “reconstruir o Templo”, “conversa com o Santo Anjo da Guarda”, indica claramente a aproximação e consideração consciente do espírito e o desenvolvimento da alma em direcção a ele, aos Mestres, aos Anjos e a Deus, níveis ou seres estes que são imortaiss e e que partilham a imortalidade, e que Fernando Pessoa com frequência meditou e glosou em poemas e em ensaios afins da simbologia cristã, templária, rosa cruz e maçónica.
Noutro valioso escrito afirmará tanto a imortalidade e a reincarnação como a diferença entre o espírito e a alma: «É o Espírito da nossa Alma, o nosso Eu Superior, que está realmente consciente em nós e de nós supremamente; o nosso Eu inferior ou Alma, que é tudo o que aqui conhecemos de nós, está apenas consciente dele – Alma e Corpo – e não consciente do Eu Superior. O Eu Superior retém as memórias e os resultados das incarnações anteriores, pelo que só apenas vagamente e por algum contacto obscuro e ocasional com o Eu Superior, é que nos lembramos deles ou vagamente os sentimos. A fórmula Santo Anjo da Guarda corresponde ao Eu Superior, e exprime a verdade» (tradução do inglês e incluída na obra Rosea Cruz, publicada por mim em 1988). 
De realçar a ligação ao Anjo da Guarda, valorizada não só no Zoroastrismo, no Cristianismo e no Islão shiaa e sufi, tal como Henry Corbin tão bem estudou e divulgou, mas também em ordens secretas ou esotéricas ocidentais modernas, tal como a Golden Dawn do seu amigo Aleister Crowley, e que a partilha no seu livro Magick, lido por Fernando Pessoa, e de certo modo de onde provirá. A moda moderna dos Anjos pelas correntes mistificadoras da nova Era, que tanto inundaram o mercado de livros, certamente que nada tem a ver com esta demanda profunda e íntima que Fernando Pessoa tentou conhecer.
Ligada com a intuição da imortalidade esteve sempre a consciência da existência dos múltiplos estados de Ser e do Cosmos, tal como exprime caracterizando as cinco pétalas da Rosa Cruz: «etérico, astral, mental, espiritual e monádico», no que corresponde sensívelmente a tradição Persa, com o mundo Humano (Nasuf), o mundo Imaginal (alam al-Mitahil), o mundo da Alma Universal (Malakut), o mundo do Intelecto (Jabarut) e o mundo da Essência (Lahut), bem trabalhados não só pelos Persas como pelos Mogóis, onde destacaremos o nosso querido Dara Shikoh, autor de belas obras de espiritualidade comparada, uma delas traduzida e lida por mim, o Majma al-bahrain, o Encontro dos dois Oceanos e que está no Youtube.
E, consciente do seu amadurecimento ou evolução, poderá dizer: «A nossa maior consciência, quando adultos, indica uma maior aproximação entre o nosso Ser superior e o inferior, uma maior proximidade da unidade. Só a morte porém unifica, e é ela a verdadeira adultidade», afirmação esta que lembra um dos seus inspiradores iniciais, Antero de Quental, escrevendo à cabeça de um dos seus sonetos, muitos dos quais Fernando Pessoa traduziu para inglês, o dito grego “Morrer é ser iniciado”, dito também bem parafraseado pelo amigo e discípulo de Antero, Joaquim de Araújo, no seu bem valioso poema e livrinho Na Morte de Antero!, que li e comentei num artigo neste blogue.
                                           
As muitas experiências de mortes de familiares e amigos foram ainda outra fonte ou impulso para poemas que exprimiam esta certeza de uma sobrevivência post-mortem: 
«Ó curva do horizonte, quem te passa, /Passa da vida, não de ser ou estar. / Seta, que o peito inerme me trespassa/ Não doas, que morrer é continuar», esta ideia com o interesse de se repetir em parte ao longo dos anos, misturando-se até com as ideias expressas noutros poemas dedicados igualmente à sobrevivência da alma: «Na curva da consciência, se nos perde/ a visão do que amamos, não o ser».
Em certos casos os poemas são mesmo expressamente dedicados a pessoas, como ao seu grande amigo Mário de Sá-Carneiro, sob um manto de fundo de perenidade («embora num comboio expresso/ seguisses, e adiante do em que vou; no términos de tudo, ao fim lá estou/ nessa ida que afinal é um regresso.// Porque na enorme gare onde Deus manda/ Grandes acolhimentos se darão», inscrevendo mesmo utópica ou imaginalmente o poema «nesse número de Orpheu que há-de ser feito com rosas e estrelas em um mundo novo».
Em 6/7/1934, um ano antes de morrer, e quando imprime finalmente a Mensagem, termina o poema iniciado pelo «Já me não pesa tanto o vir da morte», com os seguintes versos, reafirmando alguns lemas, crenças ou certezas que desabrochara, tais como o destemor perante a morte, a existência de vida depois da morte, com ou sem metempsicose, tudo sob a Providência Divina:
«Sei que a morte, que é tudo, não é nada,
E que, de morte em morte, a alma que há
Não cai num poço: vai por uma estrada.
Em Sua hora, e a nossa, Deus dirá».

                                              
Se o sábio florentino Marsilio Ficino escrevera um importantíssimo tratado, no Renascimento, de Teologia platónica e cristã de demonstração da imortalidade da alma (como antes S. Agostinho, Alcido, e depois Gerolano Cardano, Augubino Steuco), a Platonica Theologia, De Imortalitate animorum, Fernando Pessoa, sem chegar a uma transmissão doutrinal mais finalizada do que a expressa na poética da Mensagem,
                             
deixou-nos ainda assim muitos sinais da certeza da imortalidade do espírito, a qual merecia, no claustro do templo dos Jerónimos, sobre o túmulo do seu corpo incorrupto (em 1985, quando para ali foi merecidamente trasladado do cemitério dos Prazeres, verificou-se certo estado de incorrupção), por ele muito glosado a propósito de Osíris, Hirão, Jesus, Jacques de Molay e Christian Rosencreutz), manifestar-se numa inscrição-citação sobre o mármore da perenidade, justa e verdadeira, talvez como a do poema datado de 10/12/1932:
«A morte mata somente
O poder-nos outrem ver.
Nosso ser segue presente
Naquilo que é nosso ser».

Ou mesmo a do ano anterior à morte: 

«Sim, por fim certa calma...
Certa ciência antiga sentida
Na substância da vida,
De que não há acabar da alma,
Qualquer que seja a estrada que é seguida».
                          
Que na companhia dos outros seres, mestres e discípulo(a)s, trabalhadores e construtores, pacificadores e libertadores, sábias e musas da Ordem Espiritual de Portugal, saibamos identificar-nos mais ao Espírito e, neste plano físico humano tão manipulado e dilacerado pelo imperialismo e pelo neoliberalismo corrupto, agir sábia, amorosa e libertadoramente em comunhão ou comunidade com Fernando Pessoa...

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